Justiça do Amazonas nega pedido do Ministério Público para que Estado e Prefeitura adotassem o lockdown em Manaus

Decisão interlocutória do juiz Ronnie Frank Stone Torres foi proferida em Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado.

O juiz Ronnie Frank Stone Torres, titular da 1.ª Vara da Fazenda Pública de Manaus, indeferiu pedido de tutela antecipada de urgência apresentado pelo Ministério Público do Estado na Ação Civil Pública (ACP) de n.º 0814463-25.2020.8.04.0001, com o objetivo de obrigar o Estado do Amazonas e o Município de Manaus a adotarem o lockdown na capital amazonense. Conjunto de medidas de bloqueio total de circulação de pessoas e mais restritivo que o isolamento social, o lockdown, conforme o MPE, deve ser adotado para ampliar a efetividade das ações que tentam conter a disseminação do novo coronavírus – causador da covid-19 – na cidade.

“(…) ainda que se entendesse ser possível ao Poder Judiciário determinar as severas medidas de restrição à população manauara, como pretendido pelo Ministério Público, está claro que não existem nos autos, até o presente momento, elementos mínimos que justifiquem a medida judicial requerida, em caráter antecipatório, motivo pelo qual indefiro a tutela”, registra o magistrado no texto da decisão. A tramitação da ACP prossegue e o magistrado abriu prazo para contestação da parte autora.

Juiz Ronnie Frank Stone Torres, titular da 1.ª Vara da Fazenda Pública de Manaus. (Foto:Divulgação/TJAM)

O juiz Ronnie Stone frisou que a leitura da própria peça inicial (petição) do MPE-AM deixa claro que o Estado do Amazonas não se encontra omisso diante da pandemia tendo, conforme descreve a própria parte autora da ação, editado nove Decretos com medidas de restrição já a partir do dia 23 do mês de março deste ano para o enfrentamento da pandemia no Estado. Exemplo disto foi o Decreto 42.101/2020, que previu o trabalho em home office no âmbito dos Órgãos da Administração Direta e Indireta do Poder Executivo; a suspensão do funcionamento de todos os estabelecimentos comerciais e de serviços não essenciais; assegurou os serviços de entrega a domicílio; restrição de atendimento em clínicas a situações de urgência. Citou, ainda, a ampliação das medidas de contenção, que vieram com a edição de outros Decretos, como de n.º 52.158/20, com a suspensão do transporte intermunicipal e interestadual. Apesar de listados na inicial, os referidos normativos não foram acostados aos autos pela parte autora.

O juiz destacou que o pedido encaminhado à Justiça o MPE-AM quanto às eventuais medidas adotadas ou deixadas de ser adotadas pelo Município de Manaus, “nada diz de concreto, especialmente se houve ou não alguma espécie de regulamentação por parte do Executivo Municipal”. “(…) Ademais, nenhum documento relacionado especificamente ao Município de Manaus veio aos autos do processo. Sequer relatórios dos sepultamentos realizados na Capital, especialmente no mês de março, abril e maio vieram para avaliação do Juízo”.

Ronnie Frank frisa, ainda, que pedido não veio acompanhado de base documental que dê sustentação à tutela requerida e que quase todas as menções na exordial dizem respeito a matérias jornalísticas, apontando também a ausência de estudo técnico ou de dado oficial gerado, por exemplo, pelo Município de Manaus, seja em relação às ocorrências de Covid-19, seja em relação aos sepultamentos, o que obrigou o Juízo, em razão da urgência e das circunstâncias, a solicitá-los informalmente ao Município de Manaus.

“Limita-se o Autor a enfatizar que as restrições já impostas não estão sendo eficazes e que há a necessidade de medidas de força para que se efetivem, e que a circulação de pessoas tem aumentado a ponto de comprometer o sistema de saúde na Capital”, registra a decisão.

O magistrado analisou o quadro evolutivo dos sepultamentos ocorridos na Capital, nos meses de abril e maio de acordo com dados da Semulsp que, mostram, conforme a decisão, uma clara tendência decrescente, já no início do mês de maio. “Esses dados, ao contrário do que sugere o Autor, demonstram que as medidas adotadas, ainda que não tão rigorosas como as desejadas na peça inicial, estão a indicar que o surto já se encontra, no mínimo, estabilizado, com tendência de redução, na Capital”.

Outro dado considerado pelo juiz como relevantes e repassados pela Secretaria Municipal de Saúde, são os de atendimentos. “(…) não há nada que indique uma tendência crescente a justificar medidas mais drásticas de isolamento social adotadas, em especial, na cidade de Manaus”, acrescentou.

O juiz destacou que, mesmo que não dispusesse dos dados encaminhados pelo Município, a tutela requerida não mereceria acolhida, uma vez que a petição da parte Autora não nega que o Estado do Amazona tenha adotado medidas para restringir a circulação de pessoas, na capital e no interior do Estado.

“O que está dito na inicial é que essas medidas não estão sendo suficientemente cumpridas pela população, por falta de meios de coerção (multas, etc) e, por isso, requer ao Poder Judiciário que as torne eficazes por meio de decisão. (…) A rigor, o que se pretende é substituir o poder de polícia à disposição do Gestor Público pela força de uma decisão judicial, ou seja, transferir para o Poder Judiciário a responsabilidade pela execução das medidas previstas nos decretos do Senhor Governador, o que é inaceitável por conta da distribuição de atribuições dos poderes constituídos, dentro do sistema constitucional vigente”.

Para o magistrado, não cabe ao Poder Judiciário minorar ou agravar medidas de circulação de pessoas para a contenção de epidemias. A leitura dessas políticas deve ser feita por equipes técnicas que, diante de dados concretos, possam municiar as decisões a serem tomadas pelo Chefe do Executivo. “Já ao Poder Judiciário compete examinar, dentro do quadro constitucional, pontualmente, se as medidas contêm excessos que mereçam ajustes ou até supressão, mas nunca substituir a política adotada pelo Gestor Público por entender que ela não é bastante”.

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