À época da Província do Amazonas esses acontecimentos de rua eram feitos por brincadeiras como o Entrudo e o Zé Pereira, além dos foliões mascarados que invadiam o Centro antigo de Manaus, quando da época da festa popular.
Segundo a professora e historiadora Mary Del Priore, o carnaval não tem sua origem no Brasil. Sua origem se perde no tempo, tanto que as religiões históricas nascidas às margens do Mediterrâneo tiveram que criar um espaço para tais festividades no seu calendário. O Cristianismo associou o carnaval à quaresma, que antecede à Páscoa, ao Judaísmo, à festa de Purim, em homenagem a Rainha Éster. Já o Islã situou as mascaradas no início móvel do seu ano lunar. Ainda segundo a historiadora, as três festas seguem firmemente inscritas no tempo religioso, mas aparecem, em diferentes graus, como fragmentos ou parênteses pagãos.
Em tempos mais remotos do carnaval, na longínqua Babilônia e na Roma Antiga, foi no calendário cristão que brotaram suas raízes mais evidentes.
“[ ]… Ao longo da idade média, os festejos com mascaradas eram mais definidos pelas estações do ano que por datas exatas. Entre o natal e o carnaval multiplicavam-se as quermesses. O período de matanças de porcos, para o preparo de embutidos a consumir na semana gorda, permitia aos jovens tingir o rosto com cinzas, encapuzar-se, vestir-se com sacos, roupas de mulher ou suas roupas ao avesso. Assim vestidos, assustavam outras pessoas, entravam em casas, comiam, bebiam e beijavam as moças, que tentavam reconhecê-lo. Na quarta-feira de cinzas, um manequim figurando o carnaval fazia sua entrada no vilarejo seguido de um grande cortejo de mascarados. Ao fim do dia, era queimado num muro próximo à Igreja, juntamente com as mascaras e acompanhado de lamentos que anunciavam a chegada da quaresma.
O carnaval seguiu os navegadores europeus pelo resto do mundo. Ao longo do tempo, carnavais rurais e urbanos se complementaram, com duração variável. Eles apostaram no papel maior ou menor das máscaras ligadas à Quaresma, ritos agrários, como se vê no México, ou nos Andes, no Mardi Gras de Nova Órleans ou no Carnaval das Irmandades Haitianas, em que as máscaras de vodu se confundem com as de carnaval.”
Fonte: Mary Del Priore é professora de pós-graduação na USP e autora do livro Festas e utopias no Brasil colonial. São Paulo: Brasiliense, 2003.
Afirma-se também que o carnaval é considerado umas das festas mais animadas e representativas. Tem sua origem no entrudo português, cujo hábito era jogar nas outras pessoas água, ovos e farinha. O entrudo, em Portugal, acontecia em um período anterior à Quaresma, com significado ligado à liberdade. Chega ao Brasil, no século XVII, influenciado também por outros países europeus como a Itália e a França, tinham características de desfiles, onde os brincantes usavam máscaras e fantasias, não podemos esquecer os personagens como a Colombina, o Pierrô e Rei Momo, estes incorporados ao carnaval brasileiro, no Brasil, especialmente nas grandes capitais, no final do século XIX, começam a aparecer os primeiros blocos carnavalescos, cordões e os famosos corsos. Estes últimos, tornaram-se mais populares no começo do século XIX. As pessoas fantasiavam-se, decoravam seus carros ou, a maioria, a pé desfilavam pelas ruas das cidades.
O carnaval, em Manaus, teve seu período áureo, nos anos quarenta, cinquenta, sessenta e setenta, com bailes tradicionais nos principais clubes sociais, como Atlético Rio Negro Clube, Ideal Clube, Luso Sporting Clube, Nacional Futebol Clube, Barés Clube, Sheik Clube, Olímpico Cube, Internacional, América, Sulamerica, São Raimundo, Ipiranga e tantos outros.
Segundo o pesquisador e escritor Geraldo Xavier dos Anjos, as reminiscências do carnaval do passado são recheadas de fatos interessantes. Tais manifestações do carnaval que transcorriam nos principais clubes da cidade e de uma forma mais popular nas ruas de Manaus.
O pesquisador nos revela, ainda, que à época da Província do Amazonas esses acontecimentos de rua eram feitos por brincadeiras como o Entrudo e o Zé Pereira, além dos foliões mascarados que invadiam o centro antigo de Manaus, quando da época da festa popular.
Por sua vez, o Entrudo era uma prática proibida, por promover sujeira e imundície. O Entrudo foi uma manifestação introduzida no Brasil pelos colonizadores portugueses da Ilha de Açores.
A prática consistia em jogar nas pessoas água de lama, tinta e tudo que fosse mal cheiroso, até água podre e urina. Tal comportamento provocou a proibição por meio de uma portaria da Câmara Municipal de Manaus publicada no código de postura do município. O fiscal do primeiro distrito desta cidade faz publicar a bem dos interesses o seguinte artigo.
”[ ] … Artigo 82 – é proibido andar-se pelas ruas e lugares públicos e jogar entrudo ou alguma coisa sobre os transeuntes. Pena de dez mil reis de multa ou três dias de prisão.
Artigo 1. Permite-se as mascaradas danças carnavalescas de modo que não ofendam a moral e tranquilidade publica e não contenham alusão às autoridades ou a religião.
Artigo 2. Pelas ruas, praças e estradas da cidade não transitarão pessoas mascaradas depois do toque da Ave-Maria, salvo as que tiverem para isso licença da autoridade policial. Os infratores incorrerão na multa de cinco mil reis, ou dois dias de prisão.
Manaus, 28 de janeiro de 1874.
Pedro Mendes Gonçalves Pinto
“[ ]” Publicado no jornal da Barra do Rio Negro, O Estrela do Amazonas encontra-se o convite da Sociedade Recreativa Amazonense para o primeiro baile carnavalesco de que se tem notícia, da época 28 de janeiro de 1854. A Diretoria da Sociedade Recreativa Amazonense faz saber aos seus sócios que a partida carnavalesca correspondente ao mês terá lugar no dia 1 de fevereiro próximo vindouro na casa de residência do excelentíssimo senhor Capitão Gabriel Antonio Ribeiro Guimarães.
Os sócios que desejarem cartões para convidados deverão fazer os seus pedidos até o dia 31.
Barra, 24 de janeiro de 1854.
O Secretário
João Antonio Pará
Neste mesmo jornal, no dia 24 de fevereiro de 1855, temos a seguinte notícia: Na noite do dia 20 do corrente alguns dos principais negociantes desta capital ofereceram na casa da residência do Senhor Doutor Antonio José Moreira um baile de carnaval para homenagear excelentíssimo senhor Conselheiro Herculano Ferreira Penna. A ocorrência foi brilhante e, ainda nesta Capital não houve um baile em que se dançassem treze quadrilhas como nesta: o serviço foi muito bem feito.
Fonte: Carnavalesca – exposição de arte e memória do carnaval amazonense. 08 de fevereiro de 1991. Pesquisa e texto de José Geraldo Xavier dos Anjos.
Afirma-se, hoje, que o carnaval é uma festa do povo, vale relembrar os grandes desfiles na Avenida Eduardo Ribeiro, que, para os mais velhos, o local é sempre relembrado e naturalmente o preferido da velha guarda.
Em Manaus, quando os desfiles ocorriam na Avenida Eduardo Ribeiro, eram ostentadas elegantes fantasias, algumas com máscaras que desfilavam em carros alegóricos que desciam e subiam a partir do porto de Manaus até o Instituto de Educação. Tinha seu início muito cedo ,normalmente, às 16h. Os veículos da época de capotas arriadas com bonitas jovens a desfilar, o que permitia a população a tirar serpentinas e confetes e, quando em vez o lança-perfume. Tempo de boas memórias, o carro alegórico era sempre esperado com muita curiosidade pela população que se colocava nas calçadas daquela bela avenida, muito bem arborizadas pelos benjaminzeiros. Era uma avenida mesclada de comércio e residências, ainda me recordo das famílias sentadas a porta a apreciar o desfile, especialmente a família da Madame Verdade, responsável pela produção de muitas cabeças que haveriam de desfilar no Atlético Rio Negro Clube e no Ideal Clube.
Na década de quarenta, tínhamos os famosos carros alegóricos a cada ano muito bem produzidos da fábrica de cerveja Miranda Corrêa, destacando a sua saborosa cerveja XPTO, os caminhões muito bem ornamentados da empresa do Comendador Joaquim Gonçalves de Araújo, jogando para o povo os famosos saltos de borracha Coroa. A fábrica de guaraná Andrade participava oferecendo seu delicioso guaraná Andrade, o Luso Sporting Clube também participava do desfile sempre na tentativa de superar a União Esportiva Portuguesa, pois o Luso Sporting Clube era frequentado pelos portugueses mais pobres e a União Esportiva Portuguesa que era frequentado por uma camada de portugueses mais ricos. Importante ressaltar que os sócios do Luso Sporting Clube não podiam frequentar a União Esportiva Portuguesa, em contra partida os sócios do Luso Sporting Clube também não recebiam os sócios da Esportiva União Portuguesa. O Atlético Rio Negro Clube fazia o seu baile de Black-tie e o Ideal Clube seu principal concorrente com finos bailes com desfiles de belas fantasias. O Nacional Futebol Clube tinha seu baile máximo infantil, também com desfiles de fantasia.
Mas é na Avenida Eduardo Ribeiro que tínhamos o grupo da Mocidade que, segundo escritor Carlos Zamite, apresentava, no último dia de desfile, o seu carro alegórico que era construído em sigilo, cujo tema era discutido na loja dos irmãos Tetenge, também na Eduardo Ribeiro. Este grupo carnavalesco que chamava Mocidade desfilou durante 25 anos tendo saído pela primeira vez em 1953 com o tema Branca de Neve e os Sete Anões. Foram muitos os temas apresentado por eles: Cangaceiros, Ciganos, Lavadeiras, Ali Maria, TV não era, o Circo e tantos outros. O último desfile de Mocidade foi em 1978.
Vamos relembrar o famoso baile Black-tie do Atlético Rio Negro Clube que iniciava às 22h com um grande sereno, era aglomeração de pessoas na porta do clube para observar a entrada das belas fantasias da alta sociedade amazonense que haveriam de desfilar. Este baile tinha o seu término às 05:30 da manhã e desfile continuava pela Avenida Epaminondas, passando por trás da Santa Casa de Misericórdia, descia Avenida Eduardo Ribeiro, subia Avenida sete de setembro e chegava no seu ponto máximo de encerramento na famosa Praça da Polícia, assim, eram os anos de glórias da elite do carnaval amazonense. A sociedade amazonense envelheceu, porém, a partir dos anos setenta começam a surgir as primeiras bandas, de certa forma com um crescimento vertiginoso permitindo ao brincante se fazer presente de uma forma muito simples. Esse fenômeno se proliferou e, hoje, é uma verdadeira febre, podemos destacar duas Bandas, a do Bar do Armando e a da Rádio Difusora, porém, há inúmeras delas.
Sobre o autor
Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.
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