Único brasileiro homenageado com o nome de um Estado, sertanista é festejado com série em streaming e livro.
Tiradentes, Duque de Caxias, Rui Barbosa, Castro Alves, Santos Dumont, Getúlio Vargas são, nesta ordem, os brasileiros mais homenageados com seus nomes dados a ruas, bairros, cidades, escolas. Rondon não aparece entre os 100 mais lembrados em vias públicas, que privilegiam santos da Igreja Católica, números e as grandes personagens aqui citadas, dentre tantas outras.
Mas Rondon é o mais pop, perdendo apenas para Santos Dumont em reconhecimento internacional. O indigenista foi três vezes indicado ao Prêmio Nobel [sendo a primeira delas por Albert Einstein], teve seu nome vinculado à Sociedade Geográfica de Nova York e inscrito em letras de ouro junto de outros três exploradores mundiais: Amundsen (o descobridor do Polo Sul), Peary (o descobridor do Polo Norte) e Byrd (o maior explorador das terras árticas).
Além de tudo, Rondon é o único brasileiro presente no nome de um estado: Rondônia significa Terra de Rondon, na definição do etimólogo Edgard Roquete-Pinto. Há, ainda, o Meridiano Rondon, nome honorífico do Meridiano 52 W que, partindo do Polo Norte, atravessa os oceanos Ártico, Antártico e Atlântico, as américas do Norte e do Sul e chega ao Polo Sul.
Herói Brasileiro reconhecido tardiamente – sua entronização ao Panteão da Pátria, em Brasília, se deu em 2015 – Rondon já foi retratado de todas as formas: da prancheta de desenhistas de gibis a mestres das artes plásticas dos quilates de Cândido Portinari e Giuseppe Boscagli.
Um dos retratos feitos com tinta à óleo sobre tela mais valorizados era o de autoria do artista carioca Décio Villares, positivista tal qual Rondon e o responsável por ajudar a projetar a Bandeira Nacional.A obra “Rondon”, pintada na década de 1920 por Villares, foi destruído no incêndio do Museu Nacional, do Rio de Janeiro, em 2018.
O marechal esteve representado, ainda, em produções cinematográficas internacionais, desde os tempos áureos da telona até as plataformas de streaming. Recentemente, foi exibida “O Hóspede Americano” – com os atores Aidan Quinn (Roosevelt) e Chico Diaz (Rondon) – série da HBO dirigida por Bruno Barreto.
Na literatura, são dezenas de biografias, artigos, textos literários diversos e poemas. O poeta-maior do Brasil, Carlos Drummond de Andrade, dedicou a Rondon o “Pranto geral dos índios”.(…)Ó Rondon, trazias contigo o sentimento da terra. / Uma terra sempre furtada/ pelos que veem de longe e não sabem/ possuí-la (…).
A escritora Rachel de Queiroz também fez referência a Rondon e lembrou que ele deu “seu nome a um vasto território, Rondônia, maior que muitos países europeus”. Outro imortal da ABL, antropólogo Darcy Ribeiro assim se expressou no ato do sepultamento de Rondon em 1958: “Aqui estamos os que cremos que a obra da vossa vida é a mais alta expressão da dignidade do povo brasileiro”. Em 2023 está fazendo 65 anos a morte de Rondon, aos 92, no Rio de Janeiro.
O norte-americano Larry Rohter publicou em 2019 “Rondon: uma biografia”, muito bem recebida pela crítica por sair das obviedades sobre a vida do guerreiro da paz. Aliás, a obra chamou a atenção do editor rondoniense Abel Sidney (membro da Academia Rondoniense de Letras) que escreveu para a revista Karipuna Kult (publicação da ARL) uma observação interessante e muito correta: “O marechal não foi verdadeiramente auxiliado em nenhum governo em sua trajetória”. Para entender isso, é preciso ler sua história e constatar como ele driblou as burocracias e intempéries de um sistema há muito corrompido e pouco interessado nas bandeiras bradadas pela resiliência do militar mato-grossense.
Ziraldo e o menino Rondon
Em 2016 o cartunista, jornalista e escritor Ziraldo – ícone absoluto da cultura brasileira, criador do “Menino Maluquinho” – lançou, em Porto Velho, o livro “Rondon Menino Cândido”, que ele ilustrou sobre o texto de Ciça. Ziraldo disse que desde criança já admirava a personagem, porque sempre gostou de História e acredita que: “Rondon está entre os dez maiores brasileiros de todos os tempos”.
O Brasil para os brasileiros
Obra infanto-juvenil relevante é “Não se mata na mata – Lembranças de Rondon” (Editora Mercuryo Jovem, 2008), de Ana Maria Machado [autora com trabalhos reconhecidos mundialmente, ex-presidente da Academia Brasileira de Letras e vencedora do “Prêmio Jabuti”], com páginas ilustradas por Maria Inês Martins. O livro mostra que Rondon, o protetor dos filhos da floresta, encurtou distâncias e trouxe o brasileiro para dentro de seu país.
Memória, moeda e selo
Afora os artistas e intelectuais que sempre o tiveram em conta, há ações oficiais importantes, a exemplo dos museus, memoriais e galerias temáticos. O Memorial Rondon, localizado em Porto Velho, é um dos pontos turísticos mais visitados da capital rondoniense, com público de 100 mil pessoas em sete anos. Esta é a comprovação de que, sim, a preservação da memória quando acessível à população pode ser vista como um grande atrativo.
No tempo em que o Governo Brasileiro mantinha em seu dinheiro efígies em homenagem a personagens históricos em diversos campos – artistas, estadistas, poetas, cientistas, escritores, heróis –, Marechal Rondon também foi festejado. O registro iconográfico, que traz no verso da nota representações indígenas, é referente à concepção e lançamento da nota de 1.000 Cruzeiros, emitida em 1990, ano em que se comemoravam o 100º aniversário do início das atividades de exploração geográfica e implantação de linhas telegráficas com a participação de Rondon.
Os Correios também homenagearam Rondon diversas vezes, com a emissão de selos comemorativos. O último deles foi lançado em 2016 quando da inauguração do Memorial Rondon.
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