É uma época de intenso calor, queimadas, cerração e insegurança na navegação.
O Madeira é o principal rio do estado de Rondônia, nem sempre apresenta profundidade propícia para o tráfego de embarcações. Está em formação e acidentes podem ocorrer na época da vazante, quando há a diminuição do nível das águas, resultando na estiagem e seca. É uma época de intenso calor, queimadas, cerração e insegurança na navegação.
Os profissionais da navegação ficam atentos ao surgimento desses obstáculos, procuram identificá-los para realizarem uma viagem com mais segurança. Por exemplo, no decorrer do dia torna-se fácil essa localização dada a visibilidade, mas à noite nem sempre é possível por conta de chuvas e neblinas, o que atrapalha muito o trabalho de um prático e/ou comandante de embarcação.
Na vazante, compreendida entre os meses de julho a outubro, aparecem os troncos de árvores, paliteiros, pedrais (afloramentos rochosos), praias extensas, estando nas proximidades dos barrancos e no canal do rio, dificultando a passagem de grandes embarcações e facilitando os encalhes.
- Praias: são extensas, surgem ao longo do rio Madeira e dificultam a navegação. Há dois tipos de praias: praias da vazante e arroto, essa última decorre de atividade garimpeira;
- Afloramentos rochosos, conhecidos popularmente como pedrais pelos profissionais da navegação, costumam aparecer na vazante, são fixos ao longo do rio, sendo mais fácil identificá-los e mapeá-los nessa época;
- Troncos, paliteiros: verdadeiras lanças que descem o rio Madeira, podem perfurar o casco de uma embarcação de madeira e contribuir para graves acidentes;
- Temporais: pancadas d’água que surgem repentinamente e podem causar acidentes porque a força dos ventos joga uma embarcação contra outra embarcação e até mesmo contra os pedrais;
- Os raios/relâmpagos: acompanham os temporais, causam danos às árvores queimando-as e podem causar mortes aos moradores e visitantes que insistem em viajar em canoa ou voadeira durante um temporal. Costumam ser violentos no espaço ribeirinho e o cuidado deve ser redobrado nessa época;
- Banzeiros: são marolas, surgem pela passagem dos ventos, temporais e ultrapassagens de embarcações. Um banzeiro poderá ameaçar a estabilidade de uma pequena embarcação, caso esteja muito carregada de passageiros ou mercadorias, assim como o temporal a estabilidade de uma grande embarcação;
- Excesso de cargas e passageiros: podem causar acidentes diversos, sendo necessária a intensificação da fiscalização por parte dos órgãos competentes, considerando ser a época dos balneários, locais de lazer da população ribeirinha e visitantes.
A navegação no rio Madeira costuma ser praticada durante o período diurno e noturno, ou seja, durante 24 horas. Na época da vazante costuma-se restringir ou proibir a navegação noturna para os comboios de balsas, por questões de segurança e salvaguarda da vida humana.
De Porto Velho a Manaus, o barco recreio leva em torno de três dias, descendo o rio, e na subida cinco dias quando a embarcação não apresenta nenhum problema. Na prática, leva-se em conta a potência do motor, condição climática, percurso escolhido e quantidade de carga e passageiros, sendo uma viagem que exige atenção por parte do comandante e prático, profissionais atuantes na embarcação.
Os barqueiros e práticos precisam conhecer e estudar o rio Madeira, considerando que é um rio em formação e os obstáculos são frequentes nas vazantes e cheias. Os práticos são os conhecedores desse espaço geográfico e orientam a respeito dos trechos difíceis e passagens perigosas.
Tais obstáculos devem ser conhecidos, divulgados e prevenidos por meio de campanhas educativas para os passageiros, sendo muito importante uma educação voltada à navegação no interior da Amazônia e que seja inserida nos currículos escolares. A escola pode sistematizar, trabalhar e valorizar os saberes locais essenciais à sobrevivência da população na Amazônia.
No último dia 9 de agosto ocorreu um acidente envolvendo uma balsa no rio Madeira que transportava alimentos (açúcar, óleo e ração para animais), os quais ficaram boiando até serem retirados do local. A carga transportada contava com cobertura de seguro, mas os transtornos acabam sendo imensuráveis.
Cada acidente no rio Madeira levanta uma série de questionamentos ligados à proteção da vida, da biodiversidade e integridade humana. E se fosse um acidente com derramamento de produtos inflamáveis? Que medidas seriam efetivamente adotadas? Há algum plano de contingência para a situação de riscos e desastres ambientais, de modo que a população ribeirinha tenha conhecimento?
E os passageiros, caso ocorra algum acidente, podem contar com algum tipo de cobertura de seguro? Como funcionaria a segurança da população na prática? Esses questionamentos devem ser respondidos pelos órgãos competentes e com a inserção da população ribeirinha nas discussões voltadas à navegação, de modo a assegurar uma navegação mais segura.
Há muito a ser feito para a melhoria das condições da navegabilidade na Amazônia, desde acessibilidade, com portos/atracadouros funcionais ao longo das comunidades ribeirinhas, passagens mais acessíveis, linhas de crédito para reforma e manutenção dos barcos de passageiros, sinalização dos trechos perigosos, campanhas educativas, entre outras.
Portanto, o fato de o rio Madeira ser “controlado”, no sentido do volume de água armazenada por meio de abertura ou fechamento de comportas das Usinas Hidrelétricas em Porto Velho. Com isso, observa-se na vazante o quanto a navegação fica prejudicada, impacta a população ribeirinha na diminuição da água, barrancos íngremes dificultando a acessibilidade, mobilidade, alimentação e segurança no transporte fluvial.
Que esta experiência de Olhar Amazônia com pertencimento e justiça social possa ser multiplicada para a definição de campos possíveis de ação nas políticas públicas destinadas às populações ribeirinhas. Continue nos acompanhando e envie suas sugestões no e-mail:
Lucileyde Feitosa
Professora, Pós-Doutoranda em Comunicação e Sociedade (Universidade do Minho/Portugal), Doutora em Geografia/UFPR, Integrante do Movimento Jornalismo e Ciência na Amazônia e colunista da Rádio CBN Amazônia/Porto Velho.