Milhares de exemplares da espécie migram da América do Norte para o Brasil após o período de reprodução.
Imagine a seguinte situação: Uma ilhota com cerca de cinco hectares abrigar cerca de 250 mil andorinhas-azuis (Progne subis), vindas da América do Norte, mais precisamente de regiões do leste dos Estados Unidos e do Canadá. É exatamente o que ocorre na Ilha de Comaru, em Iranduba, município de quase 50 mil habitantes a 30 quilômetros (km) de Manaus.
Esse fato tem instigado pesquisadores a estudar sobre o fenômeno que consiste, dentre outras coisas, num mecanismo de defesa e sobre a importância da preservação da ilha.
O Portal Amazônia conversou com o curador de aves do Intituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Mário Conh-Haft sobre a andorinha azul e essa ocorrência.
Em primeiro lugar, é importante saber que as andorinhas-azuis procriam na América do Norte e todos os anos voam no período de fevereiro à abril para o Brasil. Quando estão fora do período reprodutivo, como pontua Conh-Haft, tendem a procurar territórios grandes, comunais, para ficar juntas, formando bandos para realizar a migração para a América do Sul.
Nesse período, onde ocorre a cheia dos rios, a Ilha do Comaru fica completamente inundada, coberta pela enchente e apenas os topos das árvores ficam visíveis. E é nesse ambiente alagado que as andorinhas azuis escolhem para fazer de dormitório.
“A vegetação inundada praticamente elimina a chegada de predadores terrestres sejam domésticos ou silvestres, como gato-maracajá, onças, que poderiam estar caçando as andorinhas e que não resistiriam a uma aglomeração grande dessas aves. O fato de ser ilha, de ser separada de outras áreas de vegetação por grandes extensões de água aberta dificulta a chegada de bichos que podem nadar […] E os predadores aéreos de modo geral não vão penetrar a vegetação densa.”
explica Mário Conh-Haft.
O que torna a ilha tão especial?
Nada. É exatamente o que nos explica Mário. A Ilha de Comaru não é necessariamente melhor que outras ilhas. “Inclusive tem uma outra ilha próxima, a uns 4 km de distância, chamada Ilha do Papagaio, que ao longo de 15 anos era onde as andorinhas dormiam todas as noites nesse mesmo período”, ressalta.
O que acontece é que a ação humana provocada na região dessa outra ilha pode ter afastado a espécie. Mário lembra que moradores da região afirmam que a Ilha do Papagaio era muito utilizada para barcos atracarem e há relatos de pessoas que jogavam malhadeiras (redes para pescar) com o objetivo de capturar andorinhas para alimentação.
Preservação da Ilha
Nesse contexto, Mário Conh-Haft destaca que as andorinhas azuis tem total capacidade de escolher bons dormitórios.
“A preocupação principal é a ação humana. É necessário minimizar a atividade humana na ilha no período que as andorinhas estão lá. E também combater o desmatamento, se desmatar lá, o lugar não presta mais para as andorinhas. É preciso que as pessoas apreciem o espetáculo que é ver um quarto de milhão de andorinhas pousarem ao anoitecer num lugar desses no meio do rio, ver o pôr-do-sol clássico do rio negro e ainda uma nuvem de andorinhas absolutamente espetacular em volta, com consciência.”
por Autor
Ele evidencia que as andorinhas toleram bem pessoas que observam ao redor da ilha, sem invadir, e dá o exemplo de cientistas e pesquisadores de modo geral que vão estudar o local.
Declínio da espécie
Atraindo a atenção de pesquisadores pelo considerável declínio da espécie documentado nos últimos 50 anos, estudos recentes sugerem que as andorinhas se alimentam de libélulas que acumulam mercúrio devido à ações como garimpo ilegal e que esse mercúrio fica acumulado nas penas das aves, o que ocasiona na morte de indivíduos o que fortalece a hipótese da diminuição da ação humana no local no período que as espécies usam a Ilha de dormitório.
Estimam que quase 3 milhões de andorinhas-azuis devem dormir na ilha Comaru até o final de abril, quando voltam para o norte. Segundo Cohn-Haft, os 3 milhões correspondem a um terço da população mundial de andorinhas-azuis, estimada em 9 milhões.