Portal Amazônia responde: qual a diferença entre povos originários e povos tradicionais da Amazônia?

Ao contrário do que muitos pensam, os dois grupos são distintos, apesar de possuírem similaridades.

A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo, formada por uma fauna e flora riquíssima e por rios que serpenteiam o território de diversos países. Mas, não apenas isso, a região é também um retrato sociocultural das populações que a habitam, que vivem do contato com suas riquezas naturais, ou que fazem de morada cada um de seus municípios, ou de suas centenas de vilas e povoados.

Para compreendermos um pouco mais alguns dos povos que compõe a cultura amazônida, o Portal Amazônia buscou entender a diferença entre os povos originários e os povos tradicionais da Amazônia que, ao contrário do que muitos pensam, os dois grupos são distintos, apesar de possuírem similaridades.

Povos originários 

Foto: Reprodução/FUNAI

Os povos originários são populações indígenas, chamados desta forma por estarem presentes no território que viria a ser o Brasil antes da colonização iniciada em 1500. Ou seja, são grupos que aqui habitavam muito antes sequer da delimitação das terras do país.

Entretanto, esses povos não estiveram sempre fixados nas mesmas localidades e para compreendê-los é necessário, primeiramente, entender a sua relação com a mobilidade. Afinal, uma população pode ser considerada originária se não se fixar em uma região? Como se delimita um território indígena?

De acordo com Daniela Gato, antropóloga e doutoranda do Programa de Pós-graduação em Antropologia Social PPGAS na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), apesar de terem características móveis, os povos originários do Brasil e da América Latina não devem ser chamados de “nômades”, pois sua mobilidade é carregada de sentido, de significados complexos e diversos. 

“É importante ter em mente que os povos indígenas, tanto do Brasil quanto da América Latina, sempre tiveram uma característica móvel. Os motivos são sempre profundos, relacionados com a cultura do povo, envolvendo sua economia, seu parentesco, seus conflitos entre comunidades. Por isso se fala sobre mobilidade”,

explica a pesquisadora.

Então, sim, por terem suas mudanças carregadas de significado, os povos pré-colombianos (anteriores a chegada de Cristóvão Colombo), são originários das terras que comporiam o território brasileiro. Mas por que mencionar as características móveis desses povos?

“Quando se fala em territórios indígenas, se pensa que aquele povo habitava o mesmo território desde sempre e, por isso, eles têm direito aquela terra. Mas, na verdade, as terras indígenas só nascem a partir da colonização, da relação entre os povos indígenas com o branco. O branco que vê a terra como pedaços delimitados, como território. Para os indígenas a terra é do mundo e o mundo é o mundo, não tem por que ser dividido”,

justifica.

Conforme explica Daniela, para esses povos o mundo não é dividido em territórios, ele é de todas as populações e suas delimitações são estipuladas pelo contexto cultural do homem branco. 

Principalmente quando se considera que muitos dos povos originários da Amazônia só passaram a ocupar estas terras após fugirem do processo de colonização.  

“[O termo] povos originários se refere à população indígena do Brasil, a qual tem conhecimento de suas origens, étnicas, culturais e ancestrais e que se reconhece de forma coletiva enquanto pertencente a um grupo étnico”,

completa.

Povos tradicionais da Amazônia 

Foto: Divulgação

Os povos tradicionais, por sua vez, surgem em um período pós-colonial. Na Amazônia essas populações se organizam principalmente derivadas do contato entre os indígenas e os colonizadores europeus. 

“Povos tradicionais é um termo que diz respeito à populações que habitam a Amazônia e que mantém um modo de vida tradicional, construído a partir dos impactos da colonização nestas sociedades”,

elucida a antropóloga.

Cada população, conforme explica Daniela, teve sua forma de reagir à colonização, alguns fugiram do processo o máximo possível, outros até mesmo se aliaram aos portugueses para combater etnias rivais. 

Seja como for, informa a pesquisadora, um fato é: todos os povos indígenas que tiveram contato com o homem branco passaram por alguma mudança, em menor ou maior escala.

“Muitos desses povos, de língua Aruak, principalmente, foram utilizados como mão de obra escrava pela colonização ou foram ‘incorporados na sociedade’ por meio dela, com a criação de vilas e comunidades que, posteriormente, tornaram-se as cidades do interior da Amazônia”,

ressalta.

A pesquisadora destaca ainda que em outras regiões do país as configurações dos povos tradicionais são diferentes, principalmente pelo contato com populações de outras etnias, como os africanos ou europeus de outras partes da Europa, que não Portugal.

Povos originários x Povos tradicionais 

Finalmente, conclui Daniela, pode-se dizer que, apesar de na Amazônia tanto os povos originários quanto os povos tradicionais terem origem das populações indígenas, “o primeiro grupo diz respeito aos povos indígenas do Brasil que buscam manter a sua continuidade cultural, enquanto que o segundo grupo diz respeito as populações que, apesar de manterem um modo de vida tradicional, foram diretamente afetadas pela colonização”. 

*Estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

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