O mês de Junho é um período extremamente festivo e feliz no Brasil. A exemplo de outras festas populares de grande vulto, como o Carnaval, também nossas festas juninas ganharam grande importância no calendário cultural do país, primeiro como festas privadas, ocorridas em âmbitos familiares e mesmo no entorno mais imediato, contemplando a vizinhança. Depois, com os incentivos públicos, passaram a ser adotadas por prefeituras, associações culturais, grupos mais organizados, tornando estas comemorações complexas, maiores e sobretudo identitárias de determinadas cidades e até mesmo regiões.
As tradições festivas do mês de Junho mesclam rituais cristãos, práticas pagãs e muitos ingredientes locais. Tratam sim de festividades que contemplam dias de homenagem a santos da Igreja Católica como Santo Antônio (dia 13 de junho), São João (dia 24 de junho), São Pedro (dia 29 de junho). Mas em que pese as representações cristãs estarem contempladas nestas festividades, muitas delas tiveram origens ligadas à tradições pagãs. Fogueiras, bebidas, comidas sempre estiveram relacionadas aos períodos de verão, colheitas, nascimentos na comunidade, na tribo, enfim, tempos de alegria e de bonança.
De todo modo, as festas populares (como as juninas) são representações das mais genuínas da cultura de um povo, demonstrando no ato de festejar o dinamismo das histórias de vida, das transformações comunitárias, das presenças e das ausências em cada tempo e espaço específicos, que são cenários em que este drama/comédia se desenrola sem um roteiro pré-definido.
E a comida saborosa e abundante numa mesa farta, com vários tipos de bebidas, pratos, sejam eles doces ou salgados, são o exemplo claro da importância que as festas juninas possuem como amálgamas ligando pessoas, interesses, crenças as mais difusas, como forma de fortalecer laços sociais, de afirmar identidades, de valorizar a cultura e as tradições. Observemos que a quase totalidade dos pratos desta época tem como base insumos ligados a grãos e raízes ou seja, ingredientes utilizados como alimento de comunidades agrícolas, vinculadas à terra, mas também populações nativas, que viviam do extrativismo de elementos da floresta como meio de sustento.
O amendoim, o milho, a batata-doce, a mandioca, as carnes de caça e até mesmo o álcool (a partir, por exemplo, da fermentação da casca de frutas, como no caso do aluá, feito com abacaxi) são ingredientes disponíveis à maioria da população, muitas vezes conhecidos pejorativamente como “culturas de pobre”, porque destinadas ao sustento diário destas comunidades. Isso explica, porque a soja não é um alimento presente nas receitas juninas. Ela simplesmente, como produto destinado ao mercado exterior, não faz parte de nossa dieta cotidiana, à exceção de seus subprodutos industrializados.
Já o milho possui um papel bastante especial neste conjunto de tradições. O sociólogo Carlos Alberto Dória no livro “Culinária caipira na Paulistânia” mostra como este ingrediente foi a base da alimentação interiorana no Brasil, à semelhança do que ocorre em toda a América, principalmente em comunidades andinas. A versatilidade do milho o torna onipresente nas festas juninas. De norte a sul do Brasil, há pratos de milho como: curau, pamonha, canjica, bolo, pipoca, mingau, in natura com manteiga ou como farinha e cuscuz, o que o torna uma verdadeira instituição junina.
Já na Amazônia, a mandioca é central no gosto popular. Em nossos cardápio festivos, ela é parte obrigatória. Ou alguém consegue pensar em um prato de maniçoba sem farinha? E o bolo de macaxeira, seja ele com côco ou não. O mingau de farinha de tapioca também é um prato que nos remete a memórias afetivas, principalmente aquele quentinho, servido com canela. O que temos, na verdade, é uma mesa farta e extremamente miscigenada, que mistura nossos ingredientes nativos com outros vindos de além-mar, preparados com técnicas europeias, desconhecidas de nossos antepassados. Voltando à maniçoba, ela reúne carnes de animais (para os indígenas amazônidas, carnes de caça) com o refogado de gordura, alho e cebola, importado pelos portugueses.
É hora de aproveitar os folguedos, os sons, cheiros e sabores de um momento tão especial. Pedir como pediu o Rei do Baião, Luiz Gonzaga, no clássico: “São João na roça”: ”Traz a cachaça Mané! / Que eu quero ver / Quero ver paia avoar!” Um salve às Festas de Junho!