Manaus anuncia resgate do Museu do Porto, fechado há 20 anos

Criado em meados da década de 1980, espaço reúne valioso acervo do complexo portuário construído pela Manáos Harbour Limited

“Tudo que eu contar daqui por diante será como testemunha de vista de um tão novo e nunca visto descobrimento”. O trecho é parte do relato do frei Gaspar de Carvajal sobre a viagem de Francisco de Orellana em toda a extensão do rio Amazonas, escrito em 1541. 

Esse relato faz parte da história que permanece viva entre as águas dos rios que banham a capital amazonense e seu povo. E ele fará parte da conexão entre passado e futuro que se desenha para um dos projetos do “Nosso Centro” para requalificação do Museu do Porto, fechado há mais de 20 anos.

O “Nosso Centro” faz parte do programa de crescimento econômico e social lançado pela prefeitura de Manaus, o “Mais Manaus”, que prevê investimentos da ordem de R$ 1,2 bilhão nos próximos anos.

Durante visita ao Instituto Municipal de Planejamento Urbano (Implurb), que coordena os projetos do “Nosso Centro”, a professora, jornalista e historiadora Etelvina Garcia apresentou conceitos, muita história e relatos sobre a importância da área portuária para a capital e o antigo museu, tratando da edificação histórica na rua Governador Vitória, esquina com a travessa Vivaldo Lima.

Foto: Divulgação/Manauscult

 Espaço

“Quando se pensa em um museu, como o Museu do Porto, lógico que procuramos preservar o que foi feito pelas pessoas que nos antecederam, que criaram um acervo, mas temos que ter um museu de futuro, juntando o passado”, comentou Etelvina Garcia.

A ideia do grupo técnico que se debruça sobre o Centro é ter projetos que promovam diálogo forte com as populações, motivadores, tecnológicos e digitais, além do caráter didático, criativo e que possam também funcionar como centro de estudos.

“Usar o espaço onde funcionou o Museu do Porto para uma área interativa, onde as pessoas entendam que tudo que aconteceu em Manaus, nasceu junto com o porto. A cidade, o rio, a floresta, tudo isso faz parte de uma coisa comum, e o homem tem uma participação interativa dentro disso”, destacou a historiadora.

Para um Museu do Porto de 2022, os grupos técnicos, colaboradores e prefeitura buscam a modernidade, que a viagem deixe as canoas e navios a vapor para dar lugar ao touch screen, levando os visitantes a uma navegação no tempo, mostrando, por exemplo, a implantação da navegação comercial que cruzava águas até chegar à Bacia Amazônica. Também poderá se viajar e recordar a riqueza da borracha e as grandes transformações promovidas na capital, a partir da linha direta de navegação entre Manaus e Liverpool.

 Reunião

Durante a reunião no Implurb com o diretor-presidente, engenheiro Carlos Valente; o vice-presidente, arquiteto e urbanista Claudemir Andrade; o diretor de Planejamento, arquiteto e urbanista Pedro Paulo Cordeiro; e o presidente da Fundação Municipal de Cultura (Concultura), Tenório Telles, Etelvina Garcia lembrou que importantes momentos da história passaram pelo porto, sobretudo o dia a dia da economia da borracha. E a agitação no começo do século 20 levou os ingleses, por exemplo, a erguerem aqui uma estrutura usando a mais moderna tecnologia da engenharia inglesa.

“Porque tínhamos criado uma atividade econômica dinâmica, que já exigia um porto com aquela qualificação. E tinha a Corte portuguesa, certamente influenciada pelos livros de Carvajal, que contavam a viagem de Orellana, e a rainha dona Maria Primeira, que queria conhecer as potencialidades econômicas da sua colônia na América do Sul”, disse Etelvina Garcia.

A historiadora acredita que a requalificação da área vai promover esse diálogo com a população hoje, com as coisas vivas que aconteceram na cidade. “Neste mundo de água, floresta, desencantos, e muita esperança, e a esperança precisa se manter viva para acalentar os sonhos”.

 Espaço

O diretor Pedro Paulo Cordeiro explicou que o espaço trabalhado para o “Nosso Centro” estava direcionado à requalificação e ampliação das instalações do Museu do Porto, incluindo o antigo prédio da Superintendência Estadual de Navegação, Portos e Hidrovias (SNPH) e a própria praça 9 de Novembro. “A professora trouxe informações valiosíssimas. Vamos inserir e potencializar um dos eixos do programa, que é o ‘Mais História’. A questão do resgate da história do porto em relação à cidade é altamente importante não só para a memória, mas também para as novas gerações conhecerem como a cidade se formou e como o espaço do porto contribuiu para este crescimento”, disse o arquiteto e urbanista.

As histórias narradas devem fazer parte do processo de revitalização de maneira tecnológica. “Para convidar as populações a conhecer o passado para fazer um futuro melhor”, completou Cordeiro.

O “Nosso Centro” concentra os trabalhos da Comissão Técnica para Implementação e Revitalização do Centro Histórico de Manaus, criada pelo prefeito David Almeida. Ela conta com membros do Implurb, Secretarias Municipais de Finanças e Tecnologia da Informação (Semef) e do Trabalho, Empreendedorismo e Inovação (Semtepi), além da Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Eventos (Manauscult).

 História

O Museu do Porto foi criado em meados da década de 1980, reunindo valioso acervo do complexo portuário construído pela Manáos Harbour Limited, a empresa inglesa a quem a firma B. Rymkiewicz & Companhy transferiu os direitos e obrigações conquistados em concorrência pública em contrato assinado com o Governo da República, em 1901, para executar obras de melhoria no porto de Manaus.

O museu foi instalado na antiga casa de máquinas da Manáos Harbour, o prédio número 1 da história do porto, construído para abrigar a usina de eletricidade que alimentaria a execução de obras e garantiria o funcionamento dos equipamentos e instalações por seis décadas.

Ali também se reuniram fotografias, instrumentos náuticos, mobiliário dos gabinetes dos diretores da empresa inglesa, atas, livros fiscais, plantas, orçamentos e cronogramas das construções de todos os prédios, pontes, cais, muralhas, armazéns, linhas férreas e outros. Eram mais de 300 peças, incluindo uma antiga locomotiva, que ainda está no local. O prédio histórico é tombado pelo Instituto Nacional de Patrimônio Histórico e Artístico (Iphan).

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