Como era a vida no Vale do Madeira em 1862

Desenhista alemão registrou o dia a dia da região: habitação, caça e pesca.

Personagem pouco falado na história de Rondônia, o viajante Franz Keller-Leuzinger era desenhista, pintor, engenheiro; foi o primeiro a registrar o “modus vivendi” no Vale do Rio Madeira, no atual estado de Rondônia. Fez todos os esboços de seus desenhos “in loco” e os concluiu no Rio de Janeiro, produzindo um acervo imprescindível à compreensão da vida na floresta àquela altura.


Franz chegou ao Brasil em 1856; casou-se com a filha de Georg Leuzinger (fotógrafo, livreiro e editor suíço residente no Rio de Janeiro), que, aliás, nos anos de 1850 já contava também com uma tipografia e litografia, antes de se tornar um dos primeiros fotógrafos no Brasil.

Índios Caripunas e suas embarcações – Foto: Reprodução

Em 1860, Franz assume a direção do departamento fotográfico da Casa Leuzinger, no Rio de Janeiro, onde teve como aprendiz o fotógrafo Marc Ferrez (1843-1923), “lenda” que deixou um vasto legado documental para o Brasil.

Posteriormente, Franz foi trabalhar como engenheiro contratado pelo Império para realizar um levantamento topográfico dos rios próximos à Bolívia, região praticamente desconhecida. Ele deveria fazer estudos para a construção de planos inclinados para a melhoria da navegação e uma ferrovia no eixo dos rios Madeira e Mamoré.

Franz tinha 27 anos de idade quando chegou ao Madeira; percorreu a misteriosa floresta Amazônica com a finalidade de estudar a arqueologia e os costumes locais, a serviço do Governo Brasileiro interessado em instalar a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré — que só seria viabilizada mais de meio século depois, quando Keller já havia falecido. 
Franz Keller: sua obra só foi publicada no exterior – Foto: Divulgação

Formado na Academia de Belas Artes de Karlsruhe, seu trabalho é pouco reconhecido no contexto da arte e da história brasileiras, e muito menos em Rondônia. Todo o livro de história que se preza deveria falar de Franz Keller como pioneiro, dada a sua importância no contexto historiográfico e, ainda, pelo valor estético do conjunto da obra.

O alemão voltou ao Rio de Janeiro; estava enfraquecido pelas febres e queimado pelo sol. Fixou moradia no Rio, aonde trabalhou no ateliê de seu sogro. No final de década de 1860 voltaria ao Norte, no atual estado do Amazonas, em companhia do fotógrafo alemão Albert Frisch (1840-c.1905).

Em 1873, Franz retornou a Alemanha para tratar de sua saúde debilitada por conta de suas aventuras na Amazonas. Naquele país ele relatou no livro “The Amazon and Madeira rivers” (Os rios Amazonas e Madeira), publicado em 1874, como eram a fauna, a flora e o dia a dia dos indígenas da região; fez o primeiro registro de que se tem notícia do mítico Pirarucu, o peixe gigante da Bacia Amazônica. Os olhares artístico e científico se encontraram na obra do alemão.

Jovem caripuna com dentes de javali nas narinas e orelhas – 

O livro publicado na Alemanha foi traduzido para o inglês; no Brasil, somente as gravuras foram publicadas em 1876, na revista Illustração Brasileira, fundada pelo litógrafo alemão Henrique Fleuiss (1823-1882).

Fotografias, aquarelas e desenhos de sua autoria podem ser encontrados na coleção Dona Thereza Christina Maria, da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro; na coleção de Paulo e Maria Cecília Geyer; e também na coleção White Martins, do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ).

O grande desenhista e pesquisador Franz Keller faleceu em 1890, em Munique, aos 54 anos. 

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