Com inteligência artificial, artista acreano recria imagem de Chico Mendes

Dionísio Neto utilizou tecnologia para trazer à vida o cotidiano do líder ambientalista acreano, que foi morto em dezembro de 1988.

Artista acreano recria imagem de Chico Mendes com inteligência artificial. Imagem: Dionísio Neto

Em um projeto que une arte, tecnologia e preservação da memória, o artista acreano Dionísio Neto recriou a imagem do líder seringueiro Chico Mendes por meio da inteligência artificial (IA). Usando ferramenta avançada e inovadora, Neto conseguiu trazer à tona o cotidiano do ambientalista, buscando transmitir a importância da preservação ambiental e das comunidades tradicionais.

O artista acreano conta que a ideia de recriar a imagem de Chico Mendes por meio da IA surgiu durante uma visita à casa do líder seringueiro em Xapuri, no interior do Acre. Foi ali, imerso na atmosfera que envolveu Chico, que Neto se inspirou a fazer um estudo sobre as possibilidades de recriar fotos que retratassem o cotidiano e a vida simples do seringueiro que se tornou símbolo da luta pela preservação ambiental.

Imagem: Dionísio Neto

A técnica utilizada por Neto envolveu a IA Midjourney, uma ferramenta operada via chat, que permite descrever a imagem desejada em qualquer idioma, retornando uma imagem de alta qualidade e detalhamento. O artista também utilizou fotos do rosto de Chico Mendes para aumentar a fidelidade das imagens geradas.

“Acho que o fator mais complexo que envolve a criação das imagens é exatamente a sua descrição, para que a I.A. consiga gerar a imagem bem nítida e concisa com os fatos descritos. Atualmente existem várias IAs para desenvolvimento de imagens disponíveis no mercado, porém a que mais me identifico e a qual considero a mais ‘assombrosa’ por assim dizer é a Midjourney. Ela tem se mostrado a mais eficaz, retornando imagens de uma perfeição surreal e atendendo fielmente os prompts que tenho testado. No caso das imagens de Chico eu utilizei também de outra técnica que foi inserir no comando fotos do rosto para que a fidelidade da imagem fosse ainda maior”,

contou o artista.

Imagem: Dionísio Neto

Simplicidade da vida do campo 

Ao recriar a imagem de Chico Mendes, Neto afirmou que buscou transmitir a liberdade do homem do campo, a simplicidade da vida rural e as dificuldades enfrentadas por aqueles que vivem em contato direto com a natureza.

Ele acredita que trazer o passado para os dias de hoje é uma forma de relembrar de onde viemos e dos limites que o ser humano não deve ultrapassar. A obra de arte de Neto também tem como objetivo destacar a importância da Amazônia e a necessidade de preservá-la de forma sustentável.

“A Amazônia deve ser cultivada, porém muito bem cuidada, e uma pessoa que representa muito o nosso verde da Amazônia, nossa seringueira, é Chico Mendes, e acho que foi um pouco dessa intenção que desenvolvi neste projeto”,

ressaltou.

Neto vislumbra um futuro promissor para a arte em relação à inteligência artificial. O artista acredita que a tecnologia pode ser uma aliada poderosa na revitalização da memória de figuras históricas e na expressão artística. Ele revela que tem planos de recriar outras personalidades importantes da história, buscando explorar as possibilidades oferecidas pela IA em futuros projetos.

“A ferramenta de criação de imagens por meio de IA já é uma realidade, e veio para ficar, acho que existem inúmeras aplicações para a mesma, e uma delas é a revitalização da memória de figuras da nossa história. Podemos recriar momentos históricos, desenvolver formas de transmitir a mensagem deixada pelos mesmos em forma de arte. Acredito que devo recriar novos personagens de nossa história como estudo e aplicações da IA, sou viciado em aprendizado e me imponho sempre a novos desafios”, destacou.

Imagem: Dionísio Neto

Líder seringueiro 

O seringueiro, que morava em Xapuri, cidade do interior do Acre, é conhecido como ativista ambiental, que lutou pela preservação e a favor dos seringueiros. Chico Mendes foi morto com um tiro de escopeta em 22 de dezembro de 1988 enquanto tomava banho nos fundos de casa, uma semana antes, o líder seringueiro havia completado 44 anos.

Nos dias que se seguiram à morte de Chico Mendes, houve comoção mundial pela partida do seringueiro. Diferente dos casos de outros líderes sindicais mortos no Acre dos anos 80, os suspeitos de planejar e matar Mendes foram logo identificados e presos.

Eram eles: o fazendeiro Darly Alves da Silva e seu filho Darci Alves Ferreira. A viúva de Chico Mendes, entretanto, chegou a pensar que eles sairiam impunes: “Na hora eu até achava, a exemplo de outros casos como o do Ivair [Higino, morto em junho de 88] e do Wilson Pinheiro [morto em junho de 80], que todos ficariam impunes”.

Darly e Darci foram condenados em 1990 a 19 anos de detenção. Eles fugiram da prisão em 1993, e foram recapturados em 1996. Em 1999, Darly saiu do presídio para cumprir o restante da pena em prisão domiciliar, alegando problemas de saúde. Darci, no mesmo ano, ganhou o direito de cumprir o restante da pena em regime semi-aberto.

Em 2013, Darly disse que considerava injusta a fama após o crime. Em entrevista na época, ele disse que as pessoas não conheciam a verdade. “As pessoas me chamam de assassino, mandante. Repórter não sabe de coisa nenhuma, só ouviu falar, e para saber de algum negócio, você tem que ler o processo ou ser testemunha. Chamam minha família de perigosa, acusando as pessoas sem saber”, chegou a dizer.

Ameaças

Ilzamar Mendes, viúva de Chico e mãe dos dois filhos do casal, Elenira e o Sandino, contou que nos dias que antecederam a morte de Chico Mendes, ele já dizia que estava com os dias contados.

“Em 15 de dezembro, dia do aniversário dele, ele me chamou até o quarto, sentou as crianças no colo, olhou para nós três e disse que aquele seria o último aniversário que passaria conosco. E isso foi ruim. Era uma facada no peito por saber que aquela pessoa que tanto você ama, que desenvolvia um trabalho importante, tanto para o Acre, como para o Brasil e para o mundo, estava sendo perseguido e ameaçado de morte”, contou.

Imagem: Dionísio Neto

Legado

Conhecido internacionalmente, o legado de Chico Mendes hoje é mantido pelos filhos, por meio do Comitê Chico Mendes e também outras ações. A casa do líder também é um patrimônio histórico do estado, porém está fechada desde 2018 para obras de revitalização.

Hoje a maior reserva extrativista do Acre leva o nome do seringueiro, mas tem sofrido com ameaças de desmatamento, sempre liderando também o ranking de queimadas em áreas protegidas.

*Por Iryá Rodrigues, do g1 Acre

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

Victor Xamã: a renovação do rap que vem da Amazônia

Expoente do estilo na região Norte, artista chama atenção por timbre grave e rimas que falam do cotidiano de quem vive entre as agruras da cidade grande e a maior floresta do mundo.

Leia também

Publicidade