Milton Hatoum doa 16 versões do livro ‘Dois irmãos’ para a Biblioteca Brasiliana da USP

“Devo parte da minha formação intelectual à USP e, por isso, tenho uma dívida em relação à universidade pública”, destacou o autor amazonense.

O escritor amazonense Milton Hatoum doou 16 versões do livro Dois irmãos para a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da Universidade de São Paulo (USP). Nas diferentes versões da obra mais famosa do autor chamam atenção os títulos que o romance teve antes de chegar ao definitivo e um cartaz em tamanho A3 com um diagrama da história dos personagens do livro, elaborado por Hatoum. 

Os originais constam também anotações de editores, críticos e escritores, que mostram a dimensão colaborativa e coletiva do trabalho do romancista.

“Entre pensar e terminar de escrever foram cerca de nove a dez anos”, explica Hatoum. Segundo ele, várias foram as motivações para a doação do material à BBM. A primeira diz respeito à gratidão pela formação acadêmica que recebeu na USP. Hatoum fez graduação em Arquitetura e Urbanismo e frequentou várias disciplinas no curso de Letras como ouvinte. 

A segunda tem relação com a afetividade: “Eu conheci o [José] Mindlin. Ele ia aos lançamentos dos meus livros e, inclusive, foi ao lançamento de Dois irmãos; no ano de 1988, ganhei uma bolsa de literatura chamada Vitae, de uma fundação que o Mindlin era presidente; frequentei a biblioteca dele e da Guita lá no Brooklin [bairro de São Paulo] antes da doação para a USP”.

E a terceira, segundo ele, é sua admiração pela Biblioteca Brasiliana: “Esses manuscritos estarão bem cuidados, não teria lugar melhor para abrigá-los. Eu acho essa biblioteca extraordinária! Quem conheceu José Mindlin percebe que ele era um apaixonado pelo livro. Eu nem mereço estar ao lado de manuscritos de Rachel de Queiroz e [datiloscritos] de Guimarães Rosa”, declarou Hatoum.  

Pesquisa

Milton Hatoum – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

“As 16 versões de Dois irmãos são uma contribuição inestimável para a biblioteca e para o projeto Registros da Produção Literária Brasileira Contemporânea, que reúne documentos de grande interesse para a pesquisa sobre os modos e processos de composição da literatura, fomentando a discussão e a reflexão sobre novas formas e suportes da produção literária. Elas se juntam aos manuscritos de O Quinze, da Rachel de Queiroz, aos datiloscritos do Grande Sertão: Veredas e de O Mundo Coberto de Penas/Vidas Secas, entre outros, colecionados por José Mindlin”, explica o professor de Literatura Brasileira da FFLCH e vice-diretor da BBM, Hélio de Seixas Guimarães. 

Para ele, a doação à biblioteca é importante não somente para preservar as versões de um romance relevante como Dois irmãos. Com este material poderão ser feitas diversas pesquisas, como as relacionadas à crítica genética, uma disciplina que estuda os processos de criação em diversas áreas, como a literatura, as artes visuais, o teatro e o cinema, entre outras.

Sobre a possibilidade de realização de pesquisa com o material de Dois irmãos, Hatoum informa que há muitas teses a respeito do livro, conforme um levantamento da professora titular da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Juciane Cavalheiro. Segundo a pesquisa da docente, em 2023, Dois irmãos, que é o romance mais estudado do autor nas universidades brasileiras, totalizou como objeto de investigação 48 teses e 80 dissertações. Na sequência, figura Relato de um Certo Oriente, com 39 teses e 49 dissertações. Cinzas do Norte, com 21 teses e 38 dissertações, e Órfãos do Eldorado, com 16 teses e 31 dissertações.

Milton na BBM

No dia 29 de agosto, às 18h30, no Auditório István Jancsó, a doação será formalizada em uma conversa gratuita e aberta ao público em geral intitulada Dois irmãos em múltiplas versões, entre Milton Hatoum e a especialista em sua obra, Maria da Luz Pinheiro de Cristo, sobre o processo de construção de seu romance. A mediação será de Samuel de Vasconcelos Titan Jr., professor do Departamento de Teoria Literária e Comparada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.

Antes da doação à BBM, o material de Dois irmãos estava em posse de Maria da Luz, sua aluna de francês em Manaus, que o utilizou como fonte em sua tese de doutorado com o título Relatos de uma Cicatriz: A Construção dos Narradores dos Romances, Relato de um Certo Oriente e Dois irmãos, defendida no ano de 2005 na USP.

Em 13 de março deste ano, Milton Hatoum esteve na BBM para participar do evento Convite à Leitura – O Autor Como Leitor, em que falou sobre a leitura na sua formação como escritor, a sua relação com seus leitores e outros assuntos ligados à leitura em geral.

Na ocasião, antes do começo do encontro, Hatoum fez uma visita pela biblioteca e pôde conhecer algumas obras raras e especiais do acervo, entre elas manuscritos e datiloscritos de grandes escritores brasileiros, como Guimarães Rosa e Rachel de Queiroz, que as várias versões de Dois irmãos farão companhia na BBM.Nascido em Manaus, Hatoum é autor de Relato de um Certo Oriente, Dois irmãos e Cinzas do Norte, entre outros títulos, todos publicados pela Companhia das Letras.

O escritor já ganhou os Prêmios Jabuti, Livro do Ano, Bravo!, APCA e Portugal Telecom. Sua obra de ficção, publicada em 14 países, recebeu em 2018 o prêmio Roger Caillois (Maison de l’Amérique Latine/Pen Club-França).

*Com informações Jornal da USP

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