Saiba quem é a escritora indígena macuxi que foi finalista do Prêmio Jabuti em 2023

O livro de Sony Ferseck não chegou a etapa final de cinco selecionados, mas concorreu com nove títulos de todo o país na categoria poesia da premiação.

“São poemas que homenageiam as mulheres indígenas, que aponta para o protagonismo dessas mulheres”.

É assim que a escritora indígena macuxi Sony Ferseck, de 35 anos, descreve seu livro “Weiyamî: mulheres que fazem sol” que foi finalista na categoria poesia do 65º Prêmio Jabuti.

A Câmara Brasileira do Livro divulgou no dia 21 de novembro os cinco finalistas em cada categoria. O livro não chegou a etapa final de cinco selecionados, mas concorreu com nove títulos de todo o país na categoria.

Sony Ferseck e Georgina Sarmento assinam o livro que concorre ao prêmio Jabuti. Foto: Foto/Petri.cor

A obra conta com as ilustrações da artista plástica também macuxi Georgina Sarmento e foi lançado em 2022 pela editora Wei — fundada por Ferseck em 2019 para publicar literatura indígena.

A escritora – que é pós-doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Roraima (UFRR) – dedica esta indicação a outros indígenas e artistas roraimenses que “já não estão mais aqui”. Ela cita: Devair Fiorotti, Thales Heitor Lopes, Vovó Bernaldina e Jaider Esbell.

“De um certo modo, ter escrito este livro e esta indicação me dizem que há muito mais nesta vida do que apenas esta vida. Como mulher indígena, ter alcançado essa indicação homenageando mulheres indígenas e reconhecendo que elas são a luz que guia nossas caminhadas num estado cujos índices de violência contra a mulher e feminicídio são os maiores do país me deixou ainda mais emocionada porque foram elas que sempre me disseram através de seus gestos, cuidados e força de trabalho que sem coletividade nem afetividade não temos continuidade”,

disse Sony Ferseck.

Weiyamî: mulheres que fazem sol 

A obra é composta por poemas bilíngues, combinando português com macuxi, escritos em versos livres. O título da obra faz referencia ao dialeto macuxi, onde “Wei” significa “Sol” que, para a cultura deste povo, é uma entidade feminina e, por isso, ela usa como alegoria para ilustrar a força da mulher indígena.

A ideia de construir esta obra surgiu do fato de Ferseck ter ouvido várias histórias de anciões indígenas e nelas nenhuma mulher ocupava o lugar de protagonismo. De acordo com ela, “as mulheres quando apareciam, ocupavam um segundo plano ou eram violentadas”. Ela destaca uma dessas histórias.

‘Weiyamî: mulheres que fazem sol’ pode ser adquirido online. Foto: Foto/Petri.cor

“Por exemplo, ouvi a história de uma fera que andava exterminando os membros de uma comunidade e para capturá-la, os homens da comunidade decidiram usar uma mulher idosa, já bem velhinha, como isca para descobrir onde ficava o refúgio do bicho. Puseram uma tocha nas mãos da mulher e a deixaram sozinha em meio à noite. Quando a fera a agarrou puderam acompanhar pelo fogo da tocha onde era o ninho da fera e assim mata-la”.

“Achei absurdo e me coloquei no lugar dessa mulher. Ela foi co-autora dessa vitória, a história dela não poderia passar em branco, então escrevi o poema Ewaron para ela. Assim acontece com outros poemas ao longo do livro”, explica a escritora.

Para Sony, a ideia é trazer essa mulheres para a luz, dado a elas o protagonismo que nunca lhes foi oferecido e, por isso, ela coloca a cultura indígena como o coração deste livro.

“As culturas indígenas nesta obra são o coração, a voz, a letra, a linha. Nela queríamos apresentar o encantamento do mundo, a capacidade de atravessar outras vidas e chegar a outros tempos que os mais velhos já sabiam, mas que precisamos reaprender”.

“A arte foi uma dessas maneiras de reencontrar esse encantamento e saber que apesar de aparentemente sermos apenas uma e estarmos sós, nunca fomos apenas uma nem estamos sozinhas”.

 Sony Ferseck

A autora é formada em letras pela UFRR e, atualmente, é professora substituta do Instituto Insikiran de Formação Superior na UFRR. Publicou os livros “Pouco Verbo” (Máfia do Verso, 2013) e Movejo (Wei, 2020). Esta é a primeira vez que ela concorre ao prêmio Jabuti como autora.

Em 2021 submeteu como editora com o livro bilíngue português-taurepang “Makunaimö pantonü – A história de Makunaima”, de Clemente Flores nas categorias conto e ilustração, mas não ficou entre os dez finalistas.

“Também fui premiada com o prêmio Arena da Palavra pela trajetória como editora da Wei, primeira editora independente de Roraima que busca o reencontro com a ancestralidade, também maravilhoso”, destaca.

“Produzir literaturas indígenas feitas por autores e autoras indígenas como editora, difundir essas literaturas e conseguir dizer que nós somos possíveis e que somos possíveis em todos os lugares, inclusive nas artes, tem sido minha maior conquista. Não tem sido fácil, mas juntas conseguimos”.
Ela destaca ainda a participação de Georgina Sarmento na criação do livro Weiyamî: mulheres que fazem sol.

“De toda forma, estamos juntas entre as dez finalistas na categoria poesia no 65º Prêmio Jabuti porque vejo nossa parceria como co-autoria também. Creio que devo ser a primeira mulher indígena aqui de Roraima a alcançar isso”.

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