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Terça, 23 Abril 2024

"Partejar": prática milenar ajuda mulheres em locais de difícil acesso na Amazônia

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Acompanhar as fases de uma gestação e trazer uma nova vida ao mundo. Esse é o papel das parteiras. No passar das gerações, as parteiras (e parteiros) acompanham mulheres até no período pós parto, mas um dos fatores de maior importância desse ofício é que elas atende pessoas que moram em áreas rurais e distantes do atendimento dos serviços públicos de saúde.

Para mostrar o peso social desse trabalho, realizado em grande parte por mulheres, a Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu o dia 5 de maio como 'Dia Internacional das Parteiras'.

Portal Amazônia traçou o contexto histórico e a relevância desse trabalho na região amazônica. Cofira:

Foto: Amanda Lelis/Instituto Mamirauá

Contexto histórico 

No Brasil, no período colonial, além das indígenas, as mulheres africanas escravizadas serviram como parteiras no 'Novo Mundo'. Enquanto isso na Europa, o atendimento a gestantes começou a mudar no início do século XVII com a institucionalização das práticas médicas.

Os primeiros cursos de parto surgiram em 1832 em terras brasileiras. Anos depois, mesmo com a medicalização - em meados de 1970 -, o movimento pelo parto natural e humanizado voltou os holofotes às parteiras tradicionais. 

Região Norte 

De acordo com a Câmara dos Deputados, a Região Norte conta com 424 parteiras associadas sendo que 101 delas são indígenas e 43,87% delas não são alfabetizadas. Como muitas têm mais de 50 anos de idade, sofrem com dificuldades de locomoção, o que exige especificidades no atendimento às suas demandas.

Distante cerca de 46 quilômetros da capital amazonense, está situada a Vila de Paricatuba, no município de Iranduba, e nela há uma figura conhecida por quem busca ajuda na hora do parto: a dona Eliana da Cruz Pereira, de 59 anos, que além de parteira também é rezadeira.

Ela contou ao Portal Amazônia que muitas vezes, pela distância e falta de transportes mais efetivos, as grávidas não têm outra opção a não ser recorrer às parteiras da região.

"Eu faço massagens [na grávida], entendendo como 'tá' a criança. Escuto o batimento pelo pulso da pessoa, verifico se ela [a criança] 'tá' na posição normal, de cabeça pra baixo ou atravessada, e auxílio a mãe",

relatou.

Eliana afirma que acredita que "a prática de partejar" seja um dom dado por Deus. "Eu tive esse ensinamento de Deus, na prática, aquela coisa que nasceu já em mim", assegura.

Dados divulgados pela OMS em 2021 sugerem que se "as intervenções das parteiras alcançassem uma cobertura de 95% no mundo, seria possível evitar 67% dos óbitos maternos, 65% dos natimortos e 64% dos óbitos neonatais". A OMS alertou ainda que existe uma carência global de 900 mil parteiras.

O lema de 2023 da data comemorativa é 'Together again: from evidence to reality' (Juntas novamente: de evidência à realidade) e realça a importância da utilização da evidência científica na atividade profissional.

Nesse sentido, Eliana conta que é preciso ter cautela e analisar cada caso com cuidado, pois existem situações em que ela vê necessário levar a gestante para um hospital equipado, para que a mulher receba o atendimento qualificado.

"Em situações de muita dor e quando não consigo ajudar, a gente espera uns minutinhos e já leva pro hospital. Depois elas mandam áudio dizendo que deu tudo certo, sempre deu certo",

assegura a parteira.
Foto: Rafael Forte/Instituto Mamirauá

Eliana também trabalha como "puxadora" e benzedora em situações de acidentes, como em queda de motos, de árvores, aliando o conhecimento prático para ajudar as pessoas de sua comunidade. Todas são formas de cuidado tradicional comuns na região amazônica.

Documentário 

Para contar histórias e a força de mulheres que realizam atividades tradicionais e lutam para permanecerem vivas em meio a modernidade, o cineasta amazonense Anderson Mendes produziu o documentário 'Mulheres da terra' para contar a história de três mulheres que realizam o trabalho de parteiras, benzedeiras, rezadeiras e puxadoras.

Associação de parteiras no Amazonas 

Criada em 2018, a primeira e única Associação de Parteiras Tradicionais do Amazonas busca valorizar a profissão frente à crítica dos médicos e à falta de reconhecimento do poder público

Em áreas rurais da Amazônia, onde o acesso às comunidades é difícil, principalmente no período da seca, são elas que atuam na linha de frente, ajudando as gestantes onde os médicos não conseguem chegar com facilidade.

Em função da extensão do território, o Amazonas é um dos líderes em mortalidade materna no Brasil, de acordo com dados da OMS do ano passado, com uma taxa de 108,4 óbitos maternos. O contraste fica extremamente visível quando contrapondo com Santa Catarina, o de menor taxa, com 35,1 mortes.

Foto: Amanda Lelis/Instituto Mamirauá

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