Em Porto Velho, túmulo de poeta Vespasiano Ramos é ponto de visitação turística
Existe um tabu sobre a morte. No entanto, algumas iniciativas mostram que os cemitérios são vitais para a compreensão da história e da memória. Formam verdadeiras cidades com distinções sociais, com obras arquitetônicas e de arte que dizem muito sobre as personagens, seu tempo e a própria sociedade.
Em Rondônia, foi recuperado em 2016 o túmulo do major Emanoel Silvestre do Amarante, morto em 1929 e sepultado no Cemitério dos Inocentes, em Porto Velho; Amarante era genro de Marechal Rondon — oficialmente, herói da Pátria — e seu braço direito, o único oficial da Comissão das Linhas Telegráficas MT/AM sepultado em solo rondoniense.
Ainda no Cemitério dos Inocentes foi revitalizado, também em 2016, o túmulo do poeta Vespasiano Ramos, morto em 1916, quando Porto Velho era um vilarejo de apenas dois anos de existência. O ato de recuperar sua última morada trouxe lustro à memória apagada daquele que é considerado o precursor da letras em Rondônia e que figura no Mapa Brasileiro de Literatura. Hoje, o túmulo de Vespasiano é dos mais visitados pelos interessados em literatura, poesia s cultura.
Procurei – sem êxito – onde ficava o túmulo da cientista e dama da ornitologia mundial, Emilie Snethalage, alemã também sepultada no Cemitério dos Inocentes em 1929. Ela foi a primeira mulher membro da Academia Brasileira de Ciências. Por não conseguir encontrar o local do sepulcro, encomendei por minha conta um busto dela e o afixei nas imediações do Memorial Rondon, no Vale do Rio Madeira, onde ela elaborou suas últimas pesquisas sobre as aves da região.
O cemitério fantasma de Porto Velho
Ali, foram sepultados milhares de corpos. A maioria, jovens. Gente do mundo todo afetada pelas doenças do “inferno verde” durante a construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, entre 1907 e 1912.
Na imagem, junto comigo, estão os veteranos José Bispo (hoje já falecido) e Paulo Ramos, antigos ferroviários e defensores da preservação do cemitério.
Há muitas lendas envolvendo o cemitério-fantasma que fora abandonado e tomado pelo mato. Casos de mistério que viraram livros e contos que passam de geração a geração.
O lendário Marechal Rondon
Rondon, que era um homem de vanguarda e amava a tecnologia, ao mesmo tempo em que tanto prezava as raízes históricas, certamente gostaria da ideia de promover cemitérios como museus a céu aberto. Tal afirmativa se sustenta no fato de que o militar voltou ao seu local de nascimento, Mimoso (MT), tendo mais de 80 anos de idade, justamente para construir o túmulo de sua mãe — Claudina Maria da Silva — e fazer dele um monumento colocado à entrada da escola que leva o nome de sua genitora para que todos o avistem. E mais: Rondon foi quem esboçou o desenho do jazigo dele próprio fazendo constar a maior expressão da Filosofia Comtista a qual o herói fez sua religião: “o amor por princípio, a ordem por meio e o progresso por fim”.
Mesmo que localizado no Rio de Janeiro, o Cemitério de São João Batista tem muito a ver com Rondônia. Nele estão sepultados os principais nomes da história local: Marechal Rondon, Aluízio Ferreira [primeiro governador e explorador do Guaporé], Coronel Jorge Teixeira [governador da fase de transição de território para estado de Rondônia], além de Álvaro de Melo Coutinho de Vilhena [patrono do município de Vilhena].
Todos merecem ser lembrados. Afinal, homens e mulheres não morrem, como bem poetou Guimarães Rosa: “O mundo é mágico. As pessoas não morrem, ficam encantadas”.
Turismo e arte tumular
Ainda nos EUA, há um cemitério, o Nacional de Arlington, em Washington, em que citytour guiado custa 9 dólares; é onde está sepultado o ex-presidente John Kennedy.
Não é diferente na Europa. Há vários cemitérios visitados por turistas na França, Espanha, Itália… Destaco o Cemitério de Highgate, em Londres, tendo como habitante mais ilustre o sociólogo alemão Karl Marx. As visitas guiadas a esse logradouro custam 8 libras.
O Père Lachaise, em Paris, também promove o turismo. Além da beleza do lugar, chamam a atenção mortos notáveis como Honoré de Balzac, Marcel Proust, Edith Piaf e Jim Morrison.
Em Pequim, o cemitério de Babaoshan, é o mais famoso da China, onde estão enterrados heróis revolucionários e membros de dinastias chinesas.
Em Buenos Aires, o túmulo de Evita Perón figura entre os atrativos turísticos da cidade em guias oficiais. Gente do mundo todo frequenta o local simples, nada monumental perto da grandeza do que foi a dama portenha idolatrada até os dias de hoje.
No Brasil, alguns cemitérios já oferecem serviços turísticos. Exemplo, o da Consolação, em São Paulo – lá descansam expoentes de tantas áreas, que vão de santos populares, artistas, passando por presidentes da República até nomes como Monteiro Lobato, Mário de Andrade, Marquesa de Santos, Conde Matarazzo e centenas de outros.
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