Aedes aegypti, o passageiro ‘invisível’ das navegações chegou de barco à Amazônia

[[podcasts]]MANAUS – Principal problema da saúde pública no Brasil, o Aedes aegypti chegou à região amazônica, possivelmente, pelas rotas de comércio do período colonial, por meio de barcos que atracavam nos portos das capitais dos estados do Norte do país. Por ser tipicamente doméstico e urbano, ao chegar à Região, o mosquito encontrou ambiente perfeito para sua sobrevivência e reprodução: cidades com problemas de saneamento, clima quente-úmido e chuvas abundantes. No Amazonas, o desembarque do Odioso do Egito – tradução literal do nome do mosquito – se deu no porto de Manaus.De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), o mosquito foi identificado pela primeira vez na capital amazonense em 1996, quando focos da espécie foram encontrados no bairro Praça 14 de Janeiro, na Zona Sul, e no bairro São José, na Zona Leste. Dois anos depois, em 1998, o Aedes aegypti provocou a primeira epidemia de dengue na cidade. Foram 13.873 casos registrados. Pouco tempo depois, todo o Amazonas estava infestado pelo mosquito. Segundo o Instituto, a infestação se deu por meio de barcos que partiam do porto de Manaus para o interior do Estado com os pneus de proteção lateral das embarcações tomados por larvas e ovos do Aedes.

Após a infestação de Manaus, em 1996, o Centro foi totalmente tomado. O Aedes estava em todos os pontos. No Porto, os barcos que vêm do interior e ficam até oito dias acumulam água nos pneus laterais, que servem para a defesa da embarcação. Então, os Aedes punham ovos e depois os ovos iam desenvolvendo dentro dos pneus, de tal forma que quando os barcos chegavam no interior, o Aedes voava e muitas das cidades foram infestadas”.  Vanderli Tadei, pesquisador do Inpa

Em visita ao Porto de Manaus, a reportagem constatou que, atualmente, a maior parte dos barcos mantém os pneus furados, conforme determinado após a epidemia ocorrida em 1998. No entanto, na área, há outros criadouros do mosquito, como copos descartáveis e garrafas pets.

O mosquito desembarcou no Brasil no período colonial, nos navios que traziam os escravos para o país. O primeiro relato de dengue foi em Curitiba, no Paraná. Em 1686, registrou-se a presença de Aedes aegypti na Bahia, causando epidemia de febre amarela (25.000 doentes e 900 óbitos). Entre 1897 e 1906, no Rio de Janeiro, capital do império na época, quase 40% dos 266.000 habitantes foram infectados e 4.000 pessoas, entre ingleses, portugueses e franceses, morreram por conta da epidemia da febre Amarela na cidade. A partir daí, a cidade passou a ser conhecida no resto do mundo como “túmulo dos estrangeiros” ou “porto sujo”.  

Como no Amazonas, a expansão do Aedes aegypti pelo mundo se deu por meio das navegações. Estudos apontam que o odioso começou a se espalhar desde o século XVI, pelas regiões tropicais e subtropicais da terra. Ele ‘pegou carona’ nas embarcações que buscavam expandir a colonização do planeta e o domínio sobre as terras recém-descobertas. E, em paralelo, por meio do comércio de produtos e tráfico de escravos.

O ponto de partida do Aedes para sua “expedição de passageiro dos mares” foi, primeiramente, a Costa Leste da África para as Américas, e depois, da Costa Oeste para a Ásia. Assim, historicamente, esse mosquito acompanha o homem em seus fluxos migratórios pelo planeta, sendo considerado, hoje, um mosquito cosmopolita, ou seja, presente em quase todo o mundo.

Odioso
Originário, provavelmente, da Região da Etiópia (África), o mosquito foi descrito cientificamente pela primeira vez no Egito, também na África, em 1762, quando foi designado inicialmente de Culex aegypti (mosquito egípcio). O gênero Aedes aegypti – Aedes, do grego (odioso/desagradável), e aegypti, do latim (do Egito) – foi catalogado somente em 1818. A partir de então, ele passou à denominação de Aedes aegypti (odioso do Egito).

O “odioso” é um mosquito pequeno, delgado e escuro, que tem hábitos diurnos e vive dentro ou nas proximidades das habitações urbanas. Possui grande capacidade adaptativa aos criadouros artificiais com água não poluída como lagos, poças e/ou em criadouros com água como garrafas, copos e pratos de plásticos, vasos, pneus velhos, dentre outros materiais jogados em quintais e em locais que possam acumular água.

De acordo o Inpa, a principal característica do A. aegypti está na resistência dos ovos, que sobrevivem a condições ambientais adversas. Segundo o pesquisador titular do Laboratório de Malária e Dengue do Instituto, Wanderli Tadei, os ovos do mosquito podem permanecer viáveis, capazes de originar mosquitos adultos , por mais de um ano e dois meses, apenas à espera de um contato com a água para eclodir e se tornar um mosquito adulto.

“Porém, a literatura já registrou que até com dois anos ainda nasce mosquito dos ovos que ficaram sem contato com água por esse longo período”, Wanderli Tadei, Pesquisador Inpa.

O período de vida do mosquito adulto varia de acordo com a região. Em áreas temperadas, ele vive cerca de um mês, enquanto que nas tropicais, essa expectativa de vida tende a reduzir aproximadamente uma ou duas semanas. O tempo transcorrido entre a eclosão do ovo e a forma adulta, em condições favoráveis, varia em torno de 10 dias.

Males
Outra característica do mosquito está no número de doenças que ele é capaz de transmitir. De acordo com o Instituto Evandro Chagas (IEC), que tem sede em Belém (PA), o Aedes aegypti é transmissor conhecido dos vírus Febre Amarela, Dengue, Chikungnya e Zika. Porém, segundo o Instituto, infecções artificiais (provocadas) detectaram que o mosquito também pode ser vetor de vários outros vírus. Dentre eles, o West Nile, Mayaro, Oropouche, Encefalite Eqüina Venezuelana, Sindbis, Tacaiuna, entre outros.

Na avaliação do Inpa, na Amazônia, as múltiplas possibilidades de transmissão dos vírus se dão pelo fato de a região ser considerada o maior reservatório de arbovírus – Vírus oriundos de artrópodes (mosquito) – do mundo.

Aproximadamente 186 tipos de arbovírus já foram identificados na região. Desse total, 157 foram isolados e descritos pela primeira vez no Brasil, 86 foram comprovados como tipos novos para a ciência e 34 estão associados a infecções humanas na Amazônia. Dentre os vírus, muitos são transmitidos por mosquitos e constituem sérios problemas global ou regional de saúde pública.Nos últimos dois anos, dois desses vírus têm chamado a atenção do mundo, o chikungunya – que significa aquele que se curva, devido às fortes dores nas articulações – e o Zika, que é capaz de causar Microcefalia em bebês e síndromes neurológicas, como a Síndrome de guillain-Barré, uma doença que ataca o sistema nervoso causando paralisia nos membros, incapacidade de respiração, podendo levar à morte, em casos graves.Em Manaus, até o dia 12, de maio de 2016 foram registrados 3.789 casos suspeitos de vírus da zika, sendo que 844 foram confirmados por laboratório, 1.627 foram descartados e 1.318 ainda estão em investigação. Do total de casos suspeitos, 755 foram em mulheres grávidas, com 180 confirmações, 301 casos descartados e 274 ainda em investigação. As informações são do último informe epidemiológico divulgado pela Secretaria Municipal de Saúde (Semsa). De acordo com a pasta, há 16 casos suspeitos de microcefalia na capital. Segundo a Semsa, até esta data apenas um  caso foi confirmada a transmissão por zika.

No mundo, a Febre Amarela foi primeira doença que se teve comprovação científica de transmissão pelo vetor, no ano de 1881. A descoberta foi feita pelo Dr. Carlos Juan Finlay, em Cuba, quando o médico levantou a hipótese de que a doença era causada por um germe que passava por transformações no organismo do mosquito, antes de infectar os seres humanos. A hipótese de Finlay, contudo, só foi confirmada cerca de vinte anos depois, por uma comissão militar liderada pelo médico norte-americano Walter Reed.Em 1930, quando o Brasil estava infestado pelo mosquito, o médico Araújo Lima, visando o combate do vetor, prescreveu:

Instrução e higiene. Educação e saneamento têm de ser os recursos transformadores de uma raça que se está desacreditando, à revelia da orientação e da assistência protetora, precisamente na idade de ouro da cultura da espécie”.

DOENÇAS TRANSMITIDAS PELO VETORFebre amarela: Primeira doença relacionada ao mosquito, no mundo, em que se teve comprovação científica. A descoberta ocorreu em 1881, feita pelo Dr. Carlos Juan Finlay, em Cuba. A febre amarela é uma doença infecciosa grave. Geralmente, as primeiras manifestações sintomáticas da doença como, febre alta, calafrios, cansaço, dor de cabeça, dor muscular, náuseas e vômitos,  são repentinas, duram cerca de três dias. A forma mais grave da doença é rara e costuma aparecer após um breve período de bem-estar (até dois dias), quando podem ocorrer insuficiências hepática e renal, icterícia – olhos e pele amarelados – manifestações hemorrágicas e cansaço intenso.http://redacao.portalamazonia.cworks.com.br/fileadmin/user_upload/acervo/Radar10/Sintomatologia-da-Febre_Amarela-arte-Radar_10-Manaus-Amazonas.jpgDengue: Doença descrita pela primeira vez no início do século 19, por conta de uma epidemia que ocorreu no Peru, com surtos no Caribe, Estados Unidos e Venezuela, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde. De origem espanhola, a palavra dengue significa “melindre”, “manha”, estado em que se encontra a pessoa contaminada pelo arbovírus , vírus oriundo dos artrópodos, dentre eles a fêmea do mosquito Aedes aegypti.

Atualmente, são reconhecidos quatro sorotipos imunologicamente distintos da Dengue, DENV1, DENV2, DENV3 e DENV4.Chikungunya
A primeira ocorrência da doença ocorreu na Tanzânia, em 1952. Sendo que, no final de 2013, houve o primeiro registro de transmissão pelo Aedes, no Caribe. Chikungunya, significa “aquele que se curva”, devido a aparência encurvada de pacientes que sofrem de artralgia intensa.Zika
O Zika é um vírus transmitido pelo Aedes aegypti que foi identificado pela primeira vez no Brasil em abril de 2015. Mas, o primeiro surto em humanos ocorreu em 2007 na Micronésia. O vírus Zika recebeu a mesma denominação do local de origem de sua identificação em 1947, após detecção em macacos sentinelas para monitoramento da febre amarela, na floresta Zika, em Uganda, no continente africano.Atualmente, Manaus conta com um Centro de Serviço de Referência Obstétrica (SRO) às gestantes com suspeita ou confirmação de ter contraído o vírus Zika. O centro de referência funciona na Unidade Básica de Saúde Nilton Lins, localizado na Avenida Professor Nilton Lins, n° 3259, Bloco D, Parque das Laranjeiras, Bairro Flores, Zona Centro-Sul. Além do SRO, a capital amazonense conta, também, com 15 Unidades de Retaguarda de atendimento a grávidas.http://redacao.portalamazonia.cworks.com.br/fileadmin/user_upload/acervo/Radar10/TABELA_COMPARATIVA_FINALIZADA.jpgO gráfico abaixo expõe o “trajeto” do Aedes Aegypti desde a sua descrição no Egito, até causar a primeira epidemia de Dengue, em Manaus.[[saiba_mais]]

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