Bloco Pretinhos do Mangue exalta o respeito à mulher e ao meio ambiente

Em Curuçá, no nordeste paraense, é do mangue que sai o caranguejo, sustento de muitas famílias, e a lama (conhecida por tijuco), matéria-prima da fantasia usada no tradicional bloco carnavalesco “Pretinhos do Mangue“. No domingo (11), segundo a organização do evento, mais de 17 mil brincantes e espectadores acompanharam o cortejo, que começou no Porto dos Pretinhos e seguiu pelas principais ruas da sede municipal até a praça da folia, na orla.

O bloco foi criado em 1989 a partir da frustração de dois amigos que foram ao mangue atrás de alimento, mas não conseguiram nenhum caranguejo. Então decidiram passar lama pelo corpo e saíram pela cidade em forma de protesto. “O mangue oferece o nosso caranguejo, mexilhão e camarão. É daqui que as famílias tiram seu sustento. Nossa intenção é aproveitar esse momento de alegria e passar essa mensagem de preservação”, informou o presidente do bloco Edmilson Campos, mais conhecido como “Cafá”, que está à frente da agremiação há 18 anos.

“Nosso bloco é o mais democrático que existe, pois quando você passa o tijuco todo mundo fica igual. É uma brincadeira saudável, onde crianças e adultos participam com tranquilidade, e que atrai todos os anos milhares de turistas do Estado, do Brasil e até internacionais”, completou Edmilson Campos.

Em 2010, em função de sua importância no calendário local, o bloco foi declarado “Patrimônio Cultural do Município de Curuçá“, pela Lei nº 1.981, de 12 de fevereiro de 2010, e “Patrimônio Cultural do Estado do Pará”, por meio da Lei nº 7.383, de 16 de março do mesmo ano.

Foto: Divulgação / Agência Pará

Respeito à mulher

Além de conscientizar sobre a importância da preservação ambiental, o “Pretinhos do Mangue” traz, em sua 29ª participação no carnaval, o tema “Mexeu com uma, mexeu com todas. #Chegadeassedio”, uma reflexão sobre o respeito à mulher. “Essa é uma  discussão que está em destaque em todo o Brasil e que resolvemos trazer para o carnaval, que é um momento de festa, mas também de respeito. E esse é um conceito que não se estende só à mulher, mas à religião, sexualidade e ao próximo de maneira geral”, explicou o presidente do bloco.

Deixa o rio levar

Em destaque no corredor da folia, cinco alegorias, entre elas o tradicional caranguejo  gigante, mascote do bloco; a ostra; ala dos guarás, ave vermelha típica dos manguezais; a canoa dos piratas e a barraca do pescador, onde turistas e foliões degustaram crustáceos e peixes da região. A animação ficou por conta de show de carimbó, na concentração do bloco, e de um trio elétrico comandado por uma banda local, que animou o público com ritmos de fanfarra e o samba-enredo deste ano, “Deixa esse rio te levar”.

De acordo com o autor do samba, o curuçaense Adalberto Favacho (“Adal”), a intenção foi mostrar as peculiaridades do município. “Procurei falar sobre pertencimento, sobre quem vive e gosta de Curuçá, mostrando as nossas praias, nossas belezas naturais, e que o maior mangue do mundo passa aqui no nosso quintal. Isso reafirma o valor da cidade para a população local, e é uma forma de mostrar ao turista o que temos de bom”, destacou.

Adal nasceu em Curuçá, mas em função de estudos e trabalho, residiu em outros Estados. Depois de 15 anos fora, retornou ao Pará em 2003, quando reacendeu sua paixão pelo bloco e criou a “Rede Mangue de Turuvisão”. Ele e o irmão, Augusto Favacho, se transformam em cinegrafista e repórter e satirizam as coberturas jornalísticas no carnaval da cidade. “De lá pra cá viramos um ícone no ‘Pretinhos do Mangue’, divertindo a todos”, contou.

Foto: Divulgação / Agência Pará
Tradição e preservação

Quem decidiu aproveitar o carnaval no município não se arrependeu. Entre os brincantes estava o servidor público Paulo Neves, 60 anos. Nascido em Curuçá, ele mora atualmente em Belém, mas todo ano faz questão de compartilhar essa vivência. “Acho importante manter a tradição e a consciência de preservar o meio ambiente. Mostro isso para meus amigos e parentes que moram em outros Estados, e muitos deles estão hoje aqui. Tem gente de Brasília, Macapá, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná, que veio especialmente para curtir esse momento”, disse Paulo Neves.

O curuçaense contou ainda que integra um grupo de quase 30 amigos, que há mais de 20 anos se reúne para limpar as áreas de mangue da cidade. “Essa é uma mobilização muito importante. Temos que preservar, pois a cada ano que passa tudo fica mais difícil. Doenças, enchentes, secas, tudo é consequência da ação do homem, do desmatamento, queimadas, entre outros fatores”, avaliou Paulo Neves. Ainda segundo ele, outros grupos do município reforçam o trabalho de conscientização ambiental.

No corredor da folia, a família da estudante Lívia Rodrigues, 14 anos, recebe os amigos de Belém. “Nesse período de carnaval a casa costuma ficar sempre cheia. Há cinco anos montamos, inclusive, um camarote para que todos pudessem curtir com mais conforto. Temos o melhor carnaval do Estado, e aqui a diversão é garantida e sempre com muita tranquilidade”, ressaltou.

Para que tradição e preservação andem juntas, a organização do evento disponibilizou camburões com barro para que os brincantes pudessem confeccionar o “abadá natural”. “Isso contribui para a diminuição da entrada no mangue. Procuramos manter a tradição, respeitando e levando adiante a importância do ecossistema para nossa sobrevivência”, frisou Adalberto Favacho.

O município também conta com a Associação Socioambiental e Cultural Pretinhos do Mangue, criada com o objetivo de profissionalizar cada vez mais o carnaval e desenvolver projetos voltados à questão ambiental.

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

Javaporcos: entenda como Roraima está atuando no controle de espécie invasora

Nos últimos anos, uma grande quantidade de javaporcos tem se espalhado por Roraima, especialmente na região central do Estado.

Leia também

Publicidade