O que você poderia ter feito diferente do que fez?
Gilda vivia um bom momento e estava feliz. De repente, uma notícia assustadora. Francisco, seu marido, sofre um acidente de carro na estrada e fica entre a vida e a morte. As primeiras horas iriam dizer se sobreviveria e se teria sequelas. O estado era muito grave, as informações difíceis de se obter no hospital, um pronto-socorro de recursos claramente limitados, carente de tecnologia, profissionais e instalações adequadas.
Com quem ficariam as crianças? Como pegar o carro na estrada, completamente destruído? Como lidar com o estresse dos familiares? E ainda tratar da documentação para a polícia, para o seguro, para o INSS, para a empresa que o marido presta serviços…
Francisco sobreviveu, foi transferido de hospital e precisou passar por duas delicadas cirurgias. Para completar o quadro, parecia que tudo acontecia ao mesmo tempo: na família, desavenças, agravamentos de doenças crônicas, suspeitas de covid e até furto de automóvel na porta do hospital. A escola também pressionava e ameaçava o cancelamento de bolsas, caso as crianças não retornassem às aulas.
A obra do vazamento do apartamento de cima empacava e gerava conflitos entre os vizinhos, síndico e profissionais contratados. Na prática, a obra se arrastava e prolongava o caos da casa empoeirada de Gilda e Francisco, frequentada agora por pedreiros, pintores e outros profissionais.
Gilda sentia-se atônita e cobrada por todos, por isso ou por aquilo. Seu mundo estava de cabeça para baixo. Não retornou a nenhum assunto de trabalho em andamento, abandonando vários compromissos, o que decididamente não era o seu perfil. Ela repetia muitas vezes para si mesma: “está difícil, está muito difícil. Me sinto perdida. Me sinto culpada por não ser capaz de lidar com isto”.
Já se passavam 15 dias e, para Gilda, o quadro ainda era muito intenso. Até que… duas perguntas a fizeram olhar de outra maneira toda a situação: “Gilda, o que você poderia ter feito diferente do que fez?” e “Gilda, o que você diria que aconteceu de positivo neste período?”.
Para a primeira pergunta, Gilda foi levada a perceber que ela fez o seu melhor, o que podia ter sido feito e que ela não conseguiria agradar a todo mundo. Tudo ficaria mais leve se ela simplesmente fizesse o que era possível e, nas suas palavras, entregasse a Deus, o que estava fora do seu alcance.
A segunda questão confrontava Gilda sobre o que ocorreu de positivo neste período. Ela lembrou do estado do carro que sugeria que ninguém poderia ter sobrevivido ao acidente; lembrou da transferência do pronto-socorro para um dos melhores hospitais da cidade; da atenciosa equipe de médicos e enfermeiros; das orações que recebeu dos amigos; da solidariedade de várias pessoas. Especialmente, pensou sobre a rápida recuperação de Francisco, que logo iria ser tratado em casa.
Na medida que Gilda ia pensando em cada um destes fatos, sua fisionomia ia se transformando, sua pele mudando de cor, surgia uma nova energia, um sorriso espontâneo nos lábios, quase que incontrolável. O sentimento era de gratidão. Ela era capaz agora de perceber tudo claramente e estava feliz como nunca.
A partir daí, Gilda retomou o trabalho e conseguiu resolver de Francisco que estavam travadas, até mesmo com facilidade. Vieram boas notícias da seguradora e do INSS. A empresa de Francisco sinalizou um apoio financeiro, os familiares melhoram o estado de saúde e se entendem tanto quanto é possível. Gilda negocia as bolsas de estudos dos filhos, com tranquilidade. A obra da casa andou e reina a paz entre os vizinhos.
Francisco está em casa. Está vivo e se recuperando. Ainda não anda e sente dores, mas a cada dia, menos. Francisco e Gilda, mais do que nunca, juntos, agradecidos e fortalecidos para lidar com os desafios que ainda existem. Um novo olhar ajudou a mudar tudo.
Sobre o autor
Julio Sampaio (PCC, ICF) é idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute, diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching e autor do livroFelicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital). Texto publicado no Portal Amazônia e no https://mcinstitute.com.br/blog/.
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