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Resgatar e preservar: línguas indígenas são repositórios de saberes ancestrais

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Conforme dados da ONU, há populações indígenas habitando todas as regiões do planeta, ocupando 22% da área terrestre global. São aproximadamente 500 milhões de indígenas que falam cerca de sete mil línguas de cinco mil culturas distintas que representam grande parte da diversidade cultural do mundo.

No Brasil, segundo dados do Censo 2022 do IBGE, há 305 povos indígenas e 274 línguas relacionadas a eles. Mesmo assim, o dado do número de línguas faladas por indígenas no país diverge, porque são utilizados critérios diferentes.

O censo está baseado nas autodeclarações, dados de retomadas linguísticas, enquanto os dados do Museu Emílio Goeldi, no Pará, e o Museu Nacional dos Povos Indígenas, no Rio de Janeiro, levam em conta critérios linguísticos, inclusive com a possibilidade de compreensão entre duas variantes consideradas como línguas iguais, o que para os povos podem ser línguas diferentes.

As línguas indígenas possuem relações de parentesco entre si e são agrupadas em famílias linguísticas. As duas principais famílias linguísticas ou troncos linguísticos no Brasil são tupi e macro-jê. São chamados de troncos porque contêm subfamílias.

Mas existem outras grandes famílias linguísticas – Pano, Caribe, Arauak – que não estão relacionadas às línguas isoladas. Há famílias pequenas e línguas isoladas ou de recente contato, além das línguas indígenas de Sinais e o Braslind, o português falado pelos povos indígenas.

Década Internacional das Línguas Indígenas

Na visão de Altaci Kokama, coordenadora-geral de Articulação de Políticas Educacionais Indígenas do MPI e primeira professora universitária indígena da Universidade de Brasília (UnB), pode haver uma solução para a incompatibilidade do número de línguas indígenas no país por meio de um levantamento feito com auxílio da iniciativa conhecida como a Década Internacional das Línguas indígenas, que começou em 2022 e segue até 2032. 

Instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), a iniciativa da Década Internacional das Línguas Indígenas (2022-2032) visa promover os direitos dos povos indígenas. A ação também está alinhada ao cumprimento do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 16, que busca ampliar o acesso público à informação, proteger liberdades fundamentais e garantir a igualdade de acesso à justiça para todos. Com apoio do MPI, o 2º Encontro do GT Nacional das Línguas Indígenas para a Década Internacional das Línguas Indígenas será realizado entre os dias de 5 a 8 de novembro de 2024, na Terra Indígena Buriti, município de Dois Irmão, em Mato Grosso do Sul.

Altaci também aponta para o lançamento, previsto para 2024, do mapeamento quantitativo de línguas e povos indígenas do Censo, que conterá uma abordagem mais atualizada e fidedigna do quadro atual de dados, já que as perguntas foram reformuladas para que as observações sejam feitas de uma perspectiva indígena, o que denota uma mudança de percepção do mundo não indígena sobre a necessidade de consultar os indígenas a respeito de elementos tão relevantes como idiomas. 

Nesse sentido, o MPI visa criar os Centros de Altos Estudos para as línguas indígenas. Trata-se de uma parceria com as universidades para formação de indígenas com o intuito de tomarem conta das suas próprias línguas, para que funcione como repositório de pesquisas de línguas indígenas e para a formação de tradutores e intérpretes em línguas indígenas. 

Cosmovisão e subjetividade

Benites cita como exemplo o caso da língua geral chamada Nheengatu, derivada do Tupi e sistematizada pelos jesuítas, que no fim do século 17 passou a ser utilizada como forma de comunicação entre indígenas e colonizadores, mas cujo ensino foi proibido em 1758 pelo Marquês de Pombal para privilegiar a inserção do idioma português como língua oficial do país. Isso contribuiu não só para desvalorizar e invisibilizar as centenas de línguas do país, mas também como um projeto dominador para sufocar conceitos, ensinamentos e maneiras de enxergar o mundo conforme os indígenas.

De acordo com Eliel Benites, a importância das informações acerca das línguas indígenas nacionais se dá como a base para fundamentar uma política linguística do MPI, tanto para promover um resgate quanto para conservar um vasto corpo de conhecimento que é vítima de um processo de extinção planejado desde a colonização. 

Universidade Indígena 

Com foco nesse situação, o DELING vem conduzindo uma série de 18 Seminários Regionais de Consulta sobre a Universidade Indígena (UIND) em diversas regiões do país. O objetivo é elaborar, junto aos povos indígenas do Brasil, um projeto para criar uma instituição de ensino. A previsão é que o giro de consultas se encerre em setembro. 

Por meio do Grupo de Trabalho (GT) criado pelo Ministério da Educação (MEC) e iniciado em abril deste ano, a iniciativa está em estudo com articulação do MPI. Países como Bolívia e México já possuem universidades indígenas, que podem servir de modelo para o projeto brasileiro.

O Grupo de Trabalho é formado por membros do Conselho Nacional de Educação Escolar Indígena, do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena, da Secretaria de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas e da Secretaria de Educação Superior, com o objetivo de construir o conceito da Universidade. 

De acordo com o diretor do DELING, Eliel Benites, trata-se de uma demanda antiga que busca utilizar a universidade como meio de resistência e luta e para formar jovens lideranças indígenas. A demanda foi originalmente apresentada pelo movimento indígena na Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena (CONEEI), em 2009, e no Seminário Educação Superior de Indígenas no Brasil, em 2013.

Outro importante papel do GT é analisar a viabilidade técnica e orçamentária da instituição até o início de outubro, quando irá apresentar o resultado da escuta feita junto aos povos indígenas.

 “A proposta foi se construindo diante da importância de legitimar o processo da estruturação da Universidade, uma vez que há 305 povos diferentes, com línguas e culturas diversas aqui no Brasil. Nesse GT, foi estabelecido um cronograma de consulta de seminários regionais para informar e também ouvir o que cada povo pensa sobre a Universidade Indígena e, a partir dali, pensar uma proposta que abarque toda essa diversidade”, acrescentou.

Vale destacar que o MPI também desenvolve outras frentes para fortalecer os idiomas indígenas do Brasil. Um dos projetos trata da tradução de legislação brasileira, como a Constituição Federal, e há o edital Ancestralidade Viva: Apoio e Incentivo à Cultura dos Povos Indígenas, que está em andamento e habilitou 147 projetos referentes à festas e festivais de povos indígenas. 

A iniciativa fornecerá apoio financeiro a 50 propostas que visem a promoção da cultura e dos saberes indígenas, garantindo visibilidade e autonomia dos povos indígenas.

*Com informações do Ministério dos Povos Indígenas

Seca atinge 69% dos municípios da Amazônia em 2024, aponta InfoAmazonia

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Entre janeiro e junho deste ano, a seca atingiu 69% dos municípios da Amazônia Legal (531 no total), enquanto apenas 31% permanecem em estado de normalidade. Isso é o que revela análise da InfoAmazonia com base no Índice Integrado de Seca (IIS), sistema do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), que monitora os registros de seca nacionalmente.

Nos primeiros meses do ano, de janeiro a maio, a Amazônia normalmente está passando por sua estação chuvosa. No entanto, os dados indicam que, no primeiro semestre de 2024, em comparação com o ano passado, houve um aumento no número de cidades que passaram da seca fraca para moderada e, também, para severa.

Assim, os números já mostram que a temporada seca no bioma está mais intensa neste ano. De janeiro a junho de 2023, 309 municípios estavam em situação de seca fraca, enquanto 126 passavam por seca moderada. No primeiro semestre deste ano, os números praticamente se inverteram: 300 municípios enfrentam seca moderada, enquanto 170 passam por seca fraca.

Além disso, a quantidade de municípios em seca severa aumentou 56% em 2024. Eram 39 no primeiro semestre de 2023 e, no mesmo período deste ano, foram 61. Os estados do Amazonas, com 19 cidades, Mato Grosso, com 14, e Rondônia, com 10, são os mais atingidos. 

Amazônia Legal tem 69% dos municípios em seca neste ano

Veja a gravidade da seca em cada um dos municípios da região no primeiro semestre de 2024.

Foto: Cemaden /Análise e visualização -InfoAmazonia

Mais forte e mais severa

Em Santa Isabel do Rio Negro, a 631 km de distância de Manaus, a mudança foi de seca fraca, no primeiro semestre de 2023, para seca severa no primeiro semestre de 2024. O autônomo Charlen Ferreira, que vive na cidade, conta que, apesar do rio ainda não estar completamente seco e a compra de alimentos ainda ser possível, ele já está pensando em estocar comida.  

No ano passado, um dos problemas enfrentados por Santa Isabel do Rio Negro foi a falta de energia. A Usina Termelétrica da cidade precisa de combustível para funcionar, mas é necessário o uso de embarcações para transportá-lo até o local, o que não foi possível devido à ausência de navegabilidade do rio. O medo é que este ano ocorra a mesma situação.

Quantidade de municípios em seca severa na Amazônia aumentou 56% em 2024

Análise da InfoAmazonia comparou a situação dos municípios da Amazônia Legal em janeiro a junho deste ano com o mesmo período de 2023.

Fonte: Cemaden/ Análise e visualização: InfoAmazonia

Também no Amazonas, o município de Beruri, a 173 km de distância de Manaus, passou da seca moderada no primeiro semestre de 2023, para severa no mesmo período deste ano. Para os moradores, o que fica perceptível é que os rios estão descendo mais rápido e antes do tempo. Porém, como estão trafegáveis, o acesso ainda é possível. O temor é pelo o que está por vir. 

Na cidade, existem casas localizadas em regiões vulneráveis. No ano passado, a cidade de Beruri passou por um desastre em que duas pessoas morreram, três ficaram desaparecidas e 151 pessoas foram diretamente atingidas. A comunidade Vila Arumã foi totalmente sugada pela terra, uma consequência da seca que começou no final do primeiro semestre de 2023. Esse fenômeno é chamado de “terra caída”, em que há erosão do solo provocada pelos rios. 

Intensidade da seca em Beruri, no Amazonas

Dados referentes aos primeiros semestres (janeiro a junho) de cada ano. Foto: Cemaden

Ainda com acesso ao rio, a seca severa não está impedindo as viagens neste ano, mas o problema de habitação continua. Em outubro do ano passado, o Serviço Geológico Brasileiro (SGB) fez um relatório mostrando que ainda existem 3 áreas de risco ao redor do local onde houve o deslizamento da Vila Arumã. 

“Após o evento, foi gerada uma nova configuração da paisagem da região, deixando uma grande quantidade de solo exposto a ações intempéricas dos próximos eventos de chuva, cheias e vazantes”, afirma o documento. 

Maria*, nome fictício de uma das moradoras de Beruri que preferiu não ser identificada, conta que a família perdeu a residência na vila e que, atualmente, os parentes estão vivendo de favor na casa de amigos. Com a intensificação da seca deste ano, eles voltam a lembrar do trauma que passaram.

Ela conta que a sua irmã ainda sofre as consequências do desastre, enfrentando crises de pânico.

“Ela não dorme direito, não sai para as ruas, vive com um medo horrível. Devido a seca ser tão grande, veio o deslizamento de terra que engoliu a vila. As pessoas ficaram sem suas casas e quase perderam suas vidas. Se não fosse a misericórdia do senhor, hoje eu estava com metade da minha família morta”, relata.

Imagem consta em relatório do SGB, com informações sobre o desastre no município de Beruri. Foto: Reprodução

A reportagem entrou em contato a prefeitura de Beruri e o governo do Amazonas, questionando se as áreas mencionadas já foram desocupadas ou estão recebendo algum tipo de planejamento para a estiagem deste ano, mas não obteve resposta. 

Comunidades vulneráveis em alerta

A seca que acomete o que deveria ser a estação chuvosa na Amazônia ainda é consequência do El Niño, evento que causa o aquecimento do Oceano Pacífico, na linha do Equador. O fenômeno, que começou em junho de 2023 e terminou em junho deste ano, inibe a formação de nuvens e reduz o volume de chuvas na região. 

“Isso perdurou ao longo do ano [2023] e chegou ao seu máximo em novembro e dezembro, que foram dois meses muito secos na Amazônia. Agora, mesmo sem El Niño, de uns dois meses para cá [junho e julho de 2024] a situação da seca está bem extensiva em quase todo o bioma, com chuvas predominando abaixo do normal”, afirma a pesquisadora Ana Paula Cunha, do Cemaden. 

Além disso, no ano passado, o El Niño foi atípico devido à combinação com outro fator: o aquecimento do Oceano Atlântico Norte, condição que eleva as temperaturas oceânicas. A previsão para agosto e setembro deste ano é que o cenário persista.

Agora, as populações mais vulneráveis, muitas delas que já vivenciaram o problema em 2023, estão em alerta. No ano passado, comunidades inteiras em diferentes regiões da Amazônia ficaram completamente isoladas por causa da seca. O rio Negro passou pela pior vazante da história em mais de cem anos. 

Doze associações de quilombolas residentes em Óbidos e Oriximiná, municípios no oeste do Pará com seca moderada neste ano, publicaram uma carta solicitando às prefeituras planos de contingência, suprimento de equipamentos para armazenamento de água, distribuição de alimentos e capacitação de agentes comunitários de saúde. 

“Ainda não estamos no limite de seca, mas nós já estamos sentindo porque cada dia que passa a água baixa mais. A nossa iniciativa com a carta foi prever a situação que nós vivemos no ano passado, que foi muito difícil. Neste ano, pelo nível da água, a gente vê que a seca vai ser ainda maior”, conta Redinaldo Alves, líder da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Município de Óbidos (ARQMOB). 

Com os rios da região secos durante o ano passado, Redinaldo esteve à frente das atividades de apoio às comunidades, oferecendo ajuda.

“Eram comunidades precisando de água potável, alimentos e remédios. Estamos muito assustados com a possibilidade desse ano ser como foi em 2023”, disse. 

Adaptação climática nos municípios

No dia 6 de agosto, o SGB divulgou um boletim mostrando que o rio Madeira, afluente do rio Amazonas, que banha os estados de Rondônia e Amazonas, está com a cota de 2,07 m. No ano passado, isso ocorreu em 1º de setembro, e foi piorando. A cota mais baixa da história, de 1,10 m, foi registrada no dia 6 de outubro do ano passado. 

Com o agravamento do padrão de seca, organizações da região começaram a cobrar planos de adaptação. Em Porto Velho, capital de Rondônia que está  em seca moderada, 150 moradores  das margens do rio Madeira fizeram uma manifestação pedindo ações de contenção aos danos da seca neste ano. 

Foto: Felipe Rufino/ MAB-RO

Eles fazem parte do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e ocuparam o prédio da prefeitura. Além disso, entregaram documentos à administração municipal e solicitaram a criação de um ‘Auxílio Calamidade Climática’ pelo período de três meses. 

Os moradores da comunidade pedem a criação de 17 poços artesianos, isenção na cobrança da taxa de água, descontaminação dos poços, reforço para atendimento médico, distribuição de alimentos e vale gás. 

Com a manifestação, o MAB conseguiu um espaço no Comitê de Crise Hídrica do município, cujos trabalhos estavam sendo feitos sem a presença de representantes das comunidades.

“Hoje, o rio Madeira está cada vez mais perto de secar. As comunidades ficarão completamente isoladas. A grande preocupação é o acesso à água e estamos nessa pressão com o poder público municipal”, conta Océlio Muniz, coordenador do MAB-RO. 

De acordo com levantamento do Instituto Jones dos Santos Neves, 15 capitais brasileiras ainda não possuem um Plano Municipal de Mudanças Climáticas, documento essencial para a gestão e redução do risco climático, para evitar perdas e danos e para a adaptação dos sistemas naturais, humanos, produtivos e de infraestrutura. Na Amazônia Legal, das nove capitais, somente Rio Branco, n Acre, tem um plano. 

No momento, o governo federal trabalha na construção de um Plano Clima, que deve ser apresentado no próximo ano e tem duas frentes: mitigação e adaptação. No caso da mitigação, o objetivo é reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Já a adaptação trata desses planos que consideram vários setores sociais, desde agricultura, transporte, populações indígenas e saúde alimentar. No entanto, embora o Plano Clima tenha suas especificidades por setores, ele ainda tem um olhar nacional.

Em Rondônia, Océlio afirma que a falta de um plano está atrasando as ações que poderiam estar ocorrendo agora. Ele cita que, além das construções dos poços artesianos, já era possível estar distribuindo alimentos, itens para limpar água e remédio para doenças como a diarréia. “No ano passado, a Prefeitura de Porto Velho e o estado de Rondônia fizeram um decreto de emergência tardio. Este ano, estamos preocupados com a necessidade de ter a urgência do plano, de ações emergenciais nas comunidades”, afirma. 

Como analisamos a seca nos municípios da Amazônia?

Nesta reportagem, analisamos os dados do Índice Integrado de Seca (IIS) do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) para os municípios da Amazônia Legal em 2023 e 2024. Analisamos o IIS6, que considera os dados dos últimos seis meses, com foco nos períodos de janeiro a junho de 2023 e o mesmo período em 2024.

O IIS combina o Índice de Precipitação Padronizada (SPI), a Água Disponível no Solo (ADS) e o Índice de Suprimento de Água para a Vegetação (VSWI) ou o Índice de Saúde da Vegetação (VHI), ambos estimados por sensoriamento remoto. O IIS é classificado em seis categorias: condição normal (6), seca fraca (5), seca moderada (4), seca severa (3), seca extrema (2) e seca excepcional (1).

Para reforçar o compromisso com a transparência e permitir a replicabilidade das análises, a InfoAmazonia disponibiliza os dados nesta pasta.

*O conteúdo foi originalmente publicado pelo INFOAMAZONIA, escrito por Jullie Pereira

Suspensão de licenças para mineroduto em terras indígenas no Pará é recomendada por MPF e DPU 

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O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) recomendaram à Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas) que suspenda imediatamente as licenças ambientais concedidas a empresas do Grupo Imerys para a operação de um mineroduto instalado em terras indígenas em Tomé-Açu, no nordeste do Estado. 

A suspensão deve ser mantida até que os direitos indígenas sejam efetivados, orienta a recomendação. Apesar de ter identificado impactos às populações, a Semas não considerou as comunidades como indígenas e não realizou os estudos apropriados de impactos a essas comunidades, que são obrigatórios. 

Para membros do MPF e da DPU, houve “um verdadeiro processo de invisibilização de tais povos na região afetada – desrespeitando, na base, os próprios direitos fundamentais e humanos à autodeclaração e autodeterminação desses povos”.

O MPF e a DPU recomendaram à Semas que as licenças sejam suspensas até a realização de consulta livre, prévia e informada às comunidades indígenas e até a elaboração do estudo de impactos socioambientais aos indígenas. Essas medidas devem levar em consideração os protocolos indígenas de consulta, peculiaridades étnicas, culturais, sociais e ambientais, dentre outras obrigações legais.

Ibama pode ser acionado

Os pedidos de renovação das licenças ambientais para a operação da tubulação de transporte de caulim (tipo de argila) aguardam há anos por decisões definitivas da Semas e, enquanto isso não ocorre, as licenças vêm sendo prorrogadas automaticamente sem qualquer estudo ou avaliação. O pedido da Pará Pigmentos está sendo renovado automaticamente há mais de 19 anos, e o da Imerys Rio Capim Caulim, há mais de 12 anos.

De acordo com o MPF e a DPU, essa prorrogação perpétua da licença ambiental não é compatível com a Constituição nem com decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Por isso, também foi recomendado à Semas que finalize os pedidos de renovação dentro de 90 dias, com a realização dos estudos de impactos socioambientais aos indígenas.

Se esse item da recomendação não for atendido, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) será acionado para analisar os pedidos de renovação, registram o MPF e a DPU.

Risco de conflito

Além das violações de direitos que sofrem há mais de duas décadas devido ao projeto, os indígenas estão sob risco de grave conflito com forças policiais destacadas para o cumprimento de medida judicial que permitiu a entrada de funcionários da Rio Capim Caulim em território indígena, segundo a recomendação.

A empresa alega que a entrada da equipe é necessária para consertar diversos pontos do conjunto de tubulações que estão danificados e com sinais de vazamento. Os indígenas são contra a entrada dos funcionários do Grupo Imerys. Segundo as comunidades, o empreendimento está causando danos ambientais, com a contaminação de nascentes de água e prejuízos à caça e à pesca.

O que são recomendações?

Recomendações são instrumentos que servem para alertar sobre a necessidade de providências para resolver uma situação irregular ou que possa levar a alguma irregularidade. O não acatamento infundado de uma recomendação ou a insuficiência dos fundamentos apresentados para não acatá-la total ou parcialmente pode levar à adoção das medidas judiciais cabíveis.

Recomendação nº 7/2024

*Com informações do MPF

Instituto Mamirauá abre projeto de restauração ecológica da Amazônia para consulta e construção coletiva

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O Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, organização social do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), realizou o Seminário de Consulta e Abertura do Projeto “Restauração de Áreas Alagáveis e outros importantes Ecossistemas Amazônicos”, que busca estimular o esforço pela restauração ecológica e mitigação das mudanças climáticas. O encontro teve o objetivo de apresentar e debater o projeto, além de coletar contribuições e expectativas.

A iniciativa é fruto de uma parceria entre o MCTI, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. O projeto será implementado em 18 grandes territórios, abarcando florestas e mangues da costa do Pará, além da região do Médio Solimões, no Amazonas, envolvendo florestas alagáveis e de terra firme.

Segundo o instituto, o objetivo do projeto é evitar a emissão de 10 milhões de toneladas de gases do aquecimento global, proteger a biodiversidade e gerar renda e segurança alimentar para as comunidades tradicionais extrativistas dos territórios beneficiados.

Foto: Divulgação/Mamirauá

O projeto busca ter um calendário com entregas planejadas, que incluem a capacitação e o envolvimento de ao menos 1.600 participantes, a troca de conhecimentos entre ciência e comunidades tradicionais, a elaboração de protocolos de restauração para florestas alagáveis, transferência tecnológica e fortalecimento da cadeia de restauração.

Para desenvolver a iniciativa, serão investidos US$ 5,6 milhões (cerca de R$ 27 milhões) via Fundo Global do Meio Ambiente (GEF, na sigla em inglês).

O seminário

O evento, realizado de maneira online e presencial, ocorreu no campus sede do Instituto Mamirauá em Tefé (AM) e contou com a presença de líderes comunitários e dos territórios tradicionais e indígenas, técnicos, pesquisadores e autoridades.

Foto: Reprodução/Mamirauá

A mesa de abertura foi composta pelo coordenador de Mudanças Ambientais Globais do MCTI, Antônio Marcos Mendonça, a consultora da FAO América Latina e Caribe, Bárbara Jarschel, o diretor-geral do Instituto Mamirauá, João Valsecchi, representantes dos governos dos estados do Pará e do Amazonas e líderes comunitários.

Em discurso, Mendonça considerou a iniciativa de extrema importância. “O projeto insere-se neste contexto dos esforços de enfrentamento à crise climática, trazendo contribuições para a mitigação e adaptação ao clima neste bioma megabiodiverso que é a Amazônia”, disse o coordenador.

*Com informações do Instituto Mamirauá

Fiocruz Amazônia recomenda uso de máscaras durante período crítico de exposição à fumaça

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Foto: Michell Mello/Arquivo Fiocruz Amazônia

O epidemiologista e pesquisador da Fiocruz Amazônia, Jesem Orellana, faz um alerta para a necessidade do uso de máscaras com sistema de filtragem especial (N95 ou PFF2), principalmente por pessoas com histórico de comorbidades e doenças respiratórias, nesse período crítico de intensificação da fumaça proveniente das queimadas e que encobre Manaus (AM).

O pesquisador afirma que alguns efeitos diretos da fumaça sobre a saúde podem ser facilmente identificados, como tosse seca, sensação de falta de ar, irritação dos olhos e garganta, congestão nasal ou alergias na pele.

“Indiretamente, o problema pode contribuir para o agravamento de doenças cardiovasculares e respiratórias como rinite, asma, bronquite, doença pulmonar obstrutiva crônica ou mesmo Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG)”, exemplifica Jesem, chamando atenção também para os efeitos negativos sobre a saúde mental de pessoas mais vulneráveis, uma vez que os níveis elevados de poluição atmosférica aumentam suas preocupações e incertezas, além de limitarem atividades de lazer ou terapêuticas ao ar livre. 

Foto: Ingrid Anne/Arquivo Fiocruz Amazônia

Orellana ressalta que o aumento na busca por atendimentos médicos ambulatoriais e internações hospitalares é outro fator preocupante, uma vez que sobrecarrega os já precários serviços de saúde. “O uso de máscara torna-se, portanto, muito apropriado principalmente para que tem histórico de doença respiratória e precisa sair de casa”, explica.

Já no caso das pessoas que precisam fazer caminhadas e corridas, por recomendação médica, essas devem evitar as atividades ao ar livre e ao sair de carro devem ligar o ar-condicionado com a circulação interna ativada. Caso desenvolvam alguma manifestação clínica, devem procurar imediatamente uma unidade de saúde, evitando assim a automedicação ou piora do quadro clínico”, frisou.

*Com informações da Fiocruz Amazônia

Pesquisa aponta causas da seca histórica dos rios da bacia hidrográfica de Rondônia

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As causas e consequências da seca histórica nos rios da bacia hidrográfica rondoniense, em especial, o rio Madeira fazem parte de uma pesquisa que aponta fatores antropogênicos e naturais; responsáveis pela seca dos rios. O aquecimento desproporcional entre os oceanos Atlântico Norte e Sul gera uma diferença que interfere na formação de nuvens de chuva na região Amazônica, crucial para a manutenção dos níveis dos rios durante todo o ano.

Desenvolvida pelo pesquisador João Paulo Assis Gobo, vinculado à Fundação de Amparo ao Desenvolvimento das Ações Científicas e Tecnológicas e à Pesquisa (Fapero) e líder do Grupo de Pesquisas em Bioclimatologia e Mudanças Climáticas na Amazônia da Universidade Federal de Rondônia (Unir), além de membro do Grupo de Pesquisa em Climatologia do Laboratório de Climatologia e Biogeografia (LCB) da Universidade de São Paulo (USP), a pesquisa apresenta fatores antropogênicos e naturais, responsáveis pela seca dos rios. Caracterizado pelo aquecimento das águas do Oceano Pacífico, o El Niño acontece com frequência a cada dois a sete anos. Sua duração média é de doze meses, gerando um impacto direto no aumento da temperatura global.

João Paulo Assis Gobo pesquisa fenômenos meteorológicos e os efeitos climáticos. Ao longo de 2023, foram observadas temperaturas recordes na superfície dos oceanos por conta do El Niño. Desde maio do ano passado, os registros térmicos no Oceano Pacífico Equatorial subiram de 0,5 °C acima da média para cerca de 1,5 °C acima da média, em setembro.

Os níveis de água do Madeira em Porto Velho, são os mais baixos em 56 anos, quando se iniciaram as medições no rio. Há quase um ano, o curso d’água, um dos maiores afluentes do rio Amazonas atingiu a cota de 1,44 metro, a menor em 17 anos. A marca, porém, chegou a 1,17 metro.

Previsão

Segundo explanado pelo pesquisador, a seca histórica dos rios da bacia hidrográfica rondoniense tem gerado consequências severas à população, com milhares de pessoas sem água e com dificuldades em obter alimentos, que o transporte hidroviário está comprometido. Já os peixes precisam mudar seu ciclo e buscar “rotas de fuga” para sobreviver. Entre os rios afetados estão o Candeias, Guaporé, Jamari, Mamoré, Machado, Madeira e Pirarara. Estes não só sustentam a biodiversidade local, mas também são vitais para as atividades econômicas da região, incluindo a agricultura e a hidroeletricidade.

O período chuvoso compreendido entre o final do ano de 2023 e os três primeiros meses de 2024, não foram suficientes para a recarga pluviométrica, ou seja, as precipitações ficaram abaixo do normal em toda a região Amazônica durante o período crucial para recarga dessa chuva que estava necessitando a região.

Conforme a pesquisa, a previsão para 2024, que está acontecendo, infelizmente é ainda pior, e, a partir de outubro, a configuração do fenômeno La Niña, oposto ao El Niño; fenômeno oceânico e atmosférico caracterizado pelo resfriamento anormal das águas do oceano Pacífico. O La Niña tende a criar condições de seca em muitas partes do mundo, a exemplo do Sul do Brasil, enquanto traz chuvas em excesso para outras áreas, como o litoral do Nordeste e a Amazônia.

O pesquisador ponderou que o fenômeno La Niña só deve ocorrer em Rondônia no final de 2024, trazendo chuvas em quantidades otimistas para os rios da Amazônia, em especial da bacia hidrográfica rondoniense, porém os próximos meses não serão bons com a esperada seca histórica.

Aquecimento

Além disso, o aquecimento global potencializa os eventos extremos como a seca e o processo de ressecamento do bioma. Estudos comprovam que o aquecimento global tem papel mais devastador na seca dos rios se comprado ao fenômeno climático El Niño, ou seja, as alterações climáticas estão modificando a reciclagem de umidade da floresta amazônica, interferindo diretamente nos processos hídricos da região e potencializando os períodos de secas. O aquecimento global do planeta interfere nas chuvas na região amazônica, atingindo os rios de Rondônia que são formados sobretudo pelos deslocamentos de massas de ar provenientes não do Oceano Pacífico, mas do Atlântico.

A população ribeirinha e as comunidades tradicionais indígenas são uma das mais afetadas, pois essas comunidades que dependem das vias fluviais da floresta Amazônica ficam isoladas, sem acesso a combustível, alimentos ou água filtrada. Outro agravante está relacionado aos problemas de acessibilidade, visto que os moradores das comunidades ribeirinhas enfrentam obstáculos para sair e voltar às suas comunidades e, por fim atingindo sua subsistência, pois dependem dos recursos naturais da região que acaba sendo afetado com a estiagem.

Neste viés, o pesquisador João Paulo Assis Gobo deixa um importante apelo: a preservação da Amazônia é essencial para o equilíbrio climático, principalmente das comunidades tradicionais que utilizam dos recursos naturais para sobreviverem e população das áreas urbanas, as quais já sentem os efeitos e reflexos da seca histórica do rios que compreendem a bacia hidrográfica de Rondônia.

*Com informações do Governo de Rondônia

Aplicativo facilita assistência técnica para produtores rurais no Pará

Para conectar equipes prestadoras de Assistência Técnica Rural (ATER) aos produtores rurais localizados na Amazônia, o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), a Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP) e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-Pará), em parceria com agricultores familiares do Pará e apoio da Fundação Walmart e da Agência Norueguesa de Cooperação para o Desenvolvimento (Norad), desenvolveram o aplicativo ATER Paidegua.

A ferramenta permite que as equipes técnicas ofereçam suporte contínuo e de qualidade aos agricultores, mesmo à distância, se baseando na metodologia de assistência técnica com foco no desenvolvimento e adoção de práticas agrícolas sustentáveis para os atendimentos à distância e presenciais. Aparecida Brandão, coordenadora de projetos da FVPP, relata que mais de 80% das famílias assistidas na área rural têm acesso à internet.

Imagem: Reprodução

Já em funcionamento, o aplicativo possibilita aos técnicos agendar visitas presenciais e criar bancos de dados organizados da propriedade e dos atendimentos realizados. “Isso reduzirá o tempo de espera para receber assistência e esclarecer dúvidas dos produtores, além de possibilitar o atendimento em locais de difícil acesso”, diz Elisangela Trzeciak, pesquisadora do IPAM.

A ferramenta também possibilita atender as necessidades específicas de cada região. “A regionalização e a característica peculiar de nossos territórios estarão mais acessíveis num aplicativo com a cara do Pará a todo o público rural paraense, especialmente a agricultura familiar, povos e comunidades tradicionais”, comenta Cristiane Fonseca, extensionista rural.

*Com informações do IPAM

Minerais industriais nas fronteiras do Brasil com Equador, Venezuela e Colômbia

Os recursos minerais que caracterizam a região andina do Peru estão visivelmente ausentes ao norte do Huancabamba Gap, o ponto baixo de altitude nos Andes ligado à zona de deflexão que criou o Vale do Rifte Amazônico. No entanto, há uma cadeia de montanhas incomum localizada a leste da Cordilheira Oriental, na fronteira entre o Peru e o Equador

A Cordillera del Condor é um cinturão de dobras e empuxos criado em uma das primeiras fases da orogenia andina, quando plútons magmáticos foram introduzidos em estratos sedimentares mais antigos que criaram pórfiros de cobre com recursos minerais significativos.

Há várias minas em desenvolvimento, mas a mais avançada é a do Projeto Mirador, que explorará uma quantidade estimada de 3,1 milhões de toneladas de cobre, 3,2 milhões de onças de ouro e 25 milhões de onças de prata. Essa é a primeira mina a céu aberto em escala industrial do Equador e incluirá uma instalação de processamento que converterá o minério em um concentrado.

A mina, que tem uma vida útil projetada de trinta anos, está sendo desenvolvida com capital chinês e gerará bilhões de dólares em royalties e receitas fiscais, contribuindo para a equação da balança de pagamentos que motiva os ministérios das finanças. Há outras quatro minas de cobre e duas minas de ouro em escala industrial em desenvolvimento. 

No lado peruano da fronteira, garimpeiros de ouro estão ativos, mas não há reservas economicamente significativas de cobre ou outros metais básicos.

Os pórfiros de cobre do norte dos Andes

O Equador e o sul da Colômbia são conhecidos por seus vulcões que são comumente associados a pórfiros de cobre e ouro. A exploração recente revelou a existência de formações ricas em cobre perto da fronteira entre o Equador e a Colômbia. 

No lado equatoriano, a Empresa Nacional Minera del Ecuador (ENAMI EP) está nos estágios iniciais de desenvolvimento de La Bonita, um depósito de cobre descoberto pela primeira vez na década de 1990, onde a perfuração exploratória extraiu amostras com concentrações de cobre entre 0,35% e 0,86%, com potencial igualmente atraente para ouro, molibdênio e chumbo. La Bonita abrange três grandes concessões com 13.500 hectares que fazem fronteira (e se sobrepõem ligeiramente) com terras reivindicadas pelo povo indígena Cofán.

A aproximadamente 300 quilômetros ao norte, um pórfiro de cobre e ouro semelhante, conhecido como Projeto Mocoa de Cobre-Molibdênio, está sendo desenvolvido por uma empresa júnior canadense de mineração.

 A descoberta inicial foi feita em 1978 pelo Serviço Geológico da Colômbia (Ingeominas), mas não foi explorada seriamente até 2004, quando uma empresa júnior canadense adquiriu a concessão, e acabou vendendo-a para o atual proprietário (Libero Copper Corporation).

Em um relatório recente para investidores, o desenvolvedor estima que o corpo de minério tenha aproximadamente 2,1 milhões de toneladas de cobre e 231.818 toneladas de molibdênio, o que seria avaliado em aproximadamente US$ 20 bilhões nas avaliações atuais de mercado para o cobre. A mina, se for desenvolvida, estará localizada a apenas 15 quilômetros ao norte da cidade de Mocoa, capital do Departamento de Putumayo; o corpo de minério se sobrepõe à Reserva Florestal Alto Rio Mocoa e é adjacente à Resguardo Indígena Yunguillo.

Áreas de mineração na Cordillera del Cóndor, no Equador, e na bacia superior do Putumayo, na fronteira com a Colômbia. Esquerda: Mineração industrial e irregular no contexto de áreas protegidas e terras indígenas. Direita: minas industriais e irregulares no contexto da história geológica. Fontes de dados: Gómez et al. (2019), RAISG (2022) e ENMI EP (2022).

Bauxita da Amazônia

O Brasil produziu mais de 35 milhões de toneladas de bauxita em 2020. Isso representa cerca de dez por cento da demanda global e representa um nível de produção que poderia ser mantido por aproximadamente 100 anos com base em reservas estimadas de 2.700 milhões de toneladas. Há três minas de bauxita em operação, localizadas em três municípios do estado do Pará, que geraram aproximadamente US$ 935 milhões em receita bruta em 2020.

A maior mina foi aberta em 1979 pela Mineração Rio Norte (MNR), uma joint venture envolvendo cinco empresas multinacionais e brasileiras. Ela está localizada na margem norte do rio Amazonas, no município de Oriximiná. Do outro lado do rio, na margem sul, há uma mina operada pela Alcoa no município de Juruti, que iniciou suas operações em 2010. 

Ambas as minas são minas de enclave cercadas por floresta natural com usinas industriais dedicadas, uma linha ferroviária e instalações portuárias. A terceira mina foi estabelecida em 2007 pela Norsk Hydro no leste do Pará (Paragominas) em uma paisagem que foi fortemente impactada pelo desmatamento. Duas minas de bauxita adicionais estão em desenvolvimento pela Companhia Brasileira de Alumínio, ambas localizadas a poucos quilômetros da mina existente em Paragominas.

Os depósitos de bauxita no oeste do Pará estão localizados em antigas planícies sedimentares (peneplanícies) que foram criadas entre 50 e 60 milhões de anos atrás, no que é essencialmente a antiga planície de inundação do rio Proto-Amazonas, quando ele fluía do leste para o oeste. As minas no leste do Pará têm uma história geológica diferente, mas foram formadas por processos de intemperismo semelhantes no que já foi uma extensa planície costeira situada a leste do Cráton Amazônico.

Foto: Hydro / Halvor Molland

O interesse no desenvolvimento futuro da bauxita é revelado pelo número de concessões solicitadas por investidores e empresas de mineração (< 1.000), o que reflete o potencial nas paisagens ao redor das minas existentes, mas também nos municípios de Nhamundá, Urucará, Borba, Autazes e Careiro no estado do Amazonas.

Durante a maior parte do século XX, a Guiana e o Suriname foram líderes globais na produção e exportação de bauxita; no entanto, os depósitos minerais facilmente exploráveis nos dois países se esgotaram na primeira década do século XXI. A Guiana exporta apenas uma pequena fração de sua antiga produção, enquanto o Suriname fechou sua última mina e instalação de processamento em 2016. 

Ambos os países ainda têm reservas consideráveis de bauxita, mas sua exploração não é, aparentemente, econômica no atual setor de mineração global. A Venezuela tem reservas muito grandes e de alta qualidade e a capacidade instalada para explorá-las; no entanto, seu setor mineral entrou em colapso devido à má gestão econômica e às restrições estruturais ligadas ao seu modelo econômico socialista.

As minas de cassiterita da Amazônia brasileira

A cassiterita é um minério conglomerado com altas concentrações de óxido de estanho [SnO2]; ela existe tanto como depósito ‘primário’ em formações de rocha dura associadas a intrusões magmáticas em rochas metamórficas quanto como depósitos ‘secundários’ em paisagens de deposição localizadas adjacentes ao corpo de minério primário. 

O Brasil tem cerca de 15% das reservas globais de cassiterita e tem sido um grande produtor de estanho desde a década de 1960, quando fazia parte de um cartel internacional de estanho. Os altos preços (~US$ 35.000 por tonelada) alimentaram um boom de mineração que teve como alvo os depósitos aluviais que eram particularmente abundantes no noroeste de Rondônia (municípios de Porto Velho e Ariquemes), bem como paisagens selecionadas no Pará (São Félix de Xingu) e Amazonas (Presidente Figueroa).

A dinâmica do mercado acabou prevalecendo e uma queda vertiginosa no preço (US$ 5.000 por tonelada) levou ao colapso do cartel em l985 e, pouco tempo depois, ao fim das minas de cassiterita de pequena escala na Amazônia brasileira. 

O preço do estanho se recuperou no superciclo de commodities entre 2007 e 2012 (US$ 15.000 e US$ 20.000), mas sua exploração agora está restrita a empresas com os recursos de capital necessários para explorar depósitos de rocha dura. Em 2022, duas empresas canadenses assinaram uma joint venture para explorar os depósitos de rejeitos e as minas de placer abandonadas em Ariquemes e nos municípios vizinhos.

A maior e mais antiga mina corporativa em operação está localizada perto da fronteira norte do estado do Amazonas, no município de Presidente Figueroa. Conhecida como mina Pitinga, ela é famosa por seu histórico de danos ambientais e conflitos sociais.

A mina foi aberta em 1982, quando o governo militar estava adotando uma estratégia de ‘desenvolvimento a todo custo’ que desconsiderava o impacto da degradação ambiental e ignorava os direitos dos povos indígenas (consulte o Capítulo 6). O recurso mineral estava localizado dentro das terras tradicionais dos Waimiri-Atroari, uma tribo que havia sido brutalmente reprimida na década de 1960 quando resistiu à construção da rodovia entre Manaus e Boa Vista. Sua reserva, criada em 1971 como forma de compensação pela brutalidade da década anterior, foi reconfigurada unilateralmente em 1981 para excluir a área da mina proposta.

Essa mina agora é operada pela Mineração Taboca, uma subsidiária de uma empresa de mineração peruana, a MINSUR, que adquiriu a concessão de 130.000 hectares e as instalações de processamento associadas em 2008. Embora a mina já tivesse iniciado sua transição para uma operação moderna a céu aberto, o novo proprietário continuou a usar a tecnologia de mineração de placer até 2012. 

As reservas de bauxita da Amazônia brasileira estão concentradas nos planaltos do vale do rifte amazônico inferior e nas peneplanícies terciárias adjacentes. A bauxita é exportada pela hidrovia amazônica ou transformada em alumínio em refinarias e fundições em Barcarena e São Luís do Maranhão. Há três minas em funcionamento e duas em desenvolvimento pela Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), além de refinarias e fundições em Barcarena e São Luís do Maranhão. Fonte de dados: RAISG (2022).

A mineração de placer é particularmente nociva porque visa seletivamente e destrói habitats ribeirinhos, e seu uso na concessão de Pitinga criou um enorme passivo ambiental de longo prazo que ameaça a saúde dos indígenas vizinhos à mina.

A mina a céu aberto de Pitinga continua sendo altamente lucrativa e o corpo de minério de rocha dura é considerado a maior reserva de estanho do mundo (500.000 toneladas de estanho refinado). Em 2020, a mina produziu cerca de 7.400 toneladas de cassiterita enriquecida com receita bruta estimada em ~US$ 220 milhões. Mais importante ainda, a usina de processamento começou a recuperar nióbio e tântalo, minerais estratégicos com reservas estimadas em 775.000 e 106.000 toneladas de mineral refinado, respectivamente.

Nióbio, tântalo e elementos terras raras

O nióbio (Nb) é usado na indústria siderúrgica para fabricar aços especializados (inoxidáveis) que são usados nos setores de construção civil, construção naval, indústria automotiva e de petróleo e gás. O tântalo (Ta) é igualmente resistente à corrosão, mas é usado na fabricação de dispositivos eletrônicos miniaturizados, incluindo telefones celulares, equipamentos médicos e aplicações aeroespaciais.

Ambos os elementos tendem a ser encontrados juntos em um minério conhecido como coltan, que, aparentemente, está presente em paisagens há muito conhecidas por seus depósitos de cassiterita.

As receitas de nióbio e tântalo na mina de estanho de Pitinga agora representam cerca de cinquenta por cento da receita bruta da mina, contribuindo com mais US$ 200 milhões para as receitas corporativas em 2020. A diversificação da produção e das receitas pode passar por mais uma transição em breve, porque a mina parece ser uma fonte globalmente importante de uma classe de minerais estrategicamente significativa conhecida como elementos de terras raras (REE).

Os elementos de terras raras são os elementos da série de lantanídeos da tabela periódica; com números atômicos que variam de 57 (lantânio) a 71 (lutécio), eles são agrupados porque todos têm uma valência de +3 e compartilham determinadas propriedades químicas que influenciam sua distribuição na natureza. 

Apesar do nome, eles não são particularmente raros, embora a mineração e a comercialização de REE tenham sido dominadas pela China por cerca de duas décadas. A geopolítica e a competição de alto risco gerada pela transição energética motivaram os investidores das economias ocidentais a priorizar o desenvolvimento de fontes alternativas desses minerais estratégicos. 

Depois da China, o Brasil tem a segunda maior reserva conhecida de REE, estimada em aproximadamente 22 milhões de toneladas. A maior parte das reservas conhecidas está localizada em uma única mina em Goiás: Complexo de Mineração de Catalão. Existem três áreas na Amazônia que têm reservas potencialmente significativas de nióbio, tântalo e REE.

A Mineração Taborca ainda não começou a separar e processar os potenciais minerais REE dentro da concessão de Pitinga; aparentemente, eles estão presentes não apenas no corpo de minério primário, mas também nos mais de 6.000 hectares de lagoas de rejeitos que contêm mais de 100 milhões de toneladas de rocha residual. 

As descobertas em andamento na mina de Pitinga, particularmente a associação de REE com cassiterita, nióbio e tântalo, estimularam um interesse renovado nas paisagens de mineração abandonadas em Rondônia e em outros lugares.

Foto: Luciana Uehara

Em janeiro de 2022, a Auxico Resources Canada Inc., criada especificamente para descobrir e desenvolver depósitos de REE, assinou um acordo com a Cooperativa Estanífera de Mineradores da Amazônia Legal Ltda. (CEMAL) para a exploração e comercialização de REE a partir dos rejeitos antigos existentes nos municípios de Ariquemes e Monte Negro, em Rondônia. 

Estima-se que as áreas contenham 30 milhões de toneladas de rejeitos de operações anteriores de mineração aluvial e coluvial. Amostras fornecidas pelo CEMAL foram analisadas por uma instituição de pesquisa canadense e revelaram um teor total de óxidos de REE superior a 63%; essas amostras eram particularmente ricas em cério (35,9%), lantânio (15,2%) e ítrio (1,14%). 

Assim como na mina de Pitinga, o potencial de explorar os rejeitos não remediados da mina seria uma oportunidade única (e inesperada) que poderia fornecer os recursos necessários para resolver um risco ambiental de longa data.

Morro dos Seis Lagos e regiões adjacentes na Colômbia e na Venezuela

O Moro de Seis Lagos é uma montanha remota no norte do estado do Amazonas com características geológicas semelhantes às da mina de Catalão, em Goiás. Muito antes de ser reconhecida como uma fonte potencial de elementos de terras raras, ela foi apontada como um depósito de nióbio de classe mundial (236 Mt @ 2,81% Nb2O5) com reservas economicamente significativas de titânio e manganês. 

Sabe-se que o corpo de minério, ainda mal mapeado, contém monazita, florencite, rabdofano e pirocloro, minerais que são fontes conhecidas de óxidos de terras raras. Levantamentos preliminares sugerem que há aproximadamente 43 Mt de minério com concentrações de óxidos de terras raras que, em média, são de cerca de 1,5%. Isso tornaria o  Morro dos Seis Lagos um dos principais depósitos de REE do Brasil.

Apesar de seu potencial mineral, existem vários obstáculos ao seu desenvolvimento, sendo o mais importante a sua localização dentro dos limites do Parque Nacional Pico da Neblina, uma área protegida de alto perfil criada em 1979. 

Além disso, as paisagens circundantes estão dentro das áreas tradicionais de coleta de alimentos de vários grupos indígenas, incluindo os Yanomami, que habitam as paisagens florestais a nordeste, e os povos Baniwa, Baré, Desana, Maku, Tariana e Tukano, que residem ao longo do Rio Negro em direção ao sul. A área foi protegida adicionalmente com a criação de uma reserva biológica dentro do parque nacional que circunscreve a própria montanha.

Além da fronteira com a Colômbia, pode haver cerca de 1.000 milhões de toneladas de minérios minerais com REE nos departamentos de Guainía, Vichada e Vaupés. O banco de dados nacional de concessões de mineração mostra várias solicitações de licenças de exploração, muitas das quais estão dentro de reservas indígenas estabelecidas. 

O governo deixou claro que não concederá nenhuma dessas solicitações; no entanto, há mais de uma década existe um comércio clandestino de coltan. A única atividade legal é uma mina proposta perto do vilarejo de Puerto Carreño (Vichada) pela empresa canadense Auxico Resources, que também manifestou interesse em uma formação geológica que se estende até o estado amazônico da Venezuela, perto da mina de bauxita de Pijiguaos.

‘Uma tempestade perfeita na Amazônia’ é um livro de Timothy Killeen que contém as opiniões e análises do autor. A segunda edição foi publicada pela editora britânica The White Horse em 2021, sob os termos de uma licença Creative Commons (licença CC BY 4.0).

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Mongabay, com análise de Timothy J. Killeen e tradução de Lisete Correa.

Artigo sobre gene codificador do hormônio de crescimento do tambaqui é publicado em revista internacional

Elson Antonio Sadalla Pinto, pesquisador docente da área de Biologia do IFAM Campus Manaus Centro (IFAM-CMC), em conjunto com pesquisadores de outras instituições, teve seu artigo científico publicado na revista ACTA AMAZONICA, uma das principais revistas de divulgação científica de pesquisas sobre a Amazônia.

A pesquisa ‘Extracellular expression, purification and bioreactor production of tambaqui (Colossoma macropomum) growth hormone in the yeast Komagataella phaffii (formerly Pichia pastoris)‘ teve o objetivo de identificar o gene codificador do hormônio de crescimento do tambaqui – espécie de peixe nativa da Amazônia mais cultivada nas pisciculturas regional e nacional -, e, introduzir este gene na levedura Pichia pastoris, a qual adquiriu a capacidade de produzir o hormônio de crescimento recombinante de tambaqui quando cultivada em biorreator.

A maior parte da pesquisa foi desenvolvida ao longo de seu doutoramento em Biotecnologia pelo Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia da Universidade Federal do Amazonas. Contudo, segundo Sadalla, “o volume global de resultados apresentados no artigo foi fruto de um trabalho colaborativo entre pesquisadores do INPA, UFAM, IFAM, Fundação Oswaldo Cruz, Embrapa Amazônia Oriental e UFRJ”.

A pesquisa foi pioneira na produção heteróloga do hormônio de crescimento de uma espécie de peixe amazônica e a “possibilidade de utilização deste hormônio no cultivo de peixes amazônicos representa a chegada de uma nova fase para a piscicultura regional e nacional, fase está conhecida como Biotecnologia Aquática, baseada no uso de biomoléculas com efeitos precisos sobre a saúde e o desempenho zootécnicos de peixes em pisciculturas, geralmente superiores àqueles alcançados pelo uso das técnicas de manejo tradicional”, afirmou Sadalla.

*Com informações do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

Versátil, pele de pirarucu manejado da Amazônia é utilizada na confecção de roupas e acessórios

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Quando se fala em pirarucu, as pessoas imediatamente pensam no sabor do peixe gigante típico da Amazônia. De fato, o pirarucu manejado conquistou paladares ao redor do mundo, estrelando o cardápio de chefs renomados e as prateleiras de grandes redes de supermercados, atraindo cada vez mais consumidores. Mas não são só as peças deliciosas do peixe que interessam ao mercado. A pele do pirarucu, que até pouco tempo era descartada, tem sido utilizada para a confecção de roupas, acessórios e estofados, agregando ainda mais valor ao pescado de origem sustentável.

Com apoio da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), manejadores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá, no estado do Amazonas, comercializam a pele do pirarucu para a empresa Nova Kaeru, que transforma o insumo em um curtume orgânico utilizado na fabricação de cintos, bolsas, sapatos e estofados. A parceria garante a geração de renda para as famílias manejadoras, com a pele do pirarucu vendida atualmente no valor de R$ 160.

A empresa compra a pele diretamente dos manejadores. Para preservar o insumo, a FAS e a Nova Kaeru promoveram capacitações aos manejadores para fazer a retirada e o beneficiamento da pele do pirarucu, deixando-a pronta para ser transformada em matéria-prima de vestimentas e acessórios, por exemplo.

Segundo Valcléia, é importante entender o conceito sustentável por trás do manejo do pirarucu. A espécie, que quase desapareceu das águas do Amazonas, encontrou reequilíbrio com incentivo ao manejo sustentável. Parcerias como essas são fundamentais para promover o valor da manutenção da floresta em pé.

Foto: Reprodução/Instagram-nova.kaeru

O manejo sustentável da RDS Mamirauá possui autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema). A FAS presta assistência técnica e assessoria para essa cadeia produtiva desde 2010. 

O pirarucu de manejo sustentável possui três conceitos agregados, explica Valcléia: o ambiental, o social e o econômico. “O conceito ambiental envolve o manejo em si, onde as pessoas realizam o trabalho de cuidar dos lagos, fazer a contagem dos peixes e evitar as invasões e pesca predatória. O conceito social reúne as pessoas em prol de uma causa, que é manter e até ampliar a quantidade de peixes. E o conceito econômico é o resultado desse trabalho, que envolve homens e mulheres que se dedicam a esse produto extrativista, para que ele possa trazer benefícios econômicos para as famílias daquele território”, explica a superintendente.

Cadeia de valor

Além da venda da pele, a FAS incentiva outras iniciativas da cadeia do pirarucu da RDS Mamirauá. Em feiras apoiadas pela FAS em 2023, os pescadores comercializaram 23,7 toneladas de pirarucu, gerando um faturamento de mais de R$ 240,8 mil. A venda beneficiou diretamente 112 manejadores.

A FAS também lançou, em 2022, o clube de comercialização por assinatura de pirarucu de manejo sustentável do Amazonas, o Piraruclub. Em um ano de existência, a iniciativa realizou a venda de 4,4 toneladas do pescado, gerando um faturamento de R$ 158 mil e beneficiando 110 famílias manejadoras no estado.

*Com informações de Fundação Amazônia Sustentável