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Alertas de desmatamento na Amazônia caem 10,6% em agosto

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Os alertas de desmatamento na Amazônia Legal tiveram queda de 10,6% em agosto deste ano, comparados ao mesmo mês de 2023, e de 69,7% em relação a agosto de 2022.

Em agosto de 2023, o sistema registrou 563,09 quilômetros quadrados (km²) sob alerta de desmatamento na Amazônia Legal. Já no mês passado, foram 503,65 km². A queda é bem maior quando comparada a agosto de 2022, quando houve alertas de desmatamento em 1.661,02 km² na região.

Nove estados compõem a Amazônia Legal: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

Os dados são do sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter-B), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), desenvolvido para informar rapidamente aos órgãos de fiscalização sobre novas alterações na cobertura florestal. O Deter-B identifica e mapeia desmatamentos e demais alterações na floresta com área mínima próxima a um hectare.

Já a taxa anual de desmatamento por corte raso na Amazônia Legal brasileira é fornecida, desde 1988, pelo Programa de Cálculo do Desmatamento da Amazônia (Prodes). As imagens utilizadas são do satélite Landsat, com maior resolução, que detecta exclusivamente desmatamentos tipo corte raso superiores a 6,25 hectares.

Sistemas de monitoramento

O Deter e o Prodes formam o conjunto de sistemas para monitoramento e acompanhamento dos biomas brasileiros, que tem como ano referência sempre de agosto de um ano a julho do ano seguinte.

De agosto de 2023 a julho de 2024, os alertas de desmatamento na Amazônia – detectados pelo Deter – caíram 45,7% em relação ao período anterior. O número de 4.314,76 km² desmatados é o menor da série histórica iniciada em 2016.

Já os dados consolidados de desmatamento do Prodes de 2023/2024 são divulgados no fim do ano. No período de agosto de 2022 a julho de 2023, o desmatamento na Amazônia Legal alcançou 9.001 km², o que representa queda de 22,3% em relação ao ano anterior (2021/2022).

No bioma Cerrado, o Deter-B verificou aumento de 9% de supressão da vegetação de agosto de 2023 a julho de 2024, em relação ao período anterior, chegando a 7.015 km² de área sob alerta. No caso do Pantanal, a área sob alerta está em 1.159,98 km². Como essa medição começou em agosto do ano passado, ainda não é possível o comparativo.

Mesmo com a retomada das políticas ambientais pelo atual governo – que resultaram em sucessivas reduções de desmatamento na Amazônia – a degradação também é uma preocupação e afeta uma área três vezes maior que o desmatamento. 

Camuflados por frágeis vegetações, distúrbios ambientais causados pelo homem avançam sobre a biodiversidade, longe do alcance das imagens de satélite e do monitoramento governamental.

*Com informações da Agência Brasil

Rio Negro está mais de 3 metros abaixo da cota de normalidade em Manaus, informa SGB

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Foto: William Duarte/Rede Amazônica AM

O Rio Negro segue em processo de descida e chegou à cota de 16,75 m em Manaus (AM). Essa marca está 3,7 m abaixo da faixa de normalidade para o período. De acordo com monitoramento do Serviço Geológico do Brasil (SGB), as descidas têm sido de 24 centímetros por dia na estação. Os dados são apresentados no 37º Boletim de Alerta Hidrológico, publicado no dia 13 de setembro, na plataforma SACE.

A mínima histórica registrada em Manaus foi de 12,7 m em outubro de 2023. 

Níveis baixos e mínimas históricas na Bacia do Amazonas

Na maioria das estações da Bacia do Amazonas, os níveis estão abaixo da faixa da normalidade. Em Tabatinga (AM), o Rio Solimões registrou, também no dia 13, a mínima histórica (desde 1983): -1,79 m.

Na estação de Itapéua (AM), a cota atual é de 2,3 m, a 3ª menor da história, atrás de 1,46 m em 2023 e de 1,3 m em 2020. Fonte Boa (AM) está na marca de 10,16 m, a 8ª mais baixa da história.

O Rio Madeira chegou a 60 cm em Porto Velho (RO), a menor cota da série histórica, desde 1967. Já o Rio Acre, na cidade de Rio Branco (AC), está na cota de 1,28 m – a segunda mínima histórica, atrás da marca de 1,24 m, registrada em 2022.

Seca no Pará

“O estado do Pará também é afetado pela seca que se estende a praticamente todo o braço direito do Rio Amazonas e também pela região do Pantanal. Em alguns pontos, como São Félix do Xingu (PA), o nível do rio está entre os 10 menores já observados em toda a série histórica (desde 1977)”, explica o engenheiro hidrólogo Artur Matos, coordenador nacional do Sistema de Alerta Hidrológico (SAH). Conforme o SACE, a cota registrada no dia 13 é de 3,37 m na estação Boa Sorte.

Em outros pontos, como no Rio Tapajós, em Itaituba (PA), o nível é também o menor já observado para o período, desde 1968. No Rio do Amazonas, em Óbidos (PA), a última cota observada foi de 1,17 m – o menor nível para essa data, desde 1967.

Parceria

O monitoramento dos rios é realizado a partir de estações telemétricas e convencionais, que fazem parte da Rede Hidrometeorológica Nacional (RHN), coordenada pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). O SGB opera cerca de 80% das estações da RHN, gerando informações que apoiam os sistemas de prevenção de desastres, a gestão dos recursos hídricos e pesquisas. 

As informações – coletadas por equipamentos automáticos ou a partir da observação por réguas linimétricas e pluviômetros – são disponibilizadas no Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos (SNIRH) e, em seguida, apresentadas na plataforma SACE.

*Com informações do SGB

Primeira borracha feita com látex 100% da Amazônia é lançada no Brasil

A Mercur, indústria das áreas da saúde e educação, apresenta ao mercado a primeira Borracha Nativa da Amazônia. O produto, informa a empresa, “reflete o compromisso com a sustentabilidade e a conservação ambiental”.

Produzida com látex extraído 100% de árvores nativas da Amazônia, a borracha é o resultado de mais de uma década de dedicação ao projeto ‘Borracha Nativa’, uma iniciativa que busca valorizar e apoiar as comunidades extrativistas locais.

O projeto conta com a parceria da rede Origens Brasil®, administrada pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora). Por meio da relação comercial direta e ética com os povos da floresta, a iniciativa contribui para a conservação dos territórios e a valorização da cultura local. Dessa forma, com a produção da borracha, a empresa apoia quatro áreas protegidas, um território indígena, dois grupos sociais, quatro organizações comunitárias e duas instituições de apoio.

A nova borracha é composta por 78% de matérias-primas renováveis, sem a adição de pigmentos. O produto possui um QR Code no verso, que leva os consumidores ao site da rede Origens Brasil®, no qual é possível conhecer a história, a origem dos produtos e comunidades envolvidas em sua produção. O conceito do novo produto é “corrigir com consciência para preservar o futuro”.

Cuidado e impacto social na Amazônia

O Projeto Borracha Nativa, informa a Mercur, procura conservar a cultura e o modo de vida das populações tradicionais da floresta amazônica, ao mesmo tempo que promove a geração de renda sustentável e o comércio ético. Através da parceria com seringueiros que vivem em reservas extrativistas, a empresa garante que o látex seja extraído de forma responsável e sustentável, sem causar danos às árvores, auxiliando em um ciclo de produção que conserva a floresta em pé.

Fazem parte deste projeto os membros da rede: Rede Terra do Meio, Associação Indígena Karo Paygap, Coopervekala, Associação Doá Txató, COOPIRB, Associação Panang e Associação APIA e as instituições de apoio Instituto Socioambiental e Pacto das Águas.

Em números, a Mercur comprou mais de 63 toneladas de borracha natural da rede Origens Brasil® entre 2010 e 2023. Em 2022 foram 4,37 toneladas. Em 2023, chegou a 8,65 toneladas. A previsão para os próximos anos é chegar em 30 toneladas/ano. O comércio com as comunidades extrativistas gerou mais de 165 mil reais em renda local em 2023. Desde maio de 2023, a parceria com Origens Brasil® foi ampliada e reforça o impacto socioambiental positivo da cadeia produtiva da borracha.

“Já investimos R$140 mil em serviços socioambientais em 2024. A estimativa é investir ainda mais este ano com a compra adicional de borracha natural da Amazônia”, explica Jorge Hoelzel Neto, Facilitador de Direção da Mercur.

“Investir neste serviço é resgatar um passivo com as comunidades extrativistas e permitir que elas continuem sendo os guardiões das florestas. Além disso, garantimos a neutralização das emissões de gases de efeito estufa, já que nessas áreas o desmatamento é evitado. Nossa intenção é continuar ampliando a compra de borracha nativa”, finaliza Jorge.

Ao todo, são oito territórios, sendo quatro na Terra do Meio em Altamira (PA), impactados pelo projeto:

  • Reserva Extrativista Rio Xingu,
  • Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio,
  • Reserva Extrativista Rio Iriri
  • e Terra Indígena Xipaya.

E outros quatro territórios em terras indígenas no Estado de Rondônia (RO):

  • Igarapé Lourdes,
  • Rio Branco,
  • Sete de Setembro
  • e Uru-Eu-Wau-Wau.

Amazon Sat Agro: programa promove novo olhar sobre agronegócio na Amazônia 

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No bioma amazônico, o agronegócio é responsável pela produção de soja, milho, carne bovina, carne de aves, frutas e outros produtos, além das iniciativas que promovem soluções para a produção ambientalmente sustentável na Amazônia, que é um desafio complexo, pois envolve a conciliação de interesses econômicos, ambientais e sociais.

O trabalho sério do agronegócio gera desenvolvimento, renda e emprego, mas sempre em busca de alternativas modernas e sustentáveis, com inovações que ajudem na preservação do meio ambiente. É com esse olhar sobre o agronegócio na Amazônia que estreia, no dia 16 de setembro, o programa Amazon Sat Agro, no canal Amazon Sat, às 18h30 (hora do Amazonas). 

O objetivo do programa é mostrar, na prática, o desafio do agronegócio no bioma amazônico, realizado de forma responsável, com a conciliação de interesses econômicos, ambientais e sociais com iniciativas que promovem soluções para a produção de baixa agressividade a natureza. Para isso, o programa trabalha de forma colaborativa com as federações de agricultura da Região Norte do país.

O Amazon Sat Agro, dará voz a quem proporciona a geração dessas riquezas para a população amazônida. De acordo com o diretor executivo do Grupo Rede Amazônica em Rondônia, Hélio Kimelblat, o projeto tem como objetivo ensinar, através das parcerias, as técnicas adequadas para se trabalhar na região.

Foto: Pedro Guerreiro / Agência Pará

“O programa será produzido com material enviado pelas federações da agricultura dos nove Estados que compõem a Amazônia Legal [Amazonas, Acre, Amapá, Rondônia, Roraima, Pará, Mato Grosso, Maranhão e Tocantins], das Aprosojas, EMBRAPA, EMATER e dos próprios produtores rurais e terá a curadoria e apresentação da Rede Amazônica e do Amazon Sat”, informa o diretor sobre o processo de produção.

O jornalista e apresentador do programa, Patrick Motta Filho, ressalta a importância de um projeto como este, produzido de forma colaborativa e com liberdade de criação, voltado para um tema que gera tantas discussões, mas dando voz aos produtores de cada região.

O diferencial: ouvir o produtor rural

“Às vezes, os produtores trazem algumas reclamações desses programas rurais que já existem, justificando que eles só tratam o que ‘o jornalista quer trata’. Então como é que a gente resolve? Não mais eu, jornalista, vou atrás de pautas específicas, e sim o que o produtor quiser falar. Quem escolhe, dessa proposta, é o produtor rural, é o trabalhador da Federação de Agricultura de cada Estado. Eu vou trabalhar junto com os produtores, com as federais, então é algo diferente, parece ser muito atrativo, porque quem entende melhor de produção rural do que o próprio produtor?”, esclareceu Patrick Motta.

“A Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Maranhão, onde estão filiados cerca de 70 sindicatos de produtores rurais em todo o estado do Maranhão, nós temos essa capilaridade muito importante para tanto captar informações quanto para receber informações. Todas essas informações do agro vão ser muito importantes para todos os produtores rurais aqui no estado”, comenta o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Maranhão (Faema/Senar), Raimundo Coelho.

Amazônia Agro

O agronegócio na Amazônia é sinônimo de desenvolvimento e integração da região, que clama por maior representatividade. O projeto Amazônia Agro, do qual o programa Amazon Sat Agro faz parte, é realizado pelo Grupo Rede Amazônica e busca dar voz a quem proporciona a geração dessas riquezas para a população amazônida.

Além disso, serão oferecidos cursos profissionalizantes para jovens, sobre os diversos setores do agronegócio na Amazônia. O objetivo é capacitá-los para o mercado de trabalho e contribuir para o desenvolvimento sustentável da região amazônica.

Presidente Lula em Manaus defende Marina da Silva, mas é vago quanto à conclusão da BR-319

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Foto: Divulgação/Observatório BR-319

Por Osíris M. Araújo da Silva – osirisasilva@gmail.com

O presidente Lula da Silva defendeu, nesta terça-feira (10), em Manaus, uma pactuação com o estado do Amazonas para a conclusão da BR-319, que liga três capitais estaduais: Boa Vista, Manaus e Porto Velho e afirmou que a “A BR-319 é uma necessidade para o estado do Amazonas, Roraima e para o Brasil”. Afirmando que Marina da Silva, ministra do Meio Ambiente, “não é contra a rodovia”, ponderou, entretanto, ser necessário “assegurar que a conclusão da rodovia não trará desmatamento da floresta”. Tal extremada preocupação com a preservação ambiental do bioma é contraditória à ausência de políticas públicas voltadas ao ZEE, regularização fundiária e manejo florestal e mineral sustentável.

O discurso de Lula da Silva diverge da titular do MMA, que determinou ao IBAMA bloquear a concessão das licenças das obras de repavimentação da rodovia. Passou despercebido ainda que a juíza federal Maria Elisa Andrade, da 7ª Vara Ambiental e Agrária da Seção Judiciária do Amazonas, derrubou, de forma monolítica, a licença prévia para a reconstrução e o asfaltamento do trecho do meio da BR-319 a despeito da concessão da licença ambiental pelo IBAMA em 2022.

Entrando na luta pela continuidade das obras da BR-319, por intermédio da Comissão Especial de Defesa da BR-319, presidida pelo advogado Marco Choy, a OAB nacional ingressou com Petição em apoio ao Agravo de Instrumento interposto pelo DNIT contra decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública que suspendeu a eficácia da Licença Prévia, emitida pelo IBAMA, autorizando a pavimentação da BR-319. Nos termos da Petição encaminhada no último dia 10/9 ao desembargador Relator Flávio Jaime de Moraes Jardim, da 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o presidente do Conselho Federal da OAB, José Alberto Ribeiro Simonetti Cabral, alega que a suspensão da licença equivale à concessão do provimento final da ação, o que é vedado pela Lei nº 9.494/1997.

Por conseguinte, “o Conselho Federal da OAB requer seja admitido no Processo como ‘amicus curiae’, nos termos do art. 138 do CPC e ratifica integralmente as razões de recurso aos pedidos de concessão de tutela provisória recursal, para suspensão dos efeitos da decisão agravada, e de provimento do recurso, para reforma/cassação da decisão”. Considera, adicionalmente, que “a defesa da revitalização da BR-319 é uma questão que reflete diretamente na mobilidade, acessibilidade e dignidade dos cidadãos amazonenses, para além das questões meramente processuais, estando vinculada à justiça social e ao direito de desenvolvimento regional, daí a pertinência da habilitação do CFOAB no feito.

Argumentos que se fundem aos termos da “Carta Aberta” dirigida ao presidente Lula, quando de sua visita a Manaus, pelo engenheiro Marcos Maurício, do grupo GT Rodovias/CREA-AM, na qual salienta a imperiosidade da conclusão da rodovia BR-319 e leva em conta que “quem defende a conservação do meio ambiente deveria defender a repavimentação da BR-319. A rodovia, conforme projetos ambientais específicos, “assegura maior presença do Estado, com eficácia na fiscalização (comando e controle), na prevenção, no combate a ilícitos ambientais e a incêndios”.

Maurício acentua ainda que a visita presidencial deve “significar muito mais que uma agenda política em tempo de eleição; que seja um ato concreto em defesa da nossa gente; que reserve um tempo para percorrer parte dessa importante rodovia, ao menos até a Comunidade do Igapó-Açu, Km 260, no Trecho do Meio”. Por fim, insta ao chefe da Nação conversar com moradores das margens da BR-319, verificando “in loco” os problemas com que se defrontam “seja pela dificuldade de trafegabilidade durante o inverno amazônico, em razão das chuvas, seja pela quantidade de poeira, no verão”. O Amazonas, na verdade, precisa da rodovia totalmente repavimentada, apta ao tráfego em qualquer época do ano, salienta o documento.

Sobre o autor

Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA) e da Associação Comercial do Amazonas (ACA).

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

A Maçonaria do Amazonas se confraterniza com a Maçonaria de Minas Gerais

Foto: Gerson Occhi/Acervo pessoal

Por Abrahim Baze – literatura@amazonsat.com.br

A Instituição Maçônica, cuja origem é motivo, ainda hoje, de paciente perquirição, ensejando as mais diversas opiniões, todas elas, porém demonstrando o caráter universalista da nossa Ordem, sempre se constituiu em tema apaixonante de apreensão da inteligência humana, especialmente quando o ilustre maçom Gerson Occhi chega até nós trazendo a luz dos conhecimentos e da fraternidade.

Difícil, por certo, será a sua conceituação uniforme, uma vez que o seu processo de expansão e evolução acompanha os fatos que se desenrolam entre os homens, gerando as motivações civilizadoras e gentis, quando esta luz é conduzida por um nobre irmão de outras plagas.

E por nossa gratidão ao bom irmão Gerson Occhi é que, na opinião de Alfredo de Paiva, somos uma associação universal filosófica, reflexo sempre de nobres tendências inspiradas na mais perfeita tolerância, humildade e principalmente no intuito de transformar esta visita em momento de aprendizado e de luz.

Sua presença espelhada por seus conhecimentos maçônicos nos serviu de bálsamo para todas as dores e aflições que pudéssemos ter. A Loja Grande Benemérita Rio Negro n.º 4, que ofereceu abrigo e proteção ao nobre irmão, permitiu a construção de fortes alicerces entre as duas instituições, em cuja presença bebemos da sabedoria deste estimado irmão.

As instituições humanas, tenham ou não amplitude de ação, acompanham o evoluir dos tempos e modificam as normas disciplinadoras de seu comportamento e de suas atividades, afim de se adaptarem ao processo de desenvolvimento das sociedades modernas. Não devem, porém, desmantelar o seu alicerce, mas consolidá-lo sempre para o edifício construído não ruir.

A presença do nobre irmão em nosso Templo Maçônico, permitiu ser formada uma unidade entre o Amazonas e Minas Gerais, uma unidade indissolúvel como o fogo, a chama e a centelha que provem da mesma fonte, para provocarem a luz do brilho do referido irmão.

Não podemos negar que nossos registros históricos, sejam em Minas Gerais ou no Amazonas, assinalam a participação de maçons na evolução dos povos. O irmão Gerson Occhi plantou no jardim da esperança da Grande Benemérita Loja Simbólica Rio Negro n.º 4 a semente benfazeja no Amazonas. Ele nada mais fez do que trazer sua pregação de caráter filosófico que aprimorou o caráter humano.

A importante trajetória maçônica de Gerson Occhi – meio século de história

Foto: Gerson Occhi/Acervo pessoal

“[…] Meu primeiro contato com a maçonaria, ocorre, quando estava com 18 anos, na cidade de Leopoldina, Loja 27 de abril, pelas mãos de um primo, Urias Siqueira, então, Venerável da Loja. Em julho, íamos a Leopoldina, por ocasião da famosa Exposição Agropecuária e hospedávamos na casa de nossos familiares, o senhor Urias nos recebia muito bem, juntamente com sua esposa Professora Violeta Mendonça.

Saindo para um passeio, meu anfitrião, conduziu-me para conhecer a Loja. Nesse primeiro contato, fiquei deslumbrado e desde então, residiu em meu âmago o interesse pela surpreendente Maçonaria.

Passaram-se anos, já graduado em Direito e História, ministrando aulas em Colégios de Juiz de Fora, mas natural de Guidoval, próximo a Ubár, recrudesceu o meu interesse pela Maçonaria. Havia um tio meu, Felicio Siqueira, membro da Loja fraternidade Ubaense que, juntamente com José Damato, Jair Dutra Venâncio, Francisco Pinto de Aguiar, José Negueta, maçons de Guidoval e obreiros da referida Loja, iniciaram gestões para minha apresentação àquela Oficina tendo como padrinho o irmão Joaozito Vieira, no ano de 1971. Ocorre que, o processo não prosperou, pois, tendo residência fixa em Juiz de Fora, a legislação do GOB, obstaculizava o procedimento da iniciação. O processo foi então enviado para a Loja Fidelidade Mineira, de Juiz de Fora, que percorreu os tramites legais, sendo iniciado nesta Sesquicentenária Loja, no dia 24 de junho de 1972, dia de São João, nosso patrono.

Era Venerável Necy Alves de Azevedo, o grande maçom, José da Silva Ribas, ex-Grão Mestre do GOMG e Venerável da Loja por 8 mandatos, um exemplo a ser seguido.

A Maçonaria passou a fazer parte indispensável da minha vida, a empolgação tomou conta de mim. Quanto mais aprendia, tanto mais me apaixonava pela filosofia e história da Sublime Ordem. Nossa Loja era grande em número de membros e com belíssima história. Ela havia participado do movimento da Abolição dos Escravos, alforriando, em 1873, três escravos, quinze anos antes da abolição. Neste mesmo ano, encetou gestão a favor da Proclamação da República, recebendo em seu templo, os lideres Quintino Bocaiuva, Nuno Telmo e Saldanha Marinho, então, Grão-Mestre do Grande Oriente Unido e ex-Governador da Província de Minas Gerais.

Graças ao apoio e instrução dos irmãos, pude fazer progresso na Maçonaria, assim é que, em 1975 fui eleito Orador da Loja e reeleito em 1977, tendo como Venerável, José da Silva Ribas e depois Celso Alves Damasceno, culto, fraterno, estudioso, outra joia rara dentre os maçons. Em 1976, sou indicado, pelo General Braga Mury. Secretário de Cultura do GOB, para ministrar Historia do Brasil, Visão Maçônica, no Seminário para Mestres Maçons, em nossa região.

Em 1978, ainda na turbulência de reflexos das eleições de 1973, quando o ir. Athos Vieira de Andrade, disputando o cargo de Grão-Mestre do GOB, obtendo 7.175 votos, fora derrotado pelo ir. Osmane Vieira de Resende, com 3.820, em uma manobra vexatória do Tribunal Eleitoral Maçônico, anulado 5.046 votos do ir. Athos. A Loja protestou e sofreu retaliação, com a expulsão de toda sua Diretoria pelo GOB, Celso Damasceno, José da Silva Ribas, Américo Duarte Pacheco, José Maria Dutra, Humberto Benedito Filho, Gerson Occhi. Este ato deu motivo a fidelidade Mineira para desligar-se do GOB, o que ocorreu na memorável sessão de 16 de abril de 1978, pela unanimidade dos presentes, migrando para o Grande Orinete de Minas Gerais.

Tive o prazer de ocupar a oratória por 8 mandatos, além de vigilante, Mestre de Cerimonias e membro de várias comissões.

Eleito Venerável para o bienio 1995/1997 e reeleito para novo biênio em 2003/2005, promovemos algumas modificações no Templo e no prédio campestre na da Rua das Arvores, 133. No segundo mandato, fui eleito vice-Presidente do Conselho de Veneráveis das Lojas de Juiz de Fora e Região.

Nos altos Corpos da Fidelidade, fui Aterzata do Capítulo e Presidente da Loja de Perfeição Virgílio Rodrigues Cruzeiro.

Permaneci no grau 30 de 1988 até 2013, quando me filiei ao Supremo Conclave Autônomo do Rito Brasileiro, galgando os graus 31, 32 e 33.

Na Assembleia Legislativa do GOMG, fui Deputado durante 11 anos ocupando a Presidência em 1984, reeleito em 1985. Disputei as eleições com dois saudosos irmãos, com larga folha de serviços em prol da maçonaria, Joaquim Augusto Ramos e José Monteiro Bittencourt, aos quais rendo minhas homenagens póstumas. Encontrei uma Assembleia desmantelada, a ponto de os arquivos e livros se resumirem a uma caixa de papel Chamaex. Reivindiquei, junto ao Grão-Mestre, Athenagoras Café Carvalhaes, melhores condições de trabalho, recebendo uma sala, com armário e máquina de escrever (computador era luxo). Criei uma lista de presenças, para cada encontro.

As reuniões eram realizadas em todo dia 10, o que estava dificultando a vinda de deputados do interior, devido aos seus afazeres, nos seus respectivos orientes. Fizemos gestões junto a eles e passamos a nos reunir no primeiro sábado, o que persiste até hoje. Assim, a frequência aumentou em mais de 50%.

Na condição de Presidente do Poder Legislativo, acompanhei o Grão-Mestre, em 1984, até Caracas, na Venezuela, onde participamos da reunião anual da AIPOMA (Associação Indoiberoamericana de Potências Maçônicas), onde o nosso Grão-Mestre Athenagoras, deixou uma excelente impressão, pelo seu nível cultural, defendendo sua tese em escorreito espanhol.

Na Soberania Assembleia, ainda ocupei a função Orador e membro da Comissão de constituição e Justiça.

Como representante da Loja José Baesso, Or. de Guarani, participei da Constituinte, cujo texto, com algumas modificações, vigora até hoje.

Detenho a Medalha do Mérito Legislativo, 2016.

No ano de 1990, 15 de novembro, foi criada a Academia Maçônica de Letras de Juiz de Fora e Região, por iniciativa dos valorosos irmãos José Soares e Boanerges Barbosa de Castro, este, seu primeiro Presidente. Foram 13 os fundadores. Restam vivos os Acadêmicos José Suarez da Mota e Gerson Occhi.

Estive na Presidência da Academia, por um mandato e de vice-Presidente em outro. Atualmente (2022), Diretor de Cerimônias.

Em 2007 foliei-me a Loja Montanheses Livres, Rito Brasileiro, pelas mãos do irmão Ítalo Brasileo Martelli, tendo sido seu Venerável por dois mandatos consecutivos (2012/2015 e 2015/2017). Fizemos com ajuda dos irmãos uma enorme obra modificando pisos (de madeira para frio), altares (de madeira para mármore), teto, porta, colunas. Unimos o prédio da Loja ao apartamento, que também foi todo remodelado, com novo piso e pintura. Criamos a sala do Venerável, Biblioteca, Secretaria, Sala dos Altos Corpos, cozinha, área externa. Hoje, parte do apartamento está locado para as Lojas União e Força e Gonçalves Ledo, com renda para a Loja.

Membro Honorário das Lojas, Fraternidade Rio-branquense, Visconde do Rio Branco, Antenor Ayres Vianna, Santos Dumont, José Baesso, Guarani (GOMG), Fé, Esperança e Caridade, Levi Gasparian (GLMRJ) Fraternidade Ubaense (Ubá), Fraternidade Guidovalense (Guidoval), Manchester Mineira (Juiz de Fora) as três últimas do GOB/MG.

Alcance o grau 33, Servidor da Ordem e da Pátria, através do Supremo Conclave Autônomo para o Rito Brasileiro, em Cataguases, chegando a Grande Orador da Magna Reitoria. Atualmente (2022), sou Bibliotecário da Loja Montanheses Livres e Orador da Loja Fidelidade Mineira.

Recebi todas as honrarias possíveis no GOMG.

Todas esses conquistas, só foram possíveis, com o auxílio, apoio e ensinamentos dos irmãos da Fidelidade Mineira, da Montanheses Livres e das demais Lojas de Juiz de Fora e Região.

Ao meu juízo penso que cumpri com minhas obrigações maçônicas iniciadas há 50 anos.

Deixo ao crivo dos irmãos, o critério julgamento dos meus atos, enquanto maçom.

Continua sendo bom e agravável viverem unidos os irmãos.

Or. De Juiz de Fora, junho de 2022.

Fonte: OCCHI, Gerson. 50 anos de Maçonaria. 24.06.1972 – 24.06.2022.

Wagner Gouvea, (direita) de barba, Delegado do Grão Mestre para a 5a Região. Helder Afonso (esquerda), Venerável Mestre da Loja Joaquim Gonçalves Ledo. Foto: Gerson Occhi/Acervo pessoal

Quem quer que ainda creia nos altos desígnios do homem sobre a face da terra; quem quer que ainda não tenha todo descrito da ação civilizadora nos destinos da humanidade; quem quer que ainda não se tenha tornado em absoluto indiferente ao movimento regenerador que as conquistas do espírito humano vão operando no mundo, limpando-o dos preconceitos religiosos, libertando-o dos prejuízos políticos; quem quer que ainda se sinta agitado pelos superiores ideais de direito e de justiça; quem quer que ainda tenha alma para crer, coração para sentir, não pode deixar de se descobrir reverente e atencioso numa saudação que traduza respeito e consideração, antes a personalidade simpática deste homem que é a mais completa encarnação da bondade.

Seu nome é Gerson Occhi, no que ele contem de mais suave e de mais carinhoso, de mais belo e de mais sublime, de mais meigo e de mais angélico, espargindo luz. Nestes tempos de intensa vida e de desamor em que, por assim dizer, o homem, no conjunto de todas suas faculdades, absorvido no dia a dia pela busca da sobrevivência que o domina por inteiro, não saindo do seu egoísmo se não para se mover na direção que lhe é indicada pelos interesses individuais.

Este é Gerson Occhi, que se constitui em um caso raro digno de menção. Sua passagem por Manaus para rever familiares, tivemos a oportunidade, sob a proteção dos irmãos da Grande Benemérita Loja Simbólica Rio Negro n.º 4, de o recebermos com a convicção profundamente inabalável de que a nossa principal missão no seio da sociedade é partilhar bondade e acolhimento.

Meu bom irmão Gerson Occhi, a Maçonaria lhe consagrou o melhor de sua existência, a seu serviço constante, ininterrupto, todos os dias empregando sua atividade maçônica de forma incansável, crente e fervoroso sem desanimar, mesmo quando o peso da fadiga lhe abatesse, sem jamais, desertar ou abandonar a jornada.

Bem aja Gerson Occhi, viva os irmãos do Oriente de Minas Gerais GOMG!

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

Milho chegou ao Brasil pela Amazônia ocidental e foi domesticado ao longo de ondas migratórias

Foto: Flaviane Costa/USP

Há milhares de anos, o milho é parte fundamental da alimentação de muitas culturas indígenas das Américas. No Brasil, receitas e bebidas feitas com o cereal, como o preparado levemente alcoólico chamado de cauim pelos povos Tupi, fazem parte da dieta amazônica e são usadas em rituais. Algumas etnias indígenas brasileiras, como os Guarani Mbya, o consideram sagrado. É o grão mais produzido em escala mundial, em grande parte como alimento na pecuária e com presença notável na alimentação humana. Essa relevância faz com que arqueólogos e geneticistas hoje investiguem a origem, a dispersão e os processos de domesticação por quais o milho passou desde a origem da agricultura nas Américas.

Novas interpretações publicadas no dia 4 de setembro na revista Science Advances mostraram as similaridades entre amostras arqueológicas do milho e raças cultivadas atualmente por indígenas e agricultores tradicionais brasileiros. Os autores defendem que o milho chegou há 6 mil anos no sudoeste da Amazônia, a partir de sua origem no México, 9 mil anos atrás, de forma apenas parcialmente domesticada e, depois, passou por diferentes etapas de seleção e diversificação em regiões como o Centro-Oeste, Sul e Sudeste do país.

Isso não significa que a domesticação inicial se tenha completado na Amazônia. Amostras de milho encontradas em Minas Gerais com datas entre 570 e 1010 anos antes do presente têm características compatíveis com o primeiro milho plantado nas Américas. Atualmente, existem cerca de 300 raças de milho no continente americano. Delas, 15 são brasileiras, divididas em 19 sub-raças, das quais quatro são nativas, associadas aos indígenas, e são chamadas de Entrelaçado, Caingang, Avati Moroti e Lenha.

Os pesquisadores analisaram a morfologia e o DNA de 282 espigas fragmentadas, duas inteiras e 12 grãos de milho antigos encontrados nos anos 1990 por uma equipe do Museu de História Natural da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) coordenada pelo arqueólogo francês André Prous no vale do Peruaçu, no norte do estado. A curadoria do material hoje está a cargo do engenheiro-agrônomo e geneticista Fábio de Oliveira Freitas, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília, um dos autores do artigo.

Ela fez as análises no âmbito de projetos coordenados pelas geneticistas Elizabeth Ann Veasey, sua orientadora no doutorado, e Maria Imaculada Zucchi, supervisora atual.

O teosinto, como essas amostras da Universidade Harvard, corresponde à forma ancestral do milho. Foto: Flaviane Costa/USP

Todos os exemplares tinham o que os biólogos chamam de endosperma farináceo: uma grande parte do corpo do grão, onde os nutrientes ficam armazenados, era opaca. Outras versões, mais transparentes, são classificadas como vítreas. As amostras arqueológicas foram comparadas às variantes de milho com endosperma farináceo, cultivadas atualmente por povos indígenas e agricultores tradicionais brasileiros, e com o teosinto, uma planta silvestre aparentada ao milho e considerada semelhante à sua forma ancestral. Os exemplares de teosinto estão armazenados no Museu de Arqueologia e Etnologia de Peabody, da Universidade Harvard, nos Estados Unidos. As informações de milho moderno foram obtidas em coleções da USP e da Universidade da República, no Uruguai.

As amostras arqueológicas são espigas cônicas com quatro a 40 grãos em cada uma de quatro a 18 fileiras. Essa configuração tem semelhanças com o teosinto moderno, cujas espigas cilíndricas têm entre duas e oito fileiras, com número de grãos que varia entre seis e 27 em cada uma. Eles definiram, com base nesses números, que um bom parâmetro para classificar as variantes primitivas de milho, ou seja, as anteriores ou mais basais do processo de domesticação, seria um número de fileiras inferior a oito, porque nenhuma raça moderna do cereal nas chamadas terras baixas da América do Sul se enquadra nesse critério – normalmente, essas raças sul-americanas exibem cerca de 12 fileiras, mas podem chegar a até 26. Entre as amostras de teosinto, 95% tinham menos de oito fileiras.

Milho arqueológico encontrado em Minas Gerais preserva características antigas. Foto: Fábio de Oliveira Freitas/Embrapa

Os geneticistas encontraram, em meio às 282 amostras do vale do Peruaçu, 14 exemplares arqueológicos com quatro ou seis fileiras, apesar de a domesticação do cereal ter se iniciado há 9 mil anos no México e há 5 mil anos na Amazônia ocidental. “Isso é algo completamente novo”, diz o arqueólogo Tiago Hermenegildo, pesquisador em estágio de pós-doutorado no Instituto Max Planck de Geoantropologia, na Alemanha, também vinculado ao Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP. Ele faz pesquisa arqueológica com milho na Amazônia, mas não participou do estudo. O traço é peculiar porque, em tese, o longo processo de domesticação, marcado pelo aumento das fileiras de grãos, deveria ter eliminado essas características.

A novidade, ao lado de dados comparativos levantados pelos autores, indica que o milho ainda não estava completamente domesticado quando chegou ao Brasil. “O artigo é disruptivo porque, até 2018, se pensava que toda a domesticação do milho havia ocorrido no México”, afirma Costa. “Havia um imenso vazio de dados para as terras baixas da América do Sul, que são as regiões do continente abaixo de 1.500 metros de altitude”.

Um estudo de 2018 tinha mapeado o genoma completo de diversas variedades de milho na América do Sul e verificado uma variação nos genes associados à domesticação do milho. Quando o processo está completo, espera-se que formas genéticas (alelos) que aumentam o número de grãos, por exemplo, se tornem as únicas existentes – ou fixadas, no jargão geneticista. “Agora mostramos exemplares arqueológicos de milho encontrados no Brasil com características primitivas, o que corrobora esses trabalhos anteriores”, afirma a pesquisadora da Esalq.

Ainda não há consenso. “O que os estudos genéticos afirmam é que no início da domesticação, no México, o milho tinha uma troca de genes muito mais intensa com as variantes silvestres”, diz Hermenegildo. “Quando chega ao Brasil, essa troca já não ocorre, apesar de ainda haver fluxo gênico com outras variedades, em um processo de domesticação secundária, e isso é reforçado pelo novo trabalho”.

Migração no continente

O grupo de Costa também buscou traçar a rota de migração do milho no continente. Para isso, identificou similaridades entre os grupos existentes e os exemplares comparados às amostras arqueológicas de milho das raças Entrelaçado, Caingang, Avati Moroti e Lenha, além de resultados sobre as mesmas raças publicados em outros artigos. Foi assim que descobriram que exemplares locais de Entrelaçado da Amazônia ocidental se aproximavam das amostras arqueológicas encontradas no Cerrado e na Caatinga.

Pinturas rupestres em cavernas do Peruaçu indicam que milho e buriti faziam parte da vida dos povos que habitavam a região. Foto: Fábio de Oliveira Freitas/Embrapa

O milho Avati Moroti está presente em várias partes do Brasil. Exemplares dessa raça encontrados no Cerrado mostraram proximidade com uma amostra da Mata Atlântica e outras descritas na literatura científica. Enquanto isso, outro subgrupo da mesma raça foi identificado mais ao Sul, na região do Pampa. Variedades locais dos milhos Caingang e Lenha também existem no Pampa e na Mata Atlântica.

Isso tudo ajudou os pesquisadores a propor um caminho de migração do cereal. Para eles, o milho foi trazido ao Brasil por migrações à Amazônia ocidental, de onde foi levado para as regiões de Caatinga e Cerrado, no Centro-Oeste e Nordeste. Ao mesmo tempo, outras ondas de migração também transportaram o grão para as regiões de Mata Atlântica, sobretudo no Sudeste, e ao Pampa, no Sul do Brasil.

Ao pôr em evidência a resiliência das características primitivas do milho, o trabalho também tem impacto para as políticas de preservação e manejo atuais. Para Costa, a presença ao longo de milênios de variedades exclusivamente sul-americanas reforça a necessidade de políticas públicas e acordos internacionais para a conservação dessas raças nativas. A falta dessas políticas pode levar ao risco de extinção das variedades locais e raças nativas que ainda existem. “O trabalho valoriza o plantio realizado por populações tradicionais e indígenas”.

Para Hermenegildo, isso é importante porque muitos tipos de milho plantados pelos povos indígenas foram extintos junto com seus agricultores. “Foi uma verdadeira erosão cultural e genética, desde os tempos da colonização”.

Projeto

Genômica populacional e caracterização fenotípica para elucidar aspectos da origem, domesticação e dispersão do urucum (Bixa orellana) e milho (Zea mays) nas terras baixas da América do Sul (nº 15/26837-0); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisadora Responsável Elizabeth Ann Veasey (USP); Investimento R$ 192.720,56.

Artigo científico
COSTA, M. F. et al. Archaeological findings show the extent of primitive characteristics of maize in South AmericaScience Advances. v. 10. 4 set. 2024.

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Revista Pesquisa Fapesp, escrito por Enrico Di Gregorio

Mais de 500 pessoas moravam em casas improvisadas no Acre em 2022, aponta IBGE

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Foto: Iryá Rodrigues/Acervo g1 Acre

Pelo menos 518 pessoas viviam em residências improvisadas no Acre em 2022, segundo dados do Censo divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no início de setembro. De acordo com o levantamento, eram 275 homens e 243 mulheres nessa situação naquele ano, e a taxa de alfabetização nesse público era de 87,6%.

A maior parte desta população, segundo o Censo 2022, vive em estabelecimentos em funcionamento. Eram 232 pessoas neste tipo de moradia.

Logo depois, vêm as tendas ou barracas (de lona, plástico ou tecido), com 141 pessoas, estruturas não residenciais permanentes degradadas ou inacabadas, com 79 pessoas, outros domicílios improvisados, com 43 pessoas.

Também há 22 pessoas em estruturas improvisadas em logradouro público (exceto tenda ou barraca), sendo 15 homens e 7 mulheres, além de 1 pessoa que vive em veículo (carros, caminhões, trailers, barcos, etc).

O total de pessoas em moradias improvisadas no Acre representa 0,32% do montante registrado no país, que foi de 160 mil.

Déficit habitacional

Em julho, ao anunciar mais 110 unidades do programa Minha Casa, Minha Vida, o secretário estadual de Habitação e Urbanismo, Egleuson Santiago, destacou que o Acre tem um déficit habitacional de 23,9 mil unidades.

À época, o Ministério das Cidades destinou a nova remessa que, segundo o governo do Acre, será construída em municípios de até 50 mil habitantes, o que abrange 20 cidades do interior do estado.

Ao todo, o estado já teve quase 2 mil unidades destinadas pelo programa do governo federal. Com a autorização, a Secretaria de Estado de Habitação e Urbanismo do Acre (Sehurb) pode definir os locais onde os projetos serão construídos, e apresentar as propostas ao governo federal.

Em novembro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já havia divulgado que seriam destinadas 1,6 mil unidades ao estado distribuídas entre três municípios: 1,4 mil em Rio Branco, além de 100 em Xapuri e mais 100 em Cruzeiro do Sul. A atualização não especifica, porém, a distribuição desta nova remessa entre as cidades.

*Por Victor Lebre, da Rede Amazônica AC

Pesquisador da Fiocruz Amazônia recebe homenagem por contribuições nos estudos sobre suicídio no Brasil

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Foto: Divulgação/ALE-AM

O epidemiologista e pesquisador da Fiocruz Amazônia, Jesem Orellana, recebeu homenagem na Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (ALEAM) pela contribuição dada para a compreensão e enfrentamento do fenômeno do suicídio, em suas diversas nuances, por meio de pesquisas, palestras e artigos científicos, realizados ao longo de sua trajetória como pesquisador e chefe do Laboratorio de Modelagem em Geoprocessamento e Epidemiologia (Legepi), da Fiocruz Amazônia.

A entrega do diploma de reconhecimento, realizada em sessão especial em alusão ao ‘Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio’ (10/09), ocorreu no dia 11, por propositura do deputado estadual Jose Luiz, presidente da Frente Parlamentar de Cuidados e Prevenção à Depressão, Suicídio e Drogas do Poder Legislativo e Comissão de Prevenção à Depressão e Drogas da União dos Legisladores e Legislativos Estaduais (Unale).

Para o pesquisador, o ‘Setembro Amarelo’ é, sem dúvida, um período do ano que passou a fazer parte do cotidiano do brasileiro na luta contra o suicídio. “No entanto, sabemos que precisamos ir além, não apenas com ações estruturantes no campo da saúde mental e do bem-estar da população, mas também com reflexões sobre a necessidade de mais ações individuais oportunas, empáticas e acolhedoras com as pessoas que estão em sofrimento, seja ele discreto ou mais nítido”, comentou.

Foto: Divulgação/ALE-AM

Num recado direto às autoridades e ao público presente, Jesem Orellana salientou que o primeiro e mais importante ponto em relação ao suicídio é que se trata de uma causa de morte evitável, sobretudo em adolescentes e adultos jovens.

E continuou: “Em 2022, o Brasil alcançou a sua maior taxa histórica de mortalidade por suicídio em maiores de nove anos (9,3 por 100 mil hab.), o que evidencia a necessidade de mais progressos em termos de políticas públicas ao seu enfrentamento e prevenção, sendo o risco de suicídio entre indígenas no Amazonas, por exemplo, um dos mais desafiadores das Américas”, observou, em consonância com as falas dos especialistas, parlamentares e a titular da Secretaria Estadual de Saúde, Nayara Maksoud, presente à solenidade.

“Esse evento serviu não apenas para reunir e evidenciar o esforço e o compromisso de diferentes atores no que tange à prevenção do suicídio no Amazonas, como também para quem sabe germinar uma agenda multisetorial e favorável à rede de atenção psicossocial no Estado, como destacado pelo Deputado João Luiz e pela Secretária de Saúde do Amazonas, Nayara Maksoud”, agradeceu Orellana.

Pesquisas

Jesem Orellana é pesquisador e epidemiologista da Fiocruz Amazônia, membro da Coordenação colegiada da Comissão de Epidemiologia da Abrasco e coordena o Laboratório de Modelagem em Estatística, Geoprocessamento e Epidemiologia (Legepi).

Colabora em projetos relacionados à COVID-19, à saúde e nutrição de populações vulneráveis, suicídio e outros tipos de violências e projetos relacionados aos efeitos negativos da emergência climática sobre a saúde humana.

Além de suas contribuições acadêmicas, Orellana presta consultorias técnico-científicas à imprensa, sociedade civil organizada e órgãos de controle como o Ministério Público e Defensoria Pública, bem como legisladores de diferentes níveis.

*Com informações da Fiocruz Amazônia

Do Pantanal à Amazônia, Iphan mapeia impactos culturais da crise climática

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Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

viola de cocho considerada patrimônio cultural, e a canoa de um pau só, são bem conhecidas por Lourenço Pereira. Pescador de terceira geração na região do Pantanal, fala do rio como se fosse um filho a quem destina todo o cuidado e agradece a ele pelas conquistas da vida. É a natureza que permite a vida de Lourenço e é com ela que ele aprende a trabalhar. Os últimos anos, no entanto, têm revelado uma série de complicações a essa relação. 

“A pesca vem mudando muito, a cada dia que passa”, relata Lourenço, preocupado com o nível do rio cada vez mais baixo que leva o peixe até a fronteira do Mato Grosso com o Mato Grosso do Sul. É do município de Cáceres (MT) que o pescador sai para trabalhar, se deslocando agora em torno de 250 km para dar início ao ofício da pesca. Não foi só a distância que aumentou: “Aumentaram muito as horas de navegação. Onde eu fazia com 12h, hoje eu tô fazendo com 18h de barco”. A poluição do corpo de água também preocupa. Impulsionada pelos incêndios cada vez mais recorrentes no Pantanal, torna impróprio para consumo o recurso que mata a sede.  

Com 54 anos de vida, Lourenço afirma que nem ele nem seu pai, que viveu até os 98 anos de idade, tinham visto algo como o incêndio de 2020 durante toda essa janela de tempo. “Depois de 2020, nunca mais o incêndio acabou no Pantanal”, lamenta. Além de afetar o modo de vida das comunidades tradicionais, as queimadas recorrentes têm diminuído muito o número de madeira necessário para a produção da viola de cocho e da canoa de um pau só. “Sou apaixonado pela canoa de um pau só, eu tenho isso no sangue, a cultura dos Guató. Meu pai era mestre em fazer canoa de um pau só e viola de cocho. O fogo matou muito as madeiras com as quais a gente faz as canoas. Futuramente a gente vê que vai ter alguma só de foto mesmo. Para dar uma canoa tem que ser uma madeira muito antiga e grossa”, relata.

Viola de cocho, patrimônio cultural do Brasil, cuja matéria-prima é ameaçada pela crise climática. Foto: Reprodução/Iphan

Associado a outros pescadores, Lourenço faz parte de um projeto empenhado em reflorestar áreas do Pantanal com plantas nativas. Em torno de 1500 pescadores se organizam na forma de um “muxirum” – palavra de origem tupi que remete a algo como mutirão ou fazer junto – sem qualquer auxílio financeiro. Cada pescador planta mais ou menos cem mudas, e os que não plantam coletam sementes e cuidam dos canteiros. 

O reflorestamento da região é importante tanto do ponto de vista ambiental como de preservação dos patrimônios nacionais originários das comunidades pantaneiras. O que essa associação de pescadores faz é um serviço para o bem estar e preservação da vida da comunidade, do país e do mundo.

Nas últimas décadas, outros bens e localidades históricas tombados pelo Iphan foram impactados por fenômenos extremos, como a cidade de São Luiz do Paraitinga (SP), que teve prédios bicentenários destruídos por um temporal em 2011. No Rio Grande do Sul, 41 museus, 52 centros culturais e 57 bibliotecas foram diretamente afetadas, segundo levantamento do governo do estado junto aos municípios gaúchos. 

Na Amazônia, uma das consequências da seca agravada pela crise climática é o aparecimento de sítios arqueológicos antes submersos, o que acarreta na necessidade de salvaguarda dos locais. Segundo a arqueóloga Marjorie Lima, em encontro virtual realizado pelo Iphan no início do ano, a consequência vai além, já que “as pessoas estão mudando seus lugares de vivência, uma alteração elementar na vida das pessoas”, afetando também o patrimônio imaterial. 

A superintendente do Iphan no Amazonas, Beatriz Calheiros,  também exemplifica os impactos.  “[Em 2023], as fumaças encobriram o centro histórico de Manaus (AM), que é um local histórico tombado pelo Iphan, inclusive apresentações artísticas no Teatro Amazonas tiveram seu agendamento impactado”. No Cerrado, a Chapada dos Veadeiros (GO), tombada pela Unesco como Patrimônio Mundial Natural, teve milhares de hectares destruídos em setembro deste ano.

É a partir desse contexto que o Iphan, junto ao Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos-BR), vem promovendo o Ciclo de Diálogos sobre Patrimônio Cultural e Ações Climáticas. O Ciclo é realizado a partir da concepção de que os detentores do patrimônio cultural são aliados fundamentais no enfrentamento às consequências das mudanças climáticas. 

As ações estão sendo pensadas para contemplar os principais biomas do Brasil, levando em conta as necessidades do patrimônio cultural de cada região e a forma como as mudanças climáticas se apresentam em cada uma delas. As primeiras reuniões presenciais acerca do programa ocorreram em Brasília e a previsão é que os encontros ocorram em cada bioma brasileiro.

Incêndio na Chapada dos Veadeiros. Foto: Reprodução/CBMGO

O Iphan também está recolhendo informações a partir de um formulário, a fim de abranger e estar a par da situação de patrimônios culturais que não poderá, pois quaisquer motivos, ser comunicada nos eventos presenciais. “O questionário veio para chegar onde nós não estamos chegando. Os fóruns exigem você se deslocar, você ficar dois, três dias em determinado local. Desde o profissional em gestão do patrimônio até o detentor do conhecimento tradicional que está lá na comunidade”, esclarece Luana Campos, Secretária do Icomos-BR.

Entre os objetivos do programa, estão a produção de dados e estudos com a perspectiva de fortalecer políticas públicas e ações de enfrentamento e a análise dos principais riscos que afetam e poderão afetar distintos tipos de bens do patrimônio cultural. 

A perspectiva é que o programa colete dados suficientes até a COP30, que vai acontecer em Belém, no Pará, em novembro de 2025. “A gente pede ajuda para que a gente tenha e consiga lançar na COP a Carta do Patrimônio e Mudanças Climáticas. As recomendações, indicadores, todos esses elementos que compõem uma carta do patrimônio como resultado desse trabalho e como um panorama, indicativos do cenário atual e projeções futuras para o patrimônio cultural frente às mudanças climáticas.”  

Para ações como a realizada pelos pescadores, junto a Lourenço, no Pantanal, a formulação de políticas públicas que incentivem e reconheçam essas movimentações é fundamental, uma vez que os impactos da crise climática já estão sendo sentidos. Luana entende a pressa de muitos detentores, mas reitera que políticas públicas levam tempo e programas como o Ciclo de Diálogos são importantes para dar início a essas elaborações. 

O exemplo de resultado a curto prazo dado por Luana é do diálogo estabelecido com a Defesa Civil em um dos eventos presenciais em Brasília. “A Defesa Civil está neste momento revendo o plano nacional de diretrizes da defesa civil. A partir desse evento que nós promovemos em Brasília, nós incentivamos o grupo a introduzir a cultura, o patrimônio. Se não tivesse tido o evento, talvez isso não teria acontecido de forma mais lógica.”

“Patrimônio Cultural e Ações Climáticas”, evento paralelo do G20 realizado em maio pelo MinC. Foto: Filipe Araújo/MinC

Esta é uma das ações que o Ministério da Cultura tem realizado para integrar o setor cultural nas discussões sobre a crise climática. Na Cop28, em Dubai, o Brasil e o país sede coordenaram juntos o lançamento do Grupo de Amigos da Ação Climática Baseada na Cultura, uma coalizão de ministros da Cultura. O debate, contudo, não teve avanços significativos e ainda não há informação sobre uma nova reunião na Cop29, que será realizada no Azerbaijão em dezembro. Outras reuniões sobre o tema têm sido realizadas na programação paralela do G20, já que o Brasil sedia os encontros do grupo em 2024. A expectativa é que a questão do clima e da cultura seja mencionada no documento final do G20, que será apresentado em novembro, em Salvador.

Os maiores debates sobre a relação entre clima e cultura têm sido realizados por organizações da sociedade civil e ativistas da área. Um exemplo é a Rede Clima & Cultura em Foco, uma iniciativa do  People’s Palace Projects do Brasil, em parceria com o Perifalab, que promove uma série de encontros sobre o tema. Para Marcele Oliveira, Diretora da PerifaLab, uma mudança na legislação que inclua a sustentabilidade no âmbito da política cultural pode fazer a diferença. “Através da cultura, a gente pode conscientizar massivamente as pessoas”. 

⅙ dos bens culturais mundiais estão ameaçadas pela crise climática, diz Unesco

A crise climática impacta o patrimônio cultural em todos os continentes. Segundo Marlova Jovchelovitch, diretora da Unesco no Brasil, pelo menos ⅙ dos patrimônios culturais estão ameaçados pelas mudanças climáticas. O levantamento, divulgado pelo órgão durante o lançamento da missão emergencial da Unesco no Rio Grande do Sul, em julho deste ano, também revelou que ⅓ dos sítios arqueológicos estão em áreas de potencial risco. 

Para a gestora, não há mais como separar a cultura das discussões sobre o clima. Nos últimos anos, as demandas por fundos emergenciais após desastres, como as enchentes no Rio Grande do Sul, têm aumentado com o passar do anos. No sul do Brasil, a missão foi formada por especialistas em gestão de crise, resgate e recuperação de acervos, que coletaram dados e informações para embasar um diagnóstico das necessidades pós-enchente e recomendações técnicas para os mais de 50 museus afetados na tragédia. Ações semelhantes foram realizadas após desastres no Haiti, no Nepal, na Namíbia e no Paquistão nos últimos anos. 

O socorrista cultural guatemalense Samuel Franco Arce foi um dos profissionais que visitaram o Rio Grande do Sul em julho. Especializado em emergências, ele explica que a velocidade das mudanças climáticas exige novos protocolos de museus e instituições culturais, de modo geral. “É importante considerar o que as mudanças climáticas estão fazendo com o Patrimônio Cultural. Nós estamos começando a ver o impacto em sítios arqueológicos que estão sofrendo erosão, por exemplo. Alguns patrimônios são mais vulneráveis que outros, mas precisamos nos preocupar, porque nossos bens culturais serão afetados de forma mais rápida do que vimos nos passado”, explica o especialista que já atuou em um terremoto no Nepal, em 2015, e enchentes na Índia, em 2022. 

Entre as mudanças práticas que serão necessárias para emergências futuras, Samuel explica que os museus vão precisar repensar a localização de seus acervos, pois, assim como no Brasil, em diferentes partes do mundo constrói-se acervos no subsolo das instituições culturais. Um prédio anexo, em lugar diferente do museu, pode ser uma saída possível para a preservação. 

Outra solução é o deslocamento das soluções para andares superiores. “Um procedimento que recomendamos é que arquivos como fotografias e documentos estejam salvos na nuvem e também em mais de um prédio, pois às vezes as pessoas guardam três backups em um mesmo lugar e, se um incêndio acontece, tudo será perdido”, exemplifica.

Para atuar como socorrista cultural, Samuel explica que são necessários treinamentos de diversos tipos: com bombeiros, com as forças armadas, com os primeiros socorros. “Você precisa enxergar de forma global, não apenas com olhar de um restaurador de acervos e obras de arte”, explica. “Em caso de enchentes, nós fazemos uma espécie de triagem e diagnóstico, percebendo o que pode ser restaurado e o que foi perdido.”

Andrea Richards, arqueóloga caribenha, ressalta que a diversidade cultural precisa ser considerada em situações de tragédias climáticas. A especialista atua, em especial, na preservação de patrimônios culturais pós-enchentes e pós-ciclones nas regiões do Caribe, onde há ocorrência periódica de furacões, e no Sudeste do continente africano. “Quando trabalhamos na reconstrução do patrimônio cultural, é importante pensar na diversidade cultural”, explica. “Para mim, vindo do Caribe, a diversidade é essencial, porque somos uma mistura de diferentes raças, e vejo o mesmo no Brasil.” 

“Quando o trabalho de restauro é feito, é importante se assegurar de que não é apenas um tipo de patrimônio que está sendo recuperado. Precisamos considerar as diversas vozes que se expressam através do patrimônio”, explica Andrea sobre sua experiência atuando em diferentes países, como Malawi, Dominica e Antigua. A visita ao Rio Grande do Sul foi sua primeira experiência de missão emergencial no Brasil. No Brasil, além dos museus do RS, apenas o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, foi contemplado com esse programa da Unesco nas últimas décadas.

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Nonada Jornalismo, por Pedro Tubiana e Anna Ortega