Aquela jovem mulher que se candidatou à perenidade da beleza, preencheu o inusitado momento de uma cidade em plena floresta amazônica.
Ainda soprava o vento frio, resquício da friagem amazônica, a chamada “friagem de São João”, quando a população de Manaus saía às ruas para lotar as duas principais avenidas, Eduardo Ribeiro e Sete de Setembro, em uma tarde sombria e soturna dos primeiros dias do mês de julho dos saudosos anos dourados para receber festivamente uma personalidade ilustre que, em sua simplicidade, fazia o amazonense, do Governador do Estado ao anônimo cidadão daquela época, sorrir e chorar ao mesmo tempo, com a oportunidade excepcional de poder ver de perto e abraçar calorosamente a mais bela mulher do Brasil.
Transcorria o ano de 1957 e havia burburinho nas ruas, um clima de grande alegria com a chegada da Miss Brasil. Manaus neste momento, também estava em festa com a visita do Presidente da República Portuguesa General Francisco Higino Craveiro Lopes, que de bom grado e de notável presença, viria trazer alegria e satisfação de forma diferenciada a colônia portuguesa em Manaus.
Aquela jovem mulher que se candidatou à perenidade da beleza, preencheu o inusitado momento de uma cidade em plena floresta amazônica, driblando qualquer influência da vida e do mundo, numa infância vivida em um município não muito distante, São Paulo de Olivença ou na adolescência em Manaus.
Aconteceu que, certo dia, no desejo de continuar seus estudos, Terezinha Morango transferiu-se para Manaus, indo morar com sua avó na Rua Jonathas Pedrosa, ao lado do Cine Éden tendo se matriculado no Instituto de Educação do Amazonas.
Saindo do Instituto de Educação do Amazonas, depois de ganhar o título de Rainha dos Estudantes do Amazonas, Terezinha matriculou-se no primeiro ano clássico do Colégio Estadual do Amazonas, nessa nova fase da vida, a criação de um espaço existencial diferenciado. Aos 15 anos foi morar com os tios, recebendo uma boa educação.
Nos anos 50 era moda colecionar recortes de revistas e jornais, principalmente daqueles que falavam dos artistas, estrelas e cantores populares da chamada era do rádio, cuja leitura principal trazendo comunicação dos grandes centros era O Cruzeiro, Manchete, Fatos e Fotos e principalmente a revista Cinelândia. Foi um período rico das rádios do Amazonas quando se ouvia com frequência a música (Normalista), composição de Benedito Lacerda e David Nasser interpretada por Nelson Gonçalves.
A nova rotina como Miss Brasil
Terezinha levantou-se às 11h30 depois de ter sido chamada três vezes. Passou os olhos pelos jornais e foi até a janela do quarto, cuja vista dava a para praia de Copacabana (RJ), sorriu para as pessoas e foi para o chuveiro. E assim dava início a vida de estrela consagrada. O telefone do apartamento que hospedou a miss não parava de tocar, logo em seguida o almoço: filé de peixe, risoto de frango e um copo de cerveja; foi servido para sobremesa morango sem creme. Às 13h, recebeu o telefonema de seu namorado, o cronista Chuck, e marcou encontro com ele às 16h, mas uma amiga comentou: “Acho que o rapaz vai levar bolo, nesta hora há várias entrevistas marcadas”.
Os diferenciais da vencedora foram as curvas e suas pernas que derrotaram a candidata de Minas Gerais – o júri estava indeciso entre Maria Dorotéia Antunes e Terezinha Morango. Carlos Machado, com sua experiência de showman, pegou duas cadeiras colocou uma ao lado da outra, mandou que as moças subissem e juntassem bem as pernas do calcanhar, às coxas, Maria Dorotéia apresentava um leve arqueamento nas pernas. Depois deste fato, o júri votou com unanimidade em Morango.
As torcidas estiveram presentes, miss Minas Gerais foi a mais aplaudida, cujos aplausos vinham principalmente das galerias, onde se concentravam a colônia mineira. Miss Ceará teve sua torcida liderada pelo Ministro Parcival Barroso, Governador Paulo Sarazate e Deputado Carlos Gereissati, todos em uma só mesa. Com medidas encantadoras, Terezinha Morango conquistou quase todos os títulos de beleza com 1,68 m de altura, 58 quilos, 94 centímetros de quadris, 91cm de busto, 62cm de coxa, 58cm de tornozelo. As medidas assim descritas foram a razão de sua vitória, que aos 22 anos pretendia fazer teatro e cinema.
O tempo passou e parece que foi ontem, porém, justifica-se a nossa eterna lembrança daquele momento vitorioso de nossa Miss Rio Negro, Miss Amazonas, Miss Brasil e Vice-Miss Universo. A beleza física é um presente de Deus, graça concebida pelo Criador.
Terezinha Morango nasceu no Canavial de São Paulo de Olivença, lugarejo escondido e distante do Brasil, localizado no Estado do Amazonas, no dia 26 de outubro de 1936. Ela nasce sob a mesma atmosfera poética que domina os romances indianistas de José de Alencar, “Iracema – a virgem dos lábios de mel”, que tinha os cabelos mais negros que as asas da graúna, assim vinha o poeta em seu imortal romance Iracema.
Dona Emir Gonçalves Morango, mãe de Terezinha, era uma amazonense típica do interior do estado, também do Município de São Paulo de Olivença, nessa época com 45 anos. Além de Terezinha, mais sete irmãos: José, Getúlio, Maria Antonieta, Marieta, Glória, Maria das Dores e Manuel. Fruto da união de um português de olhos claros e uma cabocla, seu pai era da cidade do Porto, da Zona do Rio Douro, trabalhava de sol a sol, em uma pequena mercearia.
A miss experimentou uma infância característica das personagens do romanceador ao viver simples e reservada no interior em que nasceu e mais tarde na cidade de Manaus. Aos 22 anos mostrou ao mundo sua beleza, que marcou um época de orgulho do povo amazonense. Terezinha Morango faleceu no dia 13 de março de 2021.
Sobre o autor
Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.
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