Entenda como funciona a urna eletrônica e porque o sistema brasileiro é seguro

Apesar dos recentes ataques, o sistema eletrônico de votação é auditável e tem a confiança de 64% dos brasileiros, segundo pesquisa.

Passados 25 anos da estreia das urnas eletrônicas nas eleições brasileiras, o uso dessas máquinas está novamente em pauta. A discussão foi puxada pelo presidente Jair Bolsonaro, que acusa o modelo de não ser confiável e alega que houve fraudes na votação de 2018, a mesma em que ele se elegeu.

Bolsonaro quer que, a partir da eleição presidencial de 2022, os números que cada eleitor digitar na urna eletrônica sejam impressos e que os papéis sejam depositados de forma automática numa urna de acrílico. A ideia dele é que, em caso de acusação de fraude no sistema eletrônico, os votos em papel possam ser apurados manualmente.

O tema já está no Congresso Nacional. Enquanto isso, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), responsável pela organização das votações brasileiras, refuta as acusações de vulnerabilidade do sistema eletrônico. Em nota, o TSE diz que utiliza o que há de mais moderno em tecnologia para garantir “a integridade, a confiabilidade, a transparência e a autenticidade do processo eleitoral”.

“Desde que foi adotada, em 1996, a urna eletrônica já contabiliza 13 eleições gerais e municipais, além de um grande número de consultas populares e pleitos comunitários, sempre de forma bem-sucedida, sem qualquer vestígio ou comprovação de fraude”

Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

Teste de segurança da urna eletrônica. Foto: Nelson Jr./TSE

A urna eletrônica foi adotada em algumas cidades nas eleições de 1996 e 1998, em caráter experimental. Dado o êxito dessas primeiras experiências, passou a ser utilizada nacionalmente e em definitivo nas eleições de 2000, deixando para trás o voto nas cédulas de papel.

Na época, comemoraram-se tanto a agilidade na divulgação do resultado (a apuração, que antes se arrastava por dias e até semanas, passou a ser concluída no mesmo dia da votação) quanto o fim das fraudes de longa data (como a introdução de cédulas extras nas urnas, a marcação posterior em votos originalmente em branco, eleitores votando no lugar de outros e a contagem enviesada dos votos).

A cada eleição que passa, o TSE reforça as camadas de segurança das urnas eletrônicas. Partidos políticos, órgãos do poder público e entidades da sociedade civil são de tempos em tempos convidados a acompanhar e fiscalizar a tecnologia. Especialistas em segurança da informação são chamados a tentar invadir o sistema. Caso se detecte alguma falha, os técnicos da Justiça Eleitoral a corrigem.

Diante da recente ofensiva contra as urnas eletrônicas, o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, deu início a uma campanha pública de esclarecimento sobre a segurança do sistema.

Nesta semana, Barroso participou de uma sessão temática no Plenário do Senado sobre a legislação eleitoral e disse que, ao contrário do que muitos supõem, os votos dados por meio da urna eletrônica são, sim, auditáveis – e “muitas vezes”, ressaltou. 

Para ele, trata-se de contradição dos defensores da impressão do voto:

O voto impresso sairia da mesma urna eletrônica que estaria sob suspeita. Portanto, quando se frauda o eletrônico, frauda-se também o impresso. É um paradoxo [duvidar do voto eletrônico, mas confiar no impresso]

Luís Roberto Barroso

O TSE aponta três grandes inconvenientes do voto impresso. O primeiro é que ele tem mais chances de ser fraudado do que o voto eletrônico, já que pessoas manusearão os papéis. O segundo é que, a cada dois anos, será necessário montar um grande esquema logístico para garantir o transporte e o armazenamento seguro dos votos dos 148 milhões de eleitores brasileiros. O terceiro é o risco de judicialização das eleições.

Isso significa que candidatos derrotados poderão alegar fraude na votação eletrônica e pedir a contagem dos votos impressos apenas para pôr em dúvida a legitimidade da vitória dos adversários e, assim, fragilizá-los politicamente. Na época do voto em cédulas de papel, isso era comum. Só no Rio Grande do Sul, por exemplo, foram apresentados mais de 8 mil recursos à Justiça Eleitoral nas eleições de 1994.

Em 2014, logo após perder a eleição presidencial para Dilma Rousseff (PT), o candidato Aécio Neves (PSDB) questionou a segurança da votação eletrônica e pediu uma auditoria do resultado. Depois da verificação, concluiu-se que não houve irregularidade. Mais tarde, num áudio gravado pelo empresário Joesley Batista, Aécio afirmou que o seu objetivo era apenas “encher o saco” da candidata vencedora.

Brasileiros confiam na urna

Uma pesquisa de opinião feita neste mês mostra que perto de 64% dos brasileiros afirmaram ter confiança elevada ou moderada nas urnas eletrônicas. Mesmo assim, 58% se disseram favoráveis à impressão do voto. A sondagem foi feita pelo Instituto MDA Pesquisa por encomenda da Confederação Nacional do Transporte (CNT).

Não é nova a tentativa de instituir o voto impresso. Nestes 25 anos de urna eletrônica, o Congresso Nacional aprovou três leis que tornaram obrigatória a impressão dos votos digitados no aparelho, nos mesmos moldes do modelo desejado pelo presidente Jair Bolsonaro. Todas elas, contudo, foram logo derrubadas.

A primeira lei foi aprovada em 2002. Nas eleições deste mesmo ano, a Justiça Eleitoral pôs em prática o voto impresso paralelo ao voto eletrônico, como teste, em apenas 150 cidades. O resultado foi negativo.

Nessas localidades, os eleitores precisaram ficar mais tempo diante da urna eletrônica, levando à formação de longas filas, já que era necessário conferir o papel emitido por ela após o voto. Em Brasília, houve seção eleitoral em que a votação só se encerrou na madrugada. No Rio de Janeiro, 60% dos eleitores foram embora sem nem olhar o voto impresso. Além disso, a impressora de muitas urnas enguiçou, levando ao voto em cédulas de papel. O TSE avaliou:

“A experiência demonstrou vários inconvenientes na utilização do denominado módulo impressor externo. Sua introdução no processo de votação nada agregou em termos de segurança ou transparência. Por outro lado, criou problemas. Na análise feita na reunião conjunta do Colégio de Presidentes e do Colégio de Corregedores da Justiça Eleitoral, concluiu-se ser imperativa a eliminação do voto impresso no processo de votação”.

Atendendo ao pedido da Justiça Eleitoral, o Congresso Nacional revogou a lei do voto impresso um ano depois da experiência de 2002.

As outras duas leis do voto impresso vieram em 2009 e 2015, mas foram invalidadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ao contrário da primeira, nenhuma delas chegou a sair do papel. Em ambos os casos, o mais alto tribunal do Brasil entendeu que a impressão do voto eletrônico era inconstitucional, pois colocaria em risco o sigilo do voto — uma das cláusulas pétreas da Constituição.

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