Revelado em 2016, o Grande Sistema de Recifes do Amazonas (GARS) fica em uma profundidade entre 70 a 220 metros, com uma extensão de 56 mil quilômetros quadrados.
Revelado em 2016, há 100 metros da foz do rio Amazonas, pesquisadores encontraram um recife de corais, na região onde o rio encontra o mar. Os Corais da Amazônia, como são chamados, estendem-se da Guiana Francesa até o Estado do Maranhão, formando o Grande Sistema de Recifes do Amazonas (GARS).
A descoberta foi considerada uma das mais importantes da biologia marinha na última década. A existência desses corais foi revelada na revista Science Advances, com um estudo assinado por 39 pesquisadores de 12 instituições brasileiras e internacionais. Para encontrarem, os cientistas tiveram que realizar três expedições pela costa norte do Brasil entre 2010 e 2014, com apoio da Marinha brasileira, onde puderam coletar amostras de corais, esponjas e rodolitos.
A maioria dos recifes ocorrem em águas rasas, onde o sol fornece energia para que os corais cresçam, entretanto, este não é o caso, já que eles se localizam em uma profundidade entre 70 a 220 metros nas águas barrentas do rio. Algumas regiões até recebem apenas um feixe de luz. Assim, eles possuem uma ótima adaptação, devido a área em que a água doce e a salgada se misturam.
Os cientistas acreditam que os recifes formam um corredor ecológico de biodiversidade entre o Caribe e o Atlântico Sul. Um dos motivos para levantarem essa tese é que já foram encontrados ali tanto espécies de peixes que são originários do sul do oceano Atlântico quanto do Caribe.
O recife muda de características de acordo com a água do rio ao longo de sua extensão. No setor norte, próximo à Guiana Francesa, por exemplo, há maior concentração de sedimentos do Amazonas e menos luz no fundo do mar. Já no setor sul, próximo ao Maranhão, onde os sedimentos quase não chegam, a paisagem submarina é mais parecida com a de outros recifes tradicionais do Nordeste, predominando os corais e as algas moles, que fazem fotossíntese.
Historicamente, os resultados indicam que os recifes começaram a se formar no setor norte do GARS (o mais escuro atualmente, por conta da pluma de sedimentos do Amazonas, que flui principalmente naquela direção), entre 14 mil e 12 mil anos atrás. Depois, pararam de crescer por um período de 5 mil anos, em que o nível do mar subiu rapidamente, intensificando os efeitos da pluma. A partir de 7 mil anos atrás, em condições mais favoráveis, voltaram a crescer e começaram a se espalhar para o sul, até atingir sua configuração atual.
Uma animação da Nasa, baseada em imagens de satélite da missão SMAP, mostra os deslocamentos da pluma de água doce do Rio Amazonas (em azul) ao longo de três anos (2015-2018). Quanto mais azul a cor, menor a salinidade da água.
Poucos estudos foram realizados nos Corais da Amazônia. Os cientistas estimam que apenas 5% desse grande sistema foi investigado cientificamente até agora. Até então, foram registradas cerca de 200 espécies que povoam a área, sendo elas: 40 espécies de corais, 60 de esponjas e mais de 73 tipos de peixes que habitam recifes, como lagostas e estrelas do mar. Em 2018, uma equipe do Greenpeace realizou uma expedição junto com os cientistas, para registrar como os recifes são debaixo d’água.
Um estudo publicado por Fabiano Thompson, professor e pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que os recifes têm potencial para ser uma ‘farmácia submarina’, com bactérias que podem ser usadas no estudo e desenvolvimento de novos medicamentos. Além disso, o estudo mostrou também que a extensão do recife seria de 56 mil quilômetros quadrados, e não de 9,5 mil km², como inicialmente era estimado.
Saiba mais: Recifes de corais na Amazônia: uma potencial farmácia subaquática
Petróleo e a ameaça ao GARS
Um relatório publicado em setembro de 2017 pelo Greenpeace levantou a ameaça de empresas petrolíferas que tinham interesse na foz do rio Amazonas e que poderiam perfurar o fundo do mar, próximo aos corais.
Em maio de 2013, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) leiloou concessões de exploração de petróleo na bacia da foz do rio Amazonas. Essa bacia é parte de uma formação geológica chamada “margens equatoriais do norte do Brasil”, localizada ao longo da costa dos Estados do Amapá e do Pará.
Companhias petrolíferas, como a francesa Total e a britânica BP, adquiriram concessões de seis blocos para prospecção. O mais próximo fica a apenas 8 quilômetros dos Corais da Amazônia. Nesse bloco, o primeiro poço a ser explorado estaria a 28 quilômetros do sistema recifal.
Por conta da dificuldade de licenciamento ambiental dos poços não ter sido liberada, a Total acabou desistindo da área e vendeu suas participações para a Petrobras, que ainda mantém os planos de explorar os planos da foz do Amazonas.
Para evitar a degradação do corredor da biodiversidade, um Projeto de Lei apresentado pelo senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB) que atribuía o título de área de preservação permanente ao corredor de recifes. O PL 1.404/2019 determinaria que os corais da Amazônia, localizados no litoral do Pará e do Amapá, seriam considerados Área de Preservação Permanente (APP) nos termos da Lei 12.651, de 2012.
De acordo com essa lei, a APP é uma “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. O projeto também proibia quaisquer atividades que possam causar danos aos corais amazônicos.
Segundo o autor, o objetivo seria evitar que projetos de exploração de petróleo se desenvolvam na região. “Um derramamento de óleo das plataformas de petróleo causaria danos irreparáveis aos corais”, defendeu.
Mas, em 2021, a Câmara dos Deputados rejeitou o Projeto de Lei. Ao ser rejeitado, o deputado relator da comissão, Coronel Chrisóstomo (PSL-RO), argumentou que a administração pública, por meio do licenciamento ambiental, já “dispõe dos meios necessários para controlar o impacto ambiental da exploração dos recursos e das riquezas naturais da região, sem inviabilizar legítimas e necessárias atividades econômicas”.
Com a rejeição, o projeto foi arquivado e retirado pelo autor, a menos que haja recurso no Plenário.