O Centro das Indústrias do Amazonas (CIEAM) anunciou, no início deste mês, a conclusão do estudo da Fundação Getúlio Vargas enfocando o modelo da Zona Franca de Manaus , seus impactos e efeitos sobre a economia do Amazonas. De acordo com o comunicado, “um custoso estudo acadêmico, profissional e privado patrocinado pelo CIEAM e um pool de associações e empresas privadas”, em relação ao qual o CIEAM espera “que este único e inédito trabalho responda e esclareça definitivamente questões importantes da região e que influencie em futuras, esperamos que acertadas, decisões tanto no governo estadual quanto no federal”. De suas conclusões, destaco: a) Em percentual dos gastos tributários totais do país, a ZFM caiu de 17,1%, em 2009, para 8,5%, em 2018; b) A arrecadação federal do Amazonas compensa, em parte, as renúncias da ZFM; c) Proporcionou a expansão da escolaridade na região; d) Melhoria da infraestrutura e nas condições de moradia da população.
O estudo, rico em demonstrativos econométricos sobre a política de incentivos fiscais, é de grande oportunidade neste momento particular do modelo ZFM. Do ponto de vista social, todavia, algumas das conclusões são quiméricas, não consentâneas com a realidade dos rincões povoados por hordas de invasões, que representam cerca de 60% da cidade de Manaus, e que que não cessam de crescer. De tal sorte que hoje a capital amazonense já se aproxima de 2,5 milhões de habitantes, quando, confortavelmente, não suportaria mais de um milhão. Estranhamente, ficaram fora da equipe de trabalho professores e pesquisadores de nossas universidades e centros de pesquisa, técnicos e especialistas em Zona Franca e desenvolvimento regional. De igual maneira, nas fontes bibliográficas não há citação de nenhum estudo local.
Ainda mais preocupante: os estudos foram concluídos omitindo, ao meu ver, aspectos de alta relevância em relação ao quadro conjuntural do modelo ZFM: os indicativos sobre soluções alternativas de como evoluir o PIM na perspectiva 2073. Caso não esteja enganado, sequer tocam no assunto. Isso, do meu ponto de vista é muito grave. Sobretudo para nós que aqui estamos, estudamos e discutimos publicamente ideias e soluções relacionadas ao futuro da ZFM e da própria economia do Amazonas. Salvo melhor juízo, a FGV, no que pese todo o respeito de que a instituição é merecedora, neste caso, porém, ficou devendo. Ressalto, por oportuno, que o IPEA, em 1995, quando era seu presidente o meu amigo Andrea Calabi publicou um trabalho riquíssimo em análises críticas e soluções técnicas no concernente aos pontos de estrangulamento identificados, do qual, suspeito, poucos recordam.
O trabalho do IPEA, foi editado em momento crítico da economia nacional, e da ZFM, em particular. Refiro-me à abertura da economia levada a cabo pelo Plano Collor e os fortes impactos negativos causados à nossa economia. O estudo do IPEA veio a ser validado por outro trabalho de especial relevância, elaborado pelo Núcleo de Estudo e Pesquisas do Senado, abril de 2013. O documento, à época, por haver colocado o dedo sobre alguns dos aspectos mais sensíveis e contundentes das fragilidades e inconsistências da ZFM, pelo realismo de suas avaliações, objetividade e pragmatismo das conclusões/recomendações oferecidas, foi, contudo, “queimado em praça pública”por “inteiramente inútil e depreciativo ao único modelo econômico que deu certo até hoje para o Amazonas”.
Naquele momento já havia fortes elementos indicativos de que o chamado “modelo ZFM”, nos termos originais do DL 288/67, caducara. Obrigatória, com efeito, a busca de soluções alternativas à fechada política de incentivos vigente. Governo e classes empresariais, contudo, não levaram na devida conta os diagnósticos e recomendações do IPEA e do Senado. E assim os documentos seguiram o caminho fácil do engavetamento, prática criminosa que corresponde à reação do avestruz de enfiar a cabeça na areia ao pressentir sinais de perigo à volta.