Lavoura indígena: a surpresa da Exposição de Milho de 1918, organizada pela Comissão Rondon

As variedades de milho, fava e amendoim cultivadas pelos povos nativos de Rondônia encantaram os visitantes e os jornalistas.

A Comissão Rondon tinha como missão principal ampliar as linhas telegráficas do Brasil, que chegaram à margem do Rio Madeira em 1915, conectando Santo Antônio do Rio Madeira (atual Porto Velho) a Cuiabá. Além disso, Rondon promoveu relevantes estudos científicos e propôs a criação do SPI (Serviço de Proteção ao Índio), instituído em 1910 pelo presidente Nilo Peçanha.

Para proteger os povos originários, Rondon defendia que eles deveriam se tornar autossuficientes na agropecuária. Foi assim que o militar trouxe para Rondônia as primeiras cabeças de gado, que foram colocadas nas pastagens da Fazenda Três Coqueiros, por ele criada, e tentou ensinar os indígenas a manejar a pecuária.

Mas Rondon não apenas ensinou os indígenas, como também aprendeu com eles. Ele ficou admirado com as variedades de milho, amendoim e frutos que existiam no Planalto dos Parecis e em outras áreas da “da Rondônia”. Esse era o nome que o cientista Edgard Roquette-Pinto havia dado, em 1917, à região demarcada por ele em homenagem a Rondon, embora o território ainda pertencesse ao estado do Mato Grosso.

Anúncio de jornal publicado no “Correio da Manhã”. Foto: Reprodução

As produções nativas foram investigadas pelo botânico da Comissão Rondon Francisco Carlos Hoehne, que participou de várias campanhas, inclusive a famosa Expedição Científica ao Rio da Dúvida ou Rondon-Roosevelt, em 1913/14. Ele se tornou um nome notável e contribuiu para a Seção de Botânica do Instituto Butantã, de São Paulo, onde foi diretor do Instituto de Botânica.

A Comissão Rondon apresentou o milho indígena ao Brasil na Exposição de Milho de 1918, no Rio de Janeiro. A mostra, organizada pela Sociedade Nacional de Agricultura, exibiu modelos de milho, fava e amendoim cultivados pelos povos nativos de Rondônia. Esses produtos eram essenciais para a sobrevivência dos indígenas e tinham variedades únicas no país.

O catarinense João Geraldo Kulhmann, que integrava a Comissão Rondon e se tornaria um renomado botânico, com mais de 80 publicações científicas, foi o responsável pelo estande na então capital do Brasil. Ele explicou que o milho indígena era de sementes exclusivamente brasileiras e tinha cores diferentes dos milhos comuns.

Espigas coletadas em lavouras dos Nambiquaras, Parecis e Arikemes. Foto: Comissão Rondon

O milho dos Nambiquaras, da região de Vilhena, por exemplo, era cinzento, vermelho ou amarelo, mas macio e branco por dentro. Kulhmann disse que ele seria ótimo para fazer maisena. Os indígenas gostavam de comer o milho assado com amendoim, depois de maduro. As espigas eram grandes, cerca de dois centímetros a mais do que as das plantações civis.

Amostras e sementes do milho indígena foram distribuídas pela Comissão Rondon para várias instituições de agricultura do Brasil, para estimular o cultivo dessas variedades. Havia pontos comerciais que defendiam os produtos, com sucesso.

Rondon defendia que os nativos deveriam ser independentes e fazer de seus territórios “celeiros para o Brasil”. No entanto, isso nunca se concretizou, devido às dificuldades estruturais, a interrupção da Comissão Rondon e à subjugação dos indígenas, que acabaram tutelados pelo Estado Brasileiro e tiveram suas terras repassadas aos colonos e exploradores, principalmente a partir de 1960, com a abertura da BR-364.  

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