O programa de televisão Carrossel da Saudade

Um chão cheio de estrelas da musicalidade manauara.

Programa Carrossel da Saudade. Estúdio alternativo, 18/12/87. Regional Talento não tem idade. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Tudo começou no Solar da Seresta em Belo Horizonte, quando o escritor Demosthenes Carminé participou dessa experiência em uma casa de arquitetura antiga, frequentada na época por seresteiros e cantores de MPB, faziam suas apresentações ali.

Em Manaus, comentava-se sobre um programa similar na televisão educativa para essas reminiscências, que de certa forma resgatava um período importante da era do rádio na cidade e oferecia a oportunidade de trazer para a cena os cantores participantes daquele momento cultual do rádio, evidenciando suas passagens pelas emissoras locais. 

Nesta época faziam sucessos grandes nomes do caster nacional como Sílvio Caldas, Orlando Silva, Ângela Maria, Carmem Miranda, Dalva de Oliveira, Francisco Alves, Dolores Duran, Vicente Celestino e tantos outros que brilhavam nas ondas do rádio dos anos 40 e 50.

Walesca em segunda apresentação no programa. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Foi buscando esse sentido que a TV Educativa da época, hoje TV Encontro das Águas, empenhou-se no desenvolvimento de um projeto que pudesse trazer todos esses nomes do rádio amazonense.

Sob a direção do grande Rui Alencar e a produção de Graça Barbosa e Iolanda Oliveira, e direção de imagens de Aldenildo Santos, acompanhado de um grupo de cantores locais, reunia-se todas as quintas-feiras para a gravação no estúdio de um programa com características apropriadas. 

Vale a pena destacar que o cenário era de uma praça antiga que lembrava a cidade de Manaus, com banco e lampião, ao fundo um painel azul adaptado da cantoria de salão, cuja expressão maior era a modinha, canção de súplica própria para ser cantada em saraus de forma dolente e entre suspiros.

Lélia de Souza, 1985. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

O ‘Carrossel da Saudade’, programa que fez e a faz história desde seus primórdios, tornava-se assim um programa popular que, além de musical, era informativo e com um teor humanizante. Foi um período rico transcorrido no ano de 1979, quando a televisão educativa a época formava uma família de profissionais e estudantes de comunicação, entusiastas e sonhadores com mil ideias e muitos projetos, monitorados por excelentes técnicos: Rui Alencar, Jorge Libório, Maria José Barbosa, Matilde Hosannah, Célia Lopes e outros trazidos pelo então engenheiro Nelson Lisboa. 

Com este engenheiro, veio o Carlos Alberto Viana, conhecido como “Social”, passando a integrar aquele momento a equipe da TV, emprestando sua experiência, fazendo a ponte entre câmeras e salas de transmissão, ajudando também na recepção do público.

A escolha do nome do programa fora proposto em um clima de entusiasmo e entrosamento, era uma escolha democrática e assim nasceu o ‘Carrossel da Saudade’. Temos que destacar a participação importante do jornalista Rui Alencar, afinal, sua proposta era tirar da memória a história de uma Manaus de outrora e que naturalmente teve o aval e a contribuição importante do superintendente José Cidade de Oliveira e o apoio fundamental do secretário da Fazenda a época Onias Bento, que proporcionou a TVE recursos para se dotar de excelente equipamentos para os padrões da época.

Ivaneide apresentando-se no programa em 1986. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

De toda essa riqueza, a Televisão Educativa era única a produzir programas locais. Alencar propôs a criação de um especial onde a música seria a referência, era mais um avanço nas comunicações da época. Diante de tanta seriedade da criação do programa, a direção procurou profissionais da área técnica e especialmente da área artística. 

O primeiro grupo sondado para inaugurar o ‘Carrossel da Saudade’ foi o Regional Baré do professor Carlito, conhecido como “Boca de Cantor”, profissional experiente, professor de violão e músico da noite manauara dos bares e restaurantes da cidade. Esse fato histórico ocorreu no dia 29 de outubro de 1979, veio em substituição ao antigo programa chamado ‘Noite de Seresta’ e que era apresentado pelo jornalista já falecido Paulo José.

O Regional Baré era composto por Carlito no violão de chamada, Pedro Silva no violão de apoio, Zé da Manola no cavaquinho, Badan no bongô e Paulinho no afouché. Carlito lembra dos primeiros programas e dos cantores participantes daquela quinta memorável de 1979, principalmente quando Francisco Lima, a voz de ouro ABC de 1963, cantou “Casa de Caboclo” de Heckel Tavares e Luiz Peixoto. Cantaram também nesta noite a sambista Maria das Dores, a voz possante de Simas Vieira e o talentoso Raimundo Clemêncio, antes pertencente a Rádio Difusora. Também participaram Carlos Maciel e Nico, pertencente a Rádio Rio Mar, Wanda e o conhecido seresteiro do Amazonas, Nicolau Murno.

Francisco Petrônio em apresentação no programa. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Muito embora a produção contasse com Regional Baré, havia a necessidade da busca de músicos experientes, especialmente do movimento radiofônico de nossa cidade que naquela época lotavam a Malocas dos Barés, Rádio Baré e a Rádio Difusora que mantinham programas de auditório. Outros nomes importantes da musicalidade da época forma chamados a participar, Máximo Pereira, Domingos Lima, Zé da Manola, Pedrinho do Acordeon, Anubis Celestino.

Transcorria o ano de 1953, a TVE entra em uma nova fase com a jornalista Hermengarda Junqueira buscando oferecer novas perspectivas para televisão. A nova superintendente deu seu aval ao programa prometendo total apoio ao diretor de produção e oferecendo condições de trabalho para o programa ‘Carrossel da Saudade’.
Cantora Edith Veiga pela segunda vez no programa. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Para a nova abertura do programa, foi utilizado um violão e sendo colocado no seu bojo, camafeus e fotos de logradouros e prédio antigos da cidade. Não poderia ser diferente, o programa atingiu o auge a partir desse momento, especialmente com a produtora experiente Graça Barbosa que fora mantida na função. 

Para isso houve a colaboração de Maria José Barbosa que, como diretora administrativa, empreendeu apoio financeiro para a produção do programa. A apresentação do programa tomou nova conotação com a chegada do radialista Jurandir Vieira, tendo como companhia para dividir a apresentação Ildete Dantas, dona de uma locução excepcional e experiente em Teatro e Televisão o que elevou a qualidade do programa. A chegada do maestro Jerê, agregou mais qualidade. A programação permitia também, sempre que possível, trazer cantores nacionais para se apresentar. Este é um período rico da história da TVE no Amazonas, hoje TV Encontro das Águas. A televisão no Amazonas tem muita história a ser contada.

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista 

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