O transporte escolar fluvial na Amazônia apresenta um aspecto muito forte de invisibilidade política e social.
A oferta do transporte escolar fluvial é um direito constitucional e efetivado por meio do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar –PNATE aos alunos da Educação Básica residentes em área rural no país. O problema que essa política pública deveria estar beneficiando alunos das escolas localizadas em área ribeirinha de Porto Velho e há cinco anos o serviço não é ofertado.
Com a excepcionalidade da pandemia da Covid-19 a situação se agravou ainda mais, apesar de medidas e ações judiciais empreendidas que não surtiram o efeito esperado pelas famílias e alunos ribeirinhos.
Quando se fala em transporte escolar fluvial o primeiro aspecto observado diz respeito à dimensão política, ou seja, a efetivação dessa política pública garantidora de cidadania e assegurada aos alunos residentes em área rural por meio da Constituição Federal de 1988.
Entretanto, o transporte escolar fluvial na Amazônia apresenta um aspecto muito forte de invisibilidade política e social. Será que faz parte do plano diretor das cidades? A partir dessa reflexão, é possível questionar: como pensar em alternativas eficientes, sustentáveis e a longo prazo para o transporte de alunos? É preciso promover debates junto à sociedade, especialmente nas comunidades ribeirinhas porque esse tipo de transporte deve fazer parte da agenda política como condição de participação dessa população tradicional.
Mais ainda, as distâncias são imensas e as dificuldades inumeráveis numa região com abismos de desigualdades sociais, as quais fazem com que muitos alunos vivam em permanente condição de vulnerabilidade.
Gerenciar o transporte escolar fluvial nessa vasta extensão territorial é um grande desafio, que necessita de estudos técnicos, planejamento, recursos financeiros e vontade política para resolver problemas violadores dos direitos humanos e perpetuadores de exclusões históricas e sociais.
A Amazônia, sob o ponto de vista macro, tem sua política de transporte escolar fluvial pouco prestigiada e os municípios apresentam dificuldades na realização de uma licitação, carecem de legislações específicas voltadas para esse segmento de transporte destinado exclusivamente aos alunos residentes no interior da Amazônia.
Percebe-se o quanto o aluno perde o interesse pelo estudo, a socialização fica prejudicada e o aprendizado enfraquece e isso impacta diretamente no desenvolvimento do ser humano. Nessa situação, não existe sociedade igualitária para muitos jovens e crianças ribeirinhas da Amazônia.
Contudo, o transporte escolar fluvial não tem tido a atenção merecida por parte dos representantes políticos e falta respeito aos alunos das escolas públicas localizadas em área ribeirinha.
Deve-se também considerar a diversidade de rios, desafios e obstáculos, ressaltando que nem todos os rios apresentam profundidades propícias ao tráfego de embarcações. Para cada rio deve ser previsto um tipo de embarcação, com potência de motor que atenda a geografia do lugar etc. Por que não envolver especialistas em engenharia naval para a construção de embarcações melhor adaptadas às especificidades da região?
A condição de vulnerabilidade persiste no estado de Rondônia quando inúmeros alunos não sabem mais como é a convivência no ambiente escolar porque não conseguem chegar às escolas em razão da falta do transporte escolar fluvial.
Mesmo após o retorno das aulas presenciais, o serviço de transporte escolar não foi normalizado e o problema persiste, mas até quando? Os pais, com alguma condição financeira, conseguiram trazer seus filhos para a área urbana da cidade, rompendo bruscamente essa relação do aluno com o espaço ribeirinho. Mas muitos pais não tiveram a mesma oportunidade e continuam esperando à margem de algum rio, lago ou igarapé o retorno do esperado transporte escolar fluvial.
Importante dizer que as consequências da falta do transporte escolar fluvial geram deficiências na aprendizagem, evasão escolar e abre caminhos para alunos atuarem em atividades ligadas à garimpagem de ouro, trabalho infantil e prostituição, considerando a vulnerabilidade socioeconômica existente no espaço ribeirinho.
Enquanto os alunos não conseguem chegar à escola vão vivendo nessa condição de desrespeito, fragilidade e invisibilidades. Espera-se que crianças e adolescentes tenham seus direitos sociais à educação garantidos. Que esta experiência de Olhar Amazônia possa ser multiplicada para a definição de campos possíveis de ação nas políticas públicas destinadas às populações ribeirinhas. Continue nos acompanhando e envie suas sugestões no e-mail: lucileydefeitosa@amazoniaribeirinha.com
Sobre a autora
Lucileyde Feitosa é professora, Pós-Doutora em Comunicação e Sociedade (Universidade do Minho/Portugal), Pós-Doutora em Geografia pela Universidade do Minho/Portugal, Doutora em Geografia/UFPR, Integrante do Movimento Jornalismo e Ciência na Amazônia e colunista do portalamaoznia.com e da Rádio CBN Amazônia/Porto Velho.
*O conteúdo é de responsabilidade do colunista