Desmatamento é principal causa da ameaça de extinção do sauim-de-coleira em Manaus, afirma biólogo

Para sobreviver, animais enfrentam outros desafios, como ataques de cachorros, choques elétricos e até atropelamentos

Símbolo de Manaus, o primata sauim-de-coleira (Saguinus bicolor) está ameaçado de extinção. Para o biólogo da Universidade Federal do Amazonas, Marcelo Gordo, o desmatamento é a principal causa da ameaça de extinção da espécie – que depende da floresta.

“Em primeiro lugar, a grande ameaça que existe é o desmatamento. É uma espécie de primata dependente de floresta. Não necessariamente de ser uma floresta primária, bem conservada, pois uma floresta secundária, como por exemplo, o Parque do Mindu, é suficiente para manter os bichos ali dentro, saudáveis, mas tem que ter floresta. Tem que ter árvore, tem que ter frutos dessas árvores que vão alimentar os sauins”, explicou o biólogo.

Segundo o Plano de Ação Nacional para a conservação da espécie, que Marcelo Gordo também participou, os sauins já adultos pesam entre 450 e 550 gramas e medem de 28 a 32 centímetros de comprimento, com uma cauda fina de aproximadamente 38 a 42 cm.

O sauim-de-coleira (Saguinus bicolor), que era frequente na região de Manaus, está na categoria de maior risco. Plano tenta salvá-lo da extinção — Foto: Robson Czaban/ICMBio

A espécie apresenta unhas em forma de garras, que facilita o deslocamento vertical pelos troncos e a captura de insetos ou pequenos vertebrados em frestas na vegetação

Ainda segundo o Plano de Ação, o nome sauim-de-coleira é justificado porque os animais têm “uma pelagem branca que abrange a região posterior da cabeça, o pescoço, os membros superiores e a região do tórax. Já na região dorsal, nos membros inferiores e na face interna da cauda os pelos variam da cor marrom alaranjado a marrom-escuro ou marrom-claro, sendo o dorso da cauda de pelagem negra”.

Além disso, a espécie possui comportamento diurno, que inicia as atividades entre 06:00 e 06:30. Eles repousam entre o final da manhã e o início da tarde, e procuram o local de dormir cerca de duas horas antes do pôr do sol. Se abrigam para dormir em emaranhados de cipós, no topo das árvores mais altas, na base das folhas de palmeiras.

Foto: Divulgação

Para o biólogo, acompanhado do desmatamento como ameaça da espécie, outro problema é a fragmentação do ambiente. “Ou seja, vai ficar um pedaço de floresta aqui, outro lá longe, e isso acaba gerando também um transtorno que cria uma situação que coloca os animais em risco. Eles vão ter uma bota de floresta e de contato com os seres humanos, cachorros, choques elétricos, vão atravessar de um lugar para o outro e morrer atropelado”, explicou o estudioso.

O atropelamento é um caso sério, principalmente na capital, segundo o biólogo. Na zona rural, ele considera o atropelamento também grave, mas disse que há, relativamente, poucas estradas asfaltadas. “Proporcionalmente, um problema um pouquinho menor do que na cidade”, disse.

Há também acidentes com animais domésticos, como cachorros, e também maus-tratos, captura e cativeiro. 

Foto: Marcelo Gordo

 Questionado sobre o número de animais, o biólogo disse que a população, no total, gira em torno de 30 mil exemplares no Amazonas.

“A população como um todo gira em torno de 30 mil indivíduos, isso a distribuição total no estado. Manaus, talvez, entre 1 mil e 1,5 mil indivíduos na cidade. No campus da Ufam, que é o maior fragmento que a gente tem dentro da cidade, não passa de 150 exemplares”, contou.

Atitudes que precisariam ser tomadas para manter espécie longe da extinção:

Reduzir o desmatamento seria a primeira atitude para manter o sauim-de-coleira longe da extinção, segundo o biólogo. Ele disse que zerar o desmatamento é muito difícil, pois Manaus ainda é uma cidade em expansão.

Além disso, o biólogo citou que precisa haver uma política imediata e efetiva de melhorar a arborização, melhorar a qualidade das áreas verdes e dos bosques em Manaus para ter uma maior conectividade entre os ambientes e para que esses animais consigam circular de um fragmento para o outro sem serem atropelados.

Foto: Divulgação

“Tem que construir passagem de fauna, tem que planejar os plantios, que as árvores sirvam de passagem de fauna do futuro, coisas desse tipo que hoje em dia não são pensadas”, afirmou Gordo.

Em 2018, foi anunciada pela prefeitura de Manaus a criação de uma unidade de conservação com a finalidade de proteção do saium-de-coleira, com uma área de mil hectares, compreendida entre o Corredor Ecológico do Mindu, Parque estadual Sumaúma e a Reserva Ducke, na zona Norte.

A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas) informou que a Unidade de Conservação foi criada em 2018, através do decreto nº 4.094, objetivando o aumento da conectividade de habitats naturais e conservação dos já existentes para dispersão da fauna e flora silvestres. 

Foto: Mauricio Noronha/Divulgação

“Desde sua criação, a Semmas vem trabalhando na recuperação de áreas degradadas e na sensibilização ambiental com a população inserida na unidade. Não houve expansão desse território”, disse a secretaria.

Distribuição geográfica

Além da capital amazonense, o sauim-de-coleira tem a distribuição até próximo dos municípios de Rio Preto da Eva e Itacoatiara, com uma cobertura de cerca de 7.500 km².

Gordo também citou que assim como na área urbana, a zona rural sofre também com uma fragmentação muito grande. “Lá também há desmatamento por conta do crescimento da cidade, consequentemente a área rural acaba sofrendo. Seja para produção de alimentos, seja para áreas de lazer e loteamentos, acontece uma redução de ambientes disponíveis para esse bicho”, explicou.

Projeto Sauim-de-Coleira

O Projeto Sauim-de-Coleira é um programa que tem como objetivo implementar pesquisas, monitoramento e ações de conservação da espécie.

O biólogo Marcelo Gordo coordena o projeto há mais de 20 anos na Universidade Federal do Amazonas. “O foco principal do nosso projeto é levantar informações científicas sobre a espécie que possam ajudar na conservação. Fazemos inventários, tentamos entender como é a dinâmica das populações, a dispersão dos bichos, da ecologia, o que eles comem, e assim por diante”, disse.

Atualmente o projeto trabalha bastante a questão das doenças que podem estar afetando a espécie, ocasionada pela interação com outras espécies, bem como com o ser humano. Mas ao mesmo tempo, trabalham com ações de conservação.

“Eventualmente, fazemos algum resgate. Estamos com um projeto de construção de passagem de fauna para tentar evitar atropelamento. Estamos testando alguns tipos de passagem de fauna e temos um viveiro de mudas, que é para implementar áreas degradadas onde corre o Sauim. Visando recuperar florestas sempre que possível, com árvores que vão dar alimento ou abrigo para esses bichos. São essas as ações que executamos dentro do projeto. O foco principal é a pesquisa e o carro chefe das ações de organização é produção de plantio de mudas gradativas”, finalizou. 

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