O carpinteiro Romeu Carlos Gadelha foi chamado pra trabalhar numa empresa em Presidente Figueiredo, mas depois de dois meses sem receber, não foi mais para o “emprego” e hoje engrossa a lista dos milhões de desempregados no país. Sua esposa Margarete Prado Diniz teve que largar a faculdade porque, também desempregada, não teve mais como manter os custos com os estudos. Apesar da situação difícil pela qual o casal passa, no mês de agosto Romeu e Margarete tiveram um motivo de alegria.
O filho mais velho, Robert Carlos, 10, foi escolhido o “Aluno Nota 10” do bimestre na escola Manoel Raimundo de Andrade, onde cursa a 5a série. Robert conseguiu se sobressair diante de seus 406 coleguinhas. “Não é uma conquista fácil porque o aluno precisa alcançar várias metas, como ter bom comportamento, obter as melhores notas, não faltar, respeitar os professores, fazer suas tarefas, os pais precisam comparecer a todas as reuniões na escola, além de competir com os colegas, que também almejam em ser o escolhido do bimestre”, explicou Waldemarina Amorim Félix, gestora da escola.
Comida
Ainda tem mais um item, que não consta entre as regras e, talvez, seja o mais desejado pelos alunos: a premiação de R$ 150. “Dei pra minha mãe e ela comprou comida. Às vezes nós não temos comida em casa”, falou inocentemente Robert.
O garoto é de São Gabriel da Cachoeira, neto de indígenas, mas não lembrou o nome do povo do qual descende. Os pais, ele e uma irmã mais nova vieram do distante município tentar a vida em Manaus, mas as coisas não deram muito certo, aí apareceu a chance do emprego de carpinteiro para Romeu, em Presidente Figueiredo, que também não deu certo, e lá eles resolveram ficar.
Comunicativo, Robert acrescentou que também foi “Aluno Nota 10” em Manaus, “na escola Anita Garibaldi, e ganhei uma medalha. Não teve dinheiro. Aqui recebi um certificado, além dos R$ 150”, riu. Robert deu a entrevista na Sala de Informática da escola, em frente ao computador que ele ainda está aprendendo a mexer.
Celular com internet é apenas um sonho para o garoto. “Quando eu crescer quero ser cientista, engenheiro ou carpinteiro como meu pai. Eu gosto de construir as coisas, como ele”, revelou. Entre as disciplinas que estuda, Robert gosta mais de ciências. “E quero ser ‘Aluno Nota 10’ de novo”, voltou a rir.
Hino Nacional sem ler
A escola Manoel Raimundo de Andrade (Manoel foi um dos primeiros moradores da cidade. Ficou conhecido pelos remédios à base de plantas que fazia para a população carente. Seu neto é professor na escola), é uma das seis escolas municipais da cidade de Presidente Figueiredo e uma das 27 existentes no município. “O perfil dos alunos é a baixa renda de suas famílias. De manhã recebemos as crianças da zona rural, que moram nas comunidades, na estrada. À tarde são crianças da cidade”, disse Waldemarina.
Além do “Aluno Nota 10”, outros projetos desenvolvidos na escola são a “Roda de Leitura” e o “Entre na Roda”, além de um criado pela própria gestora, a “Rádio Manoel Kids”. “O objetivo da rádio, existente desde 2014, é fazer com que os alunos percam a timidez, falando ao microfone, além de escrever pequenos textos e apresentar programas”, contou.
Mas a rádio, montada numa saleta com equipamentos surrados, está parada. “Deu problema nos equipamentos e não tivemos como mandar consertar”, lamentou. A gestora orgulha-se da Hora Cívica. “Todos os dias eles cantam o Hino Nacional diante das bandeiras de Presidente Figueiredo, do Amazonas e do Brasil. E sabem a letra do Hino sem ler, além de terem aprendido o significado das palavras mais difíceis”.
Presidente Figueiredo