Ribeirinhos do Rio Solimões aprimoram produção da famosa farinha Uarini

A farinha do Uarini é um dos alimentos mais consumidos na mesa do amazonense há séculos. Seja acompanhando um peixe assado, uma carne ou até mesmo nos restaurantes mais conceituados, a iguaria é a cara do Amazonas. A produção da zona rural de Tefé-AM e Uarini-AM (521 e 565km de Manaus, respectivamente) vem ganhando força nos últimos anos, reunindo agricultores familiares que fazem a própria farinha para vender no mercado seguindo um padrão de qualidade digno de grandes fabricantes. 

Repassar aos produtores boas práticas para a produção foi o objetivo de capacitação realizada na comunidade São Francisco do Bauana, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá. Mais de 20 produtores locais se reuniram para entender como melhorar a produção, em um intercâmbio que mobilizou também indígenas da etnia Miranha.

A oficina foi uma ação de parceria do Instituto Mamirauá e da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), por meio do Edital Floresta em Pé, que tem recursos do Fundo Amazônia/BNDES. Os ribeirinhos puderam aprimorar regras de higienização, armazenamento e transporte, além da legislação que envolve a produção, com participação da Fundação em Vigilância em Saúde (FVS).

Foto: Divulgação
Os indígenas da etnia Miranha contaram como ter mais eficiência na torra da farinha, reduzindo o consumo de lenha, além de técnicas para a redução do pó e aumento da velocidade de produção, a partir de técnicas desenvolvidas durante décadas. As dicas repassadas permitem uma farinha com qualidade diferenciada para o mercado, com grãos tipificados, crocância, além de segurança alimentar por adotar condições higiênicas de produção.

“A partir do momento em que se tem uma produção higiênica nesse processo, a segurança alimentar da farinha fica assegurada e o produto possui cada vez mais qualidade, agregando mais valor a essa produção que mantém a floresta em pé”, ressalta a coordenadora do Edital Floresta em Pé, Mickela Souza.

Selo de Identidade Geográfica

A oficina foi uma iniciativa da Associação de Produtores Agroextrativistas da Floresta Nacional de Tefé (APAFE), que tem por objetivo fornecer subsídios aos produtores rurais para a obtenção do selo Identidade Geográfica. Por meio dele, é possível reconhecer as áreas que fabricam a farinha de qualidade Uarini, popular no Amazonas. Como o próprio nome já diz, Uarini é um dos municípios que compõem essa lista, além de Maraã, Fonte Boa, Tefé e Alvarães, onde foi realizada a oficina. 

O selo IG ganha importância porque atesta a qualidade do produto desde o momento do descascamento da mandioca até a etapa de torra sustentável da farinha. A APAFE tem o objetivo de fabricar pelo menos três tipos de farinha do uarini: a farinha filé, a farinha ovinha e a farinha ova, que podem até mudar de tamanho e crocância, mas não perdem o sabor característico do interior do Amazonas. 

“Eles cumprem um padrão de qualidade que é diferenciado. Estes tipos de farinha têm um gosto diferente da farinha d’água e amarela, por exemplo. Os tamanhos dos grãos, atingidos nos processos de peneiração (pelos diferentes tamanhos da trama das peneiras) e embolagem da massa, são responsáveis por sua classificação. É um processo de produção característico. O selo IG representa que essa farinha tem valor agregado para ir ao mercado”, explica Mickela. 

Vontade e sustentabilidade

A tecnologia social iniciada nas casas de farinha financiadas via Edital Floresta em Pé/FAS funcionou graças ao desejo dos produtores de ter seus produtos valorizados no mercado. A vontade, união e espírito sustentável foram os ingredientes que tornaram a farinha do Uarini não apenas uma tentativa desses empreendedores para obter renda, mas um resultado calculado. 

Mickela explica que com a nova estrutura das casas de farinha – com estrutura diferenciada dos fornos que propiciaram a redução da quantidade de madeira para a torra da farinha – o tempo de preparação no processo de fornada caiu de 50 min a 1h para 30 a 40 minutos. “É a otimização dessa parte da produção”, afirmou.

A coordenadora destaca ainda a grande participação de mulheres na oficina. Para ela, a importância das empreendedoras é gigantesca visto a presença delas em todas as etapas da produção da farinha.

“Elas atuam desde o plantio até as fases de produção. Até mesmo no processo de comercialização junto aos atravessadores, por exemplo, a mulher vem, enquanto produtora, desempenhando um papel extremamente importante na cadeia de produção da farinha. Ela acaba fortalecendo a sua função  dentro das comunidades”. 

Floresta em Pé

Em Tefé e Alvarães, quatro comunidades fazem parte do projeto desenvolvido pela APAFE: São Francisco do Bauana, São Francisco do Arraia, Tauary e Santo Antônio do Ipapucú. Os investimentos da FAS por meio deste projeto incluiu a construção de quatro casas de farinha com toda a estrutura higienizada, fornos de qualidade e materiais para prensa e preparo da massa da mandioca que será transformada em farinha. Outros 16 projetos de renda sustentáveis estão contemplados no Edital Floresta em Pé, totalizando um investimento de R$ 2,5 milhões do Fundo Amazônia/BNDES.

Iniciado em 2017 pela FAS, o edital recebeu 181 inscrições, avaliadas por um comitê independente que selecionou os projetos 17 aptos para receberem os aportes em torno de R$ 150 mil.

Os projetos estão chegando a um ano de vigência e após o investimento em infraestrutura passam a focar fortemente nos diversos processos produtivos que agregam e a trabalhar para o escoamento da produção.

A FAS continua com seu monitoramento e assessoria em gestão de projetos junto às organizações e, por meio de consultoria específica, vem a unir esforços para impulsionar a etapa de comercialização dos produtos e serviços frutos de cada iniciativa.
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