A espécie conhecida como ‘Perema-do-Pará’ possui coloração amarelo queimado no peitoral que a diferencia das outras espécies antes já descritas.
Atualmente em toda a Amazônia existem 21 espécies de tartarugas (tracajás, jabutis) de água doce já descritos. Recentemente um estudo registrou um novo quelônio com características inusitadas. A Perema-do-Pará (Mesoclemmys sabiniparaensis) foi encontrada no município de São Geraldo do Araguaia, no sudeste do Pará.
Os primeiros registros foram nos igarapés da Unidade de Conservação (UC) do Parque Estadual Martírio Serra das Andorinhas. Essa região é conhecida como ‘Arco do Desmatamento’, por ser uma das áreas com maior alteração da paisagem natural.
A pesquisa iniciou em 2018 e foi conduzida pela Universidade Federal do Pará (UFPA), em quatro anos o estudo foi coordenado pelo biólogo especialista em répteis Fábio Cunha. Pensando nisso, o Portal Amazônia conversou com o herpetólogo para entendermos mais sobre as características identificadas na nova espécie.
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A inspiração para a pesquisa surgiu a partir de uma visita dos pesquisadores a coleção de Herpetologia do Museu Emílio Goeldi (MPEG), considerado o maior acervo da região amazônica, abrigando cerca de 100 mil espécimes de anfíbios e répteis. A Perema-do-Pará (Mesoclemmys sabiniparaensis) foi batizada com o nome científico sabiniparaensis como uma forma de homenagem ao norte-americano Andrew Sabin, por ser considerado um dos símbolos na proteção de tartarugas, primatas e fauna mundial. Por outro lado, o nome também é uma homenagem ao estado do Pará, onde a espécie foi encontrada.
“No momento em que eu tive o contato visual com os indivíduos, já tinha a certeza de que se tratava de uma espécie nova, a 21ª espécie de tartaruga da Amazônia. Algo muito característico nessa espécie é a cabeça pequena, proporcional ao corpo, em formato triangular. O que mais chama atenção é que toda a parte superior, tanto da carapaça (casco) quanto todas as partes moles, ou seja parte dorsal, é marrom enegrecida e a parte inferior é amarelo queimado. É um padrão em que todos os indivíduos compartilham, se tornando diferente das outras espécies já descritas”, declarou o herpetólogo.
“Existe uma fisiologia própria para a descrição científica de uma nova espécie. O primeiro passo é encontrar o animal que se acredita ser uma nova espécie, nesse caso eu já sabia de cara porque são poucas espécies. Depois é necessário ir a campo, coletar indivíduos e realizar o processo de medidas, descrição anatômica e morfológica. Depois é feita comparação com as espécies já descritas pela ciência. Na pesquisa fiz uma análise descritiva atômica e molecular que é o sequenciamento do DNA da espécie em comparação com os que já estavam descritas no banco de dados público”, esclareceu o pesquisador.
A tartaruga foi encontrada no sudeste do estado do Pará, no ‘Arco do Desmatamento’, área historicamente conhecida pelo acelerado processo de degradação ambiental, devido à alteração da paisagem natural causada por atividades humanas como agropecuária, mineração, queimadas e pastagens. O processo de pesquisa nessa região durou cerca de 4 anos. A nova espécie habita em regiões da unidade de conservação do Parque Estadual Serra das Andorinhas.
“O próximo passo da pesquisa é a gente conhecer mais sobre a distribuição, história natural do indivíduo, da espécie, área de uso, área de vida, modo reprodutivo, período reprodutivo. A gente vai voltar para lá pra trabalhar ainda no Parque Estadual Serra das Andorinhas, mas provavelmente devem existir esses quelônio em outras localidades e municípios”, explicou Fábio.
Novas espécies de tartarugas
Com o avanço de pesquisas e divulgação científica, existem registros que comprovam a possível existência de novas espécies de quelônio, que ainda não foram descritas.
“O Brasil hoje é o terceiro país do mundo em diversidade de tartaruga, há muito mais espécies a serem estudadas para de fato definirmos a espécie, recategorizar, descobrir novas espécies e também quem sabe que algumas deixem de existir. Por exemplo, em 2019 eu publiquei um trabalho que acabou com o conflito taxonômico que durava no mínimo 20 anos, e assim uma espécie deixou de existir por que eu sinalizei ela como uma que já estava descrita”, concluiu o herpetólogo.
O artigo científico de descrição da nova espécie foi publicado na revista científica Chelonian Conservation and Biology. O estudo foi liderado pelo biólogo Fábio Andrew Gomes Cunha, da Universidade Federal do Pará, do Núcleo de Ecologia Aquática e Pesca da Amazônia, juntamente com pesquisadores da UFPA e pesquisadores dos Estados Unidos.