Conhecido como o ‘Boi de Parintins’, bumbá azul e branco também traz heranças do quilombo urbano manauara
Um dos berços culturais do Amazonas, a Praça 14 de Novembro é um dos bairros mais diversos de Manaus. A um dia de viagem de barco dali, outro polo que emana cultura está no bairro da Francesa, em Parintins. Apesar da distância, os dois lugares são mais próximos do que se pode imaginar: ambos são o local de nascimento do boi-bumbá Caprichoso.
Parece confuso e realmente é, mas há anos se discute se o Touro Negro realmente é de Parintins ou se nasceu em Manaus e de alguma forma chegou à Ilha Tupinambarana.
Com as cores azul e branco, o boi Caprichoso é um dos bumbás que disputa anualmente, ao lado do boi Garantido, o tradicional Festival Folclórico de Parintins. Um dos “donos” da Ilha, o boi de pano empresta a cor azul para metade de Parintins. Mas e quando o boi começou?
Diretamente de Parintins, quem conta uma das versões para esta história é o historiador Raimundo Dejard Vieira. “O boi Caprichoso existia em Parintis, pelos relatos que nós temos até agora, desde 1913”, explica.
Dejard ressalta que, no início, a brincadeira de boi era mais singela e por isso, não há muito registro formal da história dos bumbás. “Essa memória que fica muito no registro oral e as contradições que isso traz só fortalecem a rivalidade entre os bois”, destaca.
O compositor parintinense Simão Assayag lembra a influência da cultura nordestina, em especial a cearense, nos bois de Parintins. “No começo do século passado, vieram muitos nordestinos pra cá e eles trouxeram também seus folguedos, suas brincadeiras. E começaram a brincar de boi aqui”, relata.
A folclorista Odinéa Andrade conta que neste contexto de fim do ciclo da borracha, os irmãos Cid vieram de Crato, no Ceará, para Parintins em busca de uma vida melhor através da borracha.
Boi manauara
Em Manaus, a versão que corre pelas ruas do quilombo do barranco de São Benedito, na Praça 14, contam uma outra versão. Muitos moradores mais antigos contam das festas de boi que aconteciam no quilombo e de um boi em especial que se chamava… Caprichoso!
Um desses moradores, Valentim dos Santos, 87, lembra que a influência para a brincadeira de boi veio de migrantes maranhenses que moravam na Praça 14. “Isso tudo aqui era uma irmandade de maranhenses”, recorda.
Outro morador do quilombo, Heitor Nascimento tem lembranças de infância com o Caprichoso. “Todo mundo queria participar da festa”, lembra. Mas não era como “esse Caprichoso que tá lá em Parintins”, retruca Heitor, relatando que o boi da infância guardava mais semelhanças com bumba-meu-boi do Nordeste.
Outras versões
Raimundinho Dutra, versador tradicional do Caprichoso, escreveu um livro chamado “A verdadeira história do Festival de Parintins”. Na obra, Dutra sustenta que o boi foi fundado por João Roque, Félix e Raimundo Cid, em 20 de outubro de 1913.
Segundo esta versão, o boi recebeu esse nome devido à sugestão do advogado José Furtado Belém, que conhecida um outro boi, de nome Caprichoso, que existia na Praça 14 de Janeiro.
Outra versão que circula pela Ilha atribui ao parintinense Luiz Gonzaga a criação do boi Caprichoso. Em 2013, ano que marcou o centenário de Garantido e Caprichoso, familiares de Gonzaga realizaram protestos pedindo o reconhecimento dele como fundador do boi.
Em entrevistas à época, Maria Inácia Gonzaga, filha de Luiz Gonzaga, afirmou que os irmãos Cid foram na realidade fundadores do Boi Galante, em 1913, enquanto seu pai teria fundado o Caprichoso em 1925.
Seja em Manaus ou em Parintins, fato é que o Touro Negro conquistou uma nação de pessoas apaixonadas e que serão azul e branco até morrer. Para a nossa alegria!