Lutando contra a procrastinação

A procrastinação está associada a duas situações aparentemente contraditórias: postergamos algo que é muito importante ou o que achamos que poderemos fazer a qualquer momento.

É segunda-feira e Francisco, finalmente, poderá dedicar-se ao seu projeto. Foi preciso coragem, mas ele venceu o medo e fez o que queria fazer já há alguns anos. Firmou um acordo com a sua antiga empresa e transformou-se em um prestador de serviços, sem vínculo empregatício e com um número determinado de horas por semana. Com isso, Francisco pretende ter metade do tempo destinado ao seu empreendimento, que é também um projeto de transição de carreira. Não foi uma decisão fácil. As crianças ainda estão em fase escolar, a esposa historicamente ganha um pouco menos do que ele e não é fácil fechar as contas todo mês. Não era. A partir de agora, poderá ser ainda mais difícil, se ele não implementar rapidamente seus planos. Sente um frio na barriga. Há uma mistura de confiança e temor.

Lutando contra a procrastinação. Imagem: Divulgação.

Sobre o novo projeto profissional, Francisco tem tudo na cabeça, mas sabe que precisa materializar as ideias, trazer do abstrato para o concreto, do invisível para o visível. É preciso escrever, pensou ele. Vai formalizar o plano, fazer uma lista dos primeiros passos e entrar em ação. Algumas definições e decisões ainda precisarão ser tomadas. Chegou a hora e pensa que esta segunda-feira é perfeita para isto. Está no quarto, transformado em escritório, a porta fechada e Franciso isolado do movimento da casa que, neste horário, pela manhã, é bem agitado.

Francisco resolve dar um alô à família e tomar mais um café. Seria só um tempinho. Demorou um pouco mais, pois uma das filhas pediu uma ajuda na lição de casa. A esposa, atrasada para o trabalho, perguntou se ele não poderia levar o cachorro para passear “bem rapidinho”.

De volta ao computador, Francisco lembrou que precisava ver os e-mails, dar alguns likes na rede e se atualizar no LinkedIn. Manter a sua visibilidade agora seria mais importante do que nunca. Indo de rede em rede e respondendo a esta ou aquela pessoa, passou a manhã. O tal plano teria que ficar para o dia seguinte, pois à tarde já havia outros compromissos.

Percebendo o que aconteceu, Francisco se culpou e decidiu que o dia seguinte seria diferente. Infelizmente, outros acontecimentos surgiram e chegou a próxima segunda-feira, sem que o tal plano estivesse escrito.

Francisco não está sozinho, não é mesmo? Quem não viveu situações semelhantes? Quem não se viu, deixando de fazer algo importante, distraído por pequenas tentações, que nem tanto prazer proporcionaram assim? O que faz a nossa mente nos levar por este caminho?

Ao contrário do que alguns diriam, não é a preguiça e a falta de responsabilidade que predominam em situações deste tipo. Ao contrário, a combinação da consciência sobre algo importante, com uma elevada autocobrança, representa para nós uma espécie de ameaça. Diante dela é acionado o sistema límbico, nos levando ao modo atacar, fugir ou, como neste caso, congelar. Nossa mente procura, inconscientemente, zonas de segurança, fora das áreas de confronto. São quando pequenas distrações podem nos tirar facilmente do foco, com boas ou más desculpas.

A procrastinação está associada a duas situações aparentemente contraditórias: postergamos algo que é muito importante ou o que achamos que poderemos fazer a qualquer momento. A questão é que, em grande parte dos casos, não procrastinamos de maneira consciente. A palavra procrastinação nos chamaria a atenção e poderia nos levar à ação. Ao invés disso, tendemos a nos justificar.

A construção consciente da felicidade nos convida a conhecer a nós mesmos e a dar nomes reais aos nossos pensamentos e sentimentos. A partir daí, fica mais fácil combater o inimigo interno que o filósofo Mokiti Okada denomina de espírito secundário (na luta contra o nosso espírito primário ou partícula divina) ou o que o escritor Steven Presfield chama de resistência (no combate ao nosso genius interno). Uma das facetas deste inimigo que habita o nosso interior é a procrastinação. Ela é ardilosa e requer uma estratégia para que seja vencida.

Não acredito em fórmulas, mas observo que pessoas driblam a procrastinação com três ingredientes importantes: leveza, autoconfiança e disciplina. A leveza neutraliza o excessivo peso e favorece o engajamento no tempo presente. A autoconfiança nos lembra que somos capazes, que estamos preparados para fazer o que precisa ser feito. A disciplina nos traz a força para transformar intenções em ações.

Francisco está avançando neste processo. Luta contra um inimigo difícil. Sabe que para ser vencedor em seu projeto precisará que as próximas segundas não sejam iguais a que passou.


Sobre o autor

Julio Sampaio (PCC,ICF) é idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute, diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching e autor do livro Felicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital). Texto publicado no Portal Amazônia e no https://mcinstitute.com.br/blog/.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

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