Especialista reforça potencial turístico da geologia do Centro Histórico de Manaus

O estudo das rochas que compõem construções como o Teatro Amazonas revela uma história própria e que deve ser preservada, segundo pesquisadora.

O que vem à mente quando se fala a respeito de geologia? Mineração? Talvez o estudo de rochas, pedras e montanhas? Bem, todos esses conceitos estão englobados nesta área do conhecimento, entretanto, este campo tem pesquisas com uma abrangência muito maior. 

A geologia urbana, por exemplo, analisa a utilização de rochas para a composição de estruturas arquitetônicas. Rochas estas que são capazes de contar histórias, revelar traços do passado de civilizações antigas, ou, em um contexto mais recente, revelar as origens de construções que compõem os centros históricos metropolitanos.

O Centro Histórico de Manaus, capital do Amazonas, é constituído por um rico contexto geológico, com rochas sendo utilizadas principalmente na construção de edificações amplamente conhecidas, como o Teatro Amazonas e a Igreja da Matriz, e na construção de muros, pavimentação das ruas, dentre outras utilidades. Até mesmo rochas que contém restos fossilizados foram utilizados nessas construções.

A Igreja da Matriz é uma construção que utiliza diversas rochas com contexto histórico. Foto: Eliana Nascimento/Acervo G1 Amazonas

Para compreender melhor a relação da geologia e do centro histórico de Manaus, o Portal Amazônia conversou com Márcia Carvalho de Oliveira, geóloga e mestranda em geociências na UFAM.

Geologia Urbana

A geologia está naturalmente localizada em ambientes “rurais”, seja na forma de montanhas, pedreiras, formações específicas, que ocorrem de maneira natural; minérios, dentre outros. Estas formações podem ser também utilizadas no contexto urbano, principalmente para construções, daí surge a área do conhecimento denominada ‘Geologia Urbana’.

“Temos a mania [geólogos] de dizer que a geologia é a forma de se desvendar o passado com o que se tem no presente”,

diz a geóloga. 

Pedras ornamentais encontradas no interior da Igreja da Matriz. Fotos: Márcia Carvalho de Oliveira/Acervo Pessoal

Ou seja, a utilização de um mineral específico é capaz de dizer muito sobre o processo de formação histórica de uma sociedade. A geologia está presente nos mais diferentes contextos dentro de uma cidade, “na fachada de shoppings, nas soleiras de portas, nos calçamentos do centro e nos seus edifícios…”, contendo histórias únicas sobre sua utilização nessas edificações.

Centro Histórico de Manaus 

A pesquisa de Márcia tem como principal enfoque a criação de um roteiro virtual com a forma tridimensional dos edifícios históricos que contém uma rocha específica, chamada de calcário de lioz. 

Entretanto, a pesquisadora afirma que já estuda o Centro Histórico de Manaus há muito tempo, e que sua riqueza geológica é facilmente identificada nas principais construções da cidade.

O próprio objeto de estudo da geóloga, o calcário de lioz, traz consigo o período áureo do ciclo da borracha em Manaus – que teve seu auge entre 1880 e 1910. Segundo explica a pesquisadora, esse tipo de rocha veio de Portugal, durante o período de abertura dos portos de Manaus para as nações aliadas, e foi utilizada em diversas construções que marcaram época na cidade. 

“Os edifícios do centro tiveram uma data para serem inaugurados, tiveram todo um projeto para serem construídos. Eles não foram simplesmente construídos porque precisavam de um Palácio da Justiça ou de um Teatro Amazonas [nos moldes em que foram idealizados]. Eles tiveram um sentido para estar ali. O ciclo da borracha influenciou muito nos elementos arquitetônicos e geológicos da cidade”, 

explica.

Imagem: Márcia Carvalho de Oliveira/Acervo Pessoal

A pesquisadora destaca ainda que o calcário é apenas uma das rochas ornamentais que enfeitam as construções históricas da cidade, e que a catalogação destas pedras tem um potencial turístico enorme, justamente pelas histórias que carregam consigo. 

Tomando o calcário de lioz, por exemplo, sua própria formação muitas vezes carrega fósseis diversos, que podem ser observados nas paredes dessas edificações, com um olhar mais atento.

“Essa rocha tem um conteúdo de fósseis, ou seja, impregnado nesta rocha existe toda uma classificação taxonômica do que pode ser encontrada. Além disso, ela é emblemática por poder ser encontrada no mundo inteiro. Portugal exportou a “pedra real portuguesa” para todas as suas colônias, sendo o Brasil uma delas”,

comenta.

Fósseis podem ser avistados na composição do calcário de lioz. Este está presente no Teatro Amazonas. Foto: Márcia Carvalho de Oliveira/Acervo Pessoal

Potencial turístico 

Por fim, a pesquisadora destaca a importância dos órgãos públicos observarem o potencial turístico desses estudos geológicos das construções históricas. 

A observação apurada destas geoformas pode evitar escândalos de gestão, como o que levou à pintura de uma ciclovia sobre pedras históricas na Ponta Negra. Entretanto, as possibilidades são amplas.

“Devemos expandir o nosso portfólio para que chegue nas autoridades e para que, com o tempo, edificações como o Teatro Amazonas tenham placas informativas. Essas placas poderiam informar a idade, de onde vieram essas rochas, qual sua importância histórica e seus registros. Aumentando, assim, a preservação e a conservação desses patrimônios”,

sugere Márcia.

*Estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

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