ZFM, redução do IPI, Reforma Tributária e suas fragilidades

O impasse é cruel: como excepcionalizar a ZFM, que detém um pouco mais de 400 fábricas no PIM diante dos interesses de mais de 300 mil indústrias beneficiadas com a redução do imposto?

A questão da redução do IPI precisa ser analisada cautelosa, porém corajosamente. Que trará enormes prejuízos à competitividade comercial da Zona Franca de Manaus não há dúvida. Lamentavelmente, porém, crise após crise continuamos a chorar o leite derramado face à razão elementar de que a ZFM repousa sobre o mesmo modelo econômico – de substituição de importações – que motivou sua criação em 1967. Só despertamos para suas inconsistências quando graves obstáculos surgem, como agora a questão do IPI. O impasse é cruel: como excepcionalizar a ZFM, que detém um pouco mais de 400 fábricas no PIM diante dos interesses de mais de 300 mil indústrias beneficiadas com a redução do imposto? Esta, a fórmula mágica que, isenta de discursos politiqueiros deve ser levada ao Ministério da Economia. 

Tivéssemos incentivado há 30/40 anos a exploração da silvinita, como de outros minerais estratégicos abundantes em nosso solo; a exploração madeireira via manejo florestal sustentável; a produção de alimentos; as nanotecnologias biológicas; o turismo ecológico; enfim, a exploração dos recursos da biodiversidade, a ZFM não estaria hoje mais uma vez a mendigar favores muito difíceis de serem satisfeitos. Entretanto, o modelo desponta no cenário empresarial brasileiro graças a uma monocultura industrial sustentada por sete cadeias produtivas que respondem por cerca de 93% do faturamento do PIM. 

O tempo passa e a ZFM ainda aguarda projeto de ajuste ao mundo globalizado 4.0. Enquanto isso, agrava-se o quadro socioeconômico do interior. Decorridos 55 anos, continua pendente de políticas públicas de estímulo a setores econômicos, sociais, educacionais e culturais. O cenário conjuntural é desalentador: 47 % da população amazonense encontra-se em estado de pobreza, ao tempo em que a capital e as sedes municipais mantêm-se vítimas de incessante êxodo rural e as zonas rurais desestruturadas em termos de produção agropecuária. 

Zona Franca de Manaus. Foto: Reprodução/Agência Brasil

Desde a abertura da economia decretada durante o governo Collor de Mello, em 1992, a ZFM deveria ter dado o grande salto, processado as reformas recomendadas pela comunidade técnica e os estudos realizados pelo IPEA, em 1995. Suas deformações institucionais já àquela altura saltavam aos olhos. Recomendar a revisão do modelo econômico, para certos líderes políticos e empresariais da época, entretanto, equivalia a crime de lesa-pátria.

Dramática igualmente a posição do Amazonas em relação à Reforma Tributária. Nenhuma das propostas em tramitação no Congresso Nacional contempla mecanismo que venha a excepcionalizar a ZFM. A não ser que, por efeito de reforma constitucional, consiga-se estabelecer princípios de extraterritorialidade, em que vendas da ZFM para o Brasil tornem-se, para fins fiscais e tributários, equivalentes a exportações.

A Associação Comercial do Amazonas (ACA), presidida pelo empresário Jorge de Souza Lima, considerado o atingimento das prerrogativas constitucionais da Zona Franca de Manaus, com grave ameaça à estrutura do Polo Industrial de Manaus e perda de empregos, ingressou com uma ADPF – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, com pedido cautelar, contra a redução do IPI nos termos do Decreto Nº 10.979/22. A Prefeitura de Manaus, por seu turno, após reunião mantida pelo prefeito David Almeida com lideranças políticas e empresariais locais, na sexta-feira, 25, propôs o envio de uma uma Carta Aberta ao presidente Jair Bolsonaro em defesa da Zona Franca de Manaus, por entender que a ZFM é atingida duramente pela medida.

Defender nossos direitos é uma obrigação, lutar pela reestruturação da ZFM de sorte a adequar o modelo ao mundo tecnológico 4.0 e promover a integração da bioeconomia à matriz econômica do Estado é o grande e decisivo avanço que tornará nossa economia infensa a trovoadas de qualquer natureza. De fato, na ausência desses passos, iremos continuar de chapéu estendido, de pires na mão a caminho de 2073.

Sobre o autor

Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas (ALCEAR), do Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos (GEEA/INPA) e do Conselho Regional de Economia do Amazonas (CORECON-AM).

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

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