Fantasias indígenas no carnaval: pode ou não pode? Especialistas opinam

Chegou fevereiro, chegou o carnaval. Entre as milhares de fantasias que tomam as ruas, cocares, pinturas e colares indígenas têm causado bastante barulho este ano nas redes sociais. A discussão foi aberta após a ativista e artista indígena Katú Mirim criar a campanha #índionãoéfantasia e publicar vídeo no qual defende a ideia de que o uso desses trajes é uma manifestação racista e ofensiva, por se apropriar da cultura dos povos indígenas.

Mas afinal, até que ponto usar fantasia de índio é ou não é ofensiva?

A comunicadora da Rádio Yande, Daiara Tukano, da etnia Tukano, explica que esse é um debate antigo. Ela comemora que a discussão tenha tomado grandes proporções no Brasil durante o carnaval.

“Não começou agora e não é uma discussão iniciada no Brasil. Hoje o mundo inteiro discute a apropriação cultural. Estados Unidos e Canadá são os países onde esse debate está mais avançado e iniciou com o questionamento sobre o uso de cocares e representação dos indígenas em times de futebol americano, por exemplo. Apesar de ver como problemático, como comunicadora vejo que o debate é válido. Que bom que a questão da apropriação cultural está sendo abertamente discutida e que bom que existem pessoas dispostas a levantar essa questão”, avalia.

Mas apesar avaliar positivamente o debate Daiara acredita que o uso de fantasias de índios pode transmitir uma imagem distorcida das comunidades tradicionais.

“Pessoalmente, acredito que o uso de fantasias de índios, não só no carnaval, mas é qualquer manifestação cultural é problemática. É problemática porque, na maioria dos casos, os indígenas são representados como selvagens e, muitas vezes, hipersexualizada pela sociedade dita “civilizada”. Nós, indígenas, não nos identificamos com essa imagem. O próprio termo índio ou indígena já nos remete à imagem dos colonizadores, que procuravam o caminho para as Índias há séculos atrás”, avalia.

A comunicadora defende um maior questionamento sobre de que forma o uso destas fantasias pode ser nocivo aos verdadeiros indígenas. “Não é um debate chato. Não somos contra a diversão. Todos têm o direito de se divertir, mas todos têm que estar conscientes também sobre a responsabilidade que está embutida com estereotipação dos indígenas”, critica.

Já o sociólogo e professor do departamento de Ciências sociais da Ufam, Marcelo Seráfico, relativiza a questão.

Ele reconhece que, no pior dos casos, o uso deste tipo de fantasia traz o debate positivo e importante acerca das representações e correntes na sociedade, sobre grupos sociais e culturais. Por outro lado, Seráfico acredita que deve-se avaliar a natureza do uso das fantasias, seja uma atitude jocosas, parte da brincadeira de carnaval, ou se trata de uma forma de menosprezo ao grupo representado nas fantasias.

“Fantasias são partes do folclore do país: boi, junino, tudo se incorpora, nesses contextos. São elementos da cultura popular em produtos da indústria cultural. O debate politico é necessário, mas tem que tem cuidado, para que não se caia em uma discussão superficial e de cunho moralista, em trono de proibir ou liberar esse tipo de manifestação. Quando se reduz a interpretação dos fenômenos a maniqueísmos, deixamos de entender o que há de substantivo delas”, pondera.

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