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Sexta, 03 Mai 2024

O Jornal, matutino que fez história no Amazonas

Os jornais que circularam em Manaus não só fazem parte da história como escreveram as suas próprias histórias juntamente com as sociedades daquele período. Num testemunho irrefutável, marcado em páginas amareladas pelo tempo, especialmente 'O Jornal', retratos vivos de épocas distintas de grandes nomes do jornalismo amazonense, dentre eles Phelippe Daou.

A credibilidade de O Jornal naquele período, a aceitação que desfrutava junto a sociedade amazonense por suas matérias publicadas, permitiu o surgimento de outro jornal, o Diário da Tarde que num litisconsórcio formaram aquela que verdadeiramente seria a primeira empresa de comunicação amazonense nos moldes de uma estrutura moderna empresarial. 

O legado de O Jornal e do Diário da Tarde marcaram importantes passagem como matutino impresso naquele período. É notável perceber a quantidade de profissionais formados em suas redações, tais como: Phelippe Daou, Milton de Magalhães Cordeiro, Arlindo dos Santos Porto, na época jovens aprendizes dos mestres Aristophano Antony e Herculano Castro e Costa, que juntamente com grandes do jornalismo regional promoveram a valorização do jornal impresso naquela época.

Face a tudo quanto representaram na época na formação do pensamento livre e crítico do nosso povo, a especial atenção dada a cultura, o verdadeiro farol espantando a ignorância e a alienação, ainda que em alguns casos tenho sabido o momento certo de recuar, foram destaques da imprensa escrita na Amazônia Ocidental.

Festa de confraternização Jornalistas do Amazonas, 1957. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Embora tenha sido criado sob o patrocínio da Revolução de 1930, fato reconhecido pelo próprio diretor proprietário, nasceu O Jornal como um diário vespertino que durante todo resto daquele ano e pelo ano seguinte, circulou com mensagens em prol da Revolução ao lado do título no alto da página, sob a responsabilidade do redator chefe, jornalista Huaskar de Figueiredo. Outra característica interessante é que não era editado nos dias de domingo. Isto aconteceu até 1934, quando passou a adotar o título "Vespertino Independente". Entretanto, em ocasiões especiais como comemorações de datas históricas ou por alguma contingência nos acontecimentos locais, saía às ruas em edições extras, pela manhã aos domingos.

No número de páginas variava entre quatro, seis e oito, apesentava desde sua fundação até o fim do decênio cerca de cinco ou seis colunas e entre estas destacava-se a coluna social, "Mudanismo", onde registrava-se aniversário de cidadãos de todas as classes sociais, os mais abastados mereciam ter suas fotografias publicadas, numa constante interação com a sociedade, advindo talvez daí juntamente com outras manifestações do período o respeito adquirido ao longo dos tempos pelos leitores da cidade da qual O Jornal se fizera porta-voz.

Com correspondentes em quase todos os municípios do interior, trazia em suas páginas sempre muito bem diagramadas, notícias de localidades distantes que o tornou um jornal de alcance em todos os rincões do nosso estado. As ocorrências policiais publicadas na coluna intitulada "Pequenos Fatos Policiais", foi com o tempo ganhado espaço cada vez maior e chegou mesmo a ocupar boa parte da folha de rosto a parti de 1934. Nos dois editoriais apresentados na primeira página, sendo uma de direita e outra de esquerda, podia se observar a interferência do jornal nos assuntos políticos principalmente do município.

Entrega de um manifesto em defesa do Amazonas. Jornalistas José Cidade de Oliveira e Phelippe Daou, presidente Juscelino Kubitschek, jornalistas Arlindo Porto e Roberto Cohen. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

A Era da Modernidade 

Manaus lucrou com o surgimento de O Jornal, órgão que não media defesa dos interesses da cidade, formando opinião pública, buscando ter o papel e a ação dos meios de comunicação em todo esse processo. Para isso, o proprietário procurava dotar de recursos que permitisse ao veículo estar em constante igualdade com os períodos mais importantes do país.

No ano de 1933, Henrique Archer Pinto arrendava do Governo do Estado uma oficina gráfica de propriedade deste, a mesma que o "Vespertino Independente" era editado desde 1930. No dia 8 de janeiro de 1930, a direção do jornal adquire no Rio de Janeiro moderno parque gráfico com uma rotativa duplex com cinco Linotypos e instalações para gravuras e estereotipia, o moderno equipamento permitiu maior tiragem de jornais para atender os leitores.

Mantendo uma sucursal na cidade do Rio de Janeiro sob a direção de Luiz Mendes, O Jornal, por meio da Agência Brasileira de Notícias, até então protegida pela Assembleia Nacional Constituinte de 1934 permite chegar à cidade de Manaus notícias atualizadas.

A atuação de O Jornal junto ao público leitor era de grande identificação, já a partir de 1934, sempre procurando dá prioridade, às manifestações populares por mais simples que fossem. Numa época em que o jornalismo impresso se tornava parte da cultura de massa, resultado das grandes transformações sofridas pela imprensa a partir dos primeiros anos do século XX, O Jornal processava em suas páginas a busca diária de uma identificação com o público.

Lourdes Archer Pinto, o senhor Henrique Archer Pinto e a menina Marilu Archer Pinto. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Morre Henrique Archer Pinto

A morte de Henrique Archer Pinto em 19 de maio de 1954, aos 67 anos, causou comoção e enlutou os jornais da época. O velho jornalista que há muito residia na cidade do Rio de Janeiro deixou a empresa que fundara amadurecida e respeitada em todo país, foi substituindo agora de modo definitivo por Agnaldo Archer Pinto que ampliou ainda mais o alcance do jornal, fazendo-o enveredar para outros meios de comunicação ao criar setores internos dos jornais passou a partir de 1955 até editorias divididas em cidades, que publicava andamento nos hospitais, repartições do governo, tribunais e polícia, colunismo social, crônica esportiva, economia e politica, obedecendo e seguindo as linhas editoriais dos grandes jornais do país.

Morre Agnaldo Archer Pinto

Em 28 de novembro de 1956 morre subitamente na cidade do Rio de Janeiro, aos 39 anos, Agnaldo Archer Pinto. A empresa toda profissionalizada contava com seis máquinas de linotypos e uma rota plana de fabricação alemã que imprimia oito páginas de O Jornal ao mesmo tempo em que seu quadro de profissionais era de uma equipe incomparável: Almir Diniz de Carvalho, Phelippe Daou que neste momento passa a ser o diretor interino, Irisaldo Godot, Bianor Garcia, Newton Garcia, Bento de Oliveira, Tomás Fonseca, José Roberto Cavalcante Oscar Carneiro, Cornélio Melo, Geraldo Gondim, Sérvio Túlio Nina, Guataçara Mitoso e Sebastião Soares de Oliveira, que a partir do primeiro semestre de 1957 passaram a ser dirigidos por Maria de Lourdes Archer Pinto, primeira mulher a ocupar a este cargo em Manaus numa grande empresa jornalística.

Obedecendo aos projetos do grande jornalista falecido, fez funcionar em 1957 os primeiros postos fixo de venda do jornal novidade em Manaus, na época instalados em vários pontos da cidade. Estes postos serviam ainda para recolher da população reclamações sobre suas necessidades e sugestões para solução de problemas que seriam publicados regularmente nas colunas: "Quais as necessidades de seu bairro e casos dolorosos da cidade", aumentando a interação do leitor com O Jornal. A intenção que logo surgiu efeito e estava seguindo a filosofia dos modernos jornais. Neste período de 1930 a 1960 foi o Diário da Tarde e O Jornal reconhecidamente jornais de grande circulação em Manaus. O Jornal de Henrique Archer Pinto escreveu sua história até o fim de seus dias no ano 1977.
Composição de mesa, cadeiras e armário com objetos de época usados por Phelippe Daou, no O Jornal, 1950. Foto: Reprodução/Acervo Museu Rede Amazônica

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

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