​Ascendino T. Bastos: uma história a ser contada

Ascendino, como atleta, participou da fundação do Atlético Rio Negro Clube, em 13 de novembro de 1913.

Os homens e as mulheres que lograram êxitos em suas histórias, tiveram como principal atributo a coragem e o espírito empreendedor. Foram sobretudo, seres que acreditaram em seus sonhos e projetos movidos pelo entusiasmo e pelos ideais e, assim legaram à sociedade uma história de feitos e conquistas.

A maior herança desses espíritos esclarecidos e altivos é o exemplo que deixam para seus descendentes e a comunidade, especialmente para os jovens, de que transformar sonhos em realidade não é impossível. A história exemplar de Ascendino T. Bastos é ilustrativa da capacidade de superação e realização do ser humano.

Avenida Eduardo Ribeiro, Ideal Clube. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Ascendino T. Bastos quando viveu entre nós trouxe a lume ou em preto e branco, cores com nuances de uma Manaus que ele nasceu, trabalhou, como atleta participou da fundação do Atlético Rio Negro Clube, em 13 de novembro, de 1913. dando ao retrato de uma história familiar em plena floresta amazônica e naturalmente agora me permito trazer a conhecimento sua história. Toda nova geração forja padrões, valores e atitudes sobre a vida, a sociedade e o seu passado.

Ah Manaus, quanta saudade daquele período. Perdoe-me a pretensão de querer ver-te na sedução do teu passado. Também te vejo nem por isso menos perdida em estamparia de chita, a sacudir a sonolência da cidade bucólica com a frivolidade do teu comércio pujante com a Europa. É de fato a volta de uma Manaus a luz de lamparinas e lampiões, perdendo seus brilhos para o sol que acabara de nascer espelhado nas águas do Rio Negro, reluzindo frenesi de suor na pele morena de tuas meninas moças nos arrebaldes de nossa cidade.

Rua Lobo D’Almada. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Ah Manaus! Quanta saudades da hora do ângelos e canto das cigarras, cumpre-se da missa das 18h no Largo de São Sebastião. Ascendino T. Bastos e sua família preservou os retratos, guardou suas ruínas, recolheu os pedaços e a partir deles trouxe para nós memórias do passado de seus familiares. Ele conseguiu fotografar com sua mente e se apropriou de retratos múltiplos e variados da beleza dos tempos de antanho de forma poética de uma cidade que não existe mais.

Ascendino T. Bastos nasceu na Paraíba no dia 24 de setembro de 1896, tendo imigrado para o Amazonas, formou-se em agronomia pela Escola Agronômica de Manáos, tendo-se graduado em 09 de fevereiro, de 1933. Foi fundador e atleta do Atlético Rio Negro Clube, como goleiro, residia na Rua Lima Bacuri, 377, centro. Na vida profissional, já no ano de 1942, trabalhou na Inspetoria da Polícia e Portuária e Área de Manaus, como Fiscal do C. M. Tramways do Roaday.

Ascendino T. Bastos, atleta goleiro e fundador do Athletico Rio Negro Clube. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Manaus: uma cidade em plena floresta amazônica onde viveu Ascendino T. Bastos

A baia do Rio Negro era bem a vitrine do que significou o poderio do período econômico do látex. Apesar de ser um período difícil para economia do Estado do Amazonas, muitos navios de todos os tipos e calados permaneciam fundeados ao lado baia do Ri Negro, cujo, contato com a terra era ligado por dezenas de catraias remadas por portugueses da Póvoa de Varzim que traziam e levavam passageiros e tripulantes desses barcos nacionais e internacionais que aguardavam por suas cargas a serem transportadas para Nova York, Liverpool, Hamburgo e outras praças.

Mesmo com a queda vertiginosa do látex ainda mantínhamos a exportação de castanha, óleos vegetais, couros de animais silvestres e demais produtos de menores que eram trazidos para o interior do Estado do Amazonas, por navios a vapor, que há época foram denominados “gaiolas, chatinhas e vaticanos”.

Rua Silva Ramos. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Manaus neste período apesar da crise oferecia aos seus visitantes e moradores ruas largas, cortadas por belos espaços e logradouros públicos, com bondes de tração elétrica, carroças com tração animal que cruzavam a cidade, pois, naquele período eram também uma forma de transporte de mercadorias, especialmente nas serrarias para transporte de madeiras.
Se a arquitetura é o símbolo mais visível de uma sociedade, a fisionomia urbana de Manaus reflete bem o espírito da sociedade que aqui floresceu. Na verdade, a arquitetura de Manaus daquela época apresentava uma atitude emocional e estética do apogeu de período do látex e da burguesia, enriquecida por um processo produtivo.

De uma aldeia dos índios Manáos, o antigo lugar da Barra, se transformara num dos mais importantes centros do mundo tropical, graças à vitalidade econômica da borracha que lhe deu vida, riqueza e encantos, como na antiguidade o comércio intenso, no Mediterrâneo e no Adriático, que possibilitou a Roma, Florença e Veneza, papel preponderante, nas artes, nas letras e na arquitetura da Velha Europa.

O movimentado centro comercial regurgitando de gente de todas as raças, nordestinos, ingleses, peruanos, franceses, israelenses, norte-americanos, alemãs, italianos, árabes e portugueses. A Avenida Eduardo Ribeiro concentrava um número expressivo de casas comerciais. Nas proximidades do Mercado Municipal Adolpho Lisboa e nas ruas Marcílio Dias, Guilherme Moreira, Quintino Bocaiuva, Henrique Martins, Praça XV, não era diferente. Tudo o que o comércio internacional a época, poderia ser encontrado nesta longínqua cidade, plantada a milhares de quilômetros dos principais centros capitalistas.

Vista aérea da Avenida Sete de Setembro. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

As atividades comerciais bem constituídas abrigavam, no andar inferior, no comércio e no andar superior a residência do proprietário, instalado próximo ao seu trabalho, era razão para uma dedicação de maior tempo ao trabalho o que ocorria normalmente das 7h às 21h. Esse espaço residencial era o que predominava em nosso centro comercial. Mais afastados como na Praça dos Remédios, onde havia uma grande concentração de árabes, ao longo da Joaquim Nabuco, Largo de São Sebastião, Sete de Setembro, Barroso, 24 de Maio, Saldanha Marinho e outras ruas circunvizinhas, dispunha-se as residências mais ricas, magníficos palacetes construídos no melhor estilo da época, assoalhos de acapu, pau-amarelo e pinho de riga, onde sol vazava as janelas e vitrais europeus. As salas normalmente iluminadas com belíssimos lustres europeus, paredes de tetos decorados de pinturas e telas ou ar frescos. Seus salões amplos exibiam luxuosíssimos moveis, porcelanas, cristais e pratarias e, que permaneciam sempre abertos para receber visitas e festas de aniversários, banquetes e saraus, as diversões familiares da Belle Epoquê.

Casas de alvenaria com porões habitáveis, com fachadas de painéis de azulejos europeus, com suas entradas de escadas em degraus de pedra de lioz ou mármore, sala de visita, alcova, sala de jantar, o grande corredor ladeado de dois ou três quartos, cozinha e mais dependências.

As famílias de menores recursos habitavam as extensas vilas de casas populares, o que encontramos ainda hoje nas ruas 24 de Maio, Lauro Cavalcante e Joaquim Nabuco e, as chamadas estâncias, extensas construções de meia-água, divididas em pequenos quartos para aluguel, vale apena lembrar a estância do Cangalha, que entrava pela 7 de Setembro até o Igarapé de Manaus, na antiga Ponte Cabral que existe até hoje. Entre os hotéis destacavam-se: o Cassina, na Praça Dom Pedro II e, o Grande Hotel na Rua Municipal n. 70, belíssimo edifício de dois andares com 42 quartos, cujos, cômodos eram caprichosamente mobiliados (este prédio muito mais tarde sofreu um grande incêndio, de suas ruínas sobrou apenas as fachadas pelas ruas 7 de setembro e Marechal Deodoro. A prefeitura propôs a demolição e em seguida houve a intercessão do então Secretário de Cultura da época Robério Braga que imediatamente, tomou providências para que as referidas fachadas fossem escoradas com enormes vigas de aço para sua sustentação, onde mais tarde foi restaurado).  

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista 

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