Avanço da tecnologia transforma a rotina dos indígenas do Amazonas

Além de captar informações, os indígenas utilizam a internet para espalhar o conhecimento tradicional

O Notebook, tablets e celulares, esses objetos são comuns para a maioria das pessoas, porém, para os indígenas ainda é um universo a ser desbravado. Aos poucos, o avanço da tecnologia possibilitou algumas mudanças no hábito das populações indígenas da Amazônia. Apesar da distância, o conhecimento tecnológico tornou-se parte da rotina de algumas comunidades.

De acordo com o professor Dr. Luiz Davi Vieira (PPGICH-UEA, Prof-Artes UEA/UFAM, TABIHUNI-Esat), o primeiro fato que devemos ressaltar é que tanto os indígenas, quanto os não indígenas possuem suas tecnologias. Enquanto para os brancos, a tecnologia pode ser um celular, computador ou a própria internet, dentro da cosmologia indígena, o mesmo termo pode ser empregado de maneira diferente.

Além de captar informações, os indígenas utilizam a internet para espalhar o conhecimento tradicional. Foto: Reprodução/FAS

“Existe um entendimento tênue que indígena tem que viver no passado. Pelo contrário, a cosmologia indígena tem seus desafios contemporâneos diante de suas cosmologias. Por exemplo, o ritual de xamanismo Yanomami (hekuramou) acontece diariamente em um diálogo entre o pajé e espíritos. Essa prática rege toda experiência da aldeia. Já os Tukanos praticam o xamanismo (Bahsese), tocam e dançam o kariçu em diálogos os com espíritos para regerem o cotidiano. Neste sentido, eles levam a cosmologia Tukano para o desafios do dia a dia, na reação de construção e elaborado de sua existência. Exemplo: dos instrumentos musicais do kariçu e construção de casas nas aldeias até teses de doutorado na Universidade do não indígena”, explicou Luiz Davi.

Ainda segundo o professor, as ferramentas tecnológicas são de suma importância para o dia a dia dos povos indígenas. Afinal, elas possibilitam o acesso deles as redes sociais, educação (aulas EaD), além de servirem como plataforma de divulgação do conhecimento tradicional, através das redes sociais. “Os indígenas precisam de informação, principalmente, aquelas voltadas a eles. O conhecimento da população indígena pode se fazer presente mediado por tecnologias, mesmo eles estando na aldeia. Ainda mais se tratando de eventos online, ratificando a voz dos próprios povos tradicionais. Ou seja, o crescimento tecnológico nas aldeias indígenas é de suma importância para inseri-los dentro do contexto do não indígena”, contou Luiz Davi.

A educação escolar indígena é uma das principais pautas quando se trata de tecnologia. Luiz Davi ao acompanhar de perto esses desafios, onde os próprios indígenas geram o seu material pedagógico como, por exemplo, a estudante indígena Lily Baniwa que está desenvolvendo junto ao seu povo em São Gabriel da Cachoeira um projeto artístico. “Pela internet, consigo ver fotos e filmagens e, assim, vou orientando e construindo juntos esse trabalho”, disse o pesquisador, destacando que esse é um fruto da tecnologia em terra indígena.

Por meio da tecnologia, indígenas podem mostrar sua cultura. Foto: Divulgação/Governo de Tocantins

Alcance

Para muitos indígenas e ribeirinhos, que habitam em regiões de difícil acesso, a internet ainda é uma “história de pescador”. Visando em mudar essa realidade, a Fundação Amazônia Sustentável e uma empresa brasileira do segmento de varejo, desenvolveram um projeto que leva internet para comunidades remotas no interior do Estado.

“Usar a internet aproxima a gente dos amigos e parentes que estão distantes. Também nos mantemos em contato direto com membros de associações e instituições, o que é essencial. O projeto Conectividade é o que socorre com uma internet boa, onde conseguimos nos comunicar de maneira rápida e fácil”, conta José Cruz Lima de Lima, 31 anos, morador da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) de Uacari, no município de Carauari, a 787 quilômetros de Manaus. José trabalha como monitor na Casa Familiar Rural do Campina, espaço de educação focado no campo e na floresta.

Outro beneficiário do projeto é João Victor, 21 anos. Natural de Manaus e estudante de Pedagogia, o jovem é um dos usuários da internet disponível no Núcleo de Conservação e Sustentabilidade (NCS) da FAS, na RDS Rio Negro, uma estrutura integrada à floresta com biblioteca, salas de aula e laboratório de informática. É no núcleo que João Victor assiste às aulas, estuda, faz cursos, se informa e se “conecta” ao mundo além do Tumbira, comunidade situada na zona rural do município de Iranduba, a 64 quilômetros de Manaus.

“Com a chegada da internet do laboratório [NCS], tudo ficou muito mais viável para mim, já que uma boa conexão e que não falha como antes é fundamental para as nossas videoaulas e das provas”, conta o universitário. 

Por causa das grandes distâncias, a tecnologia em algumas comunidades são limitadas. Foto: Divulgação/FAS

Acessibilidade

A Motorola em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e representantes dos idiomas Nheengatu e Kaigang, desenvolveu um projeto inédito de inclusão dos idiomas indígenas em seus smartphones.

De acordo com a equipe responsável pelo projeto, a iniciativa é inédita no mundo e abre uma discussão mais ampla sobre preservação cultural através da tecnologia.

A iniciativa é inédita no mundo e abre caminho para uma discussão mais ampla sobre preservação cultural, onde novas gerações de falantes indígenas poderão interagir com a tecnologia no seu dia a dia.

Trabalharam no projeto, a gerente de línguas e tradução da Motorola, Juliana Rebellato e o professor da Unicamp, Wilmar D’Angelis (Pesquisador em Lingüística Antropológica, Antropologia Cultural e Ensino de Línguas) que dedicou mais de 40 anos de sua vida nos estudos de povos indígenas e foi fundamental para viabilizar a iniciativa.

Antena é instalada em comunidade indígena. Foto: Reprodução/FAS

Nas redes sociais 

Atualmente, apenas com um celular na mão e uma ideia na cabeça, muitas pessoas se tonaram influenciadores digitais. E, através das redes sociais, a indígena Gabrielle Maragua, mais conhecida como Ira Maragua, mostra receitas regionais, dicas de beleza com produtos naturais e a rotina na comunidade Parque das Tribos, localizado no bairro Tarumã, área que abriga família indígenas de diversas etnias.

Foto: Diego Oliveira/Portal Amazônia

“Fico feliz em trazer cultura e informação dos indígenas para os internautas. Até porque é raro encontrar uma indígena que mostre suas raizes desse jeito. São receitas caseiras passadas de geração a geração, dicas que podem ser feitas com materiais que os amazônicas tem em casa”, destacou Ira.

No seu quarto, Ira montou um cenário para gravar seus vídeos de maquiagem e rotina com a pele. “A internet virou o principal espelho da nossa cultura. Recebo mensagens de internautas que se inspiram nas minhas dicas e fico contente com esse retorno”, falou a influenciadora, que conta com mais de 25 mil seguidores no Instagram. 

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