A ferrovia de papel

Depois de mais de um século, projeto de ferrovia que deverá chegar a Rondônia avança no Mato Grosso.

Depois de muitas tentativas frustradas, desde o século 19, a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (EFMM) foi inaugurada em 1912; foi a 15ª ferrovia construída no Brasil. O percurso era de 366 quilômetros ligando Porto Velho – então uma cidade ao sul do estado do Amazonas – a Guajará-Mirim, cidade mato-grossense na fronteira do Brasil com a Bolívia.

Somente em 1943 seria criado o Território Federal do Guaporé, atual estado de Rondônia, com Porto Velho como capital. Até 1966, a EFMM funcionou com passageiros e teve alguma sobrevida para fins turísticos; tornou-se uma iconografia histórica, um símbolo desta região amazônica.

O que muitos não sabem é que se planejava outra ferrovia para o atual estado de Rondônia, chegando à região do Vale Guaporé. Desde a Comissão Rondon (1907/1930), já se falava em perspectiva da instalação de uma ferrovia com saída onde está hoje o município de Cabixi no sentido a Cuiabá e, de lá, para o Sudeste do País. Em 1911, houve estudos elaborados pelo Governo Federal neste sentido. Mas ficou só na intenção.

Cidade de Vilhena, sul de Rondônia. Foto: Júlio Olivar/Acervo pessoal

Já no Governo Juscelino Kubitscheck, na década de 1950, foi idealizada a Ferrovia Transulamericana que ligaria os oceanos Pacífico e Atlântico, cortando todo o território do Guaporé no sentido Vilhena-Porto Velho. O projeto não avançou. No dia em que inaugurou a BR-29 (atual 364), em 1960, JK chegou a fazer mencionar o projeto, mas ele encerraria naquele ano o seu governo; seus substituto, Jânio Quadros, engavetou a ideia e, por pouco, não paralisou até mesmo as obras da 364, o que só não ocorreu por pressão da própria sociedade.

Em 1985, houve empolgação quando do anúncio da Leste-Oeste ligando Vilhena a Pirapora (MG), cobrindo distância de 2 mil e 300 metros, com previsão de custar US$ 5 bilhões de dólares, segundo a Valec, empresa pública vinculada ao Ministério dos Transportes. Não avançou.

Em outras ocasiões, a ferrovia foi novamente anunciada com alarde pelo Governo Federal que promoveu reuniões e audiências públicas em Vilhena. Em 1987, anunciou-se, de novo, a ferrovia agora ligando Vilhena a Vitória (ES), como parte de um estudo da Fundação Pedroso Horta sobre as necessidades globais da Região Centro-Oeste (que termina em Vilhena, divisa entre MT e RO) no abastecimento alimentar do mundo.

O mapa do traçado da FICO. Imagem: Divulgação/Governo Federal

Somente em 17 de setembro de 2008, por meio da Lei 11.772, a ferrovia foi incluída no Plano Nacional de Viação, agora com o nome de Transoceânica. Ultimamente, com o nome de FICO (Ferrovia Integração Centro-Oeste), foi anunciada “outra” ferrovia – ligando Vilhena a Mara Rosa (GO), 1.641 km de extensão, interligando à Norte-Sul, ao custo de R$ 6,8 bilhões.

A obra teve início em 2021 e, em 2023, o primeiro trecho (Mara Rosa a Água Boa (MT), com 383 km) foi aterrado. Não há uma previsão de quando a ferrovia atingirá Vilhena. Após isso acontecer, uma extensão de aproximadamente 700 quilômetros entre Vilhena e Porto Velho está em estudo, possibilitando a integração da FICO com a Hidrovia do Madeira, um dos principais corredores de exportação da soja, da carne, do milho e do algodão produzido em Rondônia e no Mato Grosso.

De acordo com o projeto da FICO, o traçado licenciado é 1,4 km distante das unidades de conservação mais próximas à ferrovia e não interceptará nenhum assentamento. Também não abarca nenhuma terra indígena ou comunidade remanescente quilombola dentro ou fora da Amazônia legal.

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