Com o objetivo de fortalecer a agricultura e a medicina tradicional entre os povos indígenas, a Fundação Amazônia Sustentável (FAS), por meio do projeto Cunhã-Eta, capacitou 83 pessoas no período de julho a outubro, com três oficinas sobre os temas e realizadas nas regiões do Médio Rio Negro e Médio Solimões, no Amazonas, na comunidade Três Unidos, situada na Área de Proteção Ambiental (APA) do Rio Negro; aldeia Vasques, zona rural do município de Tefé; e aldeia Piloto, em Barcelos.
A ideia principal do projeto Cunhã-Eta, termo que pode ser traduzido como “rede de mulheres”, é promover o resgate da cultura agrícola, empoderando as mulheres indígenas do Amazonas. Com a consultoria de profissionais especializados, sob orientação da FAS, as oficinas foram realizadas com metodologia participativa. Dessa forma, o técnico que ministra a oficina apresenta o conhecimento científico absorvendo também as informações passadas pelos comunitários, criando, assim, um contexto de protagonismo para os indígenas que participaram da capacitação.
Além disso, como forma de avaliar a questão da segurança alimentar, os participantes preencheram questionários e fizeram a prática agrícola em campo para fortalecer o conhecimento adquirido. A FAS estima que o projeto colabore na melhoria e manejo de 15 hectares de sistemas agrícolas tradicionais nas localidades atendidas.
A supervisora da Agenda Indígena da FAS, Rosa dos Anjos, explica que o trabalho foi realizado em um momento difícil, com a perda de muitas lideranças importantes para a Covid-19. “Perdemos muito de nossa história, porém, esse projeto tem o objetivo de oferecer troca de conhecimentos e saberes tradicionais. Vivenciamos crianças e jovens valorizando, e querendo mesmo aprender com as bibliotecas vivas que têm em cada aldeia, que o projeto esteve. Participar desses momento foi simplesmente gratificante. Minha eterna gratidão a todos que compartilharam conhecimentos”, pontuou.
“As palestras foram muito boas. A aldeia recebeu essa oficina com muita esperança, pois aconteceu num momento em que realmente estávamos precisando. Foi durante a pandemia (do novo coronavírus), então nos trouxe esperança, alternativa de vida e renda para aldeia”, comentou a presidente da Associação Indígena de Barcelos (Asiba), Maria Fidelis, 42, do povo Baniwa. Segundo ela, a comunidade já está aplicando as novas técnicas adquiridas na agricultura, voltadas para produção de farinha, hortaliças, banana, cana, entre outras.
O líder da aldeia Vasques, situada em Tefé, Aldair Vasques, 37, do povo Kokama, ressalta que o projeto foi muito importante não só para a inclusão das mulheres, mas também para toda a população da região. “Tenho quase 20 anos de movimento indígena e vejo que isso (o projeto voltado para a agricultura) é muito bom, porque atinge também as áreas indígenas urbanizadas”, disse.
Após a realização das três oficinas em aldeias/comunidades distintas, a FAS organizou uma oficina final na comunidade Três Unidos, com integrantes das localidades que sediaram o projeto. Os participantes fizeram troca de experiências e oficina de sabores, onde cada comunidade mostrou seu prato típico.
Jovens
Entre as 54 mulheres e 29 homens que participaram das oficinas, muitos jovens e crianças também adquiriram conhecimentos tradicionais aliados às técnicas de sustentabilidade. Rodrigo Teixeira Barbosa, 21, foi um deles. “A gente lá (na aldeia) era esquecido, não era visto por muitas pessoas, éramos uma das aldeias perdidas. O projeto resgatou tanto a aldeia quanto trouxe novas possibilidades para os jovens”, disse Rodrigo, que é morador da Aldeia Piloto e pertence ao povo Baré.
Ele considera uma verdadeira revolução o resgate de costumes que estão sendo perdidos. “É uma honra estar representando os jovens indígenas. O projeto está sendo muito bom para mim e para outros jovens”, pontuou.
Outras ações
Durante o projeto, a Agenda Indígena da FAS aplicou um total de 30 questionários de saúde nas aldeias/comunidade. Os dados serão analisados e servirão de base para futuras ações. A agenda também elaborou um levantamento de um inventário de carbono em duas das localidades atendidas.
O cálculo de emissão de carbono serve para identificar as emissões de gases do efeito estufa (GEE) e reduzi-las. O dado permite melhorar gestão ambiental e energética.
Enfrentamento à Covid-19
Parte do recurso destinado para o Cunhã-Eta foi revertido para ações de enfrentamento à Covid-19 nas localidades atendidas pelo projeto. A FAS entregou kits de prevenção para os comunitários, com oxímetros digitais, termômetros, aparelhos medidores de pressão, medidores de glicemia, máscaras, álcool gel, além de testes rápidos para a equipe do projeto e todos os participantes da oficina final.
Rede de mulheres indígenas
O Cunhã-Eta é um projeto da FAS em parceria com a Rede de Mulheres Indígenas do Estado do Amazonas (Makira-Êta). O grupo foi criado em dezembro de 2017, em Manaus, com a participação de 40 mulheres indígenas de diversas organizações do Amazonas e com o apoio da União de Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB) e da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab Amazônia).
Nos últimos anos, as mulheres indígenas da Amazônia enfrentaram vários desafios em suas organizações, aldeias e comunidades. Foi o que as incentivou a organizarem ações para unir forças, principalmente para lutar por uma vida plena e o bem viver dos povos indígenas.
Nesse sentido, o objetivo da Makira-Êta é disseminar os saberes tradicionais como alternativa de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, visando promover a conservação dos recursos naturais, a produção de alimentos e a geração de renda através da implementação de atividades produtivas sustentáveis para recuperação de áreas degradadas em aldeias e comunidades indígenas do Amazonas.
O projeto é financiado pelo Fórum Internacional das Mulheres Indígenas (FIMI) e tem o apoio da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema).
Conheça mais sobre o projeto Cunhã-Eta: