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Açaí do Acre é o primeiro a receber certificação de origem no país e estimula bioeconomia local

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Comunidades locais e especialistas dizem esperar que a formação, a pesquisa e o apoio à produção ajudem a consolidar a cadeia de produção e evitar o envolvimento de intermediários.

Distante 363 quilômetros (225,5 milhas) da capital do estado Acre, a cidade de Feijó é conhecida como a Terra do Açaí. O produto está tão entremeado à cultura local que também dá nome ao festival mais popular da cidade, reunindo centenas de pessoas como uma forma de cultuar o fruto da palmeira Euterpe precatoria, nativa da Amazônia, e protagonista na cultura e história do município.

Os produtores locais consideram a fruta a “pedra preciosa da floresta” e agora estão comemorando uma recente conquista: o açaí de Feijó agora é considerado, de fato e de direito, um dos melhores do país.

Foto: Reprodução/Agência Acre

Em setembro deste ano, o fruto cultivado nas terras feijoenses recebeu a Indicação Geográfica (IG) dada pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), sendo a primeira certificação do país para este produto. Antes disso, o açaí cultivado no Arquipélago do Bailique, na foz do Amazonas, havia recebido a certificação Forest Stewardship Council (FSC), que atesta que o açaí é extraído de forma responsável, com manejo sustentável.

Já a IG dada ao açaí de Feijó reconhece as características do produto pelo seu local de origem, o que lhes atribui reputação e identidade própria. Produtos com esse reconhecimento apresentam uma qualidade única em função de recursos naturais como solo, vegetação, clima e a forma como é cultivado.

O açaí produzido em Feijó é conhecido por sua espessura e sabor. Para quem percorre a BR-364, é fácil descobrir quando se aproxima da cidade, já que as placas anunciando “Açaí de Feijó” são inúmeras durante o trajeto.

A certificação foi resultado de um trabalho desenvolvido pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) do Acre, governo estadual, produtores, agricultores e associações da cidade. Um processo que começou ainda em 2021 com levantamento de todos os dados e a organização dessa estrutura econômica entre os produtores de açaí.

“Nós fizemos toda a parte diagnóstica do território, pleiteando ao que os normativos do instituto solicitam, juntada do dossiê, capacitação dos produtores para adequarem e estarem aptos a emitir os documentos junto ao INPI e no dia 12 de setembro tivemos a emissão da IG para o produto açaí em Feijó”, 

disse o assessor técnico do Sebrae Acre, Fabry Saavedra.

Agora, o açaí de Feijó é um dos 108 produtos com identificação geográfica no Brasil reconhecido pelo INPI — 14 deles são da Amazônia.

Produtos amazônicos com selo de Indicação Geográfica (IG)


  1. Farinha de mandioca de Bragança (PA)
  2. Farinha de mandioca de Cruzeiro do Sul (AC)
  3. Açaí de Feijó (AC)
  4. Pirarucu manejado de Tefé (AM)
  5. Queijo de Soure (PA)
  6. Café em grão Robusta Amazônico de Cacoal (RO)
  7. Guaraná de Maués (AM)
  8. Abacaxi de Itacoatiara (AM)
  9. Artesanato em capim dourado produzido em Palmas (TO), na região do Jalapão
  10. Peixes ornamentais de Barcelos (AM)
  11. Waraná (guaraná nativo) e pães de waraná (bastão de guaraná) de Parintins (AM)
  12. Cacau de Tomé-Açu (PA)
  13. Farinha de mandioca de Uarini (AM);
  14. Tambaqui, peixe amazônico, in natura e processado de Ariquemes (RO)

A concessão da IG, no entanto, não significa o fim do processo. Pelo contrário, é o começo. A partir de agora, produtores e diversos atores desse mercado precisam se enquadrar nos requisitos técnicos para manter a qualidade do produto e emplacá-lo no mercado não só nacional, mas também internacional.

“Começamos agora uma terceira fase, que é a de capacitações, participação do produto e produtores em feiras, rodadas de negócios, concursos, ou seja, a parte de promoção desse produto”, pontua Saavedra. 

Complementação histórica

Um dos documentos exigidos nesse processo foi o dossiê de notoriedade da região produtora do açaí de Feijó, elaborado pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas do Patrimônio Imaterial, assinado pela historiadora Irineida Nobre.

Essa complementação histórica demonstra como o fruto faz parte da identidade do município, sendo a cor roxa predominante em marcas de prédios públicos, serviços de mobilidade e outros. Não é à toa que Feijó também é conhecida como a “capital do açaí”.

“É um registro da relação da comunidade com aquele fazer, com aquele produto. A gente teve que visitar as comunidades para entender o motivo de o açaí de Feijó ser tão famoso. Íamos buscando informações em entrevistas, conversas e fomos tendo as respostas para essas perguntas”, explica Irineida Nobre.
A edição de 2023 do Festival do Açaí, em Feijó, reuniu mais de 53 mil pessoas. Foto: Reprodução/Josciney Bastos/Agência de Notícias do Acre.

A historiadora destacou que a forma de fazer o açaí na cidade é uma tradição dos povos originários, assim como tantas outras atividades extrativistas na região. “Não posso fechar os olhos para onde tudo começa”, Nobre disse. “Nossas tradições vêm dos povos originários. Hoje a questão do açaí é tão forte na cidade que a faixa do táxi, por exemplo, é na cor roxa e também a tinta roxa na cidade é mais cara.”

Nobre diz que o próximo passo é tornar o Festival do Açaí, que ocorre na cidade desde 1999, um bem cultural e imaterial do estado. Ao longo destes anos, a participação popular tem aumentado e o evento se tornou um dos mais tradicionais da região.

A última edição ocorreu entre os dias 18 e 20 de agosto e reuniu, segundo a organização, 53 mil pessoas. Nos três dias de evento, empreendedores expuseram seus produtos e movimentaram a economia da cidade.

“O festival tem uma solidez que permite que a gente pleiteie o Festival do Açaí como o primeiro festival acreano a ser registrado como bem cultural e imaterial do estado. Ele ocorre há 23 anos, de maneira ininterrupta, nem na pandemia deixou de acontecer, e todas edições têm registros, então tem um material histórico importante pra que a gente faça esse trabalho”,

disse Irineida Nobre.

Uma curiosidade é que até o final da década de 1990 a cidade estava longe de alcançar o título de “capital do açaí”. Naquele período, a coleta dos frutos do açaí ocorria de modo concentrado no Vale do Juruá, composto pelos municípios de Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Rodrigues Alves, Porto Walter e Rodrigues Alves. Apenas em 2002 Feijó ganhou destaque na produção dos frutos da palmeira.

Em 2022, a cadeia do açaí amazônico cresceu a produção em 8,8%, atingindo 247 mil toneladas, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em termos de valor, a safra apresentou aumento de 7,7%, totalizando R$ 830,1 milhões.

Organização dos produtores 

Há dois anos, a cadeia do açaí em Feijó passou a se organizar em torno da cooperativa AçaíCoop Feijó, que reúne atualmente cerca de 60 cooperados, entre produtores, coletores e batedores (locais de processamento e coleta do açaí). A entidade foi importante para a conquista da certificação.

A cooperativa está se ajustando, inclusive, de acordo com o presidente, José Jevanis de Lima Nascimento, e ainda não tem uma estrutura física. Segundo ele, o foco agora é organizar esse sistema para tentar atingir novos mercados e investidores e ter um real controle da produção.

“Estamos ainda na fase de conversas, mas já recebemos convites de exportação, de mandar açaí no pote para os chineses, por exemplo, mas precisamos de incentivos da iniciativa privada e também dos órgãos públicos”, Nascimento disse. 

“Estamos esperando uma das maiores safras dos últimos 10 anos em 2024 e precisamos nos organizar para isso”.

A palmeira do açaí é nativa da região e atualmente a colheita dos cachos é feita de maneira manual. Escalando a palmeira e de posse de uma faca afiada, os coletores mais habilidosos conseguem colher de três a cinco cachos em uma única escalada.

Depois, os cachos são colocados em uma lona para evitar o contato direto ao solo. O presidente da cooperativa explica que o município tem duas safras diferentes, mas que o ápice é entre fevereiro e março.

“Uma das safras ocorre às margens dos rios Envira e Jurupari e a outra na safra da terra alta, à margem da BR, que essa segunda vai de junho até início de outubro e acaba que uma safra completa a outra. Por isso, Feijó é considerado especial por ter essas duas safras”, explica Nascimento.

O coordenador do Projeto TED Bioeconomia no Acre, que analisa as cadeias produtivas de importância na agricultura familiar, o engenheiro florestal Daniel Papa, explica que os açaizeiros da região de Feijó são, em sua grande maioria, nativos, mas isso vem mudando.

Açaí de Feijó ganhou o primeiro registro de Indicação Geográfica. Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre

“Recentemente, na última década, com o aumento do valor do fruto no mercado nacional e internacional, os extrativistas começaram a transplantar as mudinhas da mata para perto das suas casas, em seus quintais”, disse Papa. “Esse processo nós chamamos de domesticação. E esse é o futuro do açaí, ele vai continuar sendo colhido na floresta, mas cada vez mais as pessoas irão plantar para poder ter uma produção maior e mais perto de casa.”

Hoje, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) está ajudando os extrativistas no processo de domesticação, pesquisando como plantar, qual espaçamento entre plantas, como preparar a muda, qual adubação fazer e como controlar pragas e doenças. Resultados dessa pesquisa são esperados para 2024.

“Temos que estimular o plantio do açaí-solteiro, que é nativo e está mais adaptado aos solos e clima do Acre. Mesmo que ele demore 8 anos, precisamos estimular o plantio da espécie”, disse Papa.

Conceitos agroflorestais podem ajudar no cultivo da planta, de acordo com o especialista. Uma alternativa, segundo Papa, é plantar o açaí-solteiro com banana e em consórcio com outras espécies de ciclo mais curto. Assim, o produtor tira renda da área com outras coisas até o açaí começar a produzir. 

Coroação e premiação 

 O presidente da cooperativa diz ainda que a emissão da certificação é a coroação de um longo trabalho que tem sido feito pelos produtores e atores do setor no Acre. Nos últimos anos, cursos de capacitação têm sido levados até as comunidades que vivem da produção do açaí.

“O principal objetivo é a valorização. Temos que investir na estruturação e na formação, temos cadernos de especificações técnicas, estamos padronizando os produtores, coletores e processadores para que sigam esse padrão para embasar a IG”, Nascimento disse. “Temos o melhor açaí da região, temos um produto de excelentíssima qualidade, então temos que seguir esse padrão também na estruturação do nosso pessoal. Essa IG vem coroar todo esse trabalho que já vem sendo feito”.

Outro ponto importante, segundo o presidente, é que essa certificação contribui também para a questão ambiental na cidade. Feijó é uma das cidades que lidera o ranking de desmatamento e queimadas e o extrativismo pode ser um aliado para mudar esse cenário.

“Um dos nossos maiores medos é do boi comer o açaí, uma metáfora para o desmatamento por conta da pecuária, porque destrói parte da floresta que tem uma grande quantidade desse produto que é o nosso trunfo. Isso é motivo para a gente brigar pela preservação da nossa floresta.”

Julia Gomes trabalha com açaí há 10 anos. Ela tem reserva nativa e também agroindústria. O carro-chefe é a produção do vinho do açaí, mas ela também trabalha com outros derivados, como licor e cocada. Para ela, a certificação traz mais notoriedade para o açaí cultivado em Feijó, o que deve abrir as portas para novos negócios.

Foto: Vanísia Nery/ G1 Acre

“Acredito que possamos alcançar outros públicos e assim aumentar a procura e agregar mais valor ao produto. Mas, primeiro precisamos de uma sede estruturada para depois fazer com que esse produto seja comercializado por quem realmente tenha autorização legal para isso”, disse.

Adevilson Paiva da Silva é produtor há cerca de 15 anos e mora no baixo Rio Envira, com uma terra de cerca de 300 hectares. “O primeiro de tudo é ter um barco grande para transportar o açaí, porque se você não tiver, tem que pegar de outra pessoa e pagar por isso, então já perde. Depois é ter produto pra vender. Se o cara tiver uma safra boa, consegue um lucro bom.” 

 Estruturar o arranjo produtivo

 Judson Valentin, do Centro de Pesquisa Agroflorestal do Acre, explica que a IG foi uma grande conquista, assim como a IG da farinha, mas ressalta que é necessário pensar na organização deste mercado para que os resultados possam ser sentidos pelos produtores e que impacte o município economicamente de forma significativa.

“Isso é um exemplo de que as cadeias da sociobiodiversidade, da bioeconomia, podem ser um vetor importante. São milhares de extrativistas no Acre que têm no açaí parte da sua fonte de renda”, pontua.

Mas, é preciso ficar atento aos desafios, segundo Valentin, principalmente para que o lucro não passe dos extrativistas para os grandes empresários.

“O ideal é que a gente tenha iniciativas, tanto de inovação tecnológica, como também de políticas públicas, que consigam apoiar essas populações para que possam agregar valor ao produto através da biodiversidade, da bioeconomia, uma bioeconomia inclusiva, que inclua as pessoas no mercado, que elas tenham oportunidade de melhorar a renda e tenham oportunidade de mudar sua qualidade de vida fazendo o uso sustentável dos recursos naturais.”

Márcio Bayma, analista da Embrapa e mestre em economia aplicada, esclarece que é necessário se apropriar desse selo de qualidade para alcançar mercados específicos.

“Entendo que nesta fase é imprescindível o engajamento dos produtores ligados à IG para o fortalecimento do associativismo e cooperativismo, por ser a única forma de se obter um grau maior de desenvolvimento comunitário e econômico. Eles precisam de crédito para a construção de uma agroindústria e assim poderem comercializar em mercados e precisarão agregar valor à produção e serem protagonistas deste arranjo”, disse.

Para que esse tipo de modelo dê certo, Bayma destaca que precisa ser um fluxo contínuo de usos e de forma que se retroalimenta. “A floresta oferece os seus produtos e os extrativistas se beneficiam dos mesmos e, ao mesmo tempo, cuidam da floresta.”

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Mongabay, escrito por Tácita Muniz. 

Especialista reforça potencial turístico da geologia do Centro Histórico de Manaus

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O estudo das rochas que compõem construções como o Teatro Amazonas revela uma história própria e que deve ser preservada, segundo pesquisadora.

O que vem à mente quando se fala a respeito de geologia? Mineração? Talvez o estudo de rochas, pedras e montanhas? Bem, todos esses conceitos estão englobados nesta área do conhecimento, entretanto, este campo tem pesquisas com uma abrangência muito maior. 

A geologia urbana, por exemplo, analisa a utilização de rochas para a composição de estruturas arquitetônicas. Rochas estas que são capazes de contar histórias, revelar traços do passado de civilizações antigas, ou, em um contexto mais recente, revelar as origens de construções que compõem os centros históricos metropolitanos.

O Centro Histórico de Manaus, capital do Amazonas, é constituído por um rico contexto geológico, com rochas sendo utilizadas principalmente na construção de edificações amplamente conhecidas, como o Teatro Amazonas e a Igreja da Matriz, e na construção de muros, pavimentação das ruas, dentre outras utilidades. Até mesmo rochas que contém restos fossilizados foram utilizados nessas construções.

A Igreja da Matriz é uma construção que utiliza diversas rochas com contexto histórico. Foto: Eliana Nascimento/Acervo G1 Amazonas

Para compreender melhor a relação da geologia e do centro histórico de Manaus, o Portal Amazônia conversou com Márcia Carvalho de Oliveira, geóloga e mestranda em geociências na UFAM.

Geologia Urbana

A geologia está naturalmente localizada em ambientes “rurais”, seja na forma de montanhas, pedreiras, formações específicas, que ocorrem de maneira natural; minérios, dentre outros. Estas formações podem ser também utilizadas no contexto urbano, principalmente para construções, daí surge a área do conhecimento denominada ‘Geologia Urbana’.

“Temos a mania [geólogos] de dizer que a geologia é a forma de se desvendar o passado com o que se tem no presente”,

diz a geóloga. 

Pedras ornamentais encontradas no interior da Igreja da Matriz. Fotos: Márcia Carvalho de Oliveira/Acervo Pessoal

Ou seja, a utilização de um mineral específico é capaz de dizer muito sobre o processo de formação histórica de uma sociedade. A geologia está presente nos mais diferentes contextos dentro de uma cidade, “na fachada de shoppings, nas soleiras de portas, nos calçamentos do centro e nos seus edifícios…”, contendo histórias únicas sobre sua utilização nessas edificações.

Centro Histórico de Manaus 

A pesquisa de Márcia tem como principal enfoque a criação de um roteiro virtual com a forma tridimensional dos edifícios históricos que contém uma rocha específica, chamada de calcário de lioz. 

Entretanto, a pesquisadora afirma que já estuda o Centro Histórico de Manaus há muito tempo, e que sua riqueza geológica é facilmente identificada nas principais construções da cidade.

O próprio objeto de estudo da geóloga, o calcário de lioz, traz consigo o período áureo do ciclo da borracha em Manaus – que teve seu auge entre 1880 e 1910. Segundo explica a pesquisadora, esse tipo de rocha veio de Portugal, durante o período de abertura dos portos de Manaus para as nações aliadas, e foi utilizada em diversas construções que marcaram época na cidade. 

“Os edifícios do centro tiveram uma data para serem inaugurados, tiveram todo um projeto para serem construídos. Eles não foram simplesmente construídos porque precisavam de um Palácio da Justiça ou de um Teatro Amazonas [nos moldes em que foram idealizados]. Eles tiveram um sentido para estar ali. O ciclo da borracha influenciou muito nos elementos arquitetônicos e geológicos da cidade”, 

explica.

Imagem: Márcia Carvalho de Oliveira/Acervo Pessoal

A pesquisadora destaca ainda que o calcário é apenas uma das rochas ornamentais que enfeitam as construções históricas da cidade, e que a catalogação destas pedras tem um potencial turístico enorme, justamente pelas histórias que carregam consigo. 

Tomando o calcário de lioz, por exemplo, sua própria formação muitas vezes carrega fósseis diversos, que podem ser observados nas paredes dessas edificações, com um olhar mais atento.

“Essa rocha tem um conteúdo de fósseis, ou seja, impregnado nesta rocha existe toda uma classificação taxonômica do que pode ser encontrada. Além disso, ela é emblemática por poder ser encontrada no mundo inteiro. Portugal exportou a “pedra real portuguesa” para todas as suas colônias, sendo o Brasil uma delas”,

comenta.

Fósseis podem ser avistados na composição do calcário de lioz. Este está presente no Teatro Amazonas. Foto: Márcia Carvalho de Oliveira/Acervo Pessoal

Potencial turístico 

Por fim, a pesquisadora destaca a importância dos órgãos públicos observarem o potencial turístico desses estudos geológicos das construções históricas. 

A observação apurada destas geoformas pode evitar escândalos de gestão, como o que levou à pintura de uma ciclovia sobre pedras históricas na Ponta Negra. Entretanto, as possibilidades são amplas.

“Devemos expandir o nosso portfólio para que chegue nas autoridades e para que, com o tempo, edificações como o Teatro Amazonas tenham placas informativas. Essas placas poderiam informar a idade, de onde vieram essas rochas, qual sua importância histórica e seus registros. Aumentando, assim, a preservação e a conservação desses patrimônios”,

sugere Márcia.

*Estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

Livros produzidos no Amazonas ressaltam importância do estudo das culturas originárias e afro-brasileiras

Pesquisadores de diversas áreas do conhecimento participaram da elaboração das duas obras que visam ressaltar a importância dos ‘resgate’ destas culturas no ensino.

Os povos originários são aqueles que estavam presentes antes mesmo da colonização do Brasil, em 1500, não necessariamente ocupando os mesmos espaços daquela época, já que muitas etnias têm uma forma completamente peculiar de enxergar a territorialidade, as posses e o mundo. Os Yanomami, por exemplo, enxergam a terra como sendo uma só, pertencente a todos. 

Essas culturas passaram por um processo de ‘apagamento’, uma desconsideração de suas culturas em prol da de seu colonizador. A colonização foi chamada de “descobrimento”, como se já não existissem seres humanos no território que hoje é denominado brasileiro.

Posteriormente, outros povos foram vítimas desse distanciamento cultural, em especial aqueles que eram trazidos à força do continente africano para que fossem escravizados. 

Em 2008, a lei de número 11.645 foi estabelecida, modificando duas leis anteriores, para incluir a obrigatoriedade da temática “história e cultura afro-brasileira e indígena” no currículo oficial da rede de ensino nacional, buscando resgatar a importância destes povos na formação da educação do brasileiro – dentre as populações mais miscigenadas do mundo – que deve compreender sua origens por diferentes perspectivas etnoculturais. 

Pensando nesses aspectos e atendendo a legislação vigente, dois livros foram produzidos na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) e participação de inúmeros pesquisadores, os volumes ‘Literatura Indígena: Práticas Leitoras para a Sala de Aula’ e ‘ Leituras Africanas e Literatura Afro-Brasileira: Práticas Leitoras para a Sala de Aula’. 

O Portal Amazônia conversou com Adriana Cristina Aguiar Rodrigues, coordenadora do projeto e professora do curso de língua e literatura portuguesa na Ufam, para compreender a importância do estudo destas culturas para a formação educacional brasileira.

Arte: Lucas Reis/Portal Amazônia

Culturas que formam a identidade brasileira 

A cultura brasileira é verdadeiramente ampla, única e miscigenada, com influências europeias, indígenas e africanas, principalmente. Estas últimas duas estão enraizadas nos costumes do povo brasileiro, mesmo que não seja de forma perceptível: dormir em redes, tomar banhos diários, a vestimenta utilizada, os pratos típicos. 

O brasileiro é fruto de experiências culturais diversas, muitas das quais foram apagadas no decorrer do tempo, muitas vezes até mesmo de forma intencional.

“Nossa perspectiva identitária contemplava, até certo ponto, apenas as contribuições europeias portuguesas, advindas da colonização, desconsiderando as contribuições advindas dos povos originários e dos povos africanos em situação de diáspora [separação de um povo por conta de um preconceito, ou perseguição política e etnocultural]”,

explica a professora.

Este projeto surge, então, não apenas para atender as leis que foram instituídas, mas visando as demandas das próprias comunidades indígenas, fundamentalmente as da Amazônia, já que diversos estudantes dessas etnias não percebem a representação de suas culturas em sala de aula. Demandas essas que, segundo a coordenadora do livro, “vem desaguar em diversos documentos que requerem uma reformulação dos modos como a gente vem ensinando, olhando e se relacionando com essas culturas”.

Cristina ressalta ainda que esse estudo é de “necessidade urgente”, principalmente quando se considera que essas leis foram instituídas há cerca de 15 anos e que nesse período a sua instituição no ensino superior permanece deficitário e no ensino básico é praticamente inexistente, apesar de ter melhorado, e muito, em relação ao que era antes, ainda existe a necessidade do cumprimento de práticas educacionais que deem mais destaque às culturas que passaram por este processo de apagamento. 

Sobre o projeto 

Os livros ‘Literatura Indígena:Práticas Leitoras para a Sala de Aula‘ e ‘Leituras Africanas e Literatura Afro-Brasileira: Práticas Leitoras para a Sala de Aula’, foram desenvolvidos com a participação de diversos pesquisadores, que trabalham os temas com focos de estudo diversos. 

Participaram de sua realização uma ampla equipe de professores e pesquisadores de universidades variadas e com escopos de estudo diferentes, contemplando antropologia, letras, dentre outras áreas do conhecimento.

*Estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

Amazônia na COP 28: o que será discutido sobre a maior floresta do mundo?

Protagonismo do Brasil, queda das áreas de desmatamento no bioma e ameaças provocadas pelas mudanças climáticas em nível global são alguns dos principais temas que devem ser abordados.

A COP, sigla em inglês que significa “Conferência das Partes”, é um evento anual com o objetivo de discutir ações efetivas para o controle das alterações climáticas no planeta, ocasionadas pelo ser humano. Participam desta conferência atores da sociedade civil, representantes governamentais, empresas privadas e pesquisadores das mais diversas áreas, principalmente relacionadas com climatologia.

A primeira COP foi realizada em 1995, e, desde então, 27 edições foram realizadas, salvo no ano de 2020, por conta da pandemia de Covid-19. A edição de 2023 é a COP 28, sediada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Com as alterações climáticas exorbitantes vistas ao redor do globo neste ano, a conferência pode ser uma das mais importantes já realizadas. 

Um dos pontos de destaque na Conferência é a participação do Brasil, pois seu posicionamento em relação à proteção ambiental sempre foi prevalente, principalmente quando se considera a riqueza dos biomas brasileiros e o fato do país contar com a maior floresta tropical do mundo, a Amazônia. 

Foto: Reprodução/Vinícius Mendonça – IBAMA 

Amazônia na COP 28 

A mudança do discurso governamental em relação a preservação ambiental demonstra saldo positivo em relação a diminuição de áreas desmatadas na Amazônia. Fica perceptível que, com cobranças mais sérias realizadas pelos órgão fiscalizadores, o Brasil caminha para retomar seu compromisso com o cumprimento da meta de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) assumida junto a Organização das Nações Unidas (ONU), de reduzir em 48% suas emissões até 2025, e 53% até 2030.

Segundo dados coletados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a Amazônia teve, no ano de 2023, uma queda de 33% de áreas em alerta de desmatamento. Apesar do fato a ser celebrado – e que deve contemplar os discursos do presidente Lula e de Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática -, as mudanças climáticas do planeta vem afetando o bioma de maneira alarmante. 

O período de estiagem da Bacia do Rio Amazonas, somada a fenômenos naturais como o El Ninõ e as mudanças climáticas ocasionadas pela ação antrópica, culminaram em um recorde de queimadas no estado do Amazonas no mês de outubro. 

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, tem destacado o papel de protagonismo do Brasil na preservação ambiental. Foto: Sandra Blaser/World Economic Forum

Dados estes fatos e, considerando o protagonismo que o país vem adotando em seus discursos em prol da conservação ambiental, representantes do Governo Brasileiro, em especial a ministra do Meio Ambiente, devem abordar estrategicamente: a necessidade da redução da emissão de gases do efeito estufa; a redução da utilização de combustíveis fósseis; e o firmamento de medidas mais expressivas para a adaptação mundial às severas alterações climáticas.  

“Estamos indo para a COP não é para ser cobrados, nem para ser subservientes, é para, altivamente, cobrarmos que medidas sejam tomadas, porque é isso que o Brasil tem feito”,

declarou Marina Silva ao participar de reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito das ONGs, no Senado Federal.

O governador do Amazonas, Wilson Lima, anunciou, também, medidas para a redução do desmatamento do bioma no Estado. Este anúncio ocorre na forma do Programa Amazonas 2030, que será apresentado na COP 28 e que visa alcançar um desmatamento líquido zero, ou seja, compensar cada área desmatada com o reflorestamento. 

Ademais, o projeto visa a arrecadação de 1 bilhão de reais para o financiamento das propostas presentes no documento, por meio da venda de créditos de carbono gerados a partir de reduções de emissões entre 2006-2015.

Outros Estados da Amazônia também já enviaram seus representantes para a COP 28, que teve início nesta quinta-feira (30) e segue até dia 12 de dezembro na Expo City, em Dubai.

*Estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

Streaming de produções independentes busca divulgar arte produzida na Amazônia para o mundo

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A plataforma SonoraPlay foi criada para dar visibilidade às produções artísticas da região amazônica, sejam musicais ou cinematográficas.

Os olhos do mundo estão voltados para a Amazônia, bioma rico em biodiversidade, contando com uma fauna e flora tão fascinantes quanto desconhecidas, com descobertas constantes realizadas por pesquisadores das mais diversas áreas. Entretanto, as riquezas da Amazônia não se resumem às naturais. As populações que se desenvolvem em torno desse bioma tem em seu cerne uma riqueza cultural diversa, tão rica e inexplorada quanto as maravilhas da floresta. 

Combinando aspectos diversos da miscigenação etnocultural dos povos habitantes desta região, produções culturais únicas surgem a todo momento, mas, muitas vezes, não alcançam a visibilidade que deveriam.

Ainda assim, artistas da região, das mais diversas áreas, continuam a fomentar em suas obras aspectos únicos, muitas vezes exuberantes e exóticos, adquiridos por meio da experiência de ser amazônida. 

Objetivando dar destaque a essas produções independentes da Amazônia, a empresa de conteúdo de entretenimento por streaming SonoraPlay foi fundada. Para compreender a importância deste projeto, o Portal Amazônia conversou com a empreendedora, musicista e CEO do projeto, Raquel Omena. 

O streaming está disponível nas mais variadas plataformas. Foto: Divulgação/SonoraPlay

Arte independente no coração da Amazônia 

Os problemas de projeção de artistas amazônidas são perceptíveis, segundo a empresária. Isso porque o “apagamento” cultural da região em cenário nacional não é recente. 

Tudo que é produzido fora da esfera sul-sudeste do Brasil é considerado como ‘arte regional’, como se esse escopo fosse intransponível, quase como se o que é produzido regionalmente não fosse essencialmente brasileiro, conforme análise da musicista. 

Segundo Raquel, até então, se um artista desejasse possuir relevância no mercado, primeiramente precisaria ser viabilizado no eixo Rio de Janeiro/São Paulo, mas ainda assim, pouquíssimos artistas conseguiram se destacar ou serem aceitos neste meio.

“Por que estamos há tanto tempo agindo dessa mesma forma, buscando através do eixo Rio-São Paulo esse reconhecimento, em vez de reunir nossas produções da região norte e colocá-las em visibilidade a apenas um clique de pessoas interessadas na Amazônia, não só no Brasil como no mundo? Já ficou claro que essa ‘cultura’ de ser visto primeiro pelo Sudeste para que o Brasil nos veja ou nos escute, além de nunca ter funcionado e nunca ter projetado nossos artistas, nos deixou sem cases de sucesso para utilizar uma fórmula validada e repeti-la ao longo dos anos com os talentos que surgem diariamente na nossa região”,

questiona a empreendedora.

“A caixa”, animação disponível no streaming. Imagem: Divulgação/SonoraPlay

Os artistas cada vez mais buscam outros meios de alavancar o alcance da sua arte, de poder sobreviver daquilo que produzem, e isso pode ser proporcionado por meio da tecnologia. O advento da internet possibilita que todo o conteúdo produzido esteja ‘a um clique de distância’. 

Raquel exemplifica esse fato citando a banda Carrapicho, que teve sua projeção inicialmente alcançada no mercado internacional, para só depois ser apreciada nacionalmente. “O sucesso começou na Europa, depois que chegou no Brasil”, lembra.

Streaming de produções independentes  

Inicialmente, conforme relata a CEO, o projeto objetivava contemplar apenas o cenário musical amazônida. No entanto, com a observação das necessidades dos artistas da região, ele foi se expandindo. 

Assim, buscando dar visibilidade ao projeto de artistas e cineastas amazônidas, a plataforma de streaming tinha como principais desafios a compilação dos conteúdos, a forma de se manter uma rentabilidade consistente e o incentivo aos artistas da região.

Raquel considerava a forma com que o lucro era distribuído por outras plataformas de streaming injustas, principalmente por se basearem na audiência e não na arte por trás do que é produzido. 

“Artistas são artistas e não necessariamente ‘digital influencers’. Esse modelo de monetização está matando produções criativas e talentosas, especialmente quando o artista é tímido e não se sente confortável em estar diariamente nas redes sociais buscando engajamento”,

afirma.

Show do artista de rap Kurt Sutil, gravado pela plataforma. Foto: Divulgação/SonoraPlay

Dessa forma, o empreendimento que oferece um serviço por assinatura passou a compartilhar 40% dos lucros líquidos vindos das assinaturas com todas as produções em cartaz. A plataforma, inicialmente idealizada apenas como musical, já conta com conteúdos dos mais diversos, que vão desde a gravação de shows até produções cinematográficas, em formato de curtas, filmes, animações e documentários.

“A gente tem como ‘core business’ [principal objetivo do negócio] entregar o que tem de melhor na produção audiovisual da Região Norte para o mundo inteiro e gerar renda para os nossos artistas e apesar de estarmos apenas começando, a gente espera que não só os artistas, mas também a população entenda a nossa causa e lute junto com a gente”,

conclui a empreendedora.

*Estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

Incentivo à empreendimentos amazônicos geram inovação em áreas cada vez mais diversas

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O mercado de trabalho em Manaus se moderniza cada vez mais, dando espaço para startups e negócios tradicionais coexistirem, mas se reinventarem.

O segmento empresarial passou por muitas inovações no decorrer das eras. Desde a célebre frase muito utilizada por Henry Ford, criador da marca de veículos Ford, “o cliente pode ter um carro da cor que quiser, desde que seja preto”, os empreendimentos passaram por diversos processos de modernização, inovação tecnológica e, claro, personalização de produtos conforme às necessidades e os anseios do consumidor (uma afronta direta ao criador do fordismo).

E, pensando cada vez mais nesses anseios e nas ‘dores’ dos consumidores, surgem empresas com maior capacidade inovadora, com o poder de revolucionar e trazer novas tecnologias que impactam diretamente na vida das pessoas.

Nesse contexto, a Secretaria Municipal do Trabalho, Empreendedorismo e Inovação (Semtepi) da cidade de Manaus, possui diversos projetos para apoiar e favorecer empreendedores que visem a especialização pessoal ou a criação de startups que levem essa força da inovação em sua proposta de realização.

“Fomentamos, principalmente as startups que são empresas inovadoras que desenvolvem soluções aplicadas a diversos segmentos econômicos. O PROINFE é uma legislação que concede incentivos fiscais que favorecem a criação e o fomento do Polo Digital de Manaus (PDM), destinado à instalação de startups, preferencialmente, no centro histórico de Manaus”, 

destaca Leonardo Rodrigo da Silva, diretor do departamento de planejamento e apoio ao empreendedor da Semtepi.

Foto: Reprodução/ Prefeitura de Manaus

Ideias e ideais 

Manaus, cidade com o maior polo industrial da América Latina, é lar de empresas tradicionais e startups que dividem espaço em busca de soluções que possam entender e resolver problemáticas, das mais gerais, como a locomoção, às mais específicas, como o mercado do entretenimento digital independente.

Comprovando o potencial dos empreendimentos na capital do Amazonas, um dos grandes exemplos é a cidade ter sido escolhida para abrigar a Campus Party Amazônia – realizada em outubro deste ano -, evento que gerou diversos cases de empreendedorismo atrelado a inovações tecnológicas em suas inúmeras palestras.

Dentre estes, dois despertaram bastante curiosidade: um barco voador e uma plataforma de streaming que trabalha com produções independentes na Amazônia. Ambos os empreendimentos demonstram a capacidade tecnológica que pode ser desenvolvida a partir da necessidade de adaptação.

‘Volitan’, o barco voador da Amazônia 

Um barco voador produzido no coração da Amazônia. Este é o projeto da empresa Aero River, que mais parece saído dos livros de ficção científica. Mas ele é real e já tem até um protótipo funcional.

Segundo Tulio Condé Duarte, cofundador da Aero River, o empreendimento surgiu com o objetivo de solucionar um grande problema da realidade amazônida: o da locomoção fluvial.

Volitan, o barco voador da Aero River. Foto: Reprodução/Aero River

Com municípios de difícil acesso em toda a Bacia Amazônica, o propósito do barco voador é oferecer uma solução de tecnologia de ponta que pode, além de facilitar a travessia de passageiros dentre os rios da Amazônia Legal, transportar mercadoria e matéria prima com maior velocidade.

“As grandes dificuldades logísticas da região amazônica são por conta do território muito distante e ausência de estrada, de infraestrutura. Hoje o que nós temos são os rios como estrutura, mas os transportes nos rios são muito lentos, principalmente por causa da resistência da água. Então temos, por exemplo, um barco regional que navega a 15 quilômetros por hora e uma lancha a jato que navega a uns 50 quilômetros por hora”, explica o cofundador da Aero River, sobre o que inspirou a criação do projeto.

 Streaming para produtores independentes 

Empresas de streaming voltadas para entretenimento são cada vez mais comuns. Aplicativos por assinatura que proporcionam acesso à uma infinidade de filmes, músicas, documentários, podcasts e tudo mais que se possa condensar. A gama de variedade deste mercado parece ser infinita. Visando utilizar esse mercado em ascensão como forma de fomento cultural de produção independente foi criado o ‘SonoraPlay’.

“O Sonoraplay é um projeto em constante evolução. A gente começou focando em música e com o tempo percebemos que ele podia abraçar também outras áreas do audiovisual e assim, passamos a trabalhar para criar uma plataforma de streaming voltada especialmente para incentivar, preservar e divulgar as riquezas audiovisuais da Amazônia”, relata Raquel Omena, CEO do SonoraPlay.

A empreendedora destaca que o projeto surgiu após a percepção da necessidade de projeção que o cenário artístico Amazônico possui, principalmente quando se considera a relevância da região na percepção mundial. Para ter relevância nacional e “furar a bolha”, os artistas precisavam primeiro buscar notoriedade no eixo sul-sudeste, em especial no Rio de Janeiro e em São Paulo. E é justamente esse processo que a plataforma visa encurtar.

“Por que estamos há tanto tempo agindo dessa mesma forma, buscando através do eixo Rio-São Paulo esse reconhecimento, em vez de reunir nossas produções da Região Norte e colocá-las em visibilidade a apenas um clique de pessoas interessadas na Amazônia, não só no Brasil como no mundo? Já ficou claro que essa ‘cultura’ de ser visto primeiro pelo Sudeste para que o Brasil nos veja ou nos escute, além de nunca ter funcionado, nunca projeta nossos artistas”, 

destaca Raquel.

Segundo a CEO, o “mundo está de olho na Amazônia” e por isso suas produções não devem depender da visibilidade de outras regiões.

O projeto que começou analógico ganhou escopo mais tecnológico por conta das necessidades, tanto do público quanto do próprio negócio. Trabalhando com gravação de shows, fomento de filmes, vídeos e documentários independentes, a necessidade de adaptação é constante. Atualmente a empresa está investindo na implementação de uma nova plataforma inteligente, com funcionalidades que podem ajudar os produtores que utilizam a plataforma, como o implemento de uma loja interativa e integrada. “Com essa função, artistas e produtores poderão gerar links e interações no próprio vídeo da produção”, explica Raquel.

Página inicial do serviço de Streaming SonoraPlay. Imagem: Reprodução/SonoraPlay

Empreendedorismo e inovação em Manaus

É com base em exemplos de empreendimentos cada vez mais ambiciosos como estes, que a cidade de Manaus é apoiada pelos projetos da Semtepi. Focada em inovação, empreendedorismo e trabalho, a secretaria oferece capacitação de empreendedores e trabalhadores, fomenta a criação de novas startups, organiza eventos que projetam a economia criativa da cidade e oferta empregos.

Qualquer um que queira se especializar pode aproveitar as mais variadas atividades ofertadas, segundo Leonardo Rodrigo da Silva, diretor do departamento de planejamento e apoio ao empreender.

Mais um exemplo desse incentivo é a ‘Inovathon’, realizada por meio da Semtepi e do Fundo Municipal de Empreendedorismo e Inovação (Fumipeq). Trata-se de uma competição de ideias, parte do edital ‘Mais Inovação’.

O evento realizado em meados de novembro foi executado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), com o propósito de criar um espaço propício para o desenvolvimento de soluções inovadoras, visando identificar problemas e construir soluções de interesse social por meio da inovação.

“Uma competição de ideias é um terreno fértil para a criatividade e a inovação florescer, além de proporcionar aos participantes um espaço público como o Casarão da Inovação Cassina, para compartilhar suas visões, desafiar os limites e transformar conceitos em soluções tangíveis. Eu não tenho dúvidas de que esses eventos podem fornecer uma plataforma de soluções para os desafios enfrentados em nossa cidade”, 

salientou o secretário da Semtepi, Radyr Júnior.

Durante três dias de imersão, os participantes tem acesso à mentores especialistas em soluções públicas para obter o melhor acompanhamento das atividades.

Sobre a Semtepi

A Secretaria Municipal do Trabalho, Empreendedorismo e Inovação (Semtepi) implementa políticas públicas que ofertam qualificação e capacitação profissional aos trabalhadores da área urbana e rural de Manaus, visando emprego e renda. A partir desse princípio, a Secretaria busca realizar ações voltadas para o segmento do Empreendedorismo, Economia Solidária e Criativa e Apoio ao Artesanato.

Projetos desenvolvidos em Manaus qualificam empreendedores e promovem startups

A Secretária Municipal do Trabalho, Empreendedorismo e Inovação (Semtepi) atua diretamente com a promoção e qualificação de empreendedores, negócios tradicionais e startups na capital amazonense.

Manaus, capital do Amazonas, é uma cidade conhecida como “porta de entrada” para visitantes do bioma amazônico, conhecida também por seu famoso centro histórico e por ter um dos polos industriais mais tecnológicos de toda a América Latina. Inúmeras multinacionais se concentram na Zona Franca (ZFM), de segmentos variados, indo desde eletrodomésticos até metalúrgicos.

Entretanto, outro tipo de modelo de negócio vem galgando espaço nos últimos anos: as startups, empreendimentos que nascem de ideias inovadoras, que visam solucionar uma problemática específica. Com elas, pequenos empreendedores conseguem alavancar ideias e propostas também para os mais variados segmentos.
E é em incentivo deste modelo de negócio que a Secretária Municipal do Trabalho, Empreendedorismo e Inovação (Semtepi) pauta parte primordial de suas funções.
Foto: Zona Franca de Manaus/Reprodução

De acordo com o diretor do Departamento de Planejamento e Apoio ao Empreendedor, Leonardo Rodrigo da Silva, a Semtepi atua em três pilares: trabalho, empreendedorismo e inovação. 

“No que compete ao trabalho, a Semtepi realiza a intermediação da mão de obra por meio do SINE Manaus, na captação e oferta de vagas de emprego. No empreendedorismo, a secretaria fomenta, por exemplo, atividades que incentivam a venda de produtos de artesanato, temos uma base de dados com mais de 1.300 artesãos cadastrados onde promovemos a participação deles em feiras e eventos onde a Semtepi atua. Na inovação, fomentamos principalmente as startups, que são empresas inovadoras que desenvolvem soluções aplicadas a diversos segmentos econômicos”, explica Silva.

O diretor destaca que o papel da secretaria se estende ainda à capacitação, voltada principalmente para o mercado de inovação, mas que também atende os negócios tradicionais, com atividades destinadas a qualquer pessoa que busque o aperfeiçoamento profissional.

“Um projeto interessante que está em execução é dos cursos na área da inovação que estão em andamento, por meio do Edital Mais Inovação. Esse edital oferta cinco cursos: Programação Básica, Introdução ao mercado de games, C-Level, Pré-aceleração de Startups e Inovathon”,

exemplifica o diretor.

Foto: Arquivo/Semcom

A secretaria visa, ainda, impactar diretamente em negócios tradicionais “promovendo e atendendo empreendedores de diversos segmentos com a entrega de kits para manicure, mecânico, costureira, vendedor de churrasquinho etc.”.

A busca por qualificação e o investimento em empresas que oferecem soluções criativas já é um tema discutido e fomentado na cidade, com a realização de grandes eventos como a Campus Party Amazônia – realizada pela primeira vez em outubro deste ano. O evento, realizado pela Gouvêa Experience, Instituto Campus Party (ICP) e Fundação Rede Amazônica (FRAM), foi uma ação de incentivo ao empreendedorismo e inovação.

Quanto ao incentivo à esses grandes eventos, Leonardo reitera os objetivos da Semtepi e convida:

“A Semtepi realiza e apoia a realização de diversos eventos que promovem e incentivam, não somente o empreendedorismo, mas também a inovação e a economia criativa. Na próxima semana estaremos co-realizando juntamente com a Associação Polo Digital de Manaus, a Expo Amazônia BIO&TIC, que tem por objetivo fomentar dois vetores econômicos em Manaus que é o da Bioeconomia e da Tecnologia da Informação e Comunicação, estaremos com uma programação em nosso estande com palestras, roda de conversas e apresentação de pitches de statups para uma banca de investidores”. 

Sobre a Semtepi 

A Secretaria Municipal do Trabalho, Empreendedorismo e Inovação (Semtepi) implementa políticas públicas que ofertam qualificação e capacitação profissional aos trabalhadores da área urbana e rural de Manaus, visando emprego e renda. A partir desse princípio, a Secretaria busca realizar ações voltadas para o segmento do Empreendedorismo, Economia Solidária e Criativa e Apoio ao Artesanato.

Saiba como são formadas as famosas “jacuzzis naturais” de Presidente Figueiredo

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Também chamadas de marmitas, panelas ou caldeirões, as formações geológicas são destaque em pontos turísticos como a Cachoeira do Mutum e as Corredeiras do Urubuí.

Panelas, caldeirões, marmitas, todas essas palavras remetem a utensílios de cozinha, mas nesse caso, são utilizadas para descrever uma ocorrência geológica popular entre os turistas que visitam Presidente Figueiredo, no Amazonas, município conhecido por suas cachoeiras exuberantes. 

Também chamadas popularmente de jacuzzis naturais, banheiras ou simplesmente ‘buracos’, estas geoformas podem ser observadas nos famosos pontos turísticos Corredeira do Urubuí e Cachoeira do Mutum, onde acabam sendo verdadeiros destaques por possibilitarem que os banhistas possam submergir nas ‘mini piscinas’. 
Para entender a ocorrência deste fenômeno, o Portal Amazônia conversou com a geóloga e pesquisadora Isabela Apoema, colaboradora do projeto Geoturismo na Amazônia, que visa divulgar pesquisas voltadas para a geodiversidade.
A Cachoeira do Mutum é famosa por suas ‘piscinas naturais’. Foto: Hanna Figueiredo/Acervo Pessoal

Nas duas corredeiras mais famosas com essas formações a denominação jacuzzis naturais ou piscinas naturais costumam ser mais utilizadas, justamente para dar destaque ao potencial turístico dessas ocorrências. Mas como essas circunferências são formadas, será influência dos mitos da região? Lar da Cobra Grande talvez?  

“Como se formam esses buracos? Bem, eles nada mais são do que a ação da água sobre o substrato rochoso [as rochas que ficam no fundo dos rios e igarapés]. A água vai passando por cima desse substrato, desagrega alguns sedimentos dessa rocha, que acabam fazendo parte do movimento turbilhonar da água. Assim, os sedimentos vão sobrescavando o substrato rochoso e acabam formando os buracos”,

explica a pesquisadora. 

Pesquisadores analisam as ‘marmitas’ na Corredeira das Lajes, em Presidente Figueiredo. Foto: Hanna Figueiredo/Acervo Pessoal

Ou seja, a força das correntezas retira sedimentos do ‘chão rochoso’, e esses sedimentos – fragmentos de rocha e seixo -, após serem acumulados, acabam sendo empurrados pelo movimento da água, que provoca um movimento circular nestas partículas. Assim, pouco a pouco cavam essas depressões geológicas que possuem um formato normalmente circular. Algumas, entretanto, possuem formas variadas: “podem ser também elípticas, podem ser ovais, podem ser poligonais”, segundo Isabela. 

Além da variedade em suas formas, as ‘marmitas’ também têm variação em sua profundidade, em que “umas possuem 30 centímetros, 50, mas vão até metros [como as que podem ser observadas na Cachoeira do Mutum]”. 

‘Marmitas’ em Presidente Figueiredo  

As marmitas de Presidente Figueiredo são formadas em rochas de arenito e podem ser encontradas principalmente em quatro principais localidades, elencadas pela geóloga, sendo elas “a Corredeira da Lages, a Corredeira do Urubuí, a Cachoeira da Princesinha do Urubuí e a Cachoeira do Mutum”.  

Confira as formações:

Cachoeira do Mutum

Corredeiras do Urubuí

 Corredeira das Lajes

Cachoeira Princesinha do Urubuí

*Estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

Mais de 8 mil hectares de Reserva Biológica no Amapá já foram consumidos por incêndios em novembro

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Os incêndios se concentram nas porções sudeste, noroeste e sudoeste. A Polícia Civil abriu investigação para apurar o caso e disse que há indícios de crime ambiental.

Mais de 8 mil hectares de vegetação da Reserva Biológica do Lago Piratuba, no leste do Amapá, já foram consumidos por três incêndios que atingem a área. Pelo menos 45 brigadistas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Renováveis (Ibama) atuam em uma nova linha de frente depois que as chamas ultrapassaram as trincheiras do último local onde os trabalhos estavam concentrados.

Os incêndios se concentram nas porções sudeste, noroeste e sudoeste – neste último onde as equipes estão. A Polícia Civil do Amapá abriu investigação para apurar o caso e disse que há indícios de crime ambiental.

Incêndio na Reserva Biológica do Lago Piratuba, no Leste do Amapá. Foto: Rafael Aleixo/G1 Amapá

A chefe da reserva, Patrícia Pinha, explicou que por conta de limitação de pessoal e de apoio aéreo, só conseguem combater um dos incêndios. 

“Hoje na reserva ocorrem três incêndios florestais de difícil controle e em localidades da reserva bem distintas. A gente tem um que estamos combatendo, que é esse na região sudoeste; um na região sudeste, que atinge florestas de mangue; e um outro incêndio na região noroeste. Os três têm grandes proporções”,

descreveu Pinha.

O fogo que passou pelas trincheiras aumentou de velocidade, de acordo com os dados monitorados pelo ICMBio. A base responsável pela reserva fica no município de Cutias, também no leste do Estado.

“A gente ‘tava’ fazendo o monitoramento. Ele [fogo] ‘tava’ avançando em média 300 metros por dia e essa era a nossa análise. Só que ele pegou uma área aberta e acabou que ele pegou uma velocidade muito maior e conseguiu avançar quatro quilômetros num dia. Então realmente o fogo nos venceu nessa, mas a gente fez uma nova logística e a gente estima que agora consiga vencer esse incêndio”, informou a analista ambiental do ICMBio, Dayane Pastana. 

Helicóptero da Marinha apoia na logística das equipes. Foto: Rafael Aleixo/G1 Amapá

A nova linha de defesa foi montada a cerca de 4 quilômetros da anterior e os trabalhos tiveram que recomeçar. Brigadistas indígenas do PrevFogo do Ibama foram de Oiapoque, no Extremo Norte do Amapá, ajudar nos combates.

“Eu vim juntamente com a minha equipe lá da aldeia do Manga, da Terra Indígena Uaçá, pra somar com eles. A gente tá acostumado pegar o incêndio superficial e aqui é outro clima e outro modo de trabalho. A gente tem orgulho do que a gente faz né, de proteger a natureza. E estamos aqui até o dia que for preciso”, disse o brigadista indígena Edson dos Santos Martins.

A reserva, que possui um total de 392.474,85 hectares, abrange os municípios de Amapá, Tartarugalzinho e Pracuúba, que ficam na Região dos Lagos.

A democratização da água limpa é uma missão complexa na Amazônia Peruana

Iniciativa quer construir casas ecológicas usando água da chuva e energia solar em áreas sem serviços básicos — realidade frequente na região

O bairro de Belén, na cidade de Iquitos, a norte do Peru, ganhou o apelido de “Veneza da Amazônia” porque palafitas amontoadas às margens do rio Itaya parecem flutuar à medida ele sobe ou desce. Mas seus moradores vivem uma relação conflituosa com esse rio, que, embora essencial à identidade e ao transporte local, traz o lixo de toda a cidade às suas portas.

O rio Itaya é um dos afluentes do Amazonas, que nasce nos Andes peruanos e é responsável por 20% da água doce que flui no planeta, o que coloca o Peru no oitavo lugar do ranking mundial em volume de água doce. Segundo a Autoridade Nacional de Águas, a bacia do Amazonas abriga mais de 97% da água doce disponível no país.

Casas de palafitas na margem do rio Itaya, no bairro Belén, em Iquitos, Peru, em 2022. O rio agora transborda com mais frequência na estação chuvosa. Foto: Karin Pezo/Alamy

Apesar dessa abundância, os moradores de Belén sofrem com problemas hídricos que se repetem no restante da Amazônia: sete em cada dez pessoas da região amazônica no continente — e, em alguns casos, nove em cada dez — não têm acesso a saneamento e água potável, segundo a organização britânica World Vision.

A crise climática também afeta a região: os rios agora enchem mais do que o usual na estação chuvosa e ficam mais secos no restante do ano. Recentemente, uma seca severa na Amazônia provocou o isolamento de comunidades em todo o continente e deixou, só no estado brasileiro do Amazonas, mais de 600 mil pessoas sem acesso a serviços básicos.

“É uma grande ironia”, diz João Diniz, diretor da divisão latino-americana e caribenha da World Vision. 

“As famílias que vivem na bacia hidrográfica do curso d’água mais importante da Terra não têm acesso à água limpa. Muitas crianças morrem de doenças infecciosas evitáveis e passam fome”.

Margens do bairro de Belén. Moradores não têm acesso a serviços de saneamento e água potável, e o rio Itaya leva resíduos de toda Iquitos até suas portas. Foto: Karin Pezo/Alamy

Urbanismo amazônico 

Em 2012, um incêndio destruiu cerca de 200 casas em Belén, o que forçou os governos nacional e local a realocar a população da parte baixa do bairro, nos anos seguintes, para a Nueva ciudad de Belén, a 12 quilômetros da cidade de Iquitos. Longe do rio Itaya, as pessoas realocadas não sofreram mais com as cheias e os resíduos que chegavam a suas portas.

A criação de Nueva Belén, em 2016, levou o Ministério da Habitação do Peru a lançar uma licitação para propostas de planejamento urbano, o que chamou a atenção da arquiteta Belén Desmaison, professora da Pontifícia Universidade Católica do Peru. “Estávamos muito interessados em abordar a arquitetura e o planejamento urbano pelo lado ambiental, considerando os impactos das mudanças climáticas na Amazônia”, afirmou ao Diálogo Chino.

“A Amazônia é muito versátil”, acrescenta Desmaison. “Os rios se movem, mudam de curso, o fluxo sobe e desce. Nos últimos anos, as secas têm sido mais persistentes. Temos que pensar nisso como um todo”. 

Protótipo de uma ‘treliça bioclimática expansível’ para armazenar água da chuva em uma residência ecológica que funciona de forma autônoma em relação às redes de água e energia, em San Tomás, perto de Iquitos. Foto: Casa-Pucp

Desmaison reuniu uma equipe interdisciplinar de instituições do Peru e Reino Unido para desenvolver o projeto Cidades Autossustentáveis Amazônicas (Casa). Desde 2018, o grupo trabalha com moradores de Nueva Belén para planejar uma comunidade com 2,5 mil casas ecológicas. O protótipo de moradia tem autonomia em relação às redes de eletricidade e água, já que um de seus principais itens é a “treliça bioclimática expansível”, que armazena água da chuva.

“Em vez de usarmos caixas d’água, o armazenamento é feito em tubos plásticos, e a casa gera sua própria energia [solar]”, explica Eliazar Ruiz, que mora em Nueva Belén e faz a manutenção do protótipo da casa ecológica. “Ela também tem um banheiro seco; é uma casa bem equipada e econômica”.

O protótipo de residências ecológicas oferece um espaço de uso comunitário, incluindo horta, local de reuniões, playground para as crianças e uma lavanderia comunitária. Foto:Casa-Pucp

O projeto-piloto inclui ainda uma cozinha planejada para reduzir a poluição e o risco de problemas respiratórios: uma churrasqueira é alimentada a energia solar; as janelas são projetadas para otimizar a circulação do ar; e os azulejos são feitos de barro amazônico adequado ao clima úmido.

Desde a criação do protótipo, a equipe do grupo Casa ganhou diversos prêmios de arquitetura e design na Ásia, na Europa e na América Latina. Porém, o desafio é fazer com que os governos adotem os protótipos onde eles são mais necessários: o projeto ainda depende de aprovação governamental para seguir adiante.

Enquanto isso, a realidade dos amazônidas é cada vez mais desafiadora. Nos últimos anos, as comunidades vêm enfrentando não apenas os efeitos das mudanças climáticas e o descarte insustentável de resíduos, como também os impactos da mineração e da exploração de petróleo. Kleber Espinoza, coordenador do Casa, acredita que tudo isso faz com que a população da Amazônia tenha cada vez mais “água de menor qualidade”. 

Equipe do projeto Casa constrói sistema de tratamento de esgoto para o projeto-piloto, que visa devolver ao rio as águas residuais já limpas. Foto: Casa-Pucp

Mais que um rio  

Nas últimas décadas, diversos projetos que buscam melhorar a qualidade de vida na Amazônia peruana foram financiados por empresas e instituições internacionais, como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Fundo das Nações Unidas para a Infância.

“Várias iniciativas privadas conseguiram garantir mais acesso à água para a população, mas a lacuna ainda é muito grande”, diz Sandra Ríos, diretora do escritório da Wildlife Conservation Society em Iquitos.

As soluções devem ir além da instalação de cozinhas, banheiros e encanamentos, acrescenta. Ríos diz haver um componente cultural na Amazônia que deve ser considerado para se ter sucesso nos projetos: “As pessoas gostam de consumir a água do rio, dos igarapés, e é complicado ir contra seus costumes. Reunir-se nesses lugares faz parte de suas vidas, é onde eles conversam, pescam, tomam banho e passam tempo juntos”.

Para Verónica Shibuya, do Centro Amazônico de Antropologia e Aplicação Prática, os povos amazônicos têm “uma conexão com a água, com seus seres espirituais”. 

“As pessoas gostam de consumir a água do rio, dos igarapés, e é complicado ir contra seus costumes. Reunir-se nesses lugares faz parte de suas vidas, é onde eles conversam, pescam, tomam banho e passam tempo juntos”,

diz Sandra Ríos, diretora do escritório da Wildlife Conservation Society em Iquitos.

Ríos cresceu dessa forma, mas hoje entende que é preciso adaptar algumas tradições. “Quando éramos crianças, costumava-se dizer que tomar banho com água da chuva fazia seus ossos doerem — e doía mesmo, doía de verdade”, lembra. “Mas precisamos nos adaptar. Mesmo que digam que [a água da chuva] tem um sabor diferente ou propriedades curativas, temos que promover um melhor uso da água”. 

Soluções hídricas autossustentáveis

Enquanto sua treliça bioclimática aguarda as aprovações necessárias das autoridades, o projeto Casa já trabalha em outros protótipos que tentam sanar problemas na Amazônia peruana, como o de uma alternativa autossustentável para o tratamento de água.

“É uma pequena balsa, que poderá viajar para outras partes da floresta e tratar a água para as populações ribeirinhas poderem usá-la”, explica Kleber Espinoza.

Mas a arquiteta Belén Desmaison sabe que esse protótipo — e o próprio Casa — só será eficaz se houver vontade política para implementá-lo e atenção aos costumes locais: “Temos de estar abertos para ouvir e aprender. Precisamos entender a história, ver como as populações da Amazônia têm crescido. Se não dedicarmos tempo para fazer isso, nenhum projeto será bem-sucedido”.

Esta reportagem foi produzida com o apoio de Voces Climáticas, iniciativa do International Development Research Centre, LatinClima, Tropical Science Centre, Claves 21, Climate and Development Knowledge Network e Fundación Futuro Latinoamericano.

*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Diálogo Chino, escrito por Jack Lo Lau.