A cidade flutuante

A sua história data de 1920, quando deu início na orla no Bairro do Educandos, o primeiro flutuante residencial em Manaus.

Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

A sua história data de 1920, quando deu início na orla no Bairro do Educandos, em Manaus, o primeiro flutuante residencial construído pelo senhor João Aprígio. O surgimento dos flutuantes no litoral da Baia do Rio Negro ocorre a partir da expansão comercial nas circunvizinhanças do mercado municipal Adolpho Lisboa. As pessoas que passaram a exercer atividades comerciais, especialmente a de varejistas e naturalmente do atravessador, sem condições de se estabelecer dentro do mercado por simples falta de espaço físico, começam a construir, no período da vazante, casas montadas em toras de madeira, o que permitiu sua permanência por tempo indeterminado.

Não podemos deixar de citar a influência do êxodo rural naquele período. Eram grandes quantidade de pessoas em busca de novas oportunidades de trabalho e a ausência dos governos em promover solução para os problemas habitacionais.

“Comparando-se, no quadro abaixo, o ano de 1920 com o ano de 1940, o de 1940 com de 1950 e este com ano de 1960, vê-se que o crescimento da população de Manaus foi da ordem de 40.5%, 31.2% e 25.6% respectivamente. Os incrementos percentuais verificados bem demonstram o quanto aumentou a população de Manaus, sem que, em contra partida, fossem construídas novas habitações”.

Anos Estados % Manaus %
1920 363.166 20.6 75.704 40.5
1940 438.008 41.6 106.399 31.2
1950 514.099 98.6 139.620 25.6
1960 721.215 175.343

Fontes: Serviço Nacional de Recenseamento – Anuário 1963. Comparação para o Estado com o ano-base de 1920. / Aspectos Econômicos e Sociais da Cidade Flutuante. Autores: Celso Luiz Rocha Serra e Wilson Rodrigues da Cruz. 

Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

A chegada destes contingentes humanos a Manaus acarreta, de certa forma, prejuízo, especialmente na repercussão econômica e social. Na verdade já aparecia nesse contexto o desemprego, proliferado através de novas atividades que surgiam a época, tais como: vendedores de picolé, vendedores de cigarro, vendedores de merendas em canoas, vendedores de pão, etc. 

Dessa forma, aumentando consideravelmente o número de pessoas sem atividades no espaço urbano, visto o poder de absorção do mercado de trabalho na cidade não comportar tal anomalia.  

Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

 Flutuantes de Manaus

População segundo os ramos de atividade (parcial)
Atividades não declaradas 1.468 pessoas
Atravessadores 816 pessoas
Vendedores ambulantes 155 pessoas
Vendedores de café (em canoas) 129 pessoas
Total 2.568 pessoas

Fonte: Aspectos Econômicos e Sociais da Cidade Flutuante. Autores: Celso Luiz Rocha Serra e Wilson Rodrigues da Cruz.

Junta-se ainda a este percentual de 2.568 pessoas que não tem profissão de carteira assinada, embora exerçam alguma atividade econômica, os 4.134 inativos, e teremos então demonstrado na aridez dos números essa realidade. Como bem disse Leandro Tocantins na sua obra ‘O Rio Comanda a Vida’, podemos destacar que a nossa malha hidrográfica permitia à época e permite ainda hoje a circulação da economia do nosso interior do Estado, com destaque para existência de um importante sistema de transporte moderno bastante eficiente. O Rio Amazonas com seus inúmeros afluentes passa a atender a ausência de estradas de rodagem obedecendo a lei natural do ir e vir, especialmente entre as cidades de Manaus e Belém e as demais cidades pequenas do interior do Estado. 

Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Os primeiros flutuantes comerciais surgiram a partir de 1950, destacando alguns pequenos empresários como Atonio Maria, Chico Vieira, Antônio Alfredo, Alberto Arrueira e o mais importante deles que mais tarde se torna um dos maiores empresários no segmento de supermercado, Ambrósio Assayag, o segundo a instalar flutuante comercial no local. Vale ressaltar que o referido empresário ainda hoje é destaque junto a seus filhos em vários segmentos comerciais em nossa capital. 

Ainda nesse ano, houve um levante geral de alguns comerciantes da Rua Barão de São Domingos, contra aqueles pequenos comerciantes da cidade flutuante. Porém, prevaleceu suas permanecias com aval das autoridades da época. Essas reclamações eram constantes, com apoio da imprensa regional, nacional e até estrangeira.

Ambrósio Assayag. Foto: Reprodução/Memorial Petronio Augusto Pinheiro

Firmas comerciais estabelecidas na cidade flutuante

Estivas 45
Bares e Restaurantes 38
Bazares 22
Compra de Produtos 22
Mercearias 20
Compra de Juta 5
Malarias 2
Drogaria 1
Armarinho 1
Colchoaria 1

Fonte: Aspectos Econômicos e Sociais da Cidade Flutuante. Autores: Celso Luiz Rocha Serra e Wilson Rodrigues da Cruz.

Atividades Industriais

Oficinas
Fábrica de Gelo
Fábrica de Calçados
Fábrica de Móveis
Fábrica de Bebidas
Engenhoca
15
2
2
2
1
1

Fonte: Aspectos Econômicos e Sociais da Cidade Flutuante. Autores: Celso Luiz Rocha Serra e Wilson Rodrigues da Cruz. 

Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Vale a pena destacar ainda, que nas cidades de Atalaia do Norte e Benjamim Constant, nos rios Javari e Solimões, respectivamente, foram na época importantes fornecedoras de madeira de lei, mas não possuíam serraria. E somente as cidades de Itacoatiara, Maués, Parintins e Manaus já tinham fábricas de gelo. Isso mostra o domínio econômico à época da Cidade Flutuante.

Na verdade sem a devida preparação para fazer frente a este contingente populacional que se estabelecera ali, nota-se principalmente ausência de um projeto de governo. Este problema ainda hoje persiste, como em outros Estados do Brasil, e Manaus tornou-se referência nesse esforço de adaptação do homem do interior. A cidade flutuante foi o resultado desse processo.

Esse artigo presta uma singela homenagem ao empresário Ambrósio Assayag, que nasce nas atividades comerciais na Cidade Flutuante e ainda hoje é destaque no mundo empresarial. 

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista 

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