Tudo isso pode parecer muito engraçado até você perceber o quanto de discriminação esses memes escondem: o ageísmo.
Foi em 1969 que Robert Butler batizou o nome de ageísmo para a discriminação contra idosos. Ele queria um nome tão forte quanto racismo e machismo, pois sabia que a discriminação contra idosos tinha reflexos até mesmo em sua área de pesquisa: a saúde dos mais velhos. Seus estudos sobre idosos em instituições de longa permanência (“asilos”) indicaram, por exemplo, que, ao contrário dos preconceitos generalizados, nem todo idoso tem disfunção sexual e nem todo idoso necessariamente será senil¹.
Estudos da área da Psicologia demonstram que o ageísmo não é apenas expressão do “politicamente correto”². Boa parte dos idosos relatam vivência de discriminação em contextos sociais: ouvem piadas sobre a idade, são ignorados, sofrem insultos, são vítimas de infantilização e paternalismo, associam dores à idade e se assumem surdos. Ageísmo não deixa de ser, também, atos de violência contra o idoso.
Se você ainda não se convenceu de que essa discriminação realmente existe, basta lembrar que, um ano atrás em fevereiro de 2020, a pandemia do coronavírus começava a chegar no Brasil. A COVID-19, àquela época, era considerada “doença de velho”. Fomos invadidos por memes para “trancar velhos em casa” e sugestões de “caminhões catavelho”³. E muita, muita gente ajudou a viralizar o ageísmo nas nossas redes sociais sem nem perceber.
O que fazer contra o ageísmo? A sugestão é mudar nossos vieses sobre a velhice. Os estudiosos apontam que exemplos positivos sobre pessoas idosas podem reduzir os estereótipos negativos (e implícitos) contra os mais velhos. Precisamos falar, sim, sobre representatividade idosa e inundar nossas mídias com esses exemplos.
Em seu clássico “A velhice”5, Simone de Beauvoir dizia que “em nós é o outro que é velho”. A velhice aparece mais para os outros do que para nós mesmos, dizia Beauvoir. É o outro que nos reconhece velhos, e não o contrário. Se Beauvoir estivesse viva, concordaria em dizer que ninguém se vê velho como a Rainha; ao mesmo tempo, ninguém quer ser vítima de memes, como aconteceu com Elizabeth.
1 Robert N. Butler, Ageism: looking back over my shoulder, Generations: Journal of the American Society on Aging, v. 29, n. 3, 2005, pp. 84-86. 2 Juliana Fernandes-Eloi et al, Ageísmo: percepção de pessoas idosas usuárias do CRAS, Subjetividades, n. 20 (fascículo especial), 2020; Maria Clara Couto et al, Avaliação de discriminação contra Idosos em contexto brasileiro: ageísmo, Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 25, n. 4, out-dez. 2009, pp. 509-518. 3 Raíssa Costa, Ageísmo em tempos de pandemia: desvelando o preconceito contra idosos no Brasil, Revista Longeviver, n. 9, jan.-mar., 2021. 4 Becca R. Levy et al, Implicit ageism, Ageism: stereotyping and prejudice against older persons, Cambridge, The MIT Press, 2002, pp. 49-75. 5 Simone de Beauvoir, A velhice, Tradução de Maria Helena Franco Martins, 2.ed., Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2018, p. 302.
Vitor Fonsêca é Doutor (PUC/SP). Professor Universitário e Promotor de Justiça (AM) – diarioprocessual.com