Responsabilidade Social: Não é gomo de mexerica numa cabeça de alho

Responsabilidade implica em responder pelos nossos próprios atos e, também, pelos atos dos outros, ou ainda, pelas coisas confiadas a nós

Nos últimos anos, o tema da responsabilidade social das empresas transformou-se em um ativo importante, porém não necessariamente, por consequência de princípios e valores enraizados aos modelos de negócios adotados. Mas, sim, fruto de uma decisão de natureza puramente financeira para reforçar o caixa ou de uma “licença social” para operar sem muitas restrições, entre outras razões. Um desvio de rota que determinados fundos de investimentos já não deixam mais passar em branco.

A responsabilidade social das empresas nasce de princípios e valores dos seus fundadores e/ou acionistas que levam em conta critérios sociais, ambientais e de governança corporativa (ESG, sigla em inglês) capazes de atender “as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de prover suas próprias necessidades”, como bem definiu o relatório Brundtland, em 1987. Nesse sentido, a responsabilidade social não se confunde com a filantropia e, tão pouco, com as ações sociais pontuais, ainda que sejam percebidas como um gesto de solidariedade corporativa. E, muito menos ainda com as obrigações legais próprias, decorrentes de marcos regulatórios.

Divulgação/Leandro Santiago

Desgraçadamente, hoje em dia, tornou-se para algumas empresas apenas uma mera conta patrimonial do ativo circulante de suas demonstrações financeiras, resultado da venda de um suposto “produto social”, uma conta mais afeita a gestão do caixa e ao financiamento da empresa, resultado de operações estruturadas de capital, mas alheia a cultura empresarial e as pessoas que dão forma e vida aquilo que é oferecido a sociedade por parte da empresa. Tratada assim, a responsabilidade social, não passa de um passivo oneroso a ser pago pelas empresas, às custas do assalto do bem comum da sociedade.

Ao transformá-la num passivo oneroso, esquece-se, assim, da advertência ensinada pelo saudoso professor do IESE Business School, José Antonio Se garra, que nos dizia que “nenhum sistema social, econômico ou político pode funcionar corretamente sem valor e a generosidade dos indivíduos” e, isso, não se contabiliza numaDemonstração de Resultados, não se precifica. Ou melhor, não deveria precificar. A responsabilidade social é fruto do desenvolvimento moral de indivíduos que não dão às costas aos desafios impostos pela vida em sociedade e, encontram na cultura de algumas organizações, uma excelente oportunidade de viver uma unidade de vida coerente com os princípios e valores que trazem consigo desde suas casas.

Responsabilidade implica em responder pelos nossos próprios atos e, também, pelos atos dos outros, ou ainda, pelas coisas confiadas a nós, registram os dicionários. A definição nos implica por completo, nos faz sair de nosso mundo particular, a enxergarmos atos dos outros como parte interessada em suas consequências. Não nos são estranhos. Ao incluir ‘os atos dos outros’, na definição de responsabilidade, fica claro que nosso papel ultrapassa os muros das organizações e os seus interesses próprios, que inclusive são muitas vezes, indiferentes às duras realidades sociais e ambientais.

As terminologias mudam de tempos em tempos, mas não podemos ignorar que o tema está no modo de ser e agir, está na forma como as empresas servem a sociedade e, não se servem dela. Desta maneira, a responsabilidade social das empresas não é como um gomo de mexerica numa cabeça de alho que, apesar de apresentar um encaixe perfeito, lhe é estranho à sua natureza, à sua cultura organizacional.

Por Alecsandro Araujo de Souza Membro do Conselho Consultivo do Grupo Rede Amazônica e do Conselho Curador da Fundação Rede Amazônica

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