Espécie de macaco da Amazônia pode perder até 59% de habitat nos próximos 40 anos

De cabeça arredondada e pelagem escura, o macaco-barrigudo (Lagothrix cana), um dos maiores primatas da Amazônia, corre o risco de perder cerca de 59% de seu habitat até 2050 caso sigam altos os níveis de desmatamento, problema que, seguido da caça, mais ameaça a espécie.

 

A pesquisa que identificou esses dados demonstra que, já em 2002, 23% de seu habitat havia sido perdido. A espécie é classificada como “em perigo” pela lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) desde 2008. Distribuído nas florestas do Peru, Brasil e Bolívia, o macaco-barrigudo tem apenas 39% da área de distribuição protegida por unidades de conservação e terras indígenas demarcadas, constataram os pesquisadores.

Publicado pelo Imazon, o Boletim do Desmatamento (SAD) detectou altos índices de desmatamento na Amazônia Legal nos últimos meses. De agosto de 2018 a abril de 2019, foram perdidos 216.900 hectares de floresta.

Primata é considerado ‘vulnerável’ pela UICN. Foto: Anamélia Jesus/Instituto Mamirauá 

A situação atinge também as áreas protegidas. De acordo com dados do Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia Legal em Tempo Real (Deter), ferramenta do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) que fiscaliza ações de desmatamento, apenas nas duas primeiras quinzenas de maio desse ano foram 6.880 hectares de floresta preservada na Região Amazônica desmatados.

 

Nesse cenário, o estudo prevê uma perda de habitat para o barrigudo que pode variar de 39% a 59%. Os parâmetros utilizados para essas previsões foram as taxas de desmatamento, implementações previstas de novas rodovias e o baixo cumprimento de leis que exigem reservas florestais em terras privadas.

 

Para manter a população da espécie, defendem os pesquisadores, é necessário o fortalecimento e multiplicações de ações como a aplicação de reservas florestais, monitoradas através de um sistema de satélite, zoneamento agroecológico da terra e expansão do Programa de Áreas Protegidas da Região Amazônica.

 

Espécies similares melhoram estudos de previsão de ocorrência

 

Para realizar as previsões, os pesquisadores utilizaram dados anteriormente publicados de uma outra espécie de primata amazônico que é similar ao barrigudo, o macaco-aranha (Ateles chamek), também conhecido como coatá-de-cara-preta, e espécie com maior número de dados científicos sobre distribuição e hábitos.

 

“Depois de testarmos a diferença entre as variáveis ambientais que determinam a ocorrência dessas espécies, vimos que os requerimentos são muito similares e percebemos que podíamos usar a presença do macaco-aranha para prever a ocorrência do macaco-barrigudo, cuja quantidade de localizações com presença confirmadas era bem menor”, explica Anamélia Jesus, pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Biologia e Conservação de Primatas do Instituto Mamirauá, e uma das autoras do estudo.

 

Além da previsão de perda de habitat, a pesquisa também resultou na atualização da distribuição geográfica do macaco-barrigudo, informação crucial para ações que visam a conservação da espécie. “Novos registros de ocorrência do macaco-barrigudo sugerem um aumento na sua extensão de ocorrência na porção norte de sua distribuição”, atestam os pesquisadores. No entanto, a pesquisa indicou que a espécie ocupa apenas 23% da extensão de ocorrência do macaco-aranha.

 

Os autores sugerem que futuros estudos precisam investigar os mecanismos que permitem a coexistência desses primatas para avaliar os impactos da competição entre eles para sua conservação. Isto porque as duas espécies são predominantemente frugívoras e utilizam dos mesmos recursos para sua sobrevivência.

 

O trabalho intitulado “Previsão de distribuição e perda de habitat para o macaco-barrigudo (Lagothrix cana) e sua sobreposição de nicho com o coatá-de-cara-preta (Ateles chamek)” é parte da tese de doutorado do pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Thiago Cavalcante em coautoria com os pesquisadores da mesma instituição, Rafael Rabelo e Adrian Barnett, e os pesquisadores do Instituto Mamirauá Anamélia Jesus e João Valsecchi.

 

O trabalho será apresentado 16º Simpósio sobre Conservação e Manejo Participativo na Amazônia (Simcon), que acontece até o dia 5 de julho, na sede do Instituto Mamirauá, no município de Tefé, no Amazonas.

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