Um estudo da PUC-Rio sobre a ZFM parte da premissa de que políticas industriais têm como propósito estimular o desenvolvimento e o crescimento econômico por meio do aumento da competitividade das firmas locais e promover uma transformação estrutural.
O estudo ‘A Zona Franca de Manaus tem impacto na eficiência da indústria?’, do Núcleo de Avaliação de Políticas Públicas, PUC-Rio, Março de 2020, parte da premissa de que políticas industriais têm como propósito estimular o desenvolvimento e o crescimento econômico, por meio do aumento da competitividade das firmas locais, e promover uma transformação estrutural. O desenho de políticas industriais que cumpram esses objetivos é, portanto, estratégico para o país. Na prática, no entanto, observa o estudo, muitas dessas políticas têm se traduzido em um elevado custo fiscal, sem que exista uma comprovação empírica acerca dos supostos efeitos benéficos, como em relação à Zona Franca de Manaus (ZFM).
Destaca o documento: “no Brasil, a Zona Franca de Manaus foi criada há mais de meio século com o objetivo de desenvolver e dinamizar a indústria e a economia e contribuir para o desenvolvimento da região. O modelo tem sido questionado em relação à sua eficiência. Uma questão reticente, até hoje sem solução, consiste no dilema ‘Zona Franca ou Zona Empresarial?'”. O documento questiona “se de fato a ZFM se insere em um modelo de zona franca, que objetiva o estímulo do comércio internacional baseado no armazenamento e reexportação de mercadorias, ou de zona empresarial, que tem como foco o desenvolvimento regional visando ganhos sociais, principalmente o estabelecimento de um mercado de trabalho local favorável”.
No entanto, há bastante questionamento sobre a eficácia dos incentivos da ZFM em relação ao aumento de produtividade e competitividade, bem como sobre a geração de melhores salários para os trabalhadores. A propósito, o estudo sobre a Zona Franca de Manaus, do Portal Uma Concertação sobre a Amazônia, observa que, desde sua criação, a ZFM enfrenta diferentes críticas quanto à sua política industrial, dentre outros pontos, quanto aos reais benefícios para a população e o desenvolvimento regional; renúncia fiscal muito elevada dado o número de empresas beneficiadas, o número de postos de trabalho gerados e a parcela da população alcançada; a baixa incorporação de novas tecnologias, a pouca contribuição para o aumento da competitividade e produtividade do país, a desconexão entre a produção industrial do PIM e as potencialidades da Amazônia.
O estudo também aponta a falta de diversidade na atividade econômica e em seus agentes, acarretando em concentração de renda e benefícios para empresas com sede no exterior, a baixa qualidade de emprego e salários (5,4% do faturamento em 2020 (média Brasil 11% em 2018), com impactos inferiores ao esperado e empregos concentrados nas faixas mais baixas de salário além de pouca estabilidade, assim como a falta de integração com as cadeias produtivas do restante do país, a baixa transferência de benefícios para o interior do Amazonas, com o esvaziamento populacional e econômico dessa região do estado, além da dependência das empresas da ZFM à concessão perene e prolongada de benefícios.
Fundamental, com efeito, levar em conta diagnósticos e recomendações de trabalhos como o do IPEA: Os Incentivos Fiscais à Indústria da ZFM: Uma Avaliação, de maio de 1995; ZFM: Desafios e Vulnerabilidades, do Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado Federal, abril de 2013; ZFM: Impactos, Efetividade e Oportunidades, da FGV, abril de 2019, bem como diversos outros trabalhos de economistas e pesquisadores da universidade, do governo do Estado, da FIEAM, do CIEAM, da FAEA sobre o modelo. Efetivamente, não se pode mais continuar batendo na mesma tecla de que “a ZFM é o único modelo que deu certo”. A questão posta nos estudos é uma só: deu certo para quem?
Perante a Comissão de Reforma Tributária precisamos de um projeto, um discurso consistente que responda aos desafios que ora se põem a cerca da efetividade do modelo no horizonte ZFM-2073. Afinal, estão em jogo não apenas interesses do PIM, porém, os da economia do estado do Amazonas como um todo. Com os quais governo estadual, classes políticas, empresariais, estudantis e laborais, a universidade e os centros de pesquisa, a própria Suframa precisam estar absolutamente bem sintonizadas a partir de um modelo alternativo, o da integração ZFM-PIM/Bioeconomia, a matriz econômica que haverá de promover a definitiva solidificação e perenização do modelo independentemente de benefícios fiscais sem porta de saída.
Sobre o autor
Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas (ALCEAR), do Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos (GEEA/INPA) e do Conselho Regional de Economia do Amazonas (CORECON-AM).
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