O Dicionário do Artesanato Indígena classifica o tipiti como um cesto de trançado que pode ter diferentes formas e tamanhos
A mandioca é uma das fontes de alimento mais antigas cultivadas na América do Sul. Variedade comum na região amazônica, a mandioca brava (Manihot esculenta ranz) é venenosa e passou por um processo de domesticação pelas populações indígenas até se tornar própria para o consumo. Para isso, foram criados diversos artefatos – entre eles, o tipiti, utilizado até hoje na secagem da massa de mandioca para a produção de farinha pelos povos tradicionais da Amazônia.
O Dicionário do Artesanato Indígena classifica o tipiti como um cesto de trançado que pode ter diferentes formas e tamanhos. De confecção engenhosa, o artefato serve para extrair o líquido da mandioca.
Como funciona
O tipiti é um cilindro de aproximadamente dois metros de comprimento cujas extremidades são reforçadas. Em um dos lados é colocada a massa de mandioca, prensada pelo objeto para extração do líquido – no caso da mandioca brava, um caldo amarelado e letal para o ser humano.
Esse líquido, entretanto, muitas vezes é aproveitado. Após a extração, é recolhido e fervido para elaboração do tucupi, caldo utilizado em pratos típicos da Amazônica, como o tacacá. A massa seca resultado do processo de extração é, então, transformada em farinha.
Pesquisa do PIBIC mapeia uso do tipiti na Amazônia
Com o objetivo de identificar a continuidade do uso dessa tecnologia na produção de farinha de mandioca na região do Médio Solimões, na Amazônia Central, o bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIBIC) do Instituto Mamirauá Fabiano Mendes está realizando o mapeamento das comunidades que fazem uso do artefato na Floresta Nacional de Tefé (FLONA), no Amazonas, e também das novas tecnologias utilizadas como substitutas ao tipiti.
“Essa pesquisa irá fazer um levantamento etnográfico da produção do tipiti para entendermos diversos aspectos, como a matéria prima é confeccionada, se é comercializado e qual o valor”, explica Felipe Pires, técnico do Programa Qualidade de Vida (PQV) e orientador do projeto.
A fonte entrevistada pelo bolsista, dona Irene, da comunidade São Francisco do Bauana, relatou que fabrica o artefato desde os 12 anos de idade. Aprendeu observando a avó.
O processo, explica dona Irene, tem três etapas. Primeiro, é necessário escolher a matéria prima. Na comunidade da artesã, o cipó arumã (Ischnosiphon sp) e a palmeira jacitara (Desmoncus polyacanthos) são utilizados para o trançado. A diferença entre as duas fibras é que o cipó arumã seca a massa mais rapidamente, mas dura menos.
Nesta etapa, constata a pesquisa, Irene conta com a colaboração dos filhos, marido e comadres. “[..] para poder tirar os cipós é preciso ter cuidado porque neles há espinhos, tanto nas talas verdes quanto nas talas maduras”, diz. Após a retirada do cipó, acontece a limpeza e o teçume das telas.
A comunitária afirma que 16 toras (o equivalente a cerca de 65 talas) de cipós é o necessário para fazer um tipiti de dois metros, considerado o tamanho ideal.
Manutenção da cultura material
Os trançados indígenas têm usos diversos na vida social das populações. As estruturas básicas, entretanto, exigem técnica com o uso das mãos, coordenação motora e imaginação do artesão.
“Os tipitis recebem denominações específicas para cada tipo de trama empregada. No caso desta pesquisa, foi possível elencar três tipos: teçume caminho de bicho; teçume boroari; teçume mata-mata”, relata o bolsista no Relatório Parcial da pesquisa intitulada “Tipiti: uma tecnologia secular dos agricultores da Amazônia”.
A pesquisa também investiga o a substituição do objeto por outras tecnologias, como a prensa. “Uma das ideias do trabalho é fortalecer a questão da cultura material do tipiti, uma vez que ele pode vir a ser completamente substituído por outras tecnologias”, afirma Felipe.
A pesquisa deve ser finalizada em julho, quando será apresentada no Seminário do Programa Institucional de Iniciação Científica (PIBIC) do Instituto Mamirauá.
Iniciação Científica no Instituto Mamirauá
Realizado há 15 anos no Instituto Mamirauá, organização social fomentada pelo Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) é um dos primeiros passos de centenas de jovens amazonenses que desejam ingressar no mundo da ciência. Desde a criação do programa, o instituto formou 390 estudantes, dos quais 42% ingressaram em programas de pós-graduação.