Projeto incentiva detentos ao empreendedorismo no Pará

Sandra Souza, 59 anos, cumpre pena no regime domiciliar e com a ajuda de um programa de microcrédito do governo do Estado conseguiu dar o primeiro passo para abrir um negócio próprio que lhe permita recomeçar a vida fora do cárcere e garanta meios de prover o sustento da família. A oportunidade surgiu depois que ela conheceu o Credcidadão, política de geração de emprego e renda que disponibiliza linhas de microcrédito a baixo custo para pessoas que desejam empreender, mas tem pouco ou nenhum recurso para investir. O programa fechou parceria com a Superintendência do Sistema Penitenciário do Estado (Susipe) para garantir crédito a detentos e egressos.

“Eu fiquei sabendo que existia o Credcidadão por meio da Susipe e sempre quis muito investir em uma lavanderia, porque tenho uma amiga em uma empresa e ela me ofereceu umas fardas para lavar, mas eu não tinha como, pois não dispunha do equipamento necessário. Eu até aceitei o serviço e comecei a lavar no tanquinho de casa mesmo, só que ficou muito pesado pra mim, pois eram muitas fardas e eu não dava conta de fazer tudo sozinha”, conta Sandra.

Foto: Thiago Gomes/Agência Pará
Quando foi fazer o cadastro para tentar conseguir a linha de crédito, Sandra já tinha em mente pelos menos dois empreendimentos que gostaria de iniciar. “Eu já fui pensando em comprar uma máquina de lavar e um ferro de passar. Com o dinheiro que ganhasse com a lavagem das roupas, eu já pensava em também fazer um curso de banho e tosa, pois vejo que é um mercado lucrativo aqui em Belém. Conheço muita gente que tem animal de estimação e não tem tempo de ir até um pet shop, então eu pensei em ir à casa da cliente e oferecer os meus serviços”, detalha.

O espírito empreendedor de Sandra deu certo e hoje a lavanderia dela é um sucesso. “Estou ganhando meu dinheirinho com isso e já consegui até ajeitar minha casa. Quero um trabalho onde eu possa passar mais tempo com o meu filho, porque ele só tem 10 anos e precisa da minha assistência ainda. Sou eu quem vai levar e buscar ele na escola, e ainda tenho que arcar com todas as despesas como compra de material escolar, roupa, alimentação e outros gastos. Quero começar logo outro trabalho, mas sem parar com o serviço da lavanderia, pois foi ele que me deu impulso para começar”, diz ela.

A parceria entre a Susipe e o Credcidadão começou em julho do ano passado. O benefício do microcrédito já foi concedido a 13 egressos do sistema penitenciário e teve investimentos de mais de R$ 32 mil reais. Agora, o programa expandiu a linha de microcrédito para os detentos monitorados e também em prisão domiciliar.

“Estamos formalizando um termo de cooperação técnica com o Credcidadão, onde teremos fixo um valor mensal de R$ 30 mil para disponibilizarmos aos egressos. Isso ainda não foi oficializado, mas a nossa expectativa é firmar este convênio ainda este ano. No mesmo termo fica prevista a capacitação destas pessoas, pois não adianta apenas emprestar o dinheiro, nós precisamos auxiliá-las a empreender, preparando-as para receber o dinheiro e utilizá-lo da forma correta, para trabalhar a questão da organização social, da liderança, do plano de negócios, de forma que elas aprendam a gerenciar o próprio negócio”, destaca Neide Azevedo, coordenadora de Assistência ao Egresso e Família (CAEF) da Susipe.

Neste mês de abril será realizada uma cerimônia para a entrega de novos créditos a sete egressos do sistema penitenciário. Até o momento pelo menos oito tipos de empreendimentos já foram iniciados a partir da disponibilização dos recursos, com atividades voltadas para a venda de frutas, lanches, frango e açaí, lava a jato, mercearias e lavanderias. De acordo com a coordenadora da CAEF, a expectativa é que em 2017 pelo menos cem egressos consigam o benefício e que os investimentos ultrapassem R$ 300 mil.

“Há muitas pessoas interessadas. O que mais dificulta o processo é enquadrá-los nos critérios pré-estabelecidos para obtenção do crédito, como avalista que não tenha restrição no SPC/Serasa e que tenha como comprovar renda. O egresso também não pode ter restrição de crédito. Isso é uma condição bancária, então não temos como mudar”, pondera Neide.

Edileuza Figueredo, 35 anos, é egressa do sistema penitenciário e com o dinheiro do microcrédito já conseguiu realizar o primeiro sonho. “Eu lutei muito para conseguir o que tenho hoje. Já estou pagando a quarta parcela do meu empréstimo e com ele eu consegui montar a minha venda de frangos. Trabalho junto com os meus dois filhos todos os finais de semana. Nós montamos uma tenda e vendemos o frango assado com farofa. Com o dinheiro que ganho nessa venda estou pensando em comprar uma moto, para um dos meus filhos começar a trabalhar como mototaxista”, conta.

Os egressos que tiverem interessados no microcrédito podem procurar a Susipe para obter mais informações. “O preconceito ainda existe e é muito forte, o egresso geralmente carrega consigo o estigma de ex-presidiário, então para ele começar o próprio negócio é de vital importância que ele se sinta valorizado, que saiba que pode mudar de vida e escrever uma nova história. Para eles o empreendedorismo é uma excelente solução e nós estamos aqui para ajudá-los”, destaca Neide.

Para Sandra Souza, começar o próprio negócio foi a chance que buscava para uma nova vida. “Essa oportunidade na Susipe foi única, porque depois do que a gente passa é difícil encontrar alguém que confie na gente e nos abra as portas. Eu consegui muitas pessoas que me ajudaram e se não fosse a Susipe, eu não sei o que faria. Hoje eu tenho condições e tenho consciência de que preciso trabalhar muito para que meu filho possa ter uma vida digna e com boas oportunidades”, afirma.
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