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Quinta, 25 Abril 2024

Sem transporte escolar fluvial, como pensar em sociedade igualitária?

A oferta do transporte escolar fluvial é um direito constitucional e efetivado por meio do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar –PNATE aos alunos da Educação Básica residentes em área rural no país. O problema que essa política pública deveria estar beneficiando alunos das escolas localizadas em área ribeirinha de Porto Velho e há cinco anos o serviço não é ofertado.

Com a excepcionalidade da pandemia da Covid-19 a situação se agravou ainda mais, apesar de medidas e ações judiciais empreendidas que não surtiram o efeito esperado pelas famílias e alunos ribeirinhos.

Quando se fala em transporte escolar fluvial o primeiro aspecto observado diz respeito à dimensão política, ou seja, a efetivação dessa política pública garantidora de cidadania e assegurada aos alunos residentes em área rural por meio da Constituição Federal de 1988.

Entretanto, o transporte escolar fluvial na Amazônia apresenta um aspecto muito forte de invisibilidade política e social. Será que faz parte do plano diretor das cidades? A partir dessa reflexão, é possível questionar: como pensar em alternativas eficientes, sustentáveis e a longo prazo para o transporte de alunos? É preciso promover debates junto à sociedade, especialmente nas comunidades ribeirinhas porque esse tipo de transporte deve fazer parte da agenda política como condição de participação dessa população tradicional.

Mais ainda, as distâncias são imensas e as dificuldades inumeráveis numa região com abismos de desigualdades sociais, as quais fazem com que muitos alunos vivam em permanente condição de vulnerabilidade.

Transporte escolar fluvial. Foto: Reprodução/Redes sociais

Gerenciar o transporte escolar fluvial nessa vasta extensão territorial é um grande desafio, que necessita de estudos técnicos, planejamento, recursos financeiros e vontade política para resolver problemas violadores dos direitos humanos e perpetuadores de exclusões históricas e sociais.

A Amazônia, sob o ponto de vista macro, tem sua política de transporte escolar fluvial pouco prestigiada e os municípios apresentam dificuldades na realização de uma licitação, carecem de legislações específicas voltadas para esse segmento de transporte destinado exclusivamente aos alunos residentes no interior da Amazônia.

Rio Madeira, 2022. Foto: Lucileyde Feitosa

Percebe-se o quanto o aluno perde o interesse pelo estudo, a socialização fica prejudicada e o aprendizado enfraquece e isso impacta diretamente no desenvolvimento do ser humano. Nessa situação, não existe sociedade igualitária para muitos jovens e crianças ribeirinhas da Amazônia.

Contudo, o transporte escolar fluvial não tem tido a atenção merecida por parte dos representantes políticos e falta respeito aos alunos das escolas públicas localizadas em área ribeirinha.

Protesto dos pais em frente ao prédio da SEDUC em Porto Velho, 2022. Foto: Reprodução/Redes sociais

Deve-se também considerar a diversidade de rios, desafios e obstáculos, ressaltando que nem todos os rios apresentam profundidades propícias ao tráfego de embarcações. Para cada rio deve ser previsto um tipo de embarcação, com potência de motor que atenda a geografia do lugar etc. Por que não envolver especialistas em engenharia naval para a construção de embarcações melhor adaptadas às especificidades da região?

A condição de vulnerabilidade persiste no estado de Rondônia quando inúmeros alunos não sabem mais como é a convivência no ambiente escolar porque não conseguem chegar às escolas em razão da falta do transporte escolar fluvial.

Mesmo após o retorno das aulas presenciais, o serviço de transporte escolar não foi normalizado e o problema persiste, mas até quando? Os pais, com alguma condição financeira, conseguiram trazer seus filhos para a área urbana da cidade, rompendo bruscamente essa relação do aluno com o espaço ribeirinho. Mas muitos pais não tiveram a mesma oportunidade e continuam esperando à margem de algum rio, lago ou igarapé o retorno do esperado transporte escolar fluvial.

Importante dizer que as consequências da falta do transporte escolar fluvial geram deficiências na aprendizagem, evasão escolar e abre caminhos para alunos atuarem em atividades ligadas à garimpagem de ouro, trabalho infantil e prostituição, considerando a vulnerabilidade socioeconômica existente no espaço ribeirinho.

Enquanto os alunos não conseguem chegar à escola vão vivendo nessa condição de desrespeito, fragilidade e invisibilidades. Espera-se que crianças e adolescentes tenham seus direitos sociais à educação garantidos. Que esta experiência de Olhar Amazônia possa ser multiplicada para a definição de campos possíveis de ação nas políticas públicas destinadas às populações ribeirinhas. Continue nos acompanhando e envie suas sugestões no e-mail:

Sobre a autora

Lucileyde Feitosa é professora, Pós-Doutora em Comunicação e Sociedade (Universidade do Minho/Portugal), Pós-Doutora em Geografia pela Universidade do Minho/Portugal, Doutora em Geografia/UFPR, Integrante do Movimento Jornalismo e Ciência na Amazônia e colunista do portalamaoznia.com e da Rádio CBN Amazônia/Porto Velho.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista 

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