Você sabia que existe um “Marrocos” na Amazônia?

Localizada na região sul do Amapá, a fundação do município Mazagão possui uma história curiosa e marcada por características da cultura portuguesa e africana.

Implantado oficialmente em 15 de novembro de 1915, o município de Mazagão, no sul do Amapá, possui uma história curiosa. O município teve origem no século 18, mais precisamente em 23 de janeiro de 1770, com a fundação de Mazagão Velho pela Coroa Portuguesa.

Mas o que tem de curioso nisso? O fato é que Mazagão Velho só foi fundado com o intuito de abrigar famílias da Mazagão africana, uma colônia portuguesa que ficava localizada no Marrocos e foi desativada para ser transferida para o Brasil.

O Portal Amazônia explica como as famílias portuguesas chegaram até o Amapá. Confira:

Foto: Reprodução/Prefeitura de Mazagão-AP

Na região Norte da África, na área geográfica dos reinos do Marrocos e Mauritânia, existiam conflitos entre portugueses, cristãos e árabes mulçumanos. A razão para o Marquês de Pombal, ministro do rei Dom José I, desativar a Mazagão Africana, foi em detrimento da ‘Guerra Santa’ que aconteceu naquela região.

Nesse contexto, foi criada a Mazagão Amazônica, no Amapá, com o intuito de abrigar famílias portuguesas residentes até então na África, acompanhadas por seus escravos, que se tornaram agricultores da região.

A Guerra Santa aconteceu devido a falta de distribuição igualitária de rendimentos, concentração de riquezas nas mãos dos portugueses, que resultaram na dependência socioeconômica exclusiva do rei. 

Com isso, em 1529 foi instalado em Marrocos um novo poder Árabe, denominado de Xerife, no qual atacou o reino de Fêz, também de dominação muçulmana, acusado de pactuar com os católicos, trazendo prejuízos à causa islâmica.

O conflito religioso existia entre os cristãos e muçulmanos. Nas ruas de Fêz, a frase mais pronunciada pelos seguidores de Maomé era: “Guerra aos cristãos”. Durante a batalha, inúmeros soldados morreram. 

Era 1771 quando os primeiros moradores, aproximadamente 160 famílias, chegaram na região amapaense após uma longa jornada entre Marrocos, na África, e o Norte do Brasil.

Entre eles, estavam os antepassados de Antônio José Pinto, narrador da batalha entre mouros e cristãos na Festa de São Tiago –  encenada há 245 anos, um dos maiores espetáculos de teatro à céu aberto do Brasil

Foto: Reprodução/Prefeitura de Mazagão-AP

Mazagão Novo

Atualmente, a cidade é conhecida como Mazagão Novo e fica a cerca de 32 quilômetros da capital Macapá, concentrando boa parte da população – estima-se 22.468 habitantes (IBGE, 2021).

O relevo do município é constituído por Serra do Iratapuru, Planície de Terra e área de Igapó. A vegetação é marcada por matas densas, arbustos e campos alagados.

A cidade tornou-se destaque no setor oleiro-cerâmico e na agricultura, ambos em declínio na região. Atualmente, uma das rendas é proveniente do comércio. Em 2016, devido a construção da ponte sobre o Rio Matapi, houve uma integração do município e da Região Metropolitana, dentre elas Santana e Macapá.

O município também é representado pela criação de gado bovino, bubalino, suíno, caprino e equino, avicultura e pesca. No extrativismo, estão presentes a castanha-do-Brasil, madeira para fabricação de carvão e móveis, e a extração de látex da seringueira, que segue para exportação.

Com a presença do catolicismo, entre julho e agosto são homenageados a padroeira da cidade, Nossa Senhora da Assunção, e São Tiago, que misturam rituais religiosos, cavalhadas e teatro a céu aberto, recontando a guerra os mulçumanos e cristãos. A festividade acontece desde 1777.

Festa de São Tiago

Nessa região é encenado um dos maiores espetáculos de teatro a céu aberto do país. A guerra foi romantizada na Festa de São Tiago, e mostra que Portugal teria vencido essa batalha contra Marrocos.

A encenação inicia com o baile das máscaras, que é a comemoração dos mouros que pensaram ter matado os portugueses após terem lhe oferecido comida envenenada como suposto sinal de trégua.
Ao desconfiarem das intenções, os cristãos foram mascarados até o baile levando a comida e distribuindo para os animais dos mouros, que no dia seguinte amanheceram mortos. Alguns soldados também morreram, entre eles o chefe dos mouros, o Rei Caldeira.

A partir daí iniciou a batalha, mas antes os mouros mandaram um espião ao acampamento dos cristãos, o “bobo velho”, que ao se aproximar foi apedrejado. Na encenação em Mazagão, a passagem é marcada pelo soldado montado em um cavalo, e ao invés de pedras, a comunidade atira bagaços de laranja no bobo.

O momento é um dos mais celebrados e reúne moradores da vila e visitantes. A partir daí inicia-se o confronto marcado pela morte do soldado Atalaia, um cristão mandado ao acampamento mouro que após roubar a bandeira inimiga é capturado, morto e tem a cabeça arrancada.

No teatro à céu aberto, parte do exército mouro é vestido com máscaras visando assustar os cavalos inimigos. As batalhas seguintes são marcadas pela fé até a vitória dos cristãos. O ato final é o vominê, a dança da vitória dos soldados cristãos, entre eles o guerreiro Tiago, que se uniu aos devotos de Cristo nas lutas.

“São 245 anos da festa de São Tiago. Durante todo esse percurso a gente vem comemorando essa história vivida lá no continente africano e que foi trazida pelos portugueses e escravos, e que, devido as constantes batalhas entre mouros e cristãos, Portugal na teve mais condições de bancar aquela ‘guerra santa'”, comenta o narrador da festa, Antônio José Pinto.

*Com informações da matéria escrita por William Amanajás, do g1 Amapá sobre a Festa de São Tiago

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

Pará perde Mestre Laurentino; artista completaria 99 anos em janeiro de 2025

Natural da cidade de Ponta de Pedras, na Ilha do Marajó, ele era conhecido como o roqueiro mais antigo do Brasil.

Leia também

Publicidade