O Efeito da Poesia


 Estátua de Fernando Pessoa no Café A Brasileira, no Chiado, Lisboa. Foto: Reprodução

O Guardador de Rebanhos
Alberto Caeiro

(…)

XXI

“Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento…
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural…
Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva…
O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica…
Assim é e assim seja…”
(…)

O Efeito da Poesia

Uma das maravilhas da poesia é o poder de nos fazer levitar, refletir, questionar… Esses versos, ao mesmo tempo em que soam puros, doces e ingênuos, aparecem carregados de questionamentos e atualidade.

Quando o poeta diz “É preciso de vez em quando ser infeliz para se poder ser natural…“ me lembra a superficialidade presente na vida moderna. De tão artificiais as pessoas já não se dão mais o direito de sofrer, de chorar, de fracassar.

Hoje esses sentimentos são condenados, repelidos e disfarçados. Em razão disso, os mais fracos precisam representar papéis, fingir eterna felicidade, aparecer sempre bem na foto. Sabemos que manter o sorriso constante, além de falso, é impossível. Somos seres humanos, e por isso sujeitos a altos e baixos, alegrias e tristezas.

O sofrimento também é importante, é ele que nos permite parar, olhar, refletir, mudar e melhorar. Vivenciar o luto faz parte do aperfeiçoamento da vida. E o luto não é só a morte física, pode ser qualquer acontecimento que contrarie nossa vontade.

Lidar bem com o fim é uma maneira de transformá-lo em começo, começo de uma nova fase que pode ser ainda melhor. Na maioria das vezes, só depende de nós fazer do problema um desafio, do desgosto uma oportunidade.

Dar valor a nós mesmos, a nossos anseios e sentimentos é muito mais importante do que dar satisfação para a sociedade.  Tentar ser o que não somos, o que nos cobram, o que os outros fingem ser, é um passaporte para a infelicidade. Sejamos nós mesmos e seremos verdadeiramente felizes.

O palhaço precisa estar sempre sorrindo para agradar e receber aplausos da plateia, é o seu papel. Mas nós não necessitamos ser como ele, temos condições fazer nossas escolhas, agir com liberdade e receber o melhor de todos os elogios, aquele que vem de dentro, do íntimo de cada um.

Saber sofrer é saber viver. E quem sabe viver tem mais chances de encontrar a felicidade, reconhecê-la e abraçá-la, sem deixá-la partir. Façamos como o poeta, deixemos a vida seguir seu curso natural…

www.atividadepensante.com
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